“Mouvement” Documenta o Nascimento do Hip-hop Francês

FYI.

This story is over 5 years old.

Fotos

“Mouvement” Documenta o Nascimento do Hip-hop Francês

Yoshi Omori relembra esses bons tempos da cena de hip-hop francês no livro cult 'Mouvement 1984-92', que ele escreveu com o jornalista Marc Boudet e o artista Jayone.

Não sei o que você estava fazendo em 1986, mas eu era um bebê de 6 meses. Por isso mesmo, eu não estava frequentando ocupações em Paris, usando moletom azul e pintando muros decrépitos com latinhas de tinta spray roubadas. Enquanto eu ainda era incapaz de comer alimentos sólidos, centenas de parisienses e caras suburbanos se reuniam nas terras devastadas do 19º arrondissement para ouvir funk acelerado, dançar com a cabeça e lançar as fundações do hip-hop francês sem perceber.

Publicidade

Yoshi Omori, um fotógrafo japonês que vivia na França na época, relembra esses bons tempos no livro cult Mouvement 1984-92, que ele escreveu com o jornalista Marc Boudet e o artista Jayone. O livro é indispensável para quem se interessa por rap francês, subculturas ou história contemporânea.

Omori concordou em responder a algumas das minhas perguntas sobre um clube notório chamado Le Globo e os caras cabeludos que passavam a noite lá.

Stomy Bugsy, antes do Ministère A.M.E.R. 

VICE: O que você estava fazendo em Paris nos anos 80?
Yoshi Omori: Fiz as fotos do Mouvement entre 1986 e 1989 nos arredores de Stalingrad [um quarteirão de Paris], no Le Globo e durante competições internacionais de arte de rua em Paris, Berlim e Bridlington, Inglaterra. Foi meu primeiro relato como fotógrafo. Eu tinha viajado de Tóquio para Aix-en-Provence com uma câmera usada, então a ideia veio fácil. Eu quis ser fotógrafo desde que descobri o trabalho de Robert Capa.

Por que você se interessou tanto por esse tema?
Bom, fui até um prédio ocupado com meu amigo Marc Baudet, o jornalista com quem coescrevi o livro, e descobri o distrito de Stalingrad e o clube Le Globo. Um ano antes, eu tinha passado um ano inteiro nos Estados Unidos e tinha notado algumas tags, principalmente no metrô de Nova York, mas não era a mesma coisa. Em Nova York, essas tags pareciam rascunhos. Em Paris, isso era arte.

Mouvement, a abertura do capítulo sobre o Le Globo. 

Publicidade

E como era o clube Le Globo?
Marc levou a gente lá, eu e alguns amigos artistas de rua. Cheguei e vi uma multidão de raças misturadas e fiquei surpreso, porque não tinha conhecido muitos negros na vida. Era um grupo muito dinâmico que me olhava de um jeito agressivo, porque eu era esse fotógrafo "chinês" que eles não conheciam. Acho que foi por isso que quis fotografá-los. Então comecei a frequentar o lugar toda sexta.

Como eram essas pessoas que fizeram parte do nascimento do hip-hop na França?
Isso é difícil de dizer. Havia vários lugares em Paris, várias terras de ninguém, lugares onde você podia dançar e cantar. Com todos os artistas de rua, rappers e dançarinos, eram mais ou menos umas mil pessoas - o suficiente para encher clubes pequenos como o Le Globo e o Le Bataclan. Eram caras que usavam lenços Burberry com jaquetas bomber de seda.

E você tinha esse lugar meio abandonado em Stalingrad onde o BBC - Bad Boys Crew - começou. Conhecemos o Bando (o artista de rua) e o Dee Nasty com seu próprio gerador. Os b-boys eram muito jovens. Eles organizavam competições de break. Eles vinham de Paris e dos subúrbios: era um caldeirão social.

Quem eram os grandes nomes do hip-hop parisiense no final dos anos 80?
Você tinha o Joey Starr e o Kool Shen, do NTM, o Assassin, com o Solo e o Rockin' Squat - o irmão do Vincent Cassel, o ator famoso de O Ódio. Eu andava com alguns artistas de rua como o JonOne, Mode 2, Skki e Meo. Eles ficaram famosos logo depois.

Publicidade

Você conheceu alguma gangue violenta?
Honestamente, nunca pensei sobre isso. Sou japonês e um cara não violento - nunca vi nenhuma violência. Eu via a energia. Depois do Mouvement, parei de seguir o movimento hip-hop. Ele foi se tornando mais despolitizado e violento; isso não era mais interessante para mim.

Flavor Flav do Public Enemy no Le Globo, 1988. 

Qual foi o evento mais marcante desse período para você?
Eu diria que foi o show do Public Enemy no Le Globo. Foi como se eles tivessem vindo direto de Nova York só para tocar pra gente. A multidão enlouqueceu. Eles estavam atrasados, todo mundo estava suando, e eles chegaram com suas correntes enormes, aquele visual louco. As pessoas estavam se descabelando. É a coisa mais louca de que me lembro.

Compre o livro Mouvement aqui.

Tradução: Marina Schnoor