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Música

Uma Viagem às Profundezas Abissais com o Novo Álbum do Jupiterian

Conversamos com o guitarrista e vocalista Thiago Vakka sobre ‘Aphotic’, o aguardado novo álbum da banda, que você ouve com exclusividade no Noisey.

Vou me dar o direito de quebrar um protocolo pessoal. Vou abrir esta entrevista com o Thiago Vakka (guitarra, vocal) explicando o significado de uma palavra. Refiro-me ao nome do novo álbum do Jupiterian – Aphotic. Em português, “afótico” quer dizer “que está privado de luz”. Criaturas afóticas são aquelas que se desenvolvem na escuridão, tais quais as impressionantes formas de vida das profundezas do mar. Onde a pressão é intensa, e os movimentos arrastados. A maior inspiração para o som, as artes e o discurso desta que é uma das mais alucinantes bandas de death/doom/black/sludge da atualidade parece ser, em substrato, o mundo abissal, e a palavra remete a essa ideia, condensando num único termo todo o jorro criativo do Jupiterian.

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Quando o Noisey lançou o single de “Drag Me to My Grave” assinalando que o Jupiterian era como um titã cósmico girando no lodo abissal, eu me referia precisamente a essa alusão e a como o grupo consegue traduzir musicalmente uma vibe tão singular. Sucessor do EP Archaic, de 2014, o CD tem lançamento no Brasil pela Black Hole Productions, e, na gringa, pela Caligari Records, em k7. O álbum foi gravado no Katarse Studio, em São Paulo, com mixagem e masterização do Mories, do Gnaw Their Tongues. Obra-prima do metal recente, o impactante Aphotic começou a ser gerido em fevereiro, durante o carnaval, mas só agora está ganhando forma física e digital.

Em tempo: o show de lançamento do álbum acontece no próximo dia 14/11, no Dissenso Lounge, em São Paulo. Infos completas aqui. Acompanhe a ideia que troquei com o Vakka:

Noisey: Você poderia começar comentando tipo um faixa a faixa sobre a pegada, as influências e a concepção/produção de cada som nesse álbum? Tem alguma curiosidade vinculada às gravações desse repertório para compartilhar com os leitores?
Thiago Vakka: “Permanent Gray”: Esta é uma música da qual não tenho muita recordação sobre como fizemos, acho que foi o lance de criar o riff e a gente terminar junto no estúdio, acho que em dois ou três ensaios. Mas ela tinha um final que tentamos usar pela segunda vez em uma música. Era uma coisa que deixava a música mais rápida, e que já tínhamos arriscado em algum outro som, mas descartamos. Acho que ouvimos e, uma vez, alguém soltou um "Tá meio Machine Head isso, né?" [risos]. Nunca mais tocamos aquilo e descartamos o riff pra sempre. Não era ruim, só não combinava… Acho que em algum ponto ele lembrava Down, ou Crowbar nas partes mais "alegres". O final era pra ter um vocal mais heavy doom, na pegada do Reverend Bizarre, mas quando ouvi aquela massa sonora pantanosa, achei que qualquer vocal ali faria perder a força do riff.

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“Daylight”: Essa música, embora seja uma das mais tretas de tocar e cantar pra mim, saiu muito rápido também. Criamos o riff inicial e as dobras em, sei lá, duas ou três tentativas ali no estúdio, na hora… Aí a música foi se desenrolando sozinha bem rápido também. Na gravação a gente chamou o Marcos Felinto, do Noala, pra dar um toque mais sorumbático no final, com o violino e aqueles barulhos todos que dá pra ouvir ao final da gravação. A gente foi criando ali na hora mesmo. No meio da música tem um riff de guitarra sozinho que deu certo pra encaixar o discurso do Oppenheimer, pai da bomba nuclear, de quando ele fez um vídeo falando sobre as consequências da bomba. Essa música é uma das minhas preferidas.

“Proclamation”: Se não me engano, essa música foi a primeira que fizemos depois da “Drag Me…”. Na mixagem, só pedi ao Mories pra tirar uns pedaços dela, por achar que estavam sobrando entre uma coisa e outra, e fechou. Curto demais o final dessa música na pegada mais Sourvein, Graves at Sea que ficou.

“Aphotic”: Essa é a música que representa o Jupiterian na essência. Gosto muito de absolutamente tudo nela. É a minha preferida do play por ser tão repetitiva que, em algum ponto, vira quase um mantra, sem vida e sem emoção. Penso nela como um cântico religioso arcaico.

“Drag Me to My Grave”: Uma música muito particular, e até inexplicável de certa forma, porque eu comecei a criá-la pouco antes de encerrar as atividades com o The Black Coffins e, quando a banda acabou, eu sabia que ia me dedicar 200% ao Jupiterian dali em diante. Uns dois dias depois do fim da banda, fui viajar para ver um festival na Europa e durante todo o tempo esse riff vinha na cabeça e eu ficava cantarolando. Fui encaixando as linhas de vozes durante esse período de uma forma totalmente involuntária, mesmo enquanto estava assistindo a outros shows. Quando voltei, tinha a música quase toda composta, só faltava sentar e botar a letra da forma como imaginei que seria o vocal. A música poderia ter esperado para sair junto com o Aphotic, e não como um single prévio, mas ela foi feita de um jeito tão estranho que achei que soava como uma música que não fazia parte do contexto do Aphotic. As outras faixas não seguem o mesmo tema, elas são uma evolução do Archaic, liricamente, mantendo o clima Lovecraftiano nas letras, de um jeito ainda mais obscuro e melancólico. Só resta dizer que existe a versão "My Dying Bride" dela com violinos gravados pelo Marcos na mesma sessão da “Daylight”. Porém essa versão só está disponível como bônus da tape Archaic, que é limitada a 40 cópias. Só vai ouvir quem tiver uma dessas.

