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Música

Os Gregos do Rotting Christ Fazem Black Metal Multicultural e Vão Tocar no Brasil

Conversamos com Sakis Tolis, o ideólogo da banda passa pelo país em maio para promover o álbum "Kata Ton Daimona Eaytoy"

Uma das bandas mais prolíficas - e pioneiras - do black metal, o Rotting Christ atualmente cumpre agenda de shows pelo mundo promovendo seu 11º álbum, Kata Ton Daimona Eaytoy. O nome faz referência a um antigo ditado de sua terra natal, a Grécia. Curiosamente, a frase também se encontra gravada no túmulo de Jim Morrison, provavelmente tirada dos escritos de Aleister Crowley. A mensagem, que o vocalista e guitarrista Sakis explica melhor na entrevista abaixo, é a mesma que caberia em qualquer retórica pela liberdade individual: seja verdadeiro consigo mesmo.

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É uma filosofia nada nova para quem acompanha a banda desde o início, ou pelo menos conhece o histórico do grupo formado em Atenas em 1987 por Sakis e seu irmão, o baterista Themis Tolis. Desde seu surgimento, o RC busca e estimula a descoberta do oculto, ancorados à premissa de que o pior inimigo do homem é ele próprio. O novo trabalho expande os horizontes musicais do tradicional black metal, resultando num álbum repleto de ingredientes multiculturais e referências a sociedades antigas. Tanto do ponto de vista histórico como de pesquisa musical: eles foram beber em fontes sumérias, russas, incas, romênias e pérsias para conceber o repertório e a temática das letras.

Poucas bandas do gênero conseguem se manter inventivas e relevantes após tantos anos de estrada, e a gente paga essa madeira para os caras. O público brasileiro vai poder conferir esta belezura da música pesada ao vivo em maio, quando eles realizam quatro apresentações por aqui. A turnê passará pelo Rio de Janeiro (Dia 15 - Teatro Odisseia), Limeira/SP (Dia 16 - Bar do Montanha), Varginha/MG (Dia 17 - Roça N' Roll) e São Paulo (Dia 18 - Hangar 110).

Peguei o gancho e fui atrás do Sakis, que mesmo cansadão na volta de uma passagem pela Rússia, foi muito gente fina e receptivo. Chega mais:

Noisey: 25 anos depois da formação da banda, vocês são considerados um dos grupos pioneiros do metal extremo. Quando vocês chegaram a esta, digamos, receita, para o som do Rotting Christ, era uma intenção consciente a ideia de cravar algo novo para o metal feito pelas bandas da época?

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Sakis: Poxa, amigo, em primeiro lugar, obrigado pelo comentário, é uma honra ouvir isso. Nós ficamos mais do que orgulhosos sempre que nos deparamos com avaliações como esta sobre nossa banda. É o que nos mantém na pegada e sempre prontos para manter o espírito vivo por mais 25 anos, nunca nos desviando desse nosso jeito único de fazer metal. De toda forma, não foi um estilo conscientemente lapidado ou arquitetado, acho que é tudo produto de nossa vivência, crescemos todos vivenciando diferentes situações de marginalidade, e acredito que a reação a este sistema ganhou uma forma musical em nossa expressão. Somos orgulhosos de ter conseguido criar o nosso próprio universo, e satisfeitos em notar que nosso mundo particular tem algo em comum com outros mundos tão distantes de nós.

O Rotting Christ já teve, naturalmente, diferentes integrantes no line-up. Como você acha que essas pessoas ajudaram a ampliar os horizontes musicais da banda, mesmo não mais fazendo parte do conjunto? Você é capaz de perceber ou pontuar os elementos que cada um deixou, como uma espécie de legado para a forma que o som acabou tomando?

Eles nos ajudaram nas apresentações ao vivo, e por isso somos muito gratos. Mas pra falar a verdade, o espírito da banda sempre foi ditado pelo meu irmão e eu, desde o começo, e eu espero que eventuais novos integrantes da banda mantenham essa pegada e pulem para dentro desse mesmo abismo. É difícil manter o espírito inicial de uma banda intacto, meu caro, com tantas adversidades que surgem entre os indivíduos envolvidos, especialmente quando passamos dos 40 anos. O importante é que vivemos e lutamos pela mesma ideia, a batalha é uma só, e continuaremos no mesmo compasso até o final, já que não faria sentido trilhar um caminho e viver uma realidade sem a busca da superação!

