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Música

O processo lento e maravilhoso de Mahmundi

Autodidata e fã de Feist, a carioca de 29 anos teve que ralar pra ser essa sensação indie-oitentista que é hoje.

Em março, na coluna Mulher do Dia, vamos diariamente parar por um minutinho o torno informacional para respirar e pensar sobre quantas vezes nós levamos realmente a sério o fato de que muitas das nossas artistas preferidas são, todos os dias, mulheres.

Foto por Eduardo Magalhães

Antes de ser a Mahmundi que faz um sonzinho oitentista tropical daqueles que faz você desejar que o verão seja eterno, Marcela do Vale teve que ralar muito. Ela foi técnica de som do Circo Voador, no Rio de Janeiro, por sete anos. Montava palco, enrolava cabo, carregava caixas, fazia som. Trabalho puxado e cansativo pelo qual já ouviu vários “nossa, mas isso é coisa pra homem fazer”. Mas foi lá também onde entrou em contato com muitas bandas da cena indie e começou a pensar em música de um jeito mais profissa.

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Sendo até chamada de “a Marina Lima da nossa geração”, a Mahmundi é fã de Feist e aprendeu a tocar sozinha. Em 2012, lançou seu primeiro EP, Efeito das Cores, depois de largar o trampo no Circo e resolver se dedicar só à música. “Ela (a música) nasceu em mim, faz parte do que eu sou. Só precisava arrumar meios de viver aquele dom. E aconteceu”, me disse. Hoje, ela chega a ficar “18 horas em casa, produzindo música e pesquisando timbres.” “Trabalhadeira”, mesmo.

Pra esse ano, ela se prepara pra lançar seu terceiro disco e conta que recebe quase todos os dias mensagens de meninas que se sentem parte do ela faz: “E eu sempre digo pra elas: você pode ser quem quiser e pode sim fazer o que quiser, sem pressões de ser apenas uma coisa só pra se encaixar nos padrões.” Leia abaixo a nossa entrevista com a Mahmundi:

NOISEY: Como você começou a trabalhar com música?
Mahmundi: Foi quando eu tinha 20 anos. Fui técnica de som por sete anos, mas minha paixão sempre esteve atrelada à música. Comecei tocando na igreja muito cedo, aos 9. Nunca houve o porquê decidi trabalhar com música. Ela nasceu em mim, faz parte do que eu sou. Só precisava arrumar meios de viver aquele dom. E aconteceu.

Você já sofreu algum preconceito no meio da música só por ser mulher ?
Sim! Quando trabalhava no Circo Voador, montava palco, enrolava cabo, carregava caixas, fazia som. Trabalho puxado, cansativo, mas apaixonante pra mim. Sempre tem preconceito, e não é só por homens, sabe? Muitas mulheres são preconceituosas também. Muitas vezes, produtoras de eventos me disseram que “não era possível eu ser responsavel por um show tão grande sendo mulher”. Outras vezes, homens mais velhos, com medo de perderem seus empregos no mundo do áudio, me diziam que "aquilo era coisa de homem adulto, que era melhor eu não me meter”.

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Mas tive homens e mulheres maravilhosos na minha vida que me ensinaram muitas coisas, foram sempre gentis e que me deram muita força pra focar no trabalho. Foram experiências boas e ruins. Tentei absorver o melhor delas.

Que mulheres você tem como influência/referência?
Muitas. Da minha geração, a Feist é uma delas. Jovem, já teve banda de punk, toca bateria, ama trabalhar com som e tem umas das vozes mais deliciosas que já ouvi na vida. E vamos falar das intocáveis referências: Nina Simone, Elis, Rita Lee e Dona Ivone Lara. Por mil motivos, são todas grandes influêcias pra mim.

O que você acha do cenário atual para as mulheres na música?
Acho que tá rolando uma melhora. Muitas mulheres estiveram nos palcos em 2015. Adorei ver todas as minhas companheiras mandando bala em suas apresentações. O Coquetel Molotov foi o maior exemplo disso. O evento é capitaneado pela Ana Garcia, que arrebenta sempre! As coisas estão mudando e a nossa força tem sido mais exposta, mais respeitada, mais bem elaborada. Sou a favor das lutas,mas torço sempre pela igualdade. É o maior tesouro da paz, seja em qual área for.

Estamos passando por um momento que a luta tem seguido com mais força e, claro, não podemos ignorar que ela já tá acontecendo há anos. E, às vezes, por conta desse tempo tão difícil ainda hoje, esquecemos de ver beleza nas coisas. Acho importante ver o lado artístico nessa saga pelo que se acredita. O importante é lutar e combater tudo sempre, mas nunca se perder e perder o sentimento neste processo. 2016 promete ser mais rico para nós, mulheres! Vai ser lindo de se ver e sentir tudo isso.

O que você diria pras minas que tão começando na música agora?
Sempre digo pra elas: o processo é lento, longo, mas é maravilhoso quando você caminha entendendo quem se é e o seu poder em fazer música. Quando digo isso, falo de uma busca pessoal e interna - e somando também com todas as pesquisas e o olhar sobre o cotidiano ao redor. Recebo quase todos os dias mensagens de meninas que se sentem parte do que eu faço: seja tocando guitarra, cantando ou sendo apenas uma pessoa comum nos nos meus clipes. Elas acham aquilo o máximo! E eu, também. A ideia é exatamente essa: você pode ser quem quiser e pode sim fazer o que quiser, sem pressões de ser apenas uma coisa só pra se encaixar nos padrões.

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