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Música

O Pachamama Fusion É a Legítima Fusão da Milonga com a Frequência da Mãe Terra

Seja do alto dos pampas gaúchos ou se reunindo remotamente pela internet, a intenção do Pachamama Fusion é buscar o auto-conhecimento através da música.

O Pachamama Fusion se preocupa mais com o auto-conhecimento do que com a autoimagem, por isso eles não têm foto da banda. Mas o Maurício mandou umas imagens com legendas, como esta aqui, que ele explica ser "o Tarot de Marselha, as mãos e o mate emulando uma bussóla que aponta ao Sul".

No alto dos pampas gaúchos, com loteamentos de terras e cabeças de gado a perder de vista, um homem, sentado em sua cadeira de balanço e tomando seu chimarrão, observa seu império. Porém, apenas observar não é o suficiente. Ele quer sentir a vibração que emana da terra, a fonte de sua riqueza. Mas como perceber este sutil movimento cósmico? “No verão de 2013 pra 2014, mostrei umas músicas pra um cara que além de baita amigo é um ciborgue do piano. Começamos a elaborar um projeto, mas como a procrastinação é um tipo de decreto-lei por aquelas bandas, as gravações de fato começaram só no verão seguinte”, nos contou Maurício Alejándro, percussionista do Pachamama Fusion, um grupo gaúcho que mistura a tradicional milonga com tambores e hinários de auto-conhecimento.

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Maurício apresenta alguns integrantes: "Negro maravilhoso de cabelo curto cantando: William Monteiro"

A banda é um projeto mantido remotamente entre cinco gaúchos: William Monteiro nos vocais, Gabriel Martins no violão, Duca Duarte no baixo, Maurício Luis Pezzi no piano e Maurício Alejándro no bumbo leguero, uma espécie de tambor feito de madeira e pele de cordeiro, cujo som pode ser ouvido a léguas de distância – daí o nome, leguero. “Eu faço bastante looping com doble bass no couro do tambor, que emula o prórpio pulsar da Mãe Terra. Os arranjos de percussão são mais minimalistas, não sou tão camisa 10”, afirma.

Como uma semente de araucária recém-plantada, o Pachamama Fusion ainda está germinando. Eles não têm nem foto com todos os integrantes e, com apenas duas músicas lançadas até agora, a banda pretende lançar um disco completo ainda este ano. “O que acontece é que, com o tempo, é bom aprender que a paciência é uma grande virtude… Cada pessoa tem seu tempo, então as faixas estão em diferentes estágios de produção”, diz Maurício.

A milonga é um gênero tradicional gaúcho forjado nos mesmos moldes românticos do tango, tal qual as faixas “Minha Sombra” e “Muito Além”, que são reflexos do cotidiano observados do alto dos morros das terras do Sul. “A milonga em si, originalmente, acho que é um gênero bastante bucólico e contemplativo. O que penso que tentamos fazer é uma milonga no limiar entre o campestre e o urbano (que é uma das várias esquizofrenias que se manifestam no Rio Grande do Sul), com uma pitada de visão oriental de desenvolvimento pessoal, The Hero’s Journey, essas coisas”.

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“Estas músicas que saíram são letras que escrevi e músicas ou de minha autoria ou parceria com o Mauricio Pezzi. Quando vou pra [cidade] Ana Rech, tenho bastante tempo para pensar bem no que vou escrever. Tenho um método e um sistema de cotas nas letras. A cada quatro letras, tem que aparecer a palavra 'araucária', por exemplo. Acho que os temas que mais desenvolvo são relacionados ao existencialismo mesmo.”

"Negro maravilhoso de cabelo longo com violão: Gabriel Martins. Volante argentino com mate na mão: Mauricio Alejándro"

O surpreendente é a capacidade que o som tem de não ser mais um sermão clichê disfarçado de budista de rave. Os vocais e a melodia têm uma tonalidade radiofônica, que soa maduramente moderno e até pop. Maurício ressalva: “Sabemos que é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que música do Rio Grande do Sul passar de Santa Catarina, mas sim, buscamos um cantor que não tivesse as características clássicas de um cantor de música regional. O William Monteiro é um cantor incrível e encaixa totalmente no que queríamos.”

"Araucária de baixo pra cima, numa clara alusão ao conceito de que não sei tirar fotografia", diz Maurício.

Como bom gaúcho, Maurício diz que “seria expulso do Rio Grande do Sul se dissesse que a milonga precisa de mais relevância. Buscamos mais visibilidade. Tem artistas fazendo coisas inacreditáveis e readaptando os ritmos regionais por aqui, tipo o Pirisca Grecco, o Bebeto Alves, o Mauro Moraes, até a Shanna Muller nos trabalhos mais recentes”. Foi-se o tempo em que precisávamos do intermédio de pequenos grupos de comunicadores para ter contato com novos talentos. Graças à internet, bandas como o Pachamama Fusion estão agora com a faca e o queijo na mão. "Espero que mais pessoas possam voltar um pouco mais os ouvidos pra música que sai dessa zona nebulosa do Sul do Mundo."