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Música

Roubadas na Estrada: As Várias Enrascadas do Batera Glauco Caruso

Escudo humano no Iraque, coronhada na cabeça, calote, apalpada no pau do Serguei e um laboratório de ecstasy no caminho. Só fitas de alta periculosidade nesta edição da coluna.

Foto por: Natasha Durski

De forma tranquila e cadenciada, o veterano músico rio-grandense Glauco Caruso vai me contando seus causos com a sagacidade de quem tem anos de experiência vivida. Não faltam perrengues, roubadas e tretas. Ele vivenciou várias situações cabulosas, na estrada e fora dela. Do alto de seus 40 e poucos anos, ele sabe que as adversidades e dissabores fazem parte dos caminhos do rock, porém mais do que isso, da vida, e convive bem com todas elas.

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Glauco começou cedo: montou sua primeira banda de punk rock aos onze anos. Fã de Garotos Podres e the Sonics, Caruso gosta de peso. Já tocou com DeFalla e Júpiter Maçã. Teve uma parceria de dez anos com seu irmão Emerson Caruso em uma banda de blues. Esteve envolvido no breve projeto Iggy D. & The Traitors – em dado momento precisou mandar o baixista vazar. Segundo ele "o cara só queimava fumo e não queria aprender a tocar baixo", apesar de seu empenho em ensiná-lo. Atualmente suas baquetas percutem na banda Turba, projeto que criou ao lado dos músicos Greco Blue, ex-Os Azuis, e João Pedro Bonfá.

Sabendo de alguns rolos com os quais o baterista já esteve envolvido, entrei em contato e troquei uma ideia com ele. A seguir, selecionei alguns trechos de situações esquisitonas, bizarras e inesperadas em seus rolês:

Coronhada na Cabeça
Onde: Estúdio Acit, Porto Alegre
Quando: 1996
"Entrou um cara mascarado no estúdio da Acit, em Porto Alegre, onde gravávamos A Sétima Efervescência, e me deu umas coronhadas com uma Magnun 765. O maluco encanou que eu era quem ele tava procurando, no caso, o Flávio Basso. Ele havia rendido a recepcionista e foi estúdio adentro com ela junto. O cara mandou todo mundo ir pro chão, o Egisto dal Santo – produtor – chorava igual criança cagada. O cara tava atrás do Flávio, que teria passado AIDS para irmã dele. O primeiro que ele viu pela frente fui eu, perguntou se eu era o Flavio Basso, eu disse que não e que ele podia ver meus documentos. Aí o cara partiu pra cima do Flávio, que estava deitado no chão, pediu os documentos, e ele disse que não tinha documento. O cara não hesitou e disse: 'então é tu o Flávio'. O cara falou que ia matar ele na rua, e não ali, no estúdio, ao que o Flávio respondeu: 'Que isso, man, que isso, man… Eu não tenho AIDS', 'Não fui eu, Não fui eu'. O Flávio tava todo cagado. Cara, tu me perguntou se o Flávio, quando abordado pelo mascarado, teria dito: 'Eu não como ninguém', e se o cara com o berro na mão, por sua vez, teria respondido pro Flávio: 'Então tu é puto, abaixa a calça que vou comer teu rabo.' Sinceramente eu não lembro desse fato [risos]. Mas sei que essa passagem está no livro Notas de Viagem – aventuras e desventuras no rock gaúcho, do Egisto. Se tá lá, deve ter acontecido. No final o cara resolveu sair fora sem 'pipocar' ninguém. O Flávio ficou três meses sem sair de casa. Foi escabrosa a situação, bro."

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Calote na Gravação do Álbum A Sétima Efervescência
Onde: Estúdio Acit, Porto Alegre
Quando: 1996
"Cara, além das coronhadas que levei, eu e o meu irmão, Emerson Caruso, baixo, nunca recebemos um centavo por termos gravado o álbum A Sétima Efervescência. Nunca tinha falado disso. Nunca processei e relevei o fato, por ser muito fã do Flávio. Gravei o disco, fiz dois shows em Vacaria e Chapecó com a banda; em Chapecó a coisa já tava bem estranha e eu saí fora. Não sei quem me deu calote, se foi a gravadora, o produtor ou o próprio Flávio, cuja fama de mau pagador o precedia."

