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Música

Canções Perversas e Canções de Lamento: Reflexões Sobre a Obra Prima Acidental do Cursive, 'The Ugly Organ'

The Ugly Organ não devia ter vendido uma única cópia.

The Ugly Organ não devia ter vendido uma única cópia. Vender nunca foi a intenção. "Parecia realmente esquisito e perverso para mim. E eu achava que não passava de eu sendo introspectivo de uma maneira tão antipática que ninguém ia captar, e me fez sentir um pouco egoísta", relembra o frontman do Cursive, Tim Kasher. "Mas acabou que foi essa surpresa imensa, estranha, louca; o que é meio empolgante, mas também me deixa perplexo".

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Armado de baixas expectativas e de ideias grandiosas, o Cursive acidentalmente conseguiu engarrafar um raio de luz em seu quarto disco, que se seguiu ao Domestica, de 2000. A banda aperfeiçoou a natureza conceitual do Domestica, levando-a um passo além em The Ugly Organ. Nele, a banda mergulhou de cabeça na essência retraída, de contemplação umbiguística, da vida de um artista, e mesclou um cinismo realista com uma narrativa de conto de fadas.

Se Kasher fosse um serial killer – o "bloody murderer" a que faz alusão na música de mesmo título – seria pego pela polícia em dois tempos, já que encobrir os próprios vestígios não é muito a dele. Em muitos casos, nas letras do disco, cujo propósito era ser uma narrativa ficcionalizada em primeira pessoa, o próprio Kasher se infiltra, desde fazer referência ao próprio nome em "Butcher the Song" (“Who’s Tim’s latest whore?” – "Quem é a puta mais recente do Tim?") até a alusão sutil e sarcástica à banda em "Art Is Hard" ("Oh Cursive is so cool!").

Mas, apesar da falta de universalidade pela qual Kasher dá crédito ao disco, ele fez um sucesso imenso ao ser lançado em 2003. Virou um queridinho entre os críticos de música, um favorito imediato dos fãs, e vendeu mais de 170.000 cópias para a Saddle Creek Records, conquistando um lugar entre os discos fundamentais da gravadora de Omaha, junto com o Danse Macabre do The Faint e o Lifted, do Bright Eyes. Ele está agora sendo relançado, numa edição especial deluxe pela gravadora, com itens extras como fotos e os primeiros esboços da arte de capa. Foi um nível de sucesso que o Cursive jamais alcançara antes, e na verdade não alcançaria de novo. "Se era introspectivo demais, bem, talvez fosse justamente isso que as pessoas queriam naquela época", conjectura Kasher.

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No encarte, há um prelúdio ao disco, como se fossem direções de palco: Entra o Organista. Vai até o centro do palco, vestido em fantasia grotesca. Faz um gesto para um público imaginário. Esta é a história de um disco de beleza fantasmagórica, executado para uma multidão de zero pessoas.

Senhoras e senhores, The Ugly Organ

Os Personagens

Tim Kasher (Cursive, guitarrista/vocalista)

Gretta Cohn (Cursive, violoncelista)

Ted Stevens (Cursive, guitarrista)

Matt Maginn (Cursive, baixista)

Robb Nansel (Saddle Creek Records)

Jordan Blilie (The Blood Brothers, vocalista)

Geoff Rickly (Thursday, vocalista)

Erin Tate (Minus the Bear, vocalista)

Fotos do relançamento de The Ugly Organ em versão deluxe.

Save me from the wreck i'm about to drown in/ Me salve do naufrágio que estou prestes a me afogar

O Cursive fora aclamado pela crítica por seu disco de 2000, Domestica. Mas, no ano seguinte, começaram a criar sem pressa as bases do que estava por vir. Havia indícios de um novo estilo do Cursive – algo diferente das obras anteriores da discografia. A banda testou a temperatura do som que viria em The Ugly Organ com o EP Burst and Bloom, de 2001.

Kasher: Tento não ser um crítico severo demais das coisas que eu fiz muito tempo atrás, mas, em termos musicais, acho que, antes de The Ugly Organ, a gente tinha um pouco menos da nossa identidade. Foi aí que aquela época nos anos 90 em que ficamos ouvindo as bandas da Dischord ficou um pouco mais evidente.

