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Música

Peso e Melodia Andam de Mãos Dadas no Segundo EP do 2faces

Curte uma sonzeira instrumental pesadona e ganchuda? Então chega mais: lançamos com exclusividade o streaming de Noema, disco novo do trio pós-metal paulistano.

O 2faces é um trio pesadão instrumental que existe oficialmente desde 2010, e que nos deu a satisfação de lançar com exclusividade nesta quarta (30) seu segundo trabalho, Noema. Mas a história que me contaram é que eles já tocavam juntos milianos antes disso, despretensiosamente ou em outros projetos, até chegar na proposta e formação do 2faces. Fui dar aquela apurada básica e descobri que o Ander (guitarrista) e o Fabio "Bronson" (batera) faziam um som desde 2000. E que o Ander era quem emprestava voz às músicas duma banda que eles tiveram por seis anos, chamada Difusion - um lance meio post-hardcore/screamo. Depois de tantos screams, o grupo se desmantelou porque a garganta do mano pediu arrego e ele ficou sem voz.

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Então é certo dizer que a onda instrumental do 2faces resultou de um mal que veio pra bem, uma vez que o som ficou bem mais daora com o foco nas bases pós-metal e não nas melodias de voz. Com o fim do Difusion, o Ander e o Fabio continuaram mandando um rock, só guitarra e batera mesmo, e foi assim que surgiu o nome da parada. Ou seja, não existe metáfora alguma por trás de "duas caras", pelo menos na origem. Com a entrada do baixista Paulo, a química ficou perfeita. Logo, temos aqui um correspondente nacional à altura de bandas como Isis, Pelican e Jesu. Mete o play e acompanhe o papo rápido que tive com o Ander:

Noisey: O que motivou, de fato, a decisão de fazer um som apenas instrumental? Não foi uma escolha puramente estética, né?
Ander: Inicialmente, o som era instrumental porque tínhamos esperança de que minha voz melhorasse e pudéssemos colocar letras nas músicas. No entanto, quando a garganta ficou 100% de novo, estávamos há tanto tempo tocando e lapidando o instrumental das músicas que a tentativa de colocar um vocal nelas pareceu mais prejudicar o som do que ajudar. Na época, estávamos escutando adoidado coisas como Pelican e outras bandas do gênero, que não têm vocal, e achamos que seria um desafio massa tentar fazer as músicas falarem por si mesmas, sem a necessidade de uma letra ou alguém "explicando" qual era a do som. Começou meio como uma necessidade que, no fim, se tornou uma possibilidade de explorar a música de forma diferente daquilo que estávamos acostumados.

Fugir ao protocolo de fazer música no intuito de emoldurar linhas vocais é algo que acaba expandindo as possibilidades de criação? Digo, dessa forma o instrumental tende a ficar mais rico e, naturalmente, mais trampado, fala aí?
Exatamente, cara! Quando uma música tem letras e vocal, é fácil das pessoas se relacionarem e até se manterem atentas à música. Querendo ou não, é o primeiro ponto de contato e identificação de muita gente. Daí, em muitos casos, as estruturas das músicas são simples e servem de suporte a isso: o verso tem X bases assim, o refrão tem Y bases assado. Quando você faz um som instrumental e longo, ainda por cima, precisa fazer cada parte da música se sustentar sozinha e, mais importante, manter uma certa dinâmica que prenda a atenção de quem ouve. Então, acaba sendo necessário desenvolver um arsenal de recursos pra tentar surpreender e entreter constantemente quem escuta o som e evitar que o cara pense: "Beleza, vocês tão repetindo a mesma coisa por um minuto agora. Já chega, né?".

Noema, o nome que escolheram para o atual trabalho, guarda alguma mensagem ou significado especial que vocês querem passar para o público? Vocês são ligados à filosofia?
Acredito que todos tenham uma curiosidade ou pensem sobre assuntos metafísicos vez ou outra, e nós não somos diferentes. Não temos ligação direta com a filosofia, mas fomos buscar lá uma palavra que exprimisse um pouco a ideia do disco, que narra a trajetória de um personagem decidido a transcender sua condição de humano e alcançar um novo degrau na evolução. No encarte do disco, inclusive, explicamos em mais detalhes como cada música se encaixa nessa ideia e o significado desse nome (aqui, peço licença pra colocar um trecho do que escrevemos lá): Noema, na filosofia, é o processo de se experimentar algo e extrair um conhecimento que seja próximo do Absoluto. No campo da retórica, é também um termo que significa usar subtextos e metáforas para exemplificar temas complexos. Dessa forma, cada música do disco se torna um noema tanto para o protagonista, que, através de experiências singulares, descobre verdades fundamentais e se torna o ser superior que almeja ser; quanto para o ouvinte, que usa as músicas para criar imagens e representações dentro de cada tema proposto.

O que o Noema traz de diferente em termos de produção e experimentos em relação ao EP anterior, de 2011,já familiar do público?
Em termos de produção, o Noema é um salto enorme em relação ao outro EP. O primeiro disco foi gravado ao vivo (guitarra, bateria e baixo tocados juntos, mas em ambientes separados) e teve alguns overdubs pra dar mais peso nas guitarras e colorir um pouco o som, não ficar tão "seco". Para esse disco novo, tínhamos desde o começo a ideia de usar todos os recursos à mão para reproduzir fielmente não só o som, mas a vibe e os climas das apresentações ao vivo. Então fizemos tudo canal por canal, mas sempre tomando cuidado para que essa ideia inicial fosse respeitada. As composições também amadureceram bastante, ousando mais na duração das músicas, usando alguns synths em momentos pontuais e consolidando alguns elementos característicos da banda (o uso dos delays ou o baixo fazendo vezes de segunda guitarra com distorções mais expressivas e linhas mais livres da base). Nossa ideia é de que, a cada disco, a gente possa apresentar elementos novos no nosso som. Cada processo de pré-produção e gravação é sempre um aprendizado enorme, então, com certeza, os próximos trampos vão refletir esse crescimento.