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Música

Falamos com a Moça dos Joelhos Cagados que Toca Violão no Bar Sinistro de 'True Detective'

O nome dela é Lera Lynn e ela existe na vida real também.
Emma Garland
London, GB

Foto por Josh Favlarge.

A segunda temporada de True Detective, de Nic Pizzolatto, dividiu o público. Grande parte das pessoas morreram de amores pela primeira temporada por conta de seu tom surreal gótico sulista, Matthew McConaughey falando coisas como “o tempo é um círculo plano” na voz caracteristicamente fatigada de quem fuma 40 cigarros por dia, e Woody Harrelson no papel de cara normalzão sempre mandando um “para de falar essas bizarrices”. Com quatro protagonistas e nada do existencialismo de sua predecessora, a segunda temporada, em comparação, demora a engrenar, apesar de começar com o corpo de um gestor público encontrado na estrada com o pau arrancado na base do tiro e olhos queimados com ácido.

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Com o enredo se passando na cidade fictícia de Vinci, Califórnia (supostamente baseada em Vernon, Califórnia), a segunda temporada nos traz Colin Farrell, Taylor Kitsch, Rachel McAdams e Vince Vaughn nos papéis de três detetives e um senhor do crime num estilo O Poderoso Chefão, respectivamente, todos com variados passados obscuros e algum tipo de problema sexual. Não há qualquer alívio cômico no relacionamento entre os personagens desta vez (a não ser que você tenha um senso de humor bastante deprê), só muita gente se olhando, seguidos por monólogos sobre esmagar ratos em um porão. Como na primeira temporada, trata-se de uma investigação complexa dos aspectos mais obscuros e fodidos da humanidade, mas desta vez soma-se um quê de noir de Los Angeles com misticismo digno de David Lynch, escolhendo um desenrolar mais gradual. Além disso, cada personagem é perpetuamente atormentado ao ponto de causar hérnias.

Beleza. Agora que você sabe um pouco do que rola na segunda temporada de True Detective, você está pronto para conhecer Lera Lynn, uma cantora-compositora de Nashville que tem levado seu tom infinitamente deprimente à música. Se você já viu algum episódio da série, talvez reconheça Lera como a mulher com os joelhos cagados que toca violão no bar sinistro frequentado por Frank (Vince Vaughn) e Ray (Colin Farrell) para trocar informações, encher a cara e ficarem se encarando furiosamente. Se você ainda não assistiu à série, talvez tenha ouvido a música de Lera do mesmo jeito: ela causou uma impressão tão boa nos fãs que acabou abocanhando o primeiro lugar nas paradas virais globais do Spotify. Uma das faixas mais proeminentes, “My Least Favorite Life”, que soa como uma Chelsea Wolfe cantando blues, atingiu mais de um milhão de visualizações no YouTube em uma semana.

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Após ouvir The Avenues, Lera foi selecionada pelo produtor e supervisor musical de True Detective T-Bone Burnett, que descreve o bar como “o coração pulsante da série […] É naquele bar que True Detective acontece. Ele é a psicoesfera. Tem algo ali que dá a sensação de muito central”.

Conversamos com Lera alguns dias antes do final da temporada, no último domingo (8), sobre compor para True Detective, teorias em subreddits e como é tocar num boteco em que o público é constituído por Colin Farrell e Vince Vaughn. Noisey: Oi Lera. De cara, estou curiosa pra saber como você se envolveu com True Detective. Como rolou isso aí?

Lera: Minha agente mandou umas músicas minhas pro T-Bone [Burnett, supervisor musical da série]. Ela tinha trabalhado com ele antes em Raising Sand, um disco colaborativo entre Alison Krauss e Robert Plant, e achou que nos daríamos bem juntos. Nos encontramos num almoço em Nashvile e inicialmente ela falou sobre usar a faixa-título do EP que havia lançado no ano passado chamada “Lying In The Sun”, que no final das contas não foi usada, mas então perguntou se estava interessada em compor algumas coisas para a série e trabalhar com T-Bone. Claro que topei. Então ele me fez ir até LA e compomos e gravamos muita coisa juntos em alguns dias. Ele chamou Nic Pizzolatto pra ver o que tínhamos feito e o cara adorou. T-Bone disse: “Bom, o que você acha de ter esta garota como cantora?” e Nic respondeu: “Teremos que fazer ela se encaixar no papel de alguma forma, mas tudo bem”. E o resto é história.

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Além de compor música para a série, você também participa dela, como cantora no bar. Como você descreveria seu papel?

O enredo até então tem sido bastante misterioso pra mim. Nunca me deixaram ver os scripts além das cenas em que apareço, então estou acompanhando a série enquanto ela se desenrola. Mas se afastando um pouco e juntando as peças do que foi revelado até então, dá pra ver como tudo está ligado. O seriado te dá tantas informações e tão rapidamente que creio que aquelas cenas [no bar] dão certo alívio. Elas te dão a chance de digerir tudo de pouquinho em pouquinho.

Ouvi dizer que você teve que deixar o cabelo ensebado e fazer coisas pra te deixar mais com cara de quem tocaria num bar daqueles.

Sim [risos]. Minha parte favorita do figurino era quando o pessoal do departamento chegava com lixas, escovas de aço e tesouras. Tinham umas seis pessoas aplicando sujeira em mim, rasgando meu vestido, cortando as mangas… Provavelmente isso nunca mais vai acontecer!

Imagem da segunda temporada deTrue Detective .

Você tocou em bares como aquele na vida real?