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Maginn: Tínhamos um amálgama de som, seja lá o que ele fosse, que se parecia com uma fusão entre a Dischord e a Merge Records. A gente adorava Archers of Loaf, mas adorava também Fugazi e essas influências todas. Muitas vezes acabávamos saindo em turnês com bandas pós-hardcore, mas na verdade não éramos tão hard assim, ainda que às vezes nosso som fosse pesado.

Kasher: A gente era muito fã do Brainiac naquela época, e existe muita perversidade na maneira com que abordavam a música deles. Parte de The Ugly Organ reflete um pouco disso. Nem só o Fugazi era muito importante para nós, o Shudder To Think era gigante para mim também, simplesmente ver a insolência do Craig Wedren naquela época foi um negócio grande demais.

Maginn: A gente tocou algumas das maiores músicas do Ugly Organ, como “Gentleman Caller”, “Art Is Hard”, “Red Handed Slight of Hand”, na turnê Plea for Peace. Senti que a recepção foi muito boa. É meio que o teste de estrada que você espera de uma música. O pessoal era bem cabeça aberta.

She pulled some strings/ Ela mexeu uns pauzinhos

Em 2001, o Cursive acrescentou uma nova arma ao seu arsenal musical, convocando a ajuda da violoncelista Gretta Cohn, que foi integrante da banda durante quase quatro anos. The Ugly Organ foi o único disco completo no qual ela apareceria, o que deu a ele um som diferente, que não se parecia com nada da extensa discografia da banda.

Cohn: Eu estava na faculdade e tocando em algumas bandas de lá. Acabou que nós abríamos todos os shows. Me formei e voltei a morar em Nova York. Daí, um ano depois, meus pais me ligaram e disseram: "tinha uma mensagem na sua secretária eletrônica, tipo de um caubói, e a gente não entendeu direito do que se tratava". Era o Ted Stevens me ligando só pra dizer: "a gente te conheceu e aí lembramos de você, e estamos procurando alguém que toque violoncelo. Está interessada?". Peguei um avião e fui pra lá, aprendi as músicas do Burst and Bloom e as gravei num intervalo de, tipo, cinco dias. Lembro de quando a gente estava no carro, voltando para Omaha, vindos do estúdio, e Ted dizia: "então, você quer se mudar pra cá e fazer parte da banda?"

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Stevens: Com a chegada da Greta, o plano era que o EP que precederia Ugly Organ seria um trampolim para algumas dessas ideias, e as que funcionassem seriam por fim incorporadas no lançamento seguinte e meio que na dinâmica da banda. Acho que foi um crescendo lento até desenvolver aquele som específico.

Cohn: Acho que o violoncelo amplifica as melodias e as paradas angustiantes, aquelas de arrancar lágrima. O cello pode ser inesperadamente inflamado. São tantas bandas que têm cello, e só usam ele para fazer um acompanhamento docinho do que está rolando. Mas no Cursive gostei, eu não tinha que tocar de um jeito doce, nem sombrio. Podia tocar com agressividade.

Maginn: Ela fez o EP Burst and Bloom, mas aquilo foi diferente, porque aquelas músicas foram quase todas escritas antes que ela entrasse na banda. Então o cello foi acrescentado como uma camada em cima da coisa pronta, em vez de ter sido escrito em conjunto, como aconteceu com o Ugly Organ, com ela participando.

Cohn: Eu tinha saído da faculdade fazia um ano, estava num emprego que não me empolgava, e a coisa tinha um gosto de aventura. Voei pra lá carregando uma mala, um estojo de violoncelo e o meu gato. Fico muito feliz por ter feito isso. Aprendi muita coisa sobre mim mesma. Pude sair em turnê e viajar pelo mundo, e fazer parte dessa coisa, e ver ela crescer. Sinto que eu estava em Omaha num momento crucial da história da Saddle Creek. Dei o salto, corri o risco. Na época, disse para mim mesma – talvez eu vá e fique por um ou dois anos pra ver o que acontece, depois volto pra casa. Acabei ficando lá durante quatro anos.

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And what comes out is a horrible mess/ E o resultado é uma zona horrorosa

As expectativas com o lançamento de The Ugly Organ, em 2003, eram baixas – tanto por parte da banda quanto da Saddle Creek Records. Não que o disco os tenha desagradado, o mais importante é que sempre haviam trabalhado com uma mentalidade de: "arte em primeiro lugar, depois vem a recepção". A aclamação era secundária.

