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Música

Exclusivo: Escute o Álbum de Estreia do Quinteto Instrumental Huey

Guitarras pesadas e tempos quebrados norteiam o disco ACE

Imagens por Alisson Louback

Eu não vou fazer citações para não gerar polêmica, mas algumas vezes já cheguei a pensar que certas bandas de rock paulera por aí são ótimas, não fosse pelo vocal. Você está lá escutando um baita de um som da hora, com um instrumental destruidor, e aí entra a voz e estraga tudo. E a coisa sempre pode piorar, caso a letra seja também meio nada a ver. Não quero nem imaginar como seria o resultado das composições do quinteto paulistano Huey se eles tivessem um vocalista, afinal, o negócio tá indo muito bem assim: três guitarras, baixo e bateria. Receita pesada, do tipo que cria uma massa sonora cheia de riffs \m/.

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As influências conjugam elementos vindos do rockão setentista, do stoner e do viajante rock experimental californiano. Até aqui a banda formada em 2010 por Dane El, Minoru e Vina nas guitarras, Rato na bateria e Vellozo no baixo, já vinha colhendo uma ótima repercussão na internet e nos shows com as faixas do EP ¡Qué No Me Chingues Wey! e o single "Por Detrás de Los Ojos", além da trilha do documentário A Música Muda. Mas isso foi só aperitivo. A grande cartada é o álbum ACE, que temos a satisfação de trazer até vocês nesta estreia exclusiva pelo Noisey.

De quebra, eles responderam algumas perguntas sobre a atual fase e proposta da banda por e-mail. Sente só:

Noisey: Vamos começar falando da proposta que define a banda. Por que apostar num estilo totalmente instrumental e calcado nas guitarras? Vocês acham que a cena atual está mais aberta para esse tipo de som?

Huey: Todos já tivemos bandas com vocal e decidimos fazer algo diferente do que estávamos acostumados, até para ser um desafio musical maior para cada um. Tratar a composição de um jeito novo e pensar em todos instrumentos como protagonistas. Apesar de ter três guitarras, o baixo e a batera assumem um mesmo papel de importância em qualquer arranjo que fazemos. Sem um vocal, os detalhes e dinâmicas de cada instrumento aparecem mais, o que faz a brincadeira ficar ainda mais divertida. Com certeza, hoje em dia tem um público mais aberto a ouvir este tipo de som instrumental, acho que o estigma de som cabeçudo e feito para músicos está mudando um pouco. No final das contas, é rock do mesmo jeito.

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O press release de vocês diz que o Huey tem uma pegada de misturar arte com música. Como funciona isso nos shows? Já pensaram em unir à arte visual e à música intervenções mais inusitadas ainda, como happenings, interação com VJing ou performances?

A gente gosta muito de artes visuais e todos possuem uma ligação estreita com isso no dia a dia fora da banda, então foi natural aplicarmos isso no Huey. O lance dos pôsteres é algo que faz parte desde o primeiro show, aí começamos a pensar em ímãs de geladeira, palhetas e várias outras formas de colocar a banda em diversas plataformas físicas, já que muito da nossa vida é digital hoje em dia. Mas apenas fazemos aquilo que gostaríamos de ter de bandas que a gente gosta, então, nada mais fácil do que fazer pra nós mesmos. Em termos de intervenções durante as apresentações ao vivo, não temos muitas pretensões no momento, estar no palco tocando já preenche bastante nossas intenções do que o público deve sentir, mas com certeza isso é algo que está latente e que enxergamos como algo que precisamos desenvolver ainda.

O álbum de vocês foi gravado todo ao vivo fora do Brasil. Vocês acreditam que os estúdios norte-americanos estão acima da média em relação aos estúdios daqui para a produção desse tipo de som?

A gente gravou o disco ao vivo em quatro dias no Infrasonic Sound em Los Angeles, com o produtor e engenheiro de som Aaron Harris, baterista e produtor do Palms, que tocou no ISIS e trampa com umas bandas que a gente gosta bastante. Quisemos ter a experiência de gravar lá fora, não pela qualidade dos estúdios brasileiros, porque existem vários com uma estrutura foda, mas sim para experimentar aquele sonho de viver momentos em um lugar que o rock faz parte da raiz musical e estrutural da cena de um país. Foi classe porque fomos preparados para algo muito mais rígido e frio, mas percebemos que na verdade não existe nada muito de outro mundo. A fórmula que fazem há muito tempo, de chegar ensaiado no estúdio, gravar em um equipamento bom e focar naquele momento, em vez de fragmentar tudo e pensar digitalmente na pós-produção, é ainda a mais eficaz. O Aaron ficou surpreso de querermos fazer tudo ao vivo, porque disse que a maioria das bandas já chega no estúdio pensando em consertar tudo no Pro Tools depois, mas na real, para gente não faz sentido gravar de outro modo. A cumplicidade que temos ensaiando e nos shows precisa ser documentada no disco e não fazer algo completamente diferente do que realmente somos. Fora que é divertido ficar puto quando alguém erra e temos que fazer tudo de novo.

