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Música

Esqueça o Nirvana: A Banda Mais Influente dos Anos 90 Foi o Pearl Jam

Uma polêmica antes dos shows da banda no Brasil sempre faz bem.

Faz alguns anos, entrevistei o Tom Delonge num show do Angels & Airwaves. Ele se certificou de me informar sobre como buscou influências na cena mod dos anos 70, na banda The Jam, e no simbolismo esotérico relacionado ao ocultismo. Foi isso mesmo que ele disse. Precisei de todas as minhas forças para não responder "ahm, não. Você é o cara da piada de pinto no blink-182, MANO. Você cresceu ouvindo NOFX, e isso todo mundo viu acontecendo."

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Tom claramente só queria parecer mais descolado do que as influências que havia sofrido. Sem problemas. Também tenho vontade de parecer descolado nas entrevistas. E ele queria passar a impressão de ter nascido descolado, o que é compreensível. Mas já tive contato suficiente com recém-nascidos para saber que todo mundo nasce nojento e inepto, e até ficar descolado vai um bom tempo. Não há vergonha nenhuma em não ter nascido descolado, certo? Certo. Então permitam que eu vá direto ao ponto. Esqueçam por um momento essas coisas de Tom Delonge e simbolismo esotérico, e deixem que eu faça uma pergunta de verdade sobre influências musicais: qual é a banda mais importante, em termos galácticos: Pearl Jam ou Nirvana?

Se você é igual a praticamente todo mundo na face da Terra, está dando uma risadinha diante da estupidez dessa pergunta, porque é óbvio que o Pearl Jam é ótimo para os titios ouvirem enquanto preparam um baseado, mas o Nirvana foi a banda que SALVOU O ROCK AND ROLL, cara. Contudo, não creio que seja assim tão simples. Acho que há uma verdade oculta a ser revelada na tensão cultural que existe entre Nevermind e Ten, e estou prestes a revelá-la.

Embora ambos tenham sido discos seminais, você teria que suar para encontrar um jornalista ou crítico de música defendendo a ideia de que Ten exerceu quase tanta influência quanto Nevermind, o qual, assim reza a história que nos contaram, finalmente sepultou o metal hedonista levinho californiano dos anos 80 e fez o rock ser novamente aceitável. Bem, recentemente me vi defendendo em festas a tese de que o Nirvana vem levando todo o crédito, embora o Pearl Jam tenha feito todo o trabalho. Já estive enganado algumas vezes, então decidi sentar e examinar as vendas e números e dados brutos, e avaliar essa questão com algo que se aproximasse da integridade jornalística (risos), e chegar, de uma vez por todas, a uma decisão embasada, 100% objetiva e correta a respeito dessa questão de suma importância, que vem incomodando os negos de meia-idade que acordam seus bebês e emputecem suas esposas rasgando solos de guitarra no porão depois das oito da noite.

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Lá fui eu até a Wikipédia e a Billboard.com para preguiçosamente conduzir o que em 2015 se passa por pesquisa, certo de que os números corroborariam minha impressão instintiva de merda: de que o Pearl Jam foi a banda que realmente exerceu influência, e que, se não fosse pela trágica e poética morte de Kurt Cobain (e as teorias da conspiração e mitologizações que se seguiram), o Pearl Jam seria visto hoje como a banda que deu um pé na bunda do hair metal e mudou as rádios para sempre, enquanto o Nirvana seria visto (corretamente) como um grupo muito mais descolado, mas de importância cultural significativamente menor.

Preciso dizer, a bem da verdade: acho que tanto Pearl Jam quanto Nirvana são boas bandas, mas não sou super fã de nenhuma delas. Consigo cantar junto ao ouvir "In Bloom" ou "Black" com a maioria, mas nunca tive um disco de nenhuma das bandas, e não tenho planos de comprar nenhum em breve. Então, quando me instalei para conduzir minha pesquisa, pensei nos meus anos de Ensino Médio, e lembrei da onipresença do Pearl Jam em contraposição a um status um tanto quanto marginal do Nirvana. Eu iria ao site da Billboard, onde os números mostrariam claramente que o Pearl Jam foi uma banda mais popular desde o início, e PÁ!, enfiaria esse artigo no rabo de todo o jornalismo de música, seu lugar de direito, e o assunto estaria encerrado. Bom, não tão rápido, Billy Ray.

Ambos os discos saíram quando começava o ano escolar americano de 1991-1992, e nenhum foi exatamente um foguete em disparada para Marte. Pouca coisa aconteceu até 1992, quando Nevermind desbancou o à época desconhecido cantor de R&B Michael Jackson e tomou o primeiro lugar na Billboard. Durante o ano de 92, Nevermind perderia e retomaria o primeiro lugar diversas vezes, com base no sucesso de seus muitos singles que viraram hits, incluindo “Smells Like Teen Spirit” “Lithium,” “In Bloom” (essa eu sei cantar junto, lembrem-se!) e, ahn… ah, é, "Come As You Are". Nevermind não permaneceu naquele primeiro lugar em 92 por tanto tempo quanto Ropin' the Wind, de Garth Brooks, mas não fez feio. Nevermind foi em frente: obteve o disco de diamante (10 MILHÕES DE CÓPIAS VENDIDAS!) em 1999, "mudou o mundo", e, é claro, se tornou a opção número um de compra não-ilegal da foto do pênis de um menino de três meses de idade.

