FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Por que as minas do Wax Idols e King Woman caíram fora da turnê com o Pentagram

Hether Fortune e Kristina Esfandiaria, líderes das bandas, falam sobre os abusos que alegam ter sofrido durante a excursão com a lendária banda de doom, que publicou um nota sobre o ocorrido.

Fotos por Mary Manning

Na semana passada, as bandas da Bay Area Wax Idols e King Woman anunciaram nas redes sociais que por conta de um “rebosteio sem fim” e por serem “tratadas muito porcamente e serem escrotamente abusadas”, estariam cancelando uma turnê de 11 shows com a clássica banda de doom metal Pentagram, mandando pro caralho seus shows de abertura em Santa Ana, San Francisco e San Jose antes de começarem sua própria turnê pelos EUA. Por mais que as duas líderes, Hether Fortune e Kristina Esfandiaria (Wax Idols e King Woman, respectivamente) tenham sido decididamente vagas quanto aos detalhes, o comunicado encerrava com “Nunca deixem ninguém foder com você ou os seus”, e por fim “Se vocês soubessem as merdas que estamos aguentando, pagariam para NÃO tocarmos com esses caras”.

Publicidade

Desde a publicação do comunicado, muitos amigos e fãs expressaram não só seu apoio, mas também presumiram o que aconteceu tendo como base na reputação do Pentagram, ou mais especificamente de seu frontman, Bobby Liebling, cujas décadas de uso de drogas e diversos comportamentos clandestinos esperados de um estilo de vida roqueirão foram relatadas no agora infame documentário Last Days Here.

O Noisey entrou em contato com o Pentagram para que comentasse o ocorrido, e recebeu uma nota enviada pelo agente da banda, que destaca a surpresa de todos com a partida de seus parças de turnê. A nota completa está no final desta matéria, mas ela afirma em determinado trecho: “Temos tocado e gravado música de forma profissional há quase 50 anos e esta é uma das situações mais infundadas e oportunistas com a qual já lidamos. Estas bandas não conversaram com o Pentagram ou com o tour manager sobre querer sair da turnê. Dadas algumas noites após seu início, as bandas simplesmente desapareceram, fizeram postagens negativas sobre nós nas redes sociais e então foram tocar no show que havia sido marcado para elas anteriormente naquela mesma noite”.

Mesmo do ponto de vista de um fã, a turnê parecia caótica: Bobby Liebling não apareceu em um show de Seattle, o que levou a banda a tocar sem ele. Na noite seguinte, no Dante’s em Portland, os sets de todas as bandas começaram atrasados, e durante o show do Wax Idols, o cara do som subiu no palco e implorou para que elas tocassem mais duas músicas, supõe-se que para ganhar algum tempo. Aparentemente Liebling estava num avião a caminho do lugar quando o show já havia começado, e o público teve uma bela surpresa quando o Pentagram subiu no palco — um desgrenhado Liebling coberto de lycra a reboque — com quase duas horas de atraso. O anúncio da decisão das bandas Wax Idols e King Woman de caírem fora da turnê veio uma semana depois, e corria à boca pequena boatos de abuso sexual e comportamento horrendo generalizado por parte dos tiozões do rock que podem ou não estarem acostumados com consequências de seus comportamentos.

Publicidade

Até o momento, nem Hether Fortune ou Kristina Esfandiari haviam vindo a público falar abertamente sobre o ocorrido. Por mais que estivessem contentes em deixarem tudo como está nas redes sociais, quando entramos em contato, elas concordaram em compartilhar sua história exclusivamente com o Noisey. Conversamos ao telefone sobre sua dura decisão e o que as levou a isso.

Noisey: Na semana passada vocês decidiram cancelar suas últimas três participação na turnê com o Pentagram. O que levou a isso?
Hether Fortune: Bom, pra começo de conversa, estávamos bem empolgadas com essa tour. Todas somos fãs de Pentagram. E sim, vimos o documentário sobre Bobby e sabemos que ele é uma força da natureza e uma figura, mas rock é isso aí. Claro, já fiz loucuras na minha vida que devem me fazer parecer muito doida mesmo, então não quis entrar nessa com ideias já formadas sobre ele ou a banda ou o que fosse, só pensei que seria uma turnê como qualquer outra, em que vamos lá e tocamos e talvez rolem umas conversas engraçadas e conseguimos conhecer os caras e tudo seria massa e tal. Tocaríamos pra públicos diferentes, manja, faríamos nosso trabalho, fazendo o que amamos.

