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Música

Sepultura e Lobão anunciaram agenda conjunta de shows e o pau comeu na internet

‘A Chamada’ serão quatro apresentações para pregar a união no rock — mas nas seções de comentários prevaleceu a polarização política. Lobão rebate: “Está mais do que na hora dessa patrulha histérica tomar um outro rumo.”

O banner dos shows de A Chamada, com quatro apresentações do Sepultura​ com o Lobão, que rolam a partir de 25 de novembro, mal caiu na internet e os fãs de ambos os lados começaram a se digladiar em comentários nas redes sociais. Enquanto alguns celebravam a inédita parceria musical (ao menos nestes moldes, pois até então só aconteceram jams entre Andreas Kisser e o cantor), outra galera, principalmente composta por membros da Sepulnation, não curtiu nem um pouco a ideia dessa junção — que, apesar de ser musical, foi julgada sob o ponto de vista político.

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As críticas ao evento na fanpage oficial do Sepultura, que reúne uma nação de 3,9 milhões de fãs pelo mundo todo, condenam o "conservadorismo" de Lobão, falam de "equívoco monumental" e que a banda está "queimando o seu filme" e incluem até ameaças de jogar a discografia fora e "cobrir a tatuagem" — já são mais de 2,6 mil comentários na postagem original.

Mas nem todo mundo está descendo a lenha na proposta: entre os chamados de "golpistas", há quem defenda e comemore a união. "Só vi cuzões reclamando", alfinetou um fã e uma outra galera já estava mais preocupada com a ampliação das datas e locais onde vão tocar 3 até o momento, estão programados eventos em Belém (PA), Goiânia (GO), Recife (PE) e Vitória (ES).

Nenhum integrante do Sepultura falou com o Noisey e a assessoria informou que não é uma tour, mas apenas esses quatro destinos, com o objetivo de fortalecer a cena rockeira no Brasil.

Para Lobão, sobre todo esse auê na internet, "está mais do que na hora dessa patrulha histérica tomar um outro rumo".

Rock de verdade

"Nossa proposta para fazer esse show é absolutamente musical", afirma o artista, que este ano lançou o álbum O Rigor e a Misericórdia, pela sua gravadora Universo Paralelo e a distribuidora Tratore. "As pessoas devem se acostumar a poder trabalhar, conviver e ter afetos por gente de diferentes formas de opiniões filosóficas, políticas ou religiosas", ressalta.

A ideia de A Chamada é misturar geral o som nos palcos – estão previstas jams e até deve rolar uma sonzeira com duas baterias simultâneas e revezamento de instrumentos entre os grupos. O repertório, segundo Lobão, terá "foco em músicas que sejam compatíveis com as sonoridades das bandas".

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Sobre a motivação de unir e fortalecer o rock brasileiro, o cantor de "Rádio Blá" declara que o país precisa ter um segmento "de verdade" no gênero, e não apenas casos isolados — "está mais que na hora", diz.

Os músicos esperam que essa movimentação toda dê uma chacoalhada na cena, em um momento em que várias cidades possuem novos talentos.

"Precisamos batalhar por uma expansão, ter rádios para executar músicas e, também, a produção de material tanto dos mais novos quanto dos veteranos", afirma o músico, que é categórico em afirmar que o estilo musical tem opinião e sempre lutou pela liberdade de expressão e "(o rock) nunca se conformou em ser um gênero parasítico, chapa-branca e lambe-saco de governo nenhum".

Codificação do nacional

Em 2003, foi publicado no periódico britânico Journal of Latin American Cultural Studies, um artigo acadêmico sob o título Heavy Metal Music in Postdictatorial Brazil: Sepultura and the Coding of Nationality in Sound (Heavy Metal no Brasil Pós-ditatorial: o Sepultura e a Codificação da Nacionalidade no Som, em tradução livre). O texto é assinado por um pesquisador da Universidade de Tulane, em Nova Orleans, o professor brasileiro Idelber Avelar, PhD em literatura e estudos culturais.

Entre outras reflexões sobre o papel do quarteto que veio das Minas Gerais para revolucionar o  thrash metal, o autor pontua que "graças ao pensamento inteligente da banda e o incessante aprendizado musical — bem como o sucesso internacional que lhes permite redescobrir o Brasil de outro ângulo —, a nação torna-se, progressivamente, uma fonte para linhas musicais e culturais, experiências inesperadas e colaborações. Eles continuamente redefinem as próprias fronteiras do gênero ao mesmo tempo que se refina o que até então se entendia como Brazilian music".

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Avelar, que é mineiro de Belo Horizonte, também manifestou sua insatisfação em um post público no Facebook, na quarta-feira (26), pelo anúncio dos shows de A Chamada.

"O Sepultura é um orgulho para qualquer belo-horizontino (…). É a maior banda de rock pesado da história do Brasil (…). Por isso, não dá para ficar calado. A banda acaba de anunciar quatro shows acompanhados de ninguém menos que… Lobão!", escreve o pesquisador na postagem, que teve dezenas de compartilhamentos e comentários.

O autor também relaciona o caso às letras de músicas de sucesso do Sepultura. "Como todos os fãs que estão em polvorosa, fiquei estupefato de saber que a banda que assina "Territory", "Refuse/Resist", "To the Wall" e "Ratamahatta" e tantos outros clássicos do rock pesado alinhado com as lutas do povo leve ao palco um reacionário lunático e caricatural como Lobão", comenta o professor, que alerta os integrantes: "ainda dá tempo de desfazer essa palhaçada".

Lobão, que apesar de não ter acompanhado de perto o movimento à época, sempre se impressionou com o som da banda, acredita que esse tipo de conduta das pessoas deve mudar. "Caso contrário, estaremos condenados a conviver numa cultura totalitária e patrulhadora", conclui.

Serviço 
A Chamada – Sepultura + Lobão

25/11 – Hangar – Belém (PA)
09/12 – Atlanta Music – Goiânia (GO)
10/12 – Baile Perfumado – Recife (PE)
17/12 – Arena Mega Troops – Espírito Santo (ES)