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O EP solo do niLL e as tretas não-tretas do fim do Sem Modos

O fim do grupo de rap de vila mais amado do underground foi triste, mas para compensar, os ex-membros estão a todo vapor em seus trabalhos solos mantendo viva a chama do rap laricado.

É, o Sem Modos acabou mesmo, não tem mais choro. O grupo responsável pela melhor trilha sonora para tomar um Corotinho mais de rap desde Return to the 36 Chambers do Ol’ Dirty Bastard (é sério, não tô tirando não) vai ser sempre lembrado quando alguém estiver com menos de 20 reais no bolso e bem afim de zuar. Mas o “chora agora, ri depois” vale pra vileiragem também, e dá pra sentir a verdade do dito percebendo que, com o fim do Sem Modos, o que tá tendo agora são os ex-membros partindo para novos e entusiasmantes projetos que buscam dar um upgrade estético no clima “foda-se” do grupo original, mas sin perder a ternura que é beber pinga direto da garrafa e fumar maconha.

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Seguindo o exemplo do Julian, o outro ex-integrante, niLL já está de volta com um novo EP. Lançado no último dia 24, NEGRAXA é o trabalho que inicia a sua fase solo e reflete sua identidade pessoal. “Se você ouvir o CD vai me conhecer bastante, mesmo sendo curto”, explicou niLL. Ainda bem largado no estilo dos beats e flow, o jundiaiense de 23 anos começou brincando de rimar na escola aos 16 e desde 2012 aposta em originalidade no Sem Modos, agora busca com o próprio nome a inovação em conteúdo e flow. Pra ele, agora é uma fase de exploração musical.

Mas nada se faz sozinho, niLL contou com o apoio monstro dos manos da Sound Food Gang, formada pelo rapper e os manos de Jundiai. A crew se formou assim que o Sem Modos acabou a partir de uma iniciativa do próprio niLL que queria seguir carreira solo mas queria se juntar com uma rapa pra fazer uma produção completa. Com cada função sendo cumprida da maneira ideal, desde o produtor dos clipes até o empresário e com um estúdio próprio as produções fluem bem e muita coisa está pra ser lançada. A crew conta com niLL, Érrea, G.u, Skin, China, Mokado, Mano Will, Dj buck, Young Buda e Chabbaz.

A produção do NEGRAXA ficou na mão do RA e foi feita toda no estúdio da gang, o D’SGUEIO. Érrea, Skin, Mokado e O Adotado (que na entrevistar revela sua identidade secreta) assinam beats no EP, que mistura traps e boom baps com bons toques de musicalidade. O disco é curto, mas consistente e reflete a realidade e visão da crew, que quer voar para muito além do fim da linha 7 da CPTM.

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Fui até Jundiaí, no estúdio da gang, pra conversar com niLL e ver de perto o que a crew está aprontando. Aproveitamos para conversar sobre das tretas que não foram tretas com o Sem Modos. Também teve muita ideia sobre a nova fase solo do niLL e a nova crew de laricados absurdamente talentosos, que prometem muita coisa boa por aí.

Coloca o EP pra tocar no YouTube enquanto lê a entrevista pra entender do que eu to falando:

Noisey: Como você começou sua caminhada no rap?
niLL: Eu comecei a ter contato com o rap na época que meu tio morava em casa. Ele ouvia o Espaço Rap [ da rádio 105 FM]. Mas eu me interessei a fazer música mesmo na época da escola, por incrível que pareça. A professora de artes pediu pra fazer um trabalho, um comercial fictício, e a gente tirou uma onda com o som que eu que escrevi. A professora acabou gostando e falou: “você fez algo tão extenso, artístico, por que você não começa a pegar mais firme nisso aí? Transformar isso em realidade?” Foi aí que eu comecei a encarnar, eu tinha uns 16 anos. Juntei com uns parças na vila e a gente fez um movimento. Dois shows, gravei meu primeiro som lá no estúdio do Pedro do Ladeira Um, e depois eu acabei encontrando o Julian na caminhada. Ele me convidou pra fazer umas dobras do som dele. Nessa época eu ainda estava no outro grupo, o Clã do Fya, mas não era uma galera muito empenhada, e eu achava que podia virar, até por que a gente invadia uma festa alternativa que tinha aqui, o Armazém, que tocava um rock, chegava e mandava um som e era isso. Aí dentro do Armazém mesmo o Sem Modos virou.

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E a sua professora que te motivou sabe que você continua fazendo um som?
Então, acho que ainda não, mas eu precisava encontrá-la porque ela foi um grande empurrão. Foi nessa época que eu me liguei na escola, que percebi o valor que tinha, que você tem que estudar e que é interessante você ser amigo dos professores. Tanto que depois que ela falou isso pra mim eu não brisava em viver totalmente da música, mas ser professor também, por que eu queria chegar em algum moleque e falar que ele também pode realizar as coisas. Eu sempre pensei nisso, a solução pra você salvar uma pessoa é dando um sonho pra ela, dando uma motivação pra realidade.

Como foi fazer o NEGRAXA? O que te inspirou?
Eu quis marcar tudo que eu sinto. E poder trabalhar dos dois lados, tanto na produção quanto na direção musical, escolher tudo. A gente gravou tudo com o RA. Se você ouvir o CD vai conseguir me conhecer bastante, mesmo sendo um disco curto. Eu to me surpreendendo muito [com a recepção], é uma experiência muito louca.