Nansel: Não lembro da primeira vez que ouvi. Aquela época foi tão louca para a gente. O The Faint tinha feito o Danse Macabre e esse disco estava tendo uma grande repercussão internacional. E aí o Bright Eyes soltou o Lifted. A cada vez que aqueles caras faziam um disco novo, todos ficavam tentando superar uns aos outros.

Maginn: Na época eu era casado, e a gente estava na sala, ouvindo o disco pela primeira vez. O disco inteiro havia tocado e "Staying Alive" tinha acabado de acabar. Lembro de dizer para a minha esposa: "acho que ninguém vai gostar desse disco, com exceção da última música". Lembro de ter uma conversa semelhante com o Tim. Tipo: "isso aqui é um disco muito esquisito e bizarro". A gente estava super empolgado com ele, mas era um disco um pouco diferente. A gente acreditava que as pessoas iam nos achar uns esquisitões, e simplesmente era excêntrico demais.

Rickly: A gente estava na turnê Plea for Peace com eles. Já tinham finalizado o disco, mas ainda faltava lançar. Eles entraram no nosso ônibus e botaram pra gente ouvir, e a gente ficou tipo: "vish…" Lembro que tocaram o disco bem aos poucos pra gente. Tocaram "Art is Hard" logo de cara e a gente ficou tipo "ca-ra-lho. Esse daí é o novo hino do Cursive, com certeza. Vocês colocam todas as cartas na mesa e zoam com a própria cara bem no meio. Isso é maravilhoso. Tão Cursive da parte de vocês". Mas daí puseram mais algumas músicas e ficaram dizendo: "bom, essas são meio bizarras, pode ser que não entrem no disco". Uma delas era "Driftwood", e nessa, quando disseram que talvez ficasse de fora, achei que estavam pirados, porque era uma das melhores.

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Cohn: Na verdade ninguém estava esperando que o disco fosse ser recebido do jeito que foi.

I've been making money off my indifference/ Venho fazendo dinheiro da minha indiferença

Apesar da tendência da banda de fazer piada consigo mesma, o disco foi um sucesso de crítica, obtendo uma avaliação de quatro estrelas da Rolling Stone e uma matéria de capa de grande destaque na seção Arts & Leisure do New York Times. O disco acabou vendendo mais de 170.000 cópias, um sucesso tremendo para os padrões do indie rock, se tornando um dos mais populares do catálogo da Saddle Creek. Foi o 51º lançamento da gravadora.

Nansel: A gente sempre adorava todos os discos que os nossos amigos estavam soltando. No início, tentávamos fazer com que todas as bandas tivessem contrato com gravadoras. E as gravadoras não queriam assinar com elas. Esse foi um outro porquê do surgimento da Saddle Creek – a gente não conseguia achar ninguém que ligasse, então começamos a soltar os discos nós mesmos. Olhando agora, dá pra dizer que, sim, Ugly Organ é tipo uma obra-prima e tal, mas não acho que você sabe o que vai acontecer antes que aconteça.

Rickly: Então, o Death Cab for Cutie é, tipo, perfeito pra galerinha Urban Outfitters. É cool o suficiente para fazer sucesso com aquele pessoal, e não chega a ter ousadia demais, algo que fosse fazer todo mundo se distanciar. E o Conor [Oberst], apesar das maluquices que faz na música, ainda é um cara bonitão segurando uma guitarra, falando sobre seus sentimentos, e isso é um produto também. O Cursive, na verdade, não tinha nenhum fator óbvio que faria você dizer: "com certeza, contrato fechado". Eles estavam vendendo a música com a força das ideias por trás dela. E isso nunca é tão fácil. É sempre um milagre quando um disco tão louco quanto The Ugly Organ vende 170.000 cópias. Tipo, hoje em dia, se eles estivessem vendendo esse tanto, caralho, seriam a maior banda do mundo.

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Nansel: A gente nem sempre participava daquele jogo. Não contratamos nenhum promotor caro de rádios comerciais, porque não era o que ninguém queria de verdade. Eles queriam fazer a música deles nos termos deles, e sair para promovê-la. Não sei se algum deles queria mesmo chegar naquele nível acima. Quando a Saddle Creek começou, a gente sempre pensava: "nossa, meu Deus, se a gente conseguisse vender 20.000 cópias de um disco ia ser insano!"

