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Música

Um Ano de Calote no Wros Fest: o que Vamos Comemorar?

Supostamente, teríamos assistido ao Hot Water Music no Espaço das Américas em outubro do ano passado. Mas o que rolou foi um rombo na conta bancária.

Please come to Brazil.

Ficção: nos dias 12 e 13 de outubro de 2013, o Hot Water Music pisou em terras brasileiras pela primeira vez, no palco do Espaço das Américas, em São Paulo. O set começou com “Main Line”, passou pelo refrão angustiante de “Trusty Chords”, fechou com a entusiasmada “Remedy” e ainda rolou bis com “Paid in Full” e “Wayfarer”. Antes deles, a galera já tinha acionado as rodas de pogo com os shows do Reel Big Fish, do MxPx, do Goldfinger, do Less than Jake, do Strung Out, do Pulley, do Flatliners e do Belvedere.

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Realidade: o Wros Fest, que teria ocupado o Espaço das Américas nos dias 12 e 13 de outubro, nunca aconteceu. Depois de adiado para 21 e 22 de dezembro de 2013, com bandas completamente diferentes do line-up original – Mustard Plug, The Casualties, Evergreen Terrace, Guttermouth, No Trigger e Zebrahead, pra citar algumas – o evento bateu as botas de vez e deixou um legado amargo: um rombo na conta de pagantes que nunca foram reembolsados pela produtora, Web Rockers, e pela empresa que vendeu os ingressos, a TicketBrasil.

Esta bem poderia ser uma história em primeira pessoa, já que adquiri ingressos para o sábado e domingo e nunca mais vi a cor dos R$ 182 investidos. Trinta e-mails foram trocados desde a primeira solicitação de reembolso, feita no dia 1º de novembro de 2013, até o completo silêncio dos organizadores. Cri cri cri. Mas percebi que essa situação era bem conhecida por várias outras pessoas. Grupos no Facebook estavam cheios de relatos, assim como as conversas no bar. Recorri então aos depoimentos de pagantes que não tinham recebido o dinheiro de volta. Entre esses, algumas situações em comum: respostas automáticas nos e-mails, promessas de reembolso, pedidos do número da conta corrente até o completo silêncio dos produtores.

A advogada Monique dos Santos Torres, 28 anos, moveu uma ação de cobrança do valor dos ingressos e das despesas que teve com hotel e passagens, já que mora no Rio de Janeiro, além de pedir uma indenização por danos morais “diante do descaso que a Web Rockers teve com o trato da questão”.

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A audiência de conciliação foi realizada em agosto desse ano, e a Web Rockers nem deu as caras, segundo a advogada. A sentença saiu em setembro, favorável a Monique: o juiz ordenou que a empresa devolvesse a ela o valor dos ingressos, o custeio das passagens e do hotel e ainda R$ 1.500 por danos morais. O pagamento espontâneo não veio e ela precisou executar a Web Rockers para reaver o dinheiro.

Anderson Quadros, de Blumenau, também teve um prejuízo além do ingresso, pois não teve o estorno total das passagens de avião. Só as reservas do hotel foram devolvidas. Segundo ele, o investimento no Wros foi de R$ 580, para recuperar apenas R$ 150. “Eu confiei 100%, pois alguns amigos meus viram o primeiro festival e adoraram”.

Saudades do que nunca vivi.

Em uma rápida pesquisa no Tribunal de Justiça de São Paulo são encontrados pelo menos 62 processos contra a Web Rockers Mídia Digital Ltda. Dentre esses, 16 dizem respeito à rescisão de contrato e devolução do ingresso do Wros Fest.

O site Reclame Aqui também tem vários registros contra a WebRockers e a TicketBrasil. Algumas reclamações foram respondidas, o que não quer dizer que o problema tenha sido resolvido. Um consumidor identificado como Ademir, por exemplo, escreveu, no dia 3 de outubro, que a TicketBrasil mandou e-mails com os prazos para o reembolso, mas que não havia conseguido o dinheiro de volta. “Não sei qual foi o acordo entre TicketBrasil e a organização do evento, sei que eu paguei na TicketBrasil por dois ingressos, de um evento que não existiu, e não tive o estorno do valor de taxa de conveniência e muito menos o reembolso dos dois ingressos”.