Uma coisa que eu adianto em primeira mão também é que o NEGRAXA vai ter várias edições, e você vai conhecendo cada vez mais, é tudo história verdadeira. Que as pessoas sejam bem vindas ao meu mundo e ao universo da Sound Food. Podem esperar mixtapes, podem esperar um CD todo mesclado da Sound Food, que nem mescladinho mesmo, vai ser mil grau.

Mano Will: Oh a apologia, hein! (risos)

Eu achei as produções bem fodas. Como foi o processo com os beatmakers?
Então isso foi um ponto que fez dar muito certo também, por que a gente tem uma variedade muito grande de beatmakers então dá pra todo mundo se encontrar, ver do que gosta, dá pra pegar e escolher, sabe? O Skin, que é o cara que faz os clipes, também toca uns instrumentos e faz umas bases. Quando ouvi as bases dele achei o que estava faltando pro meu EP. Era o que eu queria, algo que não ouço no rap.

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Assim que eu ouvi o seu som pela primeira vez eu ganhei uma influência pesada do Quinto Andar. Ela existe mesmo? Quem mais te inspira?
Tem mano, tem muito, até por que eu particularmente gosto muito de Quinto Andar. Eu levo o De Leve como influência por que eu tive a oportunidade de conhecê-lo, então é um cara que eu admiro no rap e como pessoa. O Ogi é outro cara que me influencia, por que não tem como, ele fala coisas que eu não ouvi em lugar nenhum. Isso que é daora, você pegar uma base, um instrumental e fazer um som que ninguém nunca imaginou. Eu não cheguei a falar isso pra ninguém ainda, mas o De Leve me chamou pra gravar uma coletânea em São Gonçalo que ele tá organizando e a gente fez um som juntos. Ele mandou a base e o refrão, eu gravei, mandei pra ele e tá pra sair. O de Leve tá muito na ativa ainda, fazendo vários shows. Eu espero que o Quinto Andar volte pra gente poder ver um show!

O Sem Modos tinha um estilo bem largado, bem vileiro. Qual era a intenção de vocês na época, o que vocês queriam representar na cena do rap?
A gente queria ser a gente mesmo, era basicamente isso, nunca quisemos passar lição de moral em ninguém. A gente cantava o que vivia e sempre apareceu algum parceiro na caminhada que se identificou. E mano, tem letra que pode falar de álcool, de maconha, de comida,mas por trás disso daí sempre tem uma ideia, um conselho. Vai de você querer ou não enxergar assim. Mas o intuito foi isso, fazer um som sem padrão nenhum mesmo. A arte sempre foi livre e isso sempre existiu na nossa cabeça. E por ser de longe, o Sem Modos tinha que ser original. Imitar os manos de São Paulo não ia virar.

Agora, na sua carreia solo eu ainda ganho essa tendência bem largada nos beats mas acho que você inovou bastante em flow e conteúdo. Como você descreveria essa nova fase?
Essa nova fase é a exploração do meu lado musical. Eu estou vendo como eu sou e foi graças a começar a fazer umas bases. Por que quando eu comecei, nem tinha interesse em fazer beat. É uma fase muito loca, eu consegui fazer tudo que tinha vontade. A época que comecei a entender o mundo da música, como as coisas funcionam lá fora, vi que não dá pra fazer tudo sozinho. E não dá certo também se você tem muitas ideias e é um grupo, por que o grupo não depende só da sua ideia, por mais que ela seja boa. Chega uma hora que não bate, cada um vai crescendo, almejando novas coisas. O fim do Sem Modos não foi nada que um talaricou o outro, ou que um saiu no tapa com o outro, nem teve desentendimento, só não era pra ser mais, os valores mudaram, os pensamentos também e foi isso. Aí eu comecei a aprender a fazer umas bases, mas eu não queria assinar como eu mesmo, então eu criei um personagem, O Adotado. A gente faz várias parcerias (risos) e foi isso que me deu fôlego pro meu CD. Eu pude fazer exatamente do jeito que queria, o que acabou agradando os caras também. De repente eu comecei a ter umas ideias de juntar tudo num mesmo canal, sabe? Nessa época, o Sem Modos acabou e depois de uns dias uns amigos meus iam colar em casa pra ver uns beats, e eu contei das minhas ideias, que eu queria fazer um som solo mas que eu queria juntar uma rapaziada pra produzir tudo certo e os cara já fecharam. Foi aí que eu realizei um desejo meu também, de criar a Sound Food com os amigos. Eu gostei muito da repercussão.

E quais são os planos Sound Food Gang?
É algo que tá até me surpreendendo, querendo ou não acabou vindo o cara certo pra cada coisa. O Koreia é meu melhor amigo, das antigas mesmo, é o nosso empresário e ele consegue fazer vários coisas que ajudam muito a gente . Eu tô feliz pra demais, graças a Deus conseguimos montar um estúdio, esse aqui e o no meu quarto. Deu pra realizar muito mais planos. Há males que vem pra bem. Agora o que a gente pretende lançar é basicamente o EP. do YUNG BUDA, que só rima nuns traps, canta em inglês e fala umas palavras em japonês também, o que é algo bem diferenciado. Vamos soltar clipe dele também, clipe meu, um som diferente de tudo que eu já fiz. Vai vir disco novo do U.L.O. e do Doisdenós.

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