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Música

Entrevistamos o Fudisterik e o Dandrea, que tocam no Novas Frequências 2013

Paulo Dandrea e Ricardo Fudisterik tem um projeto juntos chamado Detuned Portable Studio, mas se apresentarão solo.

Foto via Novas Frequências.

Se você curte chutar uns BPM's quebrados ou instrumentos bizarros na sua playlist, ou curte ouvir umas músicas que no final você pode falar "Caralho, essa droga eu nunca usei, onde eu consigo mais?", com certeza já está ligado na programação (mais uma vez) incrível do Festival Novas Frequências 2013. O evento, que têm rolado anualmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, é composto por artistas escolhidos a dedo pelo Chico Dub, aquele cara que também fez essas coletâneas da nova música eletrônica brasileira (http://chicodub.bandcamp.com/album/hy-brazil-vol-3-more-fresh-electronic-music-from-brazil-2013). Nomes da música experimental como Actress, Com Truise e o na-época-ainda-não-tão-conhecido Psilosamples já passaram pelo festival, o último causando um frenesi no público que aguardava pelos nomes internacionais, mas saíram surpreendidos com a força do beat mineiro. Esse ano o Novas mantém a classe da programação e conta com uma festa de abertura no dia 30 no Clube La Paz, e entrevistamos os dois brasileiros que encerram a noite e possuem um som tão curioso quanto a história de como se conheceram.

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Paulo Dandrea e Ricardo Fudisterik começaram a descobrir o potencial dos computadores e da produção musical sozinhos, cada um em seu próprio ritmo e seus gostos musicais, mas ao trocarem ideias e sons pelo Soundcloud decidiram trabalhar em um projeto juntos, o Detuned Portable Studio. O Dandrea foi apresentando mais e mais opções de produção ao Fudisterik até que os dois começaram a trabalhar usando o Ableton, atualmente a plataforma de produção virtual mais pirateada e compartilhada da internet jovem. Desde então eles se encontraram fisicamente apenas uma vez para tocar em Pouso Alegre, onde os caras afirmam estar rolando uma cena muito boa de música experimental.

Os dois se apresentam em um debut de responsa no Novas Frequências, cada um com seu projeto solo, e pra falar um pouco do que estão achando disso tudo, trocamos alguns e-mails e arquivos compactados no melhor estilo nem-te-conheço-mas-já-te-amo da internet (coisa com a qual eles já devem estar acostumados) e entregamos tudo pra vocês, inclusive o download gratuito de todas as músicas dessa playlist supimpa que eles montaram pra gente com músicas de seus projetos e do Detuned..

Noisey: Conta um pouco sobre vocês, quantos anos têm, onde moram, se fumam um ou estão putos com alguma fase de algum game.
Paulo Dandrea: Tenho 29 anos, nasci e moro São Paulo. Na maior parte do ano você me encontra sóbrio. Não estou puto com nenhuma fase de jogo por que, geralmente, não fico muito tempo num jogo só. Raramente “zero” jogos. Gosto do começo deles, ver a estética e o funcionamento.

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Ricardo Fudisterik: Tenho uma vida simples de interiorano. Trabalho, família, amigos e som -pouco mais que isso. Gosto de fazer incursões pelas estradas de chão mineiras, em companhia dos bons amigos: muito som no caminho, cachoeiras, rios, escaladas, jogar sinuca nas espeluncas da roça, falar merda, uns tombos, atoladas no barro, coisas simples. Isso me faz feliz. Tenho 39 anos.