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Os caras que tocam atualmente com vocês dois são os melhores parceiros que já tiveram nesses anos todos?

Olha, se for pra levar em conta o retorno dos fãs mundo afora… Sim! Os novos integrantes são verdadeiros guerreiros.

Como está a cena metaleira aí na Grécia hoje em dia? Vocês se sentem meio que responsáveis por terem aberto caminho e inspirado uma geração inteira de headbangers a formar bandas e desenvolver uma autossuficiência em seu país? Mais ou menos como bandas tipo Sepultura e Dorsal Atlântica fizeram aqui no Brasil?

É, eu acho que podemos ser colocados numa analogia assim, mesmo, somos uma espécie de correspondência da importância do Sepultura e do Dorsal Atlântica em nossa terra. Muitos jornalistas fazem comparações de nós com o Sepultura aqui na Grécia, mas não musicalmente, mas exatamente por conta disso que você falou: nós influenciamos a formação da nossa cena local. Se você é mais um jornalista que tem esta percepção, eu só tenho a agradecer e expressar minha satisfação. É uma alegria saber que nosso estilo de vida e fé em nossos ideais influenciaram toda uma geração, e não tenho por que esconder que eu me sinto responsável por isso. Mais alegre ainda fico quando vejo a garotada nova formando bandas por aqui que acabam chegando além das fronteiras da Grécia com aquilo que criaram.

O título do recém-lançado álbum traz uma mensagem estimulando as pessoas a agirem de acordo com suas próprias vontades, certo? Seria esta uma crítica da banda à falta de direção, autoconhecimento e alienação do indivíduo contemporâneo? E, por que escolheram um título grego dessa vez, e não em inglês? Tem aí alguma referência à mitologia grega no conceito todo?

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Os dizeres Kata Ton Daimona Eaytoy são uma antiga máxima grega que em tradução livre significa "Seja Verdadeiro ao Seu Próprio Espírito", um ditado super atual nos dias de hoje, uma era destituída de personalidade e originalidade. O conceito do álbum aborda um tipo de multiculturalismo que glorifica a ideia da liberdade individual.

De onde vocês tiraram inspiração para este conceito?

Veio do meu grande interesse pela história das civilizações antigas tanto quanto pelo conhecimento apócrifo e oculto que esse estudo descortina. Informações que me estimularam a criar um álbum assim. Bem-vindos ao meu reino obscuro, além do sol!

O que mais te influencia criativamente?

Tudo aquilo que é obscuro e apócrifo, cético, dá satisfação à minha mente e me faz querer compor alguma coisa a respeito. Infelizmente, não consigo criar quando estou feliz, as coisas surgem em momentos de descontentamento, mas isso não significa que eu sou um cara triste e depressivo. É que me torno criativo me expressando nesses momentos.

Uma coisa que eu acho muito louca quando penso na trajetória do Rotting Christ é que vocês nunca foram aquele tipo de banda que leva muito tempo para lançar cada álbum. Entre um e outro lançamento, nunca houve um hiato maior do que dois ou três anos, né? Como vocês fazem para se manter tão produtivos e qualitativos? Você escreve ou registra toda ideia que surge na cabeça, tipo, nunca parou de compor?

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É bem por aí, temos uma presença forte em termos de discografia, e isso é porque somos indivíduos que estão sempre em busca de criar algo, é uma vibração, uma necessidade que não passa. Sendo eu o compositor da banda, o que posso declarar é que sou um cara que vive em produção. Todo o tempo eu estou preocupado com algum assunto ou algum questionamento - e isso às vezes é um pesadelo pra mim -, de modo que tudo acaba refletindo-se na forma de música. É uma necessidade pessoal que ao mesmo tempo me torna expressivo, e trago comigo a satisfação em continuar me sentindo vivo e criativo depois de tantos anos.

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