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A resposta da empresa, dada no dia 7 de outubro, foi que “entendemos que todos os esclarecimentos acerca dessa questão foram devidamente prestados. Em caso de dúvidas adicionais, estamos à disposição em nossa central de atendimento”.

Alguns dos pagantes recorreram ao Procon, como foi o caso de Helena Perdiz, que comprou entradas pra ela e pro namorado e desembolsou R$ 282. “Juntei todos os documentos que tinha – comprovantes de compra, e-mails, fatura do cartão – e fui até o Procon. Fui orientada a abrir dois processos: um contra a Web Rockers e outro contra a TicketBrasil, que teriam até maio de 2014 para dar um parecer.” Nenhuma das empresas se manifestou até agora, e ela e o namorado continuam sem o pagamento. “Já não sei mais a quem recorrer. Não estou pedindo uma indenização de milhões de reais, estou pedindo de volta um dinheiro que é meu. Paguei por um evento que nunca aconteceu, só quero o meu direito de reembolso”.

Acredite, teve gente que conseguiu a grana de volta depois de fazer uma reclamação no Procon, como informa Fátima Lemos, assessora técnica do órgão fiscalizador. Ela pondera que não se chegou a solução alguma com a Web Rockers, mas alguns consumidores conseguiram a devolução do valor com a TicketBrasil. A galera fez barulho: foram tantas as reclamações recebidas que a Diretoria de Fiscalização do Procon foi acionada e abriu processo contra as duas empresas.

A TicketBrasil chegou a emitir um comunicado em que informa que, no contrato do Wros Fest, os “reembolsos são 100% de responsabilidade da Web Rockers e, por esse motivo, a Web Rockers deve assumir toda e qualquer responsabilidade pelos estornos aos clientes, em caso de possíveis cancelamentos”. O Procon, porém, assegura que os reembolsos são devidos por ambas as empresas. Questionada pela reportagem, a TicketBrasil afirma que “a nota supracitada contém todas as informações e esclarecimentos que cabem ao atendimento da TicketBrasil prestar a este respeito”.

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Eu trocando e-mails com a Web Rockers.

Nessa altura do campeonato, em que o calote faz aniversário de um ano, o caminho mais adequado para o consumidor é a Justiça, recomenda Fátima. “Estamos orientando isso, que o consumidor busque rapidamente fazer a reclamação, tanto pra quem promoveu o evento quanto pra quem comercializou, e também informar a empresa de cartão de crédito de que não houve a realização do evento e pedir o estorno do valor por desacordo comercial”.

Fátima informa que o Procon desconhece se a Web Rockers ainda atua no mercado de shows. A fanpage no Facebook está parada desde 2013, o comunicado sobre o cancelamento e o reembolso não está mais disponível, e os e-mails que a reportagem do Noisey mandou para a organização não foram respondidos. Alguns consumidores apontaram a empresa Blest Eventos como sendo a Web Rockers, mas com outro nome. Essa produtora faria uma turnê brasileira do Municipal Waste neste ano, mas essa também foi cancelada. Enviamos um e-mail para a Blest, que negou ser a Web Rockers. A resposta, na íntegra, foi essa:

“Essa informação não confere, pois nossa produtora não tem absolutamente nada a ver com a WebRockers ou com os eventos dessa produtora. Talvez a confusão foi feita pelo fato de que a primeira tour do Municipal Waste no Brasil foi produzida pela Web Rockers, então as pessoas sempre ligam as bandas às produtoras que já os trouxeram ao Brasil anteriormente. Mas não tem nada a ver uma coisa com a outra no nosso caso. Nossa produtora tem sede no México e opera em vários países da América Latina.”

A dor de cabeça, infelizmente, faz aniversário de um ano.