Kasher: O lance é que ficamos completamente frustrados. Quando fizemos a festa para comemorar as 100.000 cópias vendidas, lembro [de Nansel] ficar realmente conflitado. Tipo: "vou te dizer o seguinte, se eu acreditasse que algum disco era capaz disso, não seria esse". [risos]

Tate: Obviamente, aquele disco deveria ter vendido 500.000 cópias. Eles têm uma boa quantidade de fãs, mas são total uma banda de bandas. Os jornalistas os adoram, os empresários os adoram, todo mundo os adora. Eles são os caras mais bonzinhos, e é impossível você sair de um show do Cursive sem achar que eles são uns sujeitos muito massa.

Maginn: A gente sempre tentou manter um pensamento positivo, mas a coisa ultrapassou muito as nossas expectativas. A gente queria muito que nossos colegas gostassem – as bandas que evoluíram junto com a gente. Foi a primeira vez que a gente conseguiu uma atenção maior da imprensa, e a primeira vez que contratamos um assessor de imprensa e coisas do tipo. Estávamos expostos a coisas às quais não estávamos antes. Éramos todos garotos de um colégio católico do meio-oeste. Nossos pais não eram músicos. Eles nunca criticaram abertamente, mas com certeza diziam tipo: "o que você está fazendo? Isso não é uma carreira". Daí, com aquela capa do New York Times, lembro do meu pai dizendo algo do tipo: "bom, não sei, eu nunca vou aparecer no New York Times". Foi bom não sermos considerados uns patetas o tempo todo pelas nossas famílias. Ser músico em Omaha não é nem de longe uma escolha de carreira normal.

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Kasher: É clichê dizer isso, mas acho que a coisa tomou vida própria. Virou uma coisa que na verdade não é mais Cursive. O The Ugly Organ meio que se diferenciou, virou uma coisa sui generis.

Rub it in with your dumb lyrics/ Esfrega nas suas letras estúpidas

Uma marca registrada da genialidade do Cursive são as letras de Kasher. As palavras dele muitas vezes são sagazes e introvertidas, e às vezes pura e simplesmente engraçadas, fazendo um uso pesado de referências literárias. Kasher passa a impressão de ser aquele cara no bar que leu Bukowski demais e tem consciência disso.

Kasher: A gente decidiu, muito tempo atrás, que é mais fácil se eu chego com composições já concluídas. Economiza alguns passos. Mas também as pessoas não reconhecem que o Ted contribuiu um punhado das músicas também.

Stevens: O Cursive sempre teve um processo de escrita muito semelhante, em que Tim chega com uma estrutura, e a banda começa a compor com base nessa ideia. Edições rolam toda semana ou até todo dia, dependendo da frequência dos ensaios, que aumentou ao longo dos anos. É sempre esse tipo de ideia com o Tim. Eu compus algumas músicas para o disco também, acho, mas em grande parte é só tocar o material repetidas vezes.

Kasher: No mínimo, acho que, vindo depois do Domestica, foi um disco que ficou um pouco conceitual demais. The Ugly Organ foi escrito do jeito que escrevo todos os meus discos – escrevo em alguns meses, então todas as ideias são ideias bem detalhadas. Mas, com o Ugly Organ, foi um pouco depois disso que as ideias foram costuradas umas às outras, para fazer com que a leitura e o sentimento por trás fossem mais coesos. Ted teve grande parte nisso – um dos grandes benefícios de se trabalhar com um grupo de pessoas.

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Nansel: Tim foi um escritor muito influente para muitas das pessoas que participaram da Saddle Creek, desde o início, como Todd do The Faint e Conor [Oberst], todo mundo era simplesmente apaixonado por Tim como compositor. Esse, na verdade, foi o ímpeto para criar a gravadora. Éramos uns garotos só.

Blilie: A coisa que me impressiona muito é a perfeição com que a coisa toda flui, como são inteligentes as escolhas deles na composição. As músicas deles são muito dinâmicas mas nunca parecem forçadas. Você não sente que eles estão juntando peças de quebra-cabeça que não encaixam. Chega a alguns extremos emocionais sem parecer brega, e isso é motivo de orgulho, um feito do qual muitas bandas são incapazes. É muito inteligente, sem parecer pretensioso.

