Foto: Estúdio Muto
"Falo" deve ter sido a música que mais chamou atenção de todo mundo na primeira ouvida do Princesa, segundo disco do Carne Doce, lançado em agosto do ano passado. Seja talvez porque a vocalista/compositora Salma Jô diz na letra que é bom que você, homem, "se cuide pois não vai ter quem lhe acude quando ela quiser te capar" ou seja também por causa do duplo sentido do título escolhido para a faixa — que pode se referir tanto a uma forma de conjugação do verbo "falar" (e, no caso, de como mulheres são reprimidas quando falam), quanto ao substantivo "falo", ou seja, ao conceito de poder geralmente associada à imagem do órgão reprodutor masculino (a famigerada "piroca") —, "Falo" foi alçada quase que automaticamente a hino feminista por alguns fãs — fato que Salma Jô diz achar um tanto esquisito:Algumas pessoas acham justo que a protagonista extrapole de uma revolta legítima pra se tornar uma figura mais ameaçadora, desmedida, e até tirana mesmo. Se você for pensar, é estranho que tenha virado um 'hino', porque as demandas que ela reclama não são assim tão profundas ou urgentes. Se tratam mais de coisinhas irritantes cotidianas. São denúncias particulares contra o machismo sutil dos homens que são íntimos de gente, que são nossos parceiros afetivos ou profissionais. Não é um protesto contra o machismo mais violento e não atende às mulheres que são oprimidas de forma violenta. Mas compreendo que muitas se identificam com o que é relatado na letra. E de novo eu queria abordar uma personagem com contradições: forte e fraca, passiva e rebelde, gentil e violenta. Pra mim, é importante refletir sobre essa complexidade da mulher e não tratá-la somente como vítima, pois não gosto de atender a esses ideais, nem de poder, nem de submissão. Não vejo o poder como a propriedade do opressor contra o oprimido, mas como um exercício que circula entre essas partes, que é exercido por ambas.Hino feminista ou não, era de se esperar que a música com a letra mais incisiva do Princesaganhasse um clipe igualmente intenso: protagonizado por Salma, o vídeo traz ela e mais uma dúzia de meninas encapuzadas torturando um homem, que, apesar de parecer, não é necessariamente um padre. "Os meninos do [estúdio] Muto queriam mesmo que fosse um padre, mas eu não queria", explicou Salma, dizendo que eles até retiraram a gola da batina para que as pessoas não o associassem apenas à figura clerical. "Era pra o personagem retratar um homem mais mundano, sem o celibato e essas privações, mas que continuasse um líder, um moralista, um religioso, normal. Mas acho que não foi suficiente, infelizmente."A ideia principal do clipe surgiu da galera do estúdio, mas Salma deu uma lapidada no roteiro de acordo com a intenção da música. Duas inspirações cruciais para o vídeo foram: a locação — uma fazenda antiga do inicio do século 20 que tinha uma igrejinha no fundo — e os vídeos das Pussy Riot. "Pensamos em retratar essa tortura e esse pesadelo sofridos pelo personagem masculino porque a letra em si mostra que o seu desejo final da protagonista da música não é por justiça, mas por um linchamento, uma vingança. Daí também vem a falta de explicação sobre a motivação das meninas do clipe", explicou a vocalista.A banda goiana apresentou o clipe nesta terça-feira (14), durante o show deles no Mostra Prata da Casa, que aconteceu no Sesc Pompeia, em São Paulo. Assista abaixo:
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