Em defesa do “monhé manhoso”
Isto de ser Primeiro-Ministro não é pêra doce. (Foto por Sérgio Felizardo, originalmente publicada aqui)

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Em defesa do “monhé manhoso”

Carta aberta a António Costa, alvo de inúmeros ataques racistas nas caixas de comentários desta vida desde que é chefe do governo (deve também ser lida por trolls, haters e demais frustrados que por lá proliferam).

Caro António Costa,

O título que encabeça este texto pode ser considerado fortíssimo, mas expressa um País cheio de racistas dissimulados. Pessoas que votam em ti, veneram o Eusébio, vibram com as fintas de Gelson, ou com os golos do Marega, mas dificilmente partilhariam a viagem num Uber com alguém da Cova da Moura, ou ficariam entusiasmados se uma irmã, ou filha, lhes aparecesse em casa com um namorado de cor escura, ou de outra etnia não caucasiana. Ainda assim, acho que a maioria não é racista e os que apoiam as teorias do candidato André Ventura só o fazem por solidariedade benfiquista - pelo menos, é o que prefiro pensar…

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António, chegaste onde chegaste, mas não deve ter sido fácil. Claro que a tua mãe, sendo branca, deve ter facilitado os que te olhavam com desconfiança. Deve ter sido um pouco assim nos teus primeiros tempos na Juventude "rosa", certo? Mas, lá te entrosaste e foste um boy como tantos outros à espera da oportunidade para aparecer na hora certa. Pelo meio, alguns e algumas devem ter visto na tua cor e descendência razões suficientes para não te dizer tudo ("Se é indiano, cuidado!").


Vê também: "Charlottesville: Raça e Terror"


Se calhar, foi o que aconteceu quando eras visto como o número dois do governo. Aliás, ainda estou aqui a matutar qual é a tua relação com o teu antigo boss. Caso seja verdade o seu envolvimento em todos os esquemas que têm vindo à baila, será que sabias de algum deles e foste cúmplice? Ou foste - a par de muitos correligionários socialistas - um tapadinho de toda a ordem? Em ambos os casos, fico preocupado.

Contudo, cá para mim, algo te cheirou a esturro e bazaste à primeira oportunidade para funções camarárias em terreno alfacinha. Mais tarde, ao visitá-lo em Évora, proferiste o elucidativo, "Ele é um lutador e está, certamente, em luta por aquilo que acredita ser a sua verdade". A juntar a isso, ao saber recentemente que o político com nome de filósofo, anteriormente a essa prisão, supostamente considerou-te "um merdas", não é difícil de concluir que andavam de candeias às avessas. Certamente, ele já tinha paletes de inveja pela tua ascensão. A vossa relação parece uma versão politizada do duelo Cavani versus Neymar do último fim-de-semana.

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Desde que foste nomeado Primeiro-Ministro, há quase dois anos, tenho visto que tens sido um dos mais atacados nas redes sociais. Acredito que a maioria desse "atirar de pedras" pertence aos que apoiaram a Direita, que ganhou as eleições legislativas - ou ficou somente à frente, como disse o humorista José Pina - e que te chama, por isso, de "golpista". Que exagero. Se a Constituição Portuguesa permite que um partido menos votado constitua um governo com apoio parlamentar - e que, no teu caso, deu origem à famosa "geringonça" - , porque raio és tu o mau da fita?

Se fosse ilegal, compreenderia a revolta que grassa por aí nas caixas de comentários e dos diversos opinion makers que não perdem a mínima oportunidade para criticar o teu trabalho, mesmo quando há boas notícias para o País. Neste ping pong eleitoral - por estes dias, são as autárquicas - e após tanta trafulhice acumulada através de alguns dos seus representantes ao longo das décadas, não percebo como é que o PS e PSD ainda continuam a ter tantos votos…

Talvez, o slogan imaginário (!?), "A distribuir tachos há trinta e tal anos", explique tal facto. Mais uma vez, a culpa não é tua, pois só te adaptaste ao que a casa gasta. É o País que temos e que a Madonna, pelos vistos, adora e que prefere, claro está, nem saber desses jogos sombrios. Para quem vem de uma nação comandada por Trump, como a compreendo…

Para finalizar, da próxima vez que te chamarem "monhé manhoso" e outros ataques similares, pensei em aconselhar-lhes um filme de Bollywood, ou a comprarem flores para apaziguar a alma, mas tudo isso soa a preconceituoso. O melhor mesmo é dizer-lhes para fazerem como o João Miguel Tavares e levarem os filhos, ou outros familiares, para tomares conta deles e verem o quão porreiro podes ser. Às tantas, por estar à deriva, a actual Direita (e os seus followers) precisa de uma babysitter. É que nem Marcelo anda com pachorra para a aturar.

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Aos Osórios do nosso quotidiano (como é apelidado o hater do 5 Para a Meia-Noite), peço encarecidamente para que deixem de exercitar a democracia via maledicência, só porque sim. Há tanta coisa que podem fazer em vez de "trollarem" por aí. É que a internet pode ser mágica e divertida. Só precisam de teclar as palavras certas para seguirem nessa direcção (ver vídeo abaixo).

Última nota: Se não perceberem inglês sem terem as legendas por perto, também é razão para "bater" no Costa?

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