O que vocês ouviam na juventude, qual o background musical de vocês?.
Paulo: Bom, quando falamos de background musical, acho que aquilo que constrói de fato sua estrutura plástica do cérebro são as músicas que você ouve na infância. Nossos pais, geralmente, são responsáveis por ter assinalado sinapses “B” com “Z”, “D” com “I”. Então, posso dizer, que por um lado, tenho os vinis do meu pai e por outro, pela minha mãe, rádios românticas. Então, minha personalidade musical foi construída abaixo de discos como: Por um lado, “Close to the Edge” do Yes, “A Trick of the Tails” do Genesis, “Jazz from Hell” do Zappa, Pink Floyd, Beto Guedes, King Crimson, Gentle Giant e por ai vai. Pelo outro lado, musicas do Tears for Fears, Duran Duran, A-Ha, George Benson, Guilherme Arantes, Lô Borges, Taiguara e etc. De lá pra cá só ladeira a baixo.

Ricardo: Cara, é tudo tão fragmentado que é difícil dizer. Gosto de quase tudo, não tenho fixação por um gênero específico, só não tenho paciência ou sensibilidade pra clássico e erudito. Na juventude ouvi basicamente rock, principalmente aquela turma heavy metal dos anos 70, e também os punks como Exploited, Black Flag, Sick of It All. Mais tarde passei uns anos vidrado em reggae. Reggae de tudo quanto é tipo, mas o Culture sempre foi o meu preferido. E de uns seis anos pra cá, muita música africana e essa multiplicidade genial de malucos alternativos que descobri no Soundcloud.

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Há quanto decidiram começar a produzir música?
Paulo: Não tenho completa certeza, acredito que foi meados do começo de 2010, fim de 2009.

Ricardo: Acho que comecei no final de 2009, por aí, mas foi em 2011 que comecei mesmo a entrar numas. Foi quando me convenci que a música era a única chance que eu teria de criar alguma coisa especial na vida. Nunca pensei que um dia eu pudesse me apresentar em público, só lembro de pensar comigo mesmo: se algum dia eu conseguir criar alguma coisa realmente mágica, nem que seja com 90 anos de idade, tô satisfeito, tirei o cu da seringa. Lógico que estou muito longe disso, mas nesse meio tempo me divirto como um louco. A música é infinita, desafio e diversão sem fim.

Como e quando rolou o convite para o Novas Frequências?
Ricardo: Poucos meses atrás o Chico Dub descobriu a minha página no Soundcloud e também a do Paulo. Acredito que ele chegou até nós através de um comentário do Zé Rolê no Facebook do Novas Frequências de 2012. O convite rolou depois disso.

Estão ansiosos para ver a apresentação de algum artista?
Paulo: Embora esteja conhecendo o som da maioria agora, todos são bons demais. A criação de timbre, desenho de som e clima de todos são surpreendentes. Estou bem ansioso por isso tudo. Mas estou bem mais ansioso para ver a apresentação do Fudisterik, sem sombra de dúvida.
Ricardo: Na época do Hy Brazil 2 conheci o som do Babe, Terror e achei as texturas que ele cria simplesmente chapantes. Deve ser impactante de se ouvir ao vivo. O Paulo eu já conheço, mas não sei o que ele tá maquinando lá. Tô curioso.

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Como vocês dois se conheceram e decidiram criar o Detuned Portable Studio?
Paulo: Conheci o Fudisterik no Soundcloud e confesso que antes disso eu andava bem desanimado, a única coisa que eu achava por lá eram produtores eletrônicos tradicionais, não achava meu nicho. O Ricardo é completamente responsável por eu ter insistido na ideia de produzir música no computador. O cara gostava das músicas em que eu chutava o balde na produção, sabe? E essas eram justamente as únicas que eu gostava de fazer. Imediatamente o chamei para fazer um colaborativo.

Ricardo: Em maio de 2011 tive um acidente que me obrigou a ficar com as pernas pra cima por quase um mês. Fiquei por conta da internet, onde descobri o Paulo no Soundcloud. Foi um tapa, achei responsa demais o som desse mano - hoje posso chamar ele assim. Começamos a trocar ideias e ele me convidou pra uma colaboração. Ele tinha muita tarimba nessa parte de produção e eu era um mané total. Ele me ensinou pacientemente uma série de detalhes de produção que eu nem imaginava que existiam. Até videos ele gravou - vários. Salvou minha vida. Não me transformei num impecável artesão do som, de maneira nenhuma, mas pelo menos me livrei de alguns pecados mortais. E foi assim que surgiu o Detuned. Temos como certo fazer mais sons juntos assim que der. Estamos fissuradíssimos, mas também apertadíssimos de tempo, chato isso.