Stevens: Pra mim o Domestica era muito conceitual, mas Ugly Organ tinha meio que uma qualidade onírica, no que estava acontecendo com os personagens e com o enredo. E é esquizofrênico e esquisito em algumas partes.

Rickly: Acho que o Domestica foi um disco de rompimento muito brutal. O Burst and Bloom dava a impressão de que eles estavam extravasando um pouco. Era engraçado, era irônico, e meio imbecil em alguns trechos. Mas aí o The Ugly Organ fez esse truque de mágica impressionante, que hoje em dia parece que todo mundo faz, mas na época parecia muito raro – ele era meio que pós-irônico onde havia ironia, e zombava de si mesmo e era engraçado, mas, ao mesmo tempo, servia a uma narrativa maior que na verdade era bastante triste.

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Blilie: Eu gosto que exista esse enredo paralelo rolando, em que, por um lado, tem meio que essa linha de tentar lidar com todo o ego e o temor existencial que acompanham a criação da arte, e por outro, há a feiura e o egoísmo do desejo masculino. E é simplesmente muito bizarro o jeito que ele entrelaça as linhas paralelas.

Art is hard/ Arte não é mole

Além de ser o principal compositor do disco, Kasher também pintou a arte de capa – o icônico fundo verde com as teclas do órgão disformes e de um branco sujo, que mais se parecem com os dentes de uma fera hidrófoba.

Kasher: Penso sobre a arte de capa sempre que faço a arte de capa. Eu tinha muito tempo livre. Não sou um pintor. Mas, por algum motivo, eu virei e falei pro pessoal: "deixem eu cuidar disso. Tenho umas imagens na minha cabeça".

Maginn: A gente conversou sobre o conceito da coisa. Teve uma época em que era um urso dentro de uma caverna e tal, mas aí entrou na fase dos esboços e a gente rapidinho gostou do que o Tim estava fazendo. Era meio que perfeitamente esquisito para o disco. É legal ver ele fazendo essas coisas. Gosto de ver ele fazendo um desenho ou uma arte de vez em quando, porque não é algo que ele faz muito. A gente tem muita sorte como banda, no sentido que, se alguém tem uma ideia e está botando fé, então todos apoiamos.

Cohn: Lembro de ver a pintura original. É meio que visceral e ríspida. Acho que realmente representa o som do disco. O Tim é muito bom nisso.

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Nansel: É óbvio que as teclas são muito icônicas. As pessoas tatuam aquelas teclas no corpo.

Kasher: A pintura original eu dei para o nosso baterista na época, o Clint. Acho que dei pra ele e para a esposa dele, Susan, como presente de casamento.

When you get on stage and they scream your name/ Aquela hora que você sobe no palco e eles gritam o seu nome

Por mais que The Ugly Organ tenha uma estrutura sólida, a banda muitas vezes tomava liberdades demais com as músicas quando tocava ao vivo. Para os que procuravam uma performance que abusasse da improvisação, os shows do Cursive nunca se repetiam. Para os que queriam uma performance rígida do disco, era enlouquecedor.

Kasher: Eu sei que todo mundo conhece bem o Ugly Organ, e qual é o som dele [no disco], mas essa é uma experiência totalmente diferente da que eu tenho. Eu não. Eu não ouço o disco. Acho que toco uma versão completamente diferente. O jeito que as músicas se passam na minha cabeça continuou a mudar no decorrer dos anos. E talvez eu deva voltar e ouvir qual é a versão que todo o mundo tem na cabeça.

Tate: Eu não era muito fã [antes de fazer a turnê com o Cursive]. Tinha ouvido o Domestica, e aquele gênero de música não era muito a minha praia naquele tempo. A Susan, da Flower Booking, agendou a gente para aquela turnê, e foi uma daquelas coisas tipo: "beleza, provavelmente isso vai ser bom para a banda", e a gente não tinha ideia de como eles eram bons.