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Quais foram as melhores apresentações que vocês já fizeram até aqui? Tem lugares onde vocês são melhor recebidos ou compreendidos do que outros?

Porra, é mais fácil dizer as que foram ruins, porque na grande maioria a gente se divertiu para caralho. Em termos de público, os que fizemos na Argentina foram intensos, realmente o rock é levado a sério por lá, meio que como futebol, os caras não brincam e se envolvem mesmo, prestam atenção, agitam e querem conversar sobre o som depois. No Brasil, especialmente fora de São Paulo, seja Natal, Belo Horizonte ou Porto Alegre, também tivemos uma recepção calorosa demais, não temos do que reclamar. Já em SP, como é nossa casa, temos muitos amigos por aqui e é nosso primeiro público, que acompanha e toma cerveja com a gente toda semana. Não acho nosso som complicado a ponto de precisar ser compreendido, o interessante é ver que muita gente que não gosta de som pesado acaba curtindo também, quebrando um pouco a barreira e estereótipos segregadores da música.

Como surgem os nomes das músicas de vocês, já que o bagulho não tem letra?

Pode ser a partir de um lugar ou situação que a música foi feita, ou algo que ela lembra, enfim liberdade 100%. Mas já que não tem letra, essa é a parte mais aberta e divertida da composição, podemos dar o nome que for e foda-se.

Tendo vocês já integrado outras bandas antes, o que trouxeram desses conjuntos para o trabalho do Huey?

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Acho que o que trouxemos foi a vontade de fazermos algo que gostamos de ouvir. Nunca tivemos bandas que foram populares ou comerciais, então, não tem necessidade e vontade de tocar algo que não nos represente. A amizade acima de tudo, os bons momentos e saber como e o que queremos fazer com o Huey. A experiência com outras bandas traz um pouco mais de calma e paciência em algumas situações mais tensas, por exemplo.

O que o álbum que estão para lançar traz de diferente em termos de produção e estética em relação ao EP e ao single já familiares do público? O Huey é aquele tipo de banda que sempre procura dar um passo além a cada produção?

De produção, com certeza é mais elaborado em termos técnicos, não só de equipamentos como no modo que tocamos hoje. Fizemos o EP logo no começo da banda, muito mais no instinto, sem se preocupar loucamente. Já para o ACE fizemos uma preparação intensa de ensaios e pensamentos de arranjos, tudo com mais calma, e isso reflete diretamente nas músicas. A decisão de gravar lá fora foi de uma vontade nossa de realização, nada além disso. Queríamos viver intensamente não só o resultado de um álbum e sim todo o processo. É demais ouvir o disco hoje e lembrar dos momentos que tivemos em Los Angeles, é algo que vai marcar nossas sensações para sempre.

Vocês acham que a obrigatoriedade que muitos artistas veem em fazer música para que se encaixem linhas de vocal acaba limitando as possibilidades de criação?

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Boa pergunta, mas quem coloca limite em qualquer criação é a própria banda, ter ou não vocal não pode servir de desculpa para nada. Existem bandas com vocal muito mais experimentais que outras instrumentais. É uma armadilha criada pelos próprios músicos. Mas, culturalmente, a voz tem um protagonismo inegável e rotula muito o estilo de uma banda, algo que com certeza em uma banda instrumental é mais livre.

Já pensaram em crescer ainda mais a proposta da banda, incluindo pesquisas sonoras para trazer outros instrumentos/elementos sonoros às músicas? Ou o lance de vocês é focar estritamente nas cordas?

Estamos muito satisfeitos com o que fazemos nesta formação de guitarras, baixo e bateria. Não queremos acrescentar nada sem um propósito. Muitas vezes as bandas colocam DJs, samplers e o caralho a quatro sem função nenhuma, mas não é nosso barato. Apesar de gostarmos de diversos estilos de música, nossa formação em essência é rock, que não precisa de porra nenhuma além de guitarra, baixo e bateria. E cerveja.

Eu às vezes tenho umas noias de achar que a interferência eletrônica avançou demais sobre o rock, de modo que acabou descaracterizando um pouco a essência crua do ritmo. O que vocês pensam disso?

Concordamos plenamente. Na verdade, a essência crua está faltando não só no rock como em qualquer estilo. Como temos todas as possibilidades tecnológicas de produção musical, todos querem usufruir de todos os recursos, o que acaba ficando um excesso fodido e sem sentido. Os anos 60, que servem de referência histórica para o rock, se resumiam a um bando de doido de ácido que sabia tocar para caralho. Que para entrar em um estúdio e gravar, era preciso ser foda ao vivo. Hoje tem um pensamento inverso, de produzir e gravar do modo mais perfeito e depois aprender a tocar o disco. Aí criam rótulos e nomes para justificar essa patifaria toda. Enfim, dentro da música existem os que querem a facilidade, a gente quer a verdade.