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Compare isso com Ten, que jamais chegou à primeira posição, contentando-se (como aconteceria com o Pearl Jam) com o vagabundo posto de número dois do grunge. Mesmo que hoje em dia se tenha a impressão de que todas as músicas de Ten foram singles, na verdade somente "Alive", "Jeremy" e "Even Flow" foram grandes sucessos. Ten conseguiu o disco de diamante? É claro, mas não até o bastante recente (e patético) ano de 2013. Número de fotos de pênis infantis em Ten: zero. Em vez disso, a América de fim de século teve que se contentar com um bando de patetas songo-mongos usando tênis esdrúxulos dando um high-five diante de um recorte de madeira das palavras "Pearl Jam", fazendo dela uma capa mais bocó e menos creepy que a de Nevermind segundo todos os critérios possíveis. Em termos de números, as coisas já começam a parecer uma vitória tranquila para nossos garotos de Aberdeen nesse embate mano a mano.

SÓ QUE!

Você ouviu alguma rádio de rock nos últimos 24 anos? Ouviu? Ouviu alguma coisa das rádios country nesse tempo? Porque, se a resposta é sim, então você ouve, e provavelmente se constrange, com a inegável influência do Pearl Jam. Quando garoto, lembro de ver o clipe de "Alive" do Pearl Jam, de estar especificamente interessado no estilo vocal de Eddie Vedder, e de dizer: "Puta merda! Eu nunca ouvi ninguém cantar desse jeito antes!". Em setembro de 1992, meros 13 meses após o lançamento de Ten, o Stone Temple Pilots soltaria Core e o single que o acompanhava, "Sex Type Thing", que conseguiu chegar ao disco de platina, baseado de modo nada desprezível na desavergonhada "interpretação" do vocalista Scott Weiland do inconfundível estilo rosnado e pau-na-mesa de Vedder. E não foi só o STP, embora eles tenham sido a banda de maior destaque a "pegar emprestado" o estilo que Eddie inventou, ou ao menos popularizou. Praticamente todas as bandas de rock que tocavam nas rádios, de Collective Soul a Nickelback, até grupos já consagrados como A PORRA DO METALLICA (!) usariam a mancha xadrez de flanela da influência de Eddie Vedder até os dias de hoje. Aqui em 2015, a voz e influência de Vedder transcenderam o âmbito do estilo, e se tornaram o som padrão das rádios de rock bunda. Esse é um legado e tanto para uma banda que parecia ter intenções bastante decentes e conseguiu manter um nível surpreendente de dignidade e apoio dos fãs, não obstante os lixos infectos a que involuntariamente deu origem.

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Mas quem soa como Kurt? A resposta é: "praticamente ninguém". A verdade é que o Nirvana, no geral, era uma banda esquisita demais para ser imitada com talento, ou mesmo na qual realmente buscar influências. É claro, as pessoas dizem que o Nirvana foi uma influência, mas isso é porque elas querem parecer descoladas. Os fatos, porém, falam por si mesmos. Os famosos imitadores do Nirvana, Bush, tentaram desesperadamente seguir os passos ensopados de água sanitária de Cobain, e acabaram soando como… bem, como Bush. A garganta de Gavin Rossdale não emite os sons alquebrados, rachados, de alguma forma impossivelmente expressivos que a de Kurt emitia. Na verdade, por mais que tenha tentado macaquear Cobain, ele acabou soando muito mais parecido com um outro cantor de grunge da era do Nirvana – exibindo um timbre grave, urrante, altamente carregado, que está em seu melhor enquanto grita "yeeeeaaaaaaah". Se Nirvana é a influência que você cita, mas ninguém mais percebe, você está só mentindo para si mesmo para se sentir mais descolado, Gavin. Como todo mundo, você tentou ser influenciado pelo Nirvana, e aí percebeu que pegar do Pearl Jam era simplesmente muito mais fácil. Você não está sozinho.

Eddie Vedder deve adorar essa porra. Ele realmente deu a sua contribuição. Pegou o grunhido do Buzzo, do The Melvins, torceu e transformou em algo novo e comercializável (The Melvins, devemos observar, era uma das bandas favoritas de Kurt Cobain), e, nisso, mudou o som do moderno rock'n'roll… er, "despretensioso", para bem ou para mal (e, sejamos sinceros… bonita a coisa não está). Cobain tocava um pop torturado, claudicante, deformado, altamente agressivo, que chamou a atenção do mundo, e não sem motivo, mas ele foi meio que o único cara que conseguiu fazer desse jeito – os outros não conseguiram nem uma tentativa decente.

O Pearl Jam não vai exatamente estar para sempre no posto de bode expiatório cultural. Eles até hoje saem em turnê pelo mundo, tocando para públicos imensos, sobre os quais Eddie periodicamente arremessa sua bunda mal-ajambrada e de uma beleza rústica. Mas o Nirvana provavelmente entrará para a história do rock como a Banda Cool Oficial dos anos 90, e todos nós a ajudamos a chegar lá. Você comprou Nevermind porque sabia, na sua alma, que era um disco foda e importante. Mas o sangue do seu tio amante-do-classic-rock também circula num Even Flow pelas suas veias, e até aquele dia horrível de abril de 1994, você sabe que, em segredo, gostava mais do Pearl Jam. E tentou cantar como o Eddie Vedder quando não tinha ninguém olhando. Tentou sim, seu mentiroso do caralho.

Brendan Kelly toca no The Lawrence Arms, uma banda que pegou suas influências do Temple of the Dog. Siga-o no Twitter - @badsandwich

Tradução: Marcio Stockler