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Música

Minha Vida como Gerente de uma Loja da Hot Topic em Plenos Anos 2000

Basicamente a galeria do rock dos americanos.

Foto cortesia de Zeena Koda.

O shopping era a o lugar sagrado de qualquer adolescente rebelde criado em Nova Jersey. Se você estivesse interessado em stalkear o seu flerte, aprender a fazer pequenos furtos, tentar descobrir quais as chances de conseguir uma fantasia de puta acompanhado de seus outros amigos menores de idade que nem você ou ficar muito louco de vodca barata no banheiro, o shopping era o lugar para você estar no fim de semana. Era uma infinidade de possibilidades para jovens facilmente influenciáveis e, uma vez que eles encontravam uma loja que estimulasse suas mentes entediadas e curiosas, eram automaticamente puxados para dentro dela. Aos 13 anos descobri a Hot Topic e imediatamente descolei minha primeira corrente para o pescoço e o resto é muita história. Quando eu fiz 17 anos, me tornei gerente da Hot Topic mais alternativa possível (em um shopping a muitas quadras de distância das outras lojas), e comecei uma carreira de seis anos de muito aprendizado repleta de personagens inesquecíveis.

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A música underground sempre atraiu um grupo heterogêneo de admiradores e, na época que fui contratada, a loja ficava cheia de vagabundos obcecados por uma grande variedade de heavy metal e música experimental. A loja era um poço de músicos, bipolares, lunáticos talentosos, drama queens sagazmente sexy e pseudo-artistas. Os próprios funcionários eram uma mistura de comédia e desastre: viciados em drogas, é claro, e sempre em conflito achando que você estava pouco se fodendo quando sua ética de trabalho estava em questão, mesmo estando regularmente empregados. Frequentemente alguém chegava para trabalhar bêbado, de ressaca, sob efeito de remédios ou se achando o rei da cocada preta e com a menor vontade de trabalhar; às vezes os funcionários relaxavam tanto durante o intervalo que nem voltavam para trabalhar, ou voltavam tão destruídos que eu falava para eles irem embora para casa. Meu trabalho oscilava de gerente super paciente até babá, dependendo do dia, mas o maior desafio de trabalhar na Hot Topic era ter que escolher a própria trilha sonora diariamente.

A minha variava entre bandas do selo Trustkill Records, At The Gates, Deftones e algum besteirol gótico/industrial que eu gostava de dançar de forma oitentista. Quando o emo/screamo se tornaram mainstream e as camisetas do Dashboard Confessional tomaram conta das prateleiras, eu fui forçada a ouvir bandas que a princípio considerava "de mulherzinha" (apesar de que tenho certeza que os funcionários emos também estavam de saco cheio de ouvir o Dave Mustaine cantando sobre destruição, então pelo menos a tortura era mútua). Eventualmente eu me pegava cantando essas músicas emo esganiçadas e, de alguma forma, meu trabalho na Hot Topic era um processo educativo de expansão musical. Em paralelo me tornei líder de uma banda de heavy metal local, e foi quando tive a chance de promovê-la continuamente que comecei a lidar com rejeição de verdade, o que me ajudou a cair na real.

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Não tinha um dia que eu não ouvia "cara, você pode ouvir minha banda?" de algum cliente aleatório. Raramente era algo que me deixasse impressionada, mas sempre ouvia rapidinho com medo de que eles voltassem e me xingassem. Pensando bem, a Hot Topic foi um ótimo preparativo para o que me aguardava na minha carreira no mundo da música. Nossas criações eram abertamente divulgadas corporativamente e a loja era um lugar aberto para falar sobre novas músicas, shows e fofocas do meio artístico. Na verdade, conheci um amigo instrumentista durante o meu trabalho lá que eventualmente me ajudou a conseguir meu primeiro estágio na indústria; dobrar todas aquelas camisetas do Ramones valeu a pena no final das contas!

