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Entrevista

Knok Knok, a verdade de Armando Teixeira está nos sintetizadores

O novo projecto do músico português, em dupla com o baterista Duarte Cabaça, é uma viagem sonora carregada de influências kraut e "early electronics".
Armando Teixeira (à esq.) e Duarte Cabaça (à dir.), são os Knok Knok. Foto por Paulo Romão Brás

Com um percurso ímpar no panorama musical português, Armando Teixeira a.k.a Balla a.k.a. Bullet, apresenta-se agora com o baterista Duarte Cabaça no projecto Knok Knok. Fazer as coisas por obrigação não é com ele. A verdade está no sintetizador tocado à unha, pouco programado e na liberdade de criar o que lhe der na real gana. Já adivinharam que este senhor é um sortudo, não já?

Armando Teixeira tem sido uma presença constante no panorama musical nacional há mais de 30 anos. Ainda na década de 80 começou por projectos mais underground, como Ik Mux e depois Boris Ex Machina, onde se apoiava nos seus heróis da altura, fossem eles os neo-românticos Ultravox, os góticos Clan of Xymox ou mesmo os Sisters of Mercy. Mas, a grande exposição veio na década seguinte com os Da Weasel, onde foi membro fundador, ao mesmo tempo que abraçava os mais viscerais Bizarra Locomotiva.

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Armando esteve, portanto, na génese de duas instituições nacionais, que entretanto seguiram caminhos distintos, tal como ele próprio seguiu outra via. A dele. Sempre autónomo, criou Balla e também Bullet, projectos que ganharam o respeito da crítica. Agora, é a vez de Knok Knok. A VICE Portugal foi bater à porta do músico, para conversar sobre maquinaria, processos de composição e cassetes, numa altura em que o álbum homónimo já está disponível via Base Recordings.

VICE: A tua relação com as máquinas vem de longe. Dos tempos de Ik Mux aos Boris Ex Machina, passando por Bizarra Locomotiva e Da Weasel, até, naturalmente, aos Balla, Bullet e agora Knok Knok. Consegues localizar no tempo as tuas primeiras incursões na maquinaria?

Armando Teixeira: Sim, a minha primeira caixa de ritmos foi uma Boss DR110. Há quem tire os acordes na guitarra das suas músicas favoritas, eu copiava os ritmos dos Ultravox, Clan of Xymox ou Sisters of Mercy.

Deduzo que os suportes mais electrónicos acarretem uma maior independência na composição, um caminho mais solitário. É verdade? Como é que se processa contigo? Passas muitas horas a explorar novos sons?

É verdade, pode ser bastante solitário, mas a independência foi o que me levou - desde os Ik Mux - a usar a electrónica. Passo muito mais tempo a explorar sons e a perceber como as máquinas funcionam do que a compor. O que acontece frequentemente é estar a desenvolver um som ou ambiente e ser inspirado para uma melodia.

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Vê: "Krautrock Alemão"


Este novo disco de Knok Knok que acabaste de editar surge nos formatos digitais actuais, mas também em cassete. Com tanta tecnologia, como é que chegas novamente ao formato cassete? À partida pode parecer um retrocesso, mas, se calhar, é todo o contrário…

Ainda sinto falta do formato físico. A cassete é uma alternativa ao CD, com um som característico que me agrada bastante e que se adequa perfeitamente ao som Knok Knok.

Neste trabalho usaste instrumentos que, para o comum dos mortais e assim escritos, mais parecem os componentes de uma nave espacial: Synth Bass Roland GR33B, Minimoog, Multimoog, Buchla Music Easel, Oberheim OB8, Yamaha CS30, Yamaha SK30, Korg MS20, Sequential Circuits Pro One. Cada um terá o seu som específico. Tal como acontece em muitas outras áreas artísticas, sabes quando terminaste um tema, ou tens a tentação de ir metendo camadas sobre camadas e é o deadline que determina as coisas?

Estes sintetizadores que mencionas foram todos usados no álbum, mas em nenhum tema usei mais de três. Cada vez sou mais criterioso com o que uso. Conheço bem os meus instrumentos e, quando procuro um determinado som, sei onde o ir buscar. Acho engraçado nomear os synths usados, porque quero que se saiba que não usámos sintetizadores virtuais e que muito poucos foram programados. A maior parte dos synths neste disco foram tocados e todas as pequenas imperfeições são intencionais. Também é uma homenagem aos discos de electrónica dos anos 80 onde eram orgulhosamente descritos os sintetizadores usados.

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Por falar em viagens, a sonoridade deste Knok Knok parece-me que foi buscar algumas das tuas influências iniciais, como os belgas Front 242 ou Nitzer Ebb. Momento "revista Caras": o facto de teres feito 50 anos bateu-te de alguma maneira?

(Risos) Não me sinto com 50 anos. Não sou saudosista. A existir saudade na música dos Knok Knok é de tempos que não vivi, da early electronic dos anos 50/60 e do krautrock dos 70. Do Raymond Scott aos Can, passando pelo Morton Subotnick, Cluster e Kraftwerk.

É curioso que o movimento EBM (Eletronic Body Music) tem afinidades e anda lado a lado com algum do italo disco que se fez nos anos 80, embora tenham sido alvo de incursões no mercado completamente diferentes. A tua diversidade - do EBM, ao lado pop do recente Festival da Canção - vem dessa abertura onde na música tudo é possível e não há que ter vergonha de nada?

Para mim, de facto, vale tudo, desde que goste e fique satisfeito. Para a música do Festival a minha preocupação foi ficar satisfeito e que a canção me representasse. Acho que representa e tenho orgulho no tema "O voo das cegonhas". Tendo em conta as premissas que é necessário seguir para fazer uma canção para o Festival ficou bastante bem.

O Rui Reininho disse uma vez que tu és "um dos músicos em Portugal com mais liberdade" e, de facto, nota-se pela diversidade de coisas em que te metes, muitas delas tremendamente diferentes esteticamente. Nessa entrevista ao Observador, o vocalista dos GNR também disse sobre ti: "Tem este ar tranquilo de quem faz o que quer fazer". Confirmas tudo?

Devia ler mais o que os meus amigos dizem sobre mim (risos). Ao longo da minha carreira tenho muitos exemplos de que, de facto, faço o que quero. Embora isso nem sempre tenha sido o melhor para mim. Fazer o que devo não é muito estimulante.


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