Kristina Esfandiari: Queríamos fazer [a tour] porque o Pentagram é uma banda lendária, e pensamos “Puta merda! Temos que encontrar com eles antes que parem de fazer turnês”. Daí eu e Hether queríamos mesmo viajar juntas, então achamos que seria uma boa ideia. Não foi.

Publicidade

Fortune: Quando chegamos em Seattle, no primeiro dia, Bobby não apareceu. O cara não estava lá. A banda tocou sem ele, e isso meio que deu o tom da desorganização e caos generalizado. Logo de cara, ninguém falou nada pra gente, ninguém conversava conosco; o ambiente não era nada parecido com os padrões que tenho pra mim e minhas colegas de banda. O cara do som tratou a gente feito merda e não era nada legal. Mas levamos na boa, merda acontece, vamos aproveitar já que estamos aqui. Isso já deu a deixa da turnê toda. Dia após dia éramos destratadas, como se fôssemos umas meninas imbecis que não sabiam o que estavam fazendo. Não nos levavam em consideração nas passagens de som, ninguém se preocupava em chegar na hora ou nos tratar com respeito mesmo sendo apenas a banda de abertura — nada disso acontecia.

Então vamos fazer o que viemos fazer, tocar, e seguir nosso caminho. A gente é tranquilona. Não estamos acostumadas com as coisas dando certo, sabe? [risos] Pensamos “Bem, que seja! Vamos fazer funcionar”. E foi isso que tentamos fazer, e continuamos fazendo, e o público foi ótimo, respeitava bastante a gente, tocamos bem, e nos divertimos o máximo que pudemos.

Assim que as coisas foram progredindo, com Bobby por perto, rolaram umas paradas estranhas que nos deixaram bastante desconfortáveis. Comentários eram direcionados às garotas — digo, eu pareço durona, então ninguém mexia tanto comigo quanto com as outras meninas da minha banda, que supostamente não pareciam ameaçadoras, mas rolavam muitos comentários e contato físico inapropriado com elas. Elas estavam ficando cada vez mais desconfortáveis, chegando ao ponto que os promotores dos shows nos disseram que parte da nossa grana estava sendo mal administrada, que deveríamos receber coisas que não estávamos recebendo, e por fim, na última noite em que participamos da turnê, tentei conversar com o responsável pelo Pentagram sobre os problemas pelos quais estávamos lidando e como estávamos nos sentindo, e ele riu na minha cara, basicamente falando que nada daquilo importava. E foi isso. Daí que pensamos “Já era!”, porque no final das contas, o que importa mesmo pra mim é cuidar de quem gosto e me apoia na banda, e na minha integridade enquanto ser humano, ambos pontos que haviam sido comprometidos.

Publicidade

Então me vi diante de uma escolha: continuar tocando mesmo após esta pessoa e tantas outras terem sido tão desrespeitosas comigo e com minha banda, dessa maneira falando “Beleza, pode tratar a gente como quiser e vamos aguentar porque estamos desesperadas” ou cair fora dos últimos shows já que não estamos desesperadas. E foi isso que escolhemos. Não vou chegar e falar “Tudo bem, trate-me como quiser e eu vou aguentar”. Nunca vai rolar isso. Nenhuma grana ou sucesso ou atenção vale mais que o conforto e felicidade da minha banda, e minha integridade. Por isso, vazamos.

Esfandiari: Todos os dias acontecia algo novo e a gente ficava tipo “Tá bom, vamos aguentar essa, vamos tentar continuar otimistas”. Mas nos últimos três shows já era muita merda, em que pensávamos “É, não dá”. Daí sentamos e conversamos sobre por um tempo, já que, claro, não queríamos agir como amadoras. Meu maior problema era que não queria deixar nossos fãs na mão.

Que tipo de comentários Bobby e os outros faziam?
Fortune: Bobby fazia diversos comentários nojentos e inapropriados para todas as mulheres da turnê, mas o pior mesmo foi uma fã ter nos contado que saiu do show do Pentagram incomodadíssima porque ele estava fazendo piadas sobre estupro no palco. E fazia mesmo. Fazia piadas sobre como a idade para consentimento é 16 anos, e não sei qual foi a dessa vez, porque nem estava assistindo o show. Naquele momento, já nem via os caras tocarem. Mas as pessoas escreviam pra gente e pro King Woman falando de como estavam enojadas com as merdas que ele falava no palco sobre estupro, então pensei “Ok, não consigo fazer isso. Já é demais”.

Publicidade

Esfandiari: Eu mesma não ouvi nada, mas recebia emails de fãs e pensava “Puta merda. Não sabia que era assim”.