Escudo Humano
Onde: Londres
Quando: 2003
"Encontrei em um show do Paul McCartney, em Londres, um camarada meu, o Flávio Ravara, com quem já tive uma banda, que me pilhou para que fôssemos até o Iraque a fim de servirmos de "escudo humano" em Bagdá. Eu topei. O Flávio já tinha estado na Legião Estrangeira. Quem organizou essa roubada foi um ex-fuzileiro norte-americano que havia integrado a operação Tempestade do Deserto e revoltara-se contra a política externa norte-americana, queimando o passaporte e abrindo mão de sua cidadania. Aí indaguei o cara, "mas vem cá, como é que tu anda por aí sem passaporte?" Aí a gente começou a sacar que a parada devia ser roubada. Rolavam umas terapias em grupo que, segundo o fuzileiro, eram necessárias porque algumas pessoas estavam desestabilizando o movimento. Erámos eu e o Flávio [risos]. Pegamos um ônibus que nos levaria até o destino. O bus todo escrito em inglês… Cara, qualquer um nos alvejaria assim que entrássemos no Iraque, embora fôssemos usar nossos corpos para garantir proteção de civis. Embarcamos no ônibus e fomos de Londres até o sul da Itália, Bari. Lá, nós pulamos fora, muita gente pulou fora. Todas as fronteiras estavam fechadas, todos os ônibus tiveram que voltar. Nos deram umas cápsulas purificadoras de água, não sei pra que serviriam, já que a água no Iraque era e é cheia de metais pesados, em função daqueles anos todos de guerra. Por fim, não viramos escudos humanos. Mas foi divertido, conhecemos várias pessoas, tinha anarquista, socialista. Valeu pela experiência."

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Laboratório de Ecstasy
Onde: São Paulo
Quando: 2000
"Certa vez, morando em Curitiba, onde vive minha mãe, fui abordado por um scouter de uma agência de modelos, quando tocava em um bar. O cara me convidou para ser modelo. Achei aquilo meio viadagem, mas eu tava meio sem grana e resolvi conferir. Em pouco tempo me levaram para França, Itália, vários lugares. Funcionou. Eu ganhava muita grana. Com muito dinheiro tu quer gastar de alguma forma. Comecei a comprar uns punhados de 50, 100 cápsulas de ecstasy. Nunca vendi nada. Só tomava, tomava, tomava. Só fiquei curtindo, né. Eventualmente a polícia invadiu a minha casa, um flat em São Paulo, e me prenderam sob acusação de tráfico. O traficante tava dentro da minha casa, tinha ido lá me levar as balas. A polícia já devia estar no bico dele. Fui acusado em três artigos do código de entorpecentes. Artigo 12 – tráfico de drogas, Artigo 13 – formação de quadrilha, e Artigo 14 – aparatos para o narcotráfico. Pô, eu nem sabia onde era o laboratório, sabia porra nenhuma. Só fiquei sabendo que era no Belenzinho e que a porra era o primeiro laboratório de ecstasy do país. Tudo isso depois que eu tava preso. Inclusive que o dono era um espanhol, amigo desse meu 'amigo' preso na minha casa que era, também, DJ. Fiquei quatro meses e oito dias preso com 37 pessoas em uma cela, no 77º DP em Santa Cecília. Acabei de 'patrão' na cela, por ter caído lá enquadrado nesses artigos, apesar de eu alegar inocência e a galera me zoar dizendo que 'todo mundo era inocente na cadeia'. Eu também escrevia cartas de amor para as mulheres dos presos, fazia uns desenhos, e ficou tudo bem pro meu lado. Entrei de laranja nessa, eu era viciado. Fui inocentado".

