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Música

A Esperança do Rock Nacional Mora Bem no Meio do Cerrado

Listamos algumas das melhores bandas do underground goiano que estão reciclando o rock, o metal e a MPB com notável criatividade e altas doses de psicodelia.

Dizem que Goiás é a terra do sertanejo, e talvez seja por isso que de 2007 para cá a cena rocker da capital do estado venha se consolidando a passos curtos, porém firmes e determinados. Afinal, as expressões mais legais do rock’n’roll, em todas as épocas e lugares, sempre nasceram como resposta a uma situação hegemônica (e tediosa). Foi assim que o rock inventou a própria simbologia da juventude, explodindo em rebeldia quando as coisas ficaram modorrentas demais.

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Partindo desse pressuposto, pode-se entender a qualitativa safra de bandas surgidas em Goiânia nos últimos tempos como uma reação a essa pecha de “terra do sertanejo”, um estereótipo simplista que ignora toda a diversidade musical existente por lá. A fita é que a cidade atualmente acolhe algumas das melhores produções vinculadas ao stoner, ao punk rock, ao indie, e àquela parada meio MPB anos 70 com doses de psicodelia e shoegaze que essa rapaziada faz com tanta graça. Vale lembrar que o Boogarins, uma das maiores revelações da música nacional em 2014, vem de lá.

Diante desse pequeno fenômeno, fizemos uma peneira de tudo o que vem rolando de legal e chegamos a uma lista com pelo menos sete bandas goianas que ainda prometem render muitos frutos positivos e nas quais você tem que se ligar.

Carne Doce A MPB e a lisergia de todas as épocas são filtradas pela musicalidade intensa e bem construída, repleta de guitarras e sintetizadores, do Carne Doce. A banda nasceu a partir da união do casal Salma e Macloys, que ficaram juntos pela primeira vez em 2009 e logo passaram a morar e a compor em parceria. Em 2013 veio o EP “Dos Namorados” e, recentemente, a dupla virou banda, com a chegada do João Victor e do Ricardo Machado, ambos do Luziluzia, e do Anderson Maia, que foi baixista do Diego de Morais e o Sindicato. O primeiro álbum acaba de sair.

As músicas são provocantes e falam sobre sexo, vida a dois e o cotidiano na cidade. O lânguido vocal da Salma é o carro-chefe da banda, passeando confortavelmente entre graves e agudos, sussurros e potência. O álbum chega com dez músicas e foi gravado no Coruja Estúdio, dos caras do Hellbenders. Os destaques vão para as faixas “Passivo”, cujo vídeo e letra tomam por referência a arte erótica, “Amigo dos Bichos” e “Benzin”, composição em parceria com Fernando Almeida e Benke Ferraz, do Boogarins.

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Overfuzz

O power trio Overfuzz, formado por Brunno Veiga (guitarra/voz), Victor Ribeiro (bateria) e Bruno Andrade (baixo), começou a fazer um som em 2010 e, em pouco tempo, depois de alguns shows no circuito underground, ficou conhecido na cena local. Daí para o line-up de festivais como Vaca Amarela, Goiânia Noise e Bananada, foi um pulo. As influências são diversas, mas basta dizer que o negócio deles se resume numa sonzeira de roqueiro bêbado, com um acento de Motorhead e marcada pela crueza e a energia.

Os caras mandam muito bem ao vivo, como este que vos escreve já pôde comprovar. Recentemente lançaram o webclip “Before The Tragedy”, faixa que vai sair num split com o Corazones Muertos, provavelmente no final deste ano ou começo do ano que vem. Até aqui, a banda já tem lançados um EP de quatro músicas, um single virtual e uma porção de vídeos ao vivo, tanto em estúdio como em shows. Eles produziram, inclusive, um mini documentário que saiu esse ano. Se liga aí:

Hellbenders

O Hellbenders está no rolê desde 2007, fazendo um rock pesadão puxado para o stoner e influenciado por nomes como Kyuss, Motörhead, Mastodon, Grand Funk Railroad e Blue Cheer. O ótimo primeiro álbum, Brand New Fear, veio à luz no ano passado, e o segundo já está a caminho, sendo gravado neste exato momento em pleno deserto da Califórnia sob o comando de David Catching. David, que fez parte do Queens Of The Stone Age e do Eagles of Death Metal como guitarrista, é dono do estúdio Rancho de La Luna, o mesmo onde já gravaram bandas como Kyuss, Foo Fighters e o próprio QOTSA. Essa parceria promete render um disco altamente da pesada. “Estamos gravando e convivendo num ambiente que é muito importante para grande parte de nossas referências. Além da puta sensação de imersão musical que o lugar dá, justamente por estar localizado no meio do deserto, afastado de qualquer problema dos grandes centros”, disse o guitarrista e vocalista Braz Torres.

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Luziluzia

Formado em 2012 por integrantes do Carne Doce (João Victor, guitarra e synths; Ricardo, bateria) e do Boogarins (Benke, guitarra; Raphael, baixo e voz), o Luziluzia lançou este ano seu álbum de estreia, Come On Feel The Riverbreeze, com 11 faixas cantadas em português. Antes disso, em 2013, eles já tinham soltado o EP “52Hz”. É outra banda de Goiânia que investe no lance do encontro entre a psicodelia e brasilidades dos anos 1970, porém, com uma pegada boa de shoegaze. O som, descrito pela banda como “tropical noisy”, resulta numa chapação leve e fluente, do tipo que remete a tardes ensolaradas e preguiçosas.

Bruna Mendez

Eu não fazia ideia de quem era a Bruna Mendez até colar num show do Boogarins no Auditório Ibirapuera. Bruna e sua banda estavam para abrir. O que esperar? Logo nos acordes iniciais já dava para notar a fina qualidade musical dessa galera, que lançou um EP de seis faixas há pouco. O som faz um resgate do melhor que a música brasileira já foi capaz de produzir, condensando uma porção de influências, que vão da bossa nova ao reggae, passando pelo rock, o baião, Caetano e Vinícius. Soa agradável e contemplativo. O EP foi mixado e masterizado pelo Fernando Santos, que ajudou a produzir bandas como Dry, Space Truck e The Galo Power. Bruna é dona das letras e instrumentais, tendo gravado vozes, guitarras, violão de aço, teclados e programações. A formação se completa com Roberto Milazzo no baixo, Lucas Tomé na bateria e o Eduardo Veiga no violão de nylon e teclados.

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The Galo Power

De volta ao básico, o The Galo Power detona um típico rock setentão de derreter a cuca, mostrando que fazer música boa nem sempre tem a ver com tentar inventar umas paradas cheias do frenesi da salada de gêneros. Mas até para fazer som numa linha classic rock de tiozão doido precisa que ter cacife: as possibilidades de você querer chupinhar o Creedence Clearwater Revival ou o Crosby, Still, Nash & Young e dar merda são muito altas. Na verdade se o cara não souber levar a coisa direito, até mesmo fazer um som meio Ramones, que em tese é mais simplão, também pode dar muito ruim. Tem que ter o espírito do bagulho, do contrário não vira. O Galo não chegou pra mudar o mundo, mas pra manter a chama acesa. Eles têm o espírito do bagulho e podem ser considerados os representantes tupis de uma tendência revival rock que inclui bandas tipo Rival Sons e Airbourne. É aquela vibe proto-heavy metal numa onda Sabbath, Purple, Cream, Led e quejandos. O nome do segundo álbum, Lysergic Groove, traduz legal a proposta.

Cambriana

O Cambriana se apresenta como “pop psicodélico” e indica entre suas influências artistas como Brian Eno, The Kinks, Grizzly Bear, Neil Young e Radiohead. São vertentes do rock muito peculiares para tomar como base, alguns podem pensar. Mas o grande lance desses caras é que tais referências não surgem na música da banda como ponto de chegada, e sim como ponto de partida. O primeiro álbum, House of Tolerance, pintou batendo forte em 2012 ao exibir uma qualidade de produção acima da média e uma identidade pronta. O trampo mais recente é o EP de seis faixas Worker, um refinado trabalho de diálogos instrumentais que aglutina uma porção de melodias bonitas, ora cinemáticas ora abrasivas, além de vozes bem encaixadas e elaboradas.