Fortune: Também nos falaram que o próprio Bobby havia comentado que o único motivo pela qual ele havia topado fazer a turnê com a gente e o King Woman era pra que ele pudesse ter “muitas opções de mulheres”. E da forma como fomos tratas, e as coisas que Bobby nos falava, reforçavam isso. Ficou muito fácil acreditar naquilo por conta da forma como ele nos tratava. Nunca me senti sob risco ou violada, pessoalmente, mas enojada e desrespeitada. Minhas colegas de banda, porém, basicamente se escondiam do Pentagram. Elas não entravam no camarim, se escondiam na van — não queriam nem ficar perto deles porque não se sentiam bem.

Só pra esclarecer: sabendo da reputação de Bobby e a história do Pentagram em geral, vocês esperavam por este comportamento?
Fortune: Que fique bem claro: todas tínhamos noção de como ele era e sua reputação. Só não queríamos julgar o cara. Não gosto de julgar pessoas que tem boatos ao seu respeito espalhados por aí porque já tive gente me julgando prematuramente sem me conhecer e dar uma chance ao vivo. Então faço isso. Não ia só chegar e falar “Não vou sair em turnê com o Pentagram porque ele certamente é um tarado nojento e sexista!”. Eu não diria isso, porque não conhecia o cara! Não gosto de tratar as pessoas assim.

Também respeito as pessoas que pavimentaram o caminho na música ou arte para as coisas que faço. Respeito o fato de que nos anos 60 ou 70 ou sei lá o que, as coisas eram diferentes. As mulheres eram tratadas de outra forma. Ele provavelmente vivia em um meio em que ninguém lhe dizia que seu comportamento era escroto, e ele acabou sendo reforçado.

Publicidade

Esfandiari: Nós sabemos que todo mundo do Pentagram é doido, especialmente o Bobby, mas não esperávamos ter nossos espaços invadidos como eles invadiram, ou que seríamos tratadas de forma tão desrespeitosa enquanto músico. Não ligo se as pessoas são loucas, isso é com elas, mas penso que foram desrespeitosos e nojentos. Ficamos na turnê o máximo que pudemos, mas no final, era tanto desrespeito e destrato que chegamos a nos questionar o porquê daquilo. Não estamos desesperadas, não precisamos disso.

Mesmo que não role nada direcionado à banda, se seus fãs se sentem desconfortáveis e associam vocês a isso, é algo que não tem nada a ver com a sua banda.
Fortune: Não mesmo. E o mais importante que quero deixar claro, mais que detalhes do que disseram ou fizeram, é quem eu sou e quem é minha banda. E somos uma banda que apenas quer existir no mundo, enquanto artistas, em que possamos fazer nosso lance, o que amamos e nos expressar. E se outras pessoas reagem a isso, ou isso as deixa felizes, ou as faz se sentir bem, isso é ótimo. É isso que nos importa. Só queremos ser tratadas com o mínimo de respeito. Trato outras pessoas com quem trabalho de forma respeitosa, e espero o mesmo de volta. Se não rola isso, não dá e pronto.

Já me acostumei com ser desacreditada, zombada, zoada, ouvir que sou uma vagabunda, uma louca, uma iludida, uma qualquer, que o que penso não importa, que minha banda não importa — ouvi isso de tanta gente que já me acostumei. Mas não acredito em nada disso. Então me recuso a permitir ser trata de tal forma, não importa o que me digam e como me tratem. Logo, não vou deixar minhas parceiras de banda serem tratadas assim. De forma alguma. Nunca vou ficar parada vendo gente com quem me importo ser desrespeitada e tratada feito merda, vê-las se sentindo mal e desconfortáveis, sem fazer nada pra ajudar. Não rola.

Publicidade

Ou ter que vê-las se escondendo em sua própria turnê.
Fortune: Exatamente. Não queríamos o tapete vermelho ou um bufê personalizado, ou dinheiro ao qual não tínhamos direito por contrato ou qualquer coisa do tipo. Sei que não sou uma rockstar famosa, e minha banda não é mega bem-sucedida, sei que não tenho direito a nada fora respeito e consideração enquanto ser humano. E isto nos foi negado na maior parte do tempo.

Você comentou que alguns promotores disseram que dinheiro estava sendo mal administrado. Poderia falar mais sobre isso?
Fortune: Nos disseram que tanto dinheiro como hospedagem e afins estavam sendo mal administrados, que não estávamos recebendo tudo que deveríamos. Então quando tentei falar com o responsável pela turnê, o tour manager do Pentagram [Greg Turley], fui tratada bizarramente.