Tinha uma vibe diferente ali, uma expressão cultural e musical que nenhuma outra loja tinha sido capaz de conquistar naquele início dos anos 2000. As lojas "padrão" eram uma mistura surpreendente de mães que não trabalhavam, uns bobões jogando World of Warcraft e zapeando animes e jogos de videogame por horas, roqueiros caindo aos pedaços e garotos mexicanos APAIXONADOS por Iron Maiden e Metallica. Eu sempre ficava chocada com a quantidade de gente sem nada melhor pra fazer do que ir até a loja e ver o que tinha de novo. Você não tem nenhuma mina pra pegar em vez de ficar bagunçando as camisetas do Taking Back Sunday? Quantas calças do Kik Wear você realmente precisa ter no seu armário? O nível de sanidade mental dos clientes sempre foi algo difícil de avaliar, e eu fui reprimida uma vez porque estava ouvindo uma música do Rancid com uma série de palavrões ininterruptos. Eu pulei a música imediatamente, mas a mulher mal-humorada que eu tinha ofendido estava determinada a me denunciar. Tudo que eu consegui pensar foi "isso é punk rock, querida, segura a onda porque eu sei que você fala coisa muito pior pro seu marido no dia-a-dia".

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"Provavelmente a única vez que eu fui Funcionária do Mês". Foto cortesia da Zeena Koda.

Eu fui equivocadamente encarregada de contratar funcionários temporários para o Natal. Uma tarefa assustadora, eu sei, mas estava empolgada com a possibilidade de contratar novos garotos gatos e tatuados todo ano. A maioria dos meus funcionários eram músicos assim como eu, e eu frequentemente afrontava eles com debates musicais intensos e sem sentido. Nós discutíamos sobre os constrangimentos e humilhações que você pode passar enquanto músico e acabávamos fofocando sobre os funcionários. A minha banda costumava fazer shows com outros colegas de trabalho e era reconfortante saber que outras pessoas ao seu redor também estavam passando por momentos difíceis. Às vezes músicos, personalidades e celebridades importantes colavam lá. Uma vez o Degrassi Live Tour fez um show próximo à entrada da loja e várias garotas fizeram uma fila logo quando estava amanhecendo, todas fora de si. Se eu soubesse o quão longe o Jimmy-da-cadeira-de-rodas (também conhecido com Drake) iria, talvez eu me desse ao trabalho de me importar com isso na época, mas, para mim, era só mais um dia de trabalho qualquer no shopping.

Tiveram algumas fases da minha vida que o jeito de me vestir foi influenciado pela minha presença lá. Quando mergulhada em um ambiente repleto de espartilhos, cenas do Lip Service, maquiagem da Manic Panic e a fada do glitter, você tende a tomar decisões inusitadas. Era totalmente normal para mim ostentar tranças de um vermelho vibrante enquanto usava botas pretas com um salto plataforma enorme em plena terça-feira. Sexy, hein? Também comecei a ter um respeito aleatório e também profundo pelo Insane Clown Posse. Os verdadeiros fãs do ICP arrasavam com suas calças cheias de correntes combinando com as bandanas e o logo do cara com um machado sempre onipresente no pescoço – comprovando a dedicação pelo estilo Juggalo. Aquele logo era uma maneira de reconhecer os poucos, os orgulhosos e os inquestionáveis, e felizmente para mim, eu vi todos eles.

"Meus colegas de trabalho e eu em 2003". Foto cortesia da Zeena Koda

As pessoas vinham até a loja e berravam "seus bizarros!" pra gente sempre, e isso me deixava louca. A percepção pública era diferente naquela época. Diferentemente de hoje, que todo mundo pode se vestir que nem um idiota e ainda se sair como "excepcional e artístico", naquela época você tinha que lutar por esse direito. Felizmente, a Hot Topic deixava você se vestir do jeito que quisesse, desde que estivesse fazendo eles lucrarem enquanto vende esse estilo de vida. Era o abrigo perfeito para músicos em turnê que procuravam trabalho temporário, groupies atrás de migalhas e pessoas complexadas e sem direção que precisavam de uma falsa sensação de importância.

Graças à Hot Topic eu fui introduzida à indústria musical. Foi o primeiro lugar onde eu pude discutir abertamente sobre música com outros idiotas que pensavam como eu e também acreditavam que, um dia, "a nossa banda vai dar certo, cara". Era um lugar onde descrentes de todos os estilos se congregavam, e a loja até criou seu próprio gênero de música: mall metal. Eu consigo pensar em inúmeras bandas que ainda estariam comendo arroz com feijão se não fosse a ajuda de distribuição da Hot Topic. Quando uma empresa se integra tanto à cultura que ela se torna a própria cultura, você sabe que essa porra vale alguma coisa. Para a nossa geração, foi o nosso Empire Records, e, sinceramente, eu amei cada minuto daquilo.