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Turnê com Iggy & The Traitors
Onde: Rio de Janeiro
Quando: 2013
"Fomos fazer a primeira turnê da banda, que eu armei. A rota incluía Montevidéu. Os guris, o Igor e o Bonfá, foram até lá se 'detonando', full time, usando vários ilícitos. Fomos no meu carro, que é uma Belina das antigas. Acordava para viajar sempre às oito da matina, e os dois iam dormir àquela mesma hora, porque ficavam se detonando. Nessa fui dirigindo sozinho até o Uruguai, eles iam dormindo no carro. A turnê incluía outras cidades no caminho. Tocamos em Curitiba, Porto Alegre, Rio Grande, que é minha cidade natal, e Montevidéu. Fui motorista, músico, babá e empresário da parada. No Uruguai o show foi demais, afudê, tocamos lá com o guitarrista uruguaio Federico Dinamita e sua banda, a Dinamita La Swing Factory. Tudo ia razoavelmente bem. Na volta, novamente, tocamos em Rio Grande, Porto Alegre, e faríamos mais um show em Camboriú e outro em Curitiba, para encerrar. Aí fudeu, os guris gastaram toda a grana, a gente não tinha grana nem pro pedágio, para sair de Porto Alegre. Paramos em um posto e pedimos dinheiro para uns motoqueiros, que gentilmente nos deram a grana. Pra fuder de vez, faltando uns 20 km para Camboriú ficamos sem gasolina, quem nos salvou foi uma guria de lá, que o Bonfá tava ficando. Levou gasolina pra gente ir fazer o show na cidade. Foi foda. Fizemos o show. Avisei que sairíamos às onze da manhã do dia seguinte para o show de Curitiba. As oito da manhã eles estavam acordados, lógico, passaram a noite em claro e me disseram 'espera aí que vamos na bocada', ao que prontamente respondi: 'Ok, mas impreterivelmente saímos daqui às onze horas'. Dito isso, peguei minhas malas, meus pratos, minha caixa, pus no carro e, às 11h, eu fugi deles. Fui pra Curitiba. Não teve show. No final da primeira turnê, a banda acabou."

Shows com DeFalla
Onde: Casa do Edu K, Rio de Janeiro
Quando: 2001/2002
"Tocar com ele é ótimo, nunca vi o cara de mau humor, foi entre 2001/2002. Na época do CD Superstar. Tinha a Syang, lembra de uma mina da Casa dos Artistas? Ela tava na banda nessa época. O fato é: nunca consegui fazer uma passagem de som com o Edu. Se a passagem estava marcada para as dez da noite, eu chegava na casa dele às oito, eu sempre me adianto nos troços. Pô, ele ia se arrumar e nós saíamos da casa dele à meia-noite, já na hora do show. Tinha toda aquela indumentária costumeira do Edu, maquiagem e o caralho. O lance é que nós nunca conseguíamos passar o som, nem uma vez. Ele se atrasava de propósito, eu acho. Sei lá qual é a dele."

Pocket Show com Iggy & The Traitors feat Serguei
Onde: Bar Londra - Hotel Fasano, Rio de Janeiro
Quando: 2012
"O Serguei é uma figuraça, tá com 80 ou quase 80 anos, sei lá. Não é tão louco quanto dizem. Diz ele que não usou muita droga nem quando namorava a Janis Joplin. Mas no dia do show ele tomou três doses de conhaque, eu vi. E tem a peruca dele que nunca foi lavada, parece um pelego sujo, cheio de nó. A parada desse show foi a seguinte: fomos buscar ele lá em Saquarema, para vir tocar com a gente, daí ele se 'apaixonou' pelo Igor. Ele veio no carro atrás com o Igor. Cara, não sei se ele tomou um Viagra… Ele disse: 'Igor, vem cá que eu tô com frio'. Ele pegou a mão do Igor e pôs no pau dele, o veio tava de pau duro! O Igor ficou apavorado e bolado. Comentou que o pau era grande [risos]."