Em quais projetos estão trabalhando atualmente e o quais são os planos para o futuro?
Paulo: Do meio do ano pra cá só tive tempo pro meu trabalho, e com o pouco que tive de sobra estou preparando o meu lance de tocar ao vivo. Antes do meio do ano nem imaginava que eu tocaria ao vivo, então, estou destrinchando todas minhas músicas para poder improvisar o máximo possível. Jjá estou fazendo rascunhos dos sons para o ano que vem também. Pretendo fazer músicas mais coesas entre si.

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Ricardo: Só em janeiro devo começar a pegar mais firme em produção. Tenho pelo menos três linhas bem definidas que gostaria de explorar, mas nem levo isso a sério porque na hora H sempre aparece uma idaia inesperada e o projeto acaba descambando para outra coisa.

De onde vocês tiram inspiração na hora de compor?
Paulo: Eu não sei explicar bem, mas existe uma espécie de gerador de aleatoriedade no meu cérebro. Mas, basicamente, sou muito guiado pelo senso de estranheza e por aquilo que eu realmente gostaria de ouvir. Gosto das coisas que soam como “tem algo errado ai”. Se o gerador não funcionar, eu ponho limitações. Como fazer X usando apenas Y?

Ricardo: Minha inspiração é o primeiro timbre lindão que eu encontrar ali, testando e tunando os instrumentos virtuais. Me encanto por um timbre, então beleza, começou. Aí vou casando outros timbres que soem com esse primeiro instrumento. O que vai sair eu não sei. Depende do que aquela paleta de sons garimpados ali na hora vai me sugerindo enquanto brinco com os sons.

Como é o processo de produção de vocês? Que equipamento/software vocês usam?
Paulo: Tenho feito linearmente, segundo por segundo. O que faz, muitas vezes, as músicas terem uma estruturação não muito legal, o tal “começo meio e fim”. Isso é algo que pretendo melhorar. Eu uso Ableton Live 8.

Ricardo: O item mais importante é tempo livre. O resto é sentar e viajar sem compromisso com nada. Uso o Ableton Live 8 também.

E apresentações ao vivo, quantas fizeram e como foram?
Paulo: Apenas no AbertoAudiovisual de Pouso Alegre. Aliás, a cena musical de lá é uma coisa impressionante. Brotam por todo lado produtores, músicos e apresentações de qualidade.

Falem um pouco da história de alguma música que está na mix, como foi feita, porquê ela está aqui e tal.
Paulo: Bom, a “Macaco Azul”. Fiz ela para o Hy Brasil e foi através dela que o Chico Dub teve conhecimento do meu trabalho. Essa música, por exemplo, fiz pelo esquema de limitações. A brincadeira era ter simultaneamente loops de 9/4 e 12/4 se sobrepondo. Toda vez que o fim dos loops coincidissem, a música mudaria. Ela não é inteiramente assim, mas é a ideia inicial, o resto foi inspiração retro-alimentada.

Ricardo: A "É de Aruanda" me surpreendeu porque de início imaginei que só eu gostaria, tipo “acho que to viajando, mas foda-se”. Foi a faixa em que eu senti mais receptividade entre os brasileiros. Vi um DJ que eu não conhecia tocando ela num evento bem doido - pensei “caramba, esse som não é tão indigesto como eu pensava”. Ela surgiu de um vídeo com ótima qualidade de som que o Paulo me aplicou, sabendo que gosto tanto de sons africanos. Usei uns samples soltos no início, depois recortei três vozes de cantores nativos pra montar um mantra afro, e mandei uns bereguedé em cima.