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Falámos com o Mykki Blanco sobre a sua prisão em Portugal

Uma viagem atribulada.

I’m being arrested in Portugal for being gay.” Foi assim que deu as boas-vindas a Portugal, no Facebook, o rapper Mykki Blanco, na véspera de uma actuação na Galeria Zé dos Bois, no Bairro Alto, Lisboa. A frase do músico da West Coast norte-americana, conhecido pela sua assumida homossexualidade, dava conta de uma troca de insultos com um polícia português – que lhe terá chamado “bicha”, e cuja contraresposta foi “FUCK YOU” — no aeroporto da Portela e que o levou a passar uma tarde numa cela lisboeta. Contou-nos o que realmente levou à sua detenção, como conheceu dois prisioneiros “malucos, mas muito fixes” e como tudo podia ter sido evitado não fosse a sua “personalidade” que gosta de testar os limites da “discriminação gritante” entre as pessoas.  VICE: Olá Mykki. Afinal o que aconteceu no aeroporto de Lisboa?
Mykki Blanco: A única explicação que encontro para o sucedido é que fui enganado pelos polícias portugueses por ser um turista negro e gay. Tinha literalmente acabado de descer do avião e estava prestes a deixar o aeroporto a caminho da galeria de arte [Zé dos Bois, no Bairro Alto, Lisboa] onde tenho, neste momento, a minha residência. Daí segui para uma longa fila fora do aeroporto de Lisboa para obter um voucher para um táxi. O taxista disse-me, então, que não podia usar cartão de crédito, apenas dinheiro. A conversa subiu de tom quando, tanto o taxista como um polícia que se encontrava ali perto, se recusaram a ajudar-me ou a responder a quaisquer outras perguntas sobre meios alternativos para me deslocar. Foram impacientes e agressivos comigo enquanto ajudavam atenciosamente outros turistas que estavam na mesma fila. Uma senhora portuguesa nessa mesma fila ainda se chegou a mim e disse: “Não compreendo por que estão a ser tão estranhos contigo. No aeroporto há um local para comprar vouchers para o táxi, não precisas de dinheiro”. O que eu devia ter feito era ir de imediato comprar o voucher, mas há qualquer coisa na minha personalidade que gosta de testar até onde vão as pessoas para me prejudicar; que gosta de perceber se o meu optimismo de West Coast sobre o mundo está a ser desafiado por uma gritante discriminação. E foi o que se veio a confirmar. Fui perguntar novamente ao polícia onde era o gabinete dos vouchers, ao que me respondeu: “Vai-te embora”, como se eu não fosse ninguém, como se não tivesse esperado na mesma fila que todos os outros turistas. Quando perguntei porque é que não me podia ajudar a mim, ele gritou: “VAI-TE EMBORA, BICHA!” Então e o que fizeste a seguir?
O mundo é um lugar imperfeito e a ideia de um negro jovem e de sucesso não encaixa em toda a gente. Acabei insultado e discriminado e foi aí que gritei: “FUCK YOU” e fui embora. Claro, o polícia seguiu-me até ao interior do aeroporto, chamou outro colega pelo rádio e disse-me: “Estás preso!” E eu disse: “Desculpa?! Não cometi qualquer crime, pedi-te ajuda e tu recusaste.” “Insultaste um agente da autoridade e isso é crime em Portugal, não podes falar comigo naqueles modos.” E algemou-me. O que fizeram as pessoas que assistiram?
A maioria das pessoas que assistiu ao episódio era britânica ou americana, pelo que, para ser honesto, não creio que tenham compreendido o que se passou. No início, eu próprio tinha percebido “bitch”, em vez de “bicha”, o que já era bruto o suficiente. Mas quando percebi o real significado do que me chamou, compreendi a brutalidade e impaciência do polícia a quem pedi ajuda. Como é que a polícia te tratou na esquadra?
Na esquadra foram uns autênticos cabrões. Repeti várias vezes que não compreendia como era possível que aquilo que eu disse pudesse ser um crime. “Recusaste-me ajuda e foste extremamente rude”, disse novamente ao polícia. “Tenho o direito a responder a tratamento prejudicial e não me podes prender apenas porque te apetece.” E lá repetiu que estou acusado de injuriar um polícia e que isso é crime em Portugal. A cela do Mykki. Como é que era o ambiente dentro da cela?
Fiquei junto de três rapazes muito queridos que eram um pouco malucos, mas muito simpáticos. Infelizmente um deles tinha morto o namorado da irmã nessa manhã, mas no geral foram fixes comigo. E como é que tiraste as fotografias? Estas na prisão com o telemóvel? As pessoas até se interrogavam nas redes sociais se não seria uma brincadeira…
Na realidade tirei fotografias enquanto aguardava ser levado para a cela e acabei por também conseguir umas imagens logo após ser libertado por ordem de um juiz. O Mykki a brincar com o telemóvel. Portugal é conhecido por receber muito bem os estrangeiros. Depois deste episódios, contas cá voltar na mesma?
Um cabrão é um cabrão e isto podia ter acontecido em qualquer lado. Eu amo Portugal, só acho que os europeus não estão habituados a ver um negro bem sucedido, creio que têm uma visão muito estereotipada dos negros, mesmo que vivam nesses países. Quando uma pessoa não se comporta como as pessoas esperam, estas parecem apanhadas de surpresa, ficam desconfortáveis e sentem-se prejudicadas. Não se trata da primeira vez que estive na Europa e que fui ignorado e tratado de forma impaciente após pedir auxílio. A atitude é sempre a mesma, é a de: “quem é este nego que julga que se pode comportar deste modo?” Mais do que um acto de racismo, perjúrio ou até homofobia (foi um pouco de todos), compreendi que a classe na forma de ser interessa e que um negro bem sucedido não é algo que se veja todos os dias. Pois, deve ser. Obrigado, Mykki. Nota: Não se admirem se encontrarem aqui respostas muito (mesmo muito!) parecidas com as que o Mykki deu no seu Facebook oficial e a outros meios. Pelos vistos, o cantor não gosta de perder tempo e prefere fazer um copy/paste da história para todos. Por sorte ainda lhe arrancámos uns detalhes extra.