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Como o Jupiterian está repercutindo na gringa, depois do lançamento do k7 pela Caligari Records?
Cara, tá indo muito bem! Nós já tivemos uma excelente recepção com o Archaic, agora com esse play novo, a coisa tá indo bem mais longe. A Cvlt Nation se encarregou de fazer a première na gringa e logo em seguida soltou uma resenha que é um verdadeiro pergaminho a respeito. Uma resenha que certamente fez valer todo nosso trabalho e dedicação a esse álbum. Fora uma menção foda que rolou no Invisible Oranges e outros sites que vão aparecendo pouco a pouco.

Para nós esses sons são novos, mas para vocês, não. Afinal, já faz uma cara que vocês estão trabalhando neles, tocando, e a gravação rolou em fevereiro. Já deu uma enjoada de escutá-los e tocá-los? Ou a empolgação ainda é a mesma?
Se contar desde o tempo que nós pensamos o riff, estruturamos as músicas, ensaiamos toda semana, gravamos, mixamos e ouvimos o resultado final, representa pouco mais de um ano ouvindo cada música antes mesmo delas estarem disponível pela primeira vez. Acho que esse trabalho mais exaustivo ficou mais comigo, pois era eu quem recebia as versões da mix, ouvia no trampo, depois no caminho pra casa, depois em casa pra ter certeza de que estava do jeito que era pra ser. Mas aí você pede algumas mudanças e esse trabalho se repete no dia seguinte, e no outro, e no outro, e assim por diante até estar 100% satisfeito. Parece que enjoa, mas é um trabalho tão gratificante que acabo não pensando dessa forma. Uma coisa que sinto é que tocamos as músicas com muito mais punch depois que ouvimos o resultado final, porque a música não muda mais dali pra frente, e já tocamos tanto no estúdio na hora de gravar que sai muito mais fácil e natural depois.

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Continua abaixo…

Saindo o álbum oficialmente aqui no Brasil, pela Black Hole, o que vocês já têm planejado para a divulgação? Tem uma turnê esquematizada, clipe a caminho? O que dá para adiantar?
Tour não tem. Temos alguns planos, mas é uma coisa que ainda está sendo conversada de forma bem rasa entre a gente. Mas faremos o show de lançamento do Aphotic, o CD e a tape.

Pode-se dizer que no Aphotic o Jupiterian chegou à sua identidade substancial? Digo, as paradas daqui pra frente vão seguir essa linha, ou podemos contar com novos experimentos sonoros, flertando com outros gêneros, de repente, no futuro?
Espero que não, assim não nos forçarmos à repetição. Trabalhar com músicas muito lentas e com esse monte de espaço vazio pode ser entediante se você não procura se reinventar dentro desses espaços. Seja com o instrumento, com voz, dobras e atmosferas. Nós flertamos muito com vários estilos de som desde o começo, tem muita coisa que queremos fazer para um próximo álbum, inclusive já temos uma música nova, o esqueleto da segunda, e estamos tocando um cover de uma banda dos anos 1970 que é quase certo que esse vai entrar pro nosso próximo disco.

Qual é a parada da capa? Tem um conceito que vocês passaram pro cara que fez a arte?
Então, eu passei o nome do disco pra ele, Aphotic. Ele me mandou o rascunho do que imaginou praquilo, o ser humano passando por um processo de evolução, e tornando-se uma dessas criaturas [afóticas]. A capa ilustra essa evolução a partir de um feto que se torna o esqueleto e dos símbolos de alfa e ômega, vida e morte, bem e mal, e é como somos.

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Quem assina o desenho?
Foi feito pelo Manuel Tinnemans, o mesmo cara que já fez artes pro Deathspell Omega, Urfaust, Bolzer, The Devil´s Blood, Sunn O))) e etc.

Como rolou o contato com ele? Vocês já trocavam ideia?
Eu o conheci quando fui pro Roadburn, em 2013. Ele tinha lançado o livro Tábula Obscura, uma coletânea das ilustras dele com outros dois artistas, incluindo o Sami, do Reverend Bizarre. Aí comprei o livro e trocamos ideia, depois mantivemos o contato e ele foi a primeira pessoa em quem pensei pra fazer a arte do disco. Como o formato quadrado não caberia na tape que saiu antes do CD, acabamos tendo que fazer outra arte. Aí chamei a fotógrafa Patrícia Montrase e usamos parte da minha coleção de crânios pra essa sessão na tape. Já o CD traz no slipcase a mesma foto da tape. Quando você tira, tem a arte do Manuel. Foi a forma que encontramos de linkar os dois formatos.

O processo todo pra definir a arte foi demorado? Teve várias adaptações, ou nem?
Não, foi diretão. O Manuel mandava cada upgrade da capa. E no caso da Patrícia, nós fizemos juntos. Então foi bem direto.

Bruxaria! Vou procurar mais coisas do trampo dele pra sacar.
Procura como Comaworx. É o nome dele como ilustrador. Só bagulho bruto.

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