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Blilie: Minha apresentação àquele disco foi por meio daquela turnê que fizemos juntos, esse tempo todo atrás. Eu não conhecia muito bem a banda. Cody, o nosso guitarrista, era mais bem versado no Cursive e naquelas outras bandas da Saddle Creek. Entrei na parada a frio. Tenho várias memórias muito específicas das músicas deles, mas tudo no contexto do ao vivo. Foi meio estranho ouvir as versões gravadas. Ao vivo, pegavam muito mais pesado. Acho que a maioria das pessoas talvez concordaria que isso é um sinal de que você é uma boa banda de rock – quando suas músicas são muito mais pesadas ao vivo do que nas gravações.

Tate: Aquela foi uma turnê decisiva para todos nós. Os fãs deles foram incríveis e maravilhosos, e eles tratam muito bem os fãs. Todo mundo sabe que eles escolhem as bandas a dedo. Então, se você é um fã do Cursive, você está empolgado por eles apresentarem outras bandas que acham legais, de modo que os fãs deles tendem a curtir. Todo o respeito ao Cursive por isso.

Blilie: Eu lembro do público, havia uma mistura muito interessante de gente. Era uma época estranha para o rock e o punk, em que você podia ter duas bandas como as nossas fazendo turnê, e ali haveria algum tipo de mistura. A gente tinha feito turnês abrindo shows antes, que no papel pareciam fazer muito mais sentido, e a gente era destruído durante sete semanas, toda noite. Mas os públicos deles foram muito receptivos, ou ao menos educados. Tipo quando abrimos para o Glassjaw, por exemplo. Seria de imaginar que haveria mais interesse mútuo entre os grupos de fãs. Mas a recepção que tivemos na turnê com o Cursive foi, de longe, muito melhor do que a que tivemos na turnê com o Glassjaw.

Stevens: Parecia que tinha mais gente indo aos shows e comprando discos. Naquele ponto, na minha cabeça, eu não percebia que estávamos fazendo o que talvez fosse o nosso ápice. [risos]. Ninguém gosta de pensar isso Cursive em Irvington, NJ, dia 19 de setembro de 2003. Foto do autor.

The sunrise is just over that hill, the worst is over/ O alvorecer está logo atrás daquela colina, o pior já passou

Em 2004, o Cursive já havia realizado uma extensa turnê do The Ugly Organ, com 126 shows em 2003. Eles estavam começando a sentir o cansaço. Cohn voltou a morar em Nova York e a banda entrou num breve hiato. Kasher devotou mais tempo ao seu projeto paralelo, The Good Life.

Cohn: Em qualquer banda existem tensões. Às vezes elas crescem e crescem e ficam cada vez mais difíceis de administrar. Não que a nossa fosse tão grande, é só que havia tensões. Ali por volta de 2004 o Cursive meio que entrou num hiato, acho que foi quando a turnê do Ugly Organ acabou. Lembro de simplesmente sentar pra conversar com o Matt e da gente basicamente rompendo a banda.

Stevens: A gente meio que, convenientemente, tirava umas folgas depois de cada grande lançamento, então houve um período, depois do ciclo de shows de Ugly Organ, em que estávamos num limbo em relação a quando faríamos um outro. O Tim e o Cursive sempre funcionaram dessa maneira, fizemos um intervalo depois de cada disco. A gente garantia que cada um estivesse metido em algo que tinha vontade de fazer depois de cada processo.

Kasher: Na sua cabeça, você está sempre tentando se superar. Então, para mim, estou sempre tentando superar o Ugly Organ num certo sentido. Porém, com isso, não tenho expectativa nenhuma. Mas você tenta. E antes do Ugly Organ, eu estava só tentando superar o Domestica. E antes do Domestica, estava só tentando superar o Such Blinding Stars. É meio assim que a coisa sempre funciona. Mas tenho uma discografia agora – alguns discos se saem melhor do que outros. Mas, em vários sentidos, você está só tentando superar o que fez antes. Acho que o ponto é que Ugly Organ aconteceu, e isso foi ótimo, e desde então eu passei a usar a abordagem de escrever o melhor disco que eu pudesse. E não há sentimento de derrota em não atingir esse marco. O Ugly Organ realmente foi lá no alto. E é massa ter chegado a esse nível uma vez. Ou simplesmente chegar nele. Quero dizer… tô de boa. Eu posso me conformar tranquilamente com o fato dele ter sido o maior de todos.

Saem de cena.

Do-do do-do do-do do-do Dan Ozzi está no Twitter - @danozzi

Tradução: Marcio Stockler