Meu Deus, incontáveis vezes. É um rito de passagem. Meio que ainda toco neles. Mas essas são algumas das melhores experiências que se pode ter mesmo. Já toquei em tudo que é lugar, de um bar esportivo até no último andar de uma igreja com três pessoas. Você topa nuns lugares bizarros, mas a vida é assim. Tem tanto a se aprender nesses momentos, na minha opinião. Ainda curto tocar em locais como esses.

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Li que uma das deixas de Nic Pizzolatto para “My Least Favorite Life” era compor uma canção sobre um amante que morre e vira um corvo. Nic e T-Bone te direcionaram em termos do que queriam de cada música?

Foi bem isso. Digo, a HBO é bem rígida com isso de vazar informações, e comigo não foi diferente. Só me passavam informações muito ambíguas por meio de T-Bone. Nem tanto sobre o personagem ou papel na série, só o tom que Nic queria capturar. Ele me dava algumas informações do tipo, esta garota está fodida, presa em um boteco tocando músicas incríveis pra ninguém. Então eu me dava uma forcinha com uma boa dose de uísque antes de gravarmos e tentava deixar tudo o mais preguiçoso e relaxado possível. Catatônico.

Foi a primeira vez que você gravou pra TV ou cinema?

Foi. A outra coisa que tinha feito era a música-tema de Squidbillies, um desenho do Adult Swim. Eles pegam vários artistas pra fazer a música-tema, o que é bem diferente de compor para um personagem, então, é, foi meu primeiro trabalho para TV.

Trabalhar na trilha de True Detective foi um passo adentro de um território musical mais obscuro pra você ou tem temas ali que você crê que seriam explorados de qualquer forma?

Acho que T-Bone pensou que eu era capaz de fazer aquilo porque ele ouviu algo em minha música, ele me ouvia dando indícios de escuridão. Certamente é algo que faz parte de mim enquanto artista, mas que raramente é celebrado.

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Você teve que entrar no personagem pra compor ou rolou naturalmente?

Eu diria que foi 80% natural e 20% entrando na personagem ou, sabe como é, tentar cantar com o mínimo de afetação possível. Isso aí deu trabalho. [Nic] queria performances bastante lânguidas e era difícil fazer isso porque eu compunha, arrumava os microfones e gravava. É difícil tocar violão no tempo certo e cantar por trás da batida tranquilona quando ainda está decorando a letra e acordes. Você fica tipo “opa, como que era mesmo? Eu deveria estar chapada agora…”.

Acho que isso ajudou com a característica visceral já que não tínhamos tempo de aperfeiçoar ou pensar muito em qualquer coisa. Tudo era gravado ao vivo e reflete exatamente o que rolava no bar, do tipo, uma garota pode tocar e cantar ali e soar daquele jeito mesmo.

Sempre ficou claro que você participaria da série ou essa foi uma decisão tomada posteriormente?

Havíamos escrito um punhado de faixas e tocado-as para Nic. T-Bone claro que me perguntou se queria fazer aquilo e disse que largaria a ideia pro Nic, então não sei se topariam ou não. Mas de primeira só trabalhávamos em cima das músicas e me colocar pra tocá-las ao vivo veio depois. É mais fácil do que tentar ensinar pra alguém o fraseado dos vocais e como tocar com afinação estranha e tal. Era mais fácil pegar quem escreveu aquilo e economizar tempo, né?

E como foi filmar? Tocar em bar é sempre a mesma coisa, mas o negócio muda quando os únicos dois no público são Colin Farrell e Vince Vaughn.

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É! Lembro da primeira vez que vi os dois – ambos tem uma baita presença e são tão gentis com todo mundo. Dá pra ver que todos gostaram de trabalhar com eles. Trabalhando com música, já bati minha cota de experiências com gente famosa e tentar deixa-las na delas, sem irritar! Eles falaram comigo no set e se apresentaram, o que foi completamente desnecessário, mas muito bacana. Tipo, eu sei quem vocês são. [Risos] Os dois gostavam muito de música. Acho que a primeira cena que filmamos lá tinha música, e claro que a trilha tem o poder de levar tudo a outro nível e acho que eles estavam bem inspirados em ter aquele elemento ali.

Li uma teoria de que o bar supostamente representa o purgatório. Uma espécie de lugar entre a vida e a morte em que Ray está esperando, e a bartender é um tipo de anjo que o espera pra lhe levar, mas ele ainda tem motivos para viver por meio dos outros personagens – Frank, Ani, Paul, seu filho, etc. Você acha que há alguma verdade nessa ideia de que é uma metáfora visual para o estado mental de Ray?

Purgatório, tipo onde todo mundo tá preso? É uma ideia interessante. Consigo sacar isso. É interessante ver como as pessoas se ligam no enredo, tentando entendê-lo e o que significa. É tipo “Odeio! Amo! Amo”.

Você tem trabalhado em algo mais no momento?

Encerramos True Detective há mais ou menos um ou dois meses. Mas tenho trabalhado em cima do meu novo disco em Nashville. Acho que já fizemos 25% dele, então estou compondo e gravando bastante e curtindo todo o processo. Fui criada no sul dos Estados Unidos – Georgia, Texas, Louisiana – então acho que sempre haverá elementos sulistas no meu som, mas seria exagero chamar meu próximo álbum de country ou Americana. Estou meio que seguindo essa trilha inclassificável, e esse disco vai anda mais além!

Obrigado Lera!

A trilha sonora de True Detective estará disponível dia 14 de agosto via iTunes. Conheça mais de Lera Lynn aqui.

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Tradução: Thiago “Índio” Silva