Como ele agiu quando você o questionou?
Fortune: Eu disse “Você não saberia nada sobre o que tá rolando nos contratos sobre como o dinheiro devia estar sendo distribuído para nós?” e ele respondeu “Não sei nada disso” e eu disse “Então você não acha que os pagamentos incluam nossa banda?” no que ele revidou “Ah, então você acha que estão te devendo”. Respondi “Cara, isso é babaquice. Estamos sendo tratadas feito merda essa turnê inteira e tudo que estou tentando fazer é ser tratada com algum respeito e fazer meu trabalho”, no que ele rebateu “Como tratada feito merda?” e listei tudo que aconteceu, incluindo coisas que Bobby e outros do lado deles ali haviam feito. Foi aí que ele riu na minha cara e disse “Bom, vai ver você não foi feita pra isso” no que respondi “Foda-se”.

Publicidade

“Vai ver você não foi feita pra isso.”
Fortune: Estou em turnê com bandas há dez anos — com homens e mulheres, em turnês só com homens e só com mulheres. Trabalhei com homens e mulheres, mas nunca na minha vida fui tão maltratada por alguém como nessa turnê. Nunca. Foi chocante. Sei que não sou famosa nem nada, mas faço isso há tempo o bastante pra saber o que estou fazendo e como as coisas devem ser feitas para ser algo profissional e respeitoso, o que não aconteceu aqui. Foi tudo uma piada.

Como você se sente sobre tudo isso agora?
Esfandiari: O lado bom é ver como nossos fãs nos apoiam e a comunidade também. E como todo mundo ficou puto, tipo “Aqui não. Não na nossa comunidade, não com nossas garotas”.

Todas nos sentimos bastante resilientes porque rolaram tantos obstáculos na turnê: umas chatices menores que rolaram, ou coisas maiores que pensamos que não seria possível seguir com a tour, e demos um jeito de superar aquilo. Todas nos aproximamos por conta disso. Então no final das contas, me sinto bem com o fato de que caímos fora, porque era uma besteirada.

Vocês parecem ter recebido muito apoio na internet também.
Esfandiari: Sim! O pessoal tem sido foda. Acho que o Cedric do At the Drive-In e The Mars Volta comentou algo como “Isso aí, meninas”. Ele achou legal o que fizemos.

Você está preocupada com qualquer repercussão profissional disso tudo?
Esfandiari: O que eles vão falar? “Ah, essas meninas se deram ao respeito. Não vamos mais trabalhar com elas!”, foda-se isso daí. Vamos fazer as coisas do nosso jeito.

Publicidade

O Noisey entrou em contato com o Pentagram para comentar a situação e recebemos a seguinte nota de seu agente:

Do Pentagram enquanto banda:

Temos tocado e gravado música de forma profissional há quase 50 anos e esta é uma das situações mais infundadas e oportunistas com a qual já lidamos. Estas bandas não conversaram com o Pentagram ou com o tour manager sobre querer sair da turnê. Dadas algumas noites após seu início, as bandas simplesmente desapareceram, fizeram postagens negativas sobre nós nas redes sociais e então foram tocar no show que havia sido marcado para elas anteriormente naquela mesma noite.

Nosso agente em comum havia feito um contrato separado com os promotores para as bandas de abertura. O contrato do Pentagram e todas suas inclusões/exclusões ficava entre o promotor e a banda.

Bobby Liebling ofendeu alguém de uma das bandas de abertura. Ele disse algo como “Aprovo vocês na turnê porque quero ter opções”. O Pentagram enquanto banda pede desculpas sinceras pelo comentário de Bobby, que deu em cima desta garota, verbalmente, e ficou por aí. Não é segredo nenhum que ele goste de mulheres e isso não é crime. Ele é um homem solteiro. Pode ter sido rude, mas não houve contato físico. Tentamos ser legais, mas estas bandas de abertura não nos deram chance para interagir, nos evitando a qualquer custo e nos deixando desconfortáveis em nossa própria turnê.

Catch Wax Idols and King Woman on the rest of their Noisey-sponsored US tour:

Publicidade

June 7: Philadelphia, PA – Boot & Saddle

June 8: Washington DC – Songbyrd DC

June 9: Richmond, VA – Strange Matter

June 10: Chapel Hill, NC – Local 506

June 11: Atlanta, GA – The EARL

June 12: New Orleans, LA – Siberia

June 14: Dallas, TX – Red Blood Club

June 15: Austin, TX – Mohawk

June 17: Tucson, AZ – Club Congress

June 18: Fullerton, CA – The Slidebar

June 19: Oakland, CA – Starline Social Club

Cat Jones viu quatro shows seguidos do Pentagram em dois continents e ainda acha que isso tudo é inaceitável. Siga-a no

Twitter

.

Tradução: Thiago “Índio” Silva

Siga o Noisey nas redes Facebook | Soundcloud | Twitter