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Música

Os Melhores Discos Brasileiros de 2014

Como dá pra ver, tem a “nossa carinha”: indie torto, rap gangsta, bom gosto brasileiro e batidas do futuro.

2014 foi um ano estranho: agitado e parado ao mesmo tempo. Enquanto no primeiro semestre as coisas estavam naquele clima de ansiedade pra Copa, dali pra frente foi tudo tão rápido e meio desgraçado que, às vezes, parecia que não ia ter nada de música boa. Que nada: passado o caos das eleições, começou a chover som – tem gente mandando coisa pra gente até o Natal. Como somos chatos e seletivos, decidimos escolher só dez discos nacionais pro nosso top de fim de ano. Sorte que a equipe é unida e não teve (muito) choro e ranger de dentes.. Como dá pra ver, tem a “nossa carinha”: indie torto, rap gangsta, bom gosto brasileiro, batidas do futuro. Role a página, curta os sons e reclame de quem faltou na lista na caixa de comentários – afinal, a ideia é essa.

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10. Cybass – Altered Carbon

O lance é que o Cybass sacou algo muito simples e que tá aí na cara de todo paulistano minimamente ligado ao universo da música, só não vê quem não quer. Hip hop, reggae, dubstep, EDM, drum and bass, tudo isso bateu por aqui em maior ou menor escala nos últimos 20 anos e tal, ondas que vieram, ficaram ou foram; no rápido e certeiro EP Altered Carbon, o Mano Cibas conseguiu desenhar no Fruity Loops um ponto de conversão dessas ondas, que são ao mesmo tempo história e estética da club music de São Paulo. "Bola de Gude" é tudo o que o EDM americanão de universidade tenta ser, mas com aquele suíngue que não dá pra saber bem se é do dub, do rap e da dedada de MDMA que se materializa na minha frente sempre que eu dou o play nesse som. Se o fluxo das engrenagens musicais do Brasil mudasse só um tantinho pra cá, era dois palito para as hordas de jovens periféricos fãs de Avicii substituírem os vídeos de gente branca europeia do Tomorrowland pelos sons do Cybass nos grupos de Whatsapp com as novinhas. (Eduardo Roberto)

9. mario maria – Abertura do Programa

Colagem é aquela arte muito bonita de juntar um monte de coisa pra criar algo ainda melhor. O que mario maria fez em Abertura do Programa foi pegar clássicos da MPB, uns efeitos eletrônicos, seu violão e sua voz de João Gilberto e transformar em um disco moderno (ainda usam essa palavra?) e cheio de sentimento. Não um sentimento específico, mas aquelas músicas que enchem a sala e te levam a um lugar paralelo onde parece que você é capaz de entender tudo. (Taís Toti)

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8. Holger – Holger

Não é uma banda de axé dos anos 90, são os paulistanos do Holger começando o disco homônimo com "a gente mexe e remexe até ficar bom". Guitarrinhas frutíferas, timbragem fresca, suingue, vocais amaciados e aquela zuerinha sensual e molecalizada de sempre – desta vez com experimentos eletrônicos (que não cortam a brisa brazilis) e letras mais maduras, falando da cidade, da saudade, da alma. Neste disco, o Holger continua sendo o Holger, só que mexido, remexido e melhor. (Débora Lopes)

7. Death by Starvation – Death by Starvation

Enquanto o mundo todo entrou numas de ouvir um metalzinho cabisbaixo, as guitarras com mais efeitos que o macaco bebum do Edmundo e aqueles papinhos de curador de galeria de arte que vende grafite, a turma do metal underground aqui de São Paulo mantém com honra o clima de desgraça black metal suburbano meio de esquerda. A verdade é que o auto-intitulado disco saiu no finalzinho de 2013, mas acabou passando absolutamente despercebido pela estúpida imprensa musical brasileira (nem o Noisey falou sobre rs). O disco saiu, nada aconteceu, e a banda acabou em julho deste ano. E isso foi um puta vacilo, mas que de jeito nenhum tira a força do álbum, recheado com black metal de segunda geração monstrão e pútrido à lá Mayhem/Bathory, exalando niilismo e frequências médias, mas daquele jeitão hardcore que a rapaziada de cá tem transformado em marca registrada. Fazer isso e não cair na cilada ideológica que todo terceiro-mundista se enrosca quando importa o BM nórdico (o famoso "nazi por acidente") é um baita sucesso. O grupo voltará à (semi) ativa para um único show em janeiro de 2015. (Eduardo Roberto)

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6. Criolo – Convoque seu Buda

O papo é aquele de sempre: depois de lançar um disco estouradão, a prova de fogo vem na sequência. E depois do Nó na Orelha, de 2011, o doidera paulistano Criolo precisava chegar bem demais no novo Convoque seu Buda. E ele chegou. Do doidinho sentado no fundo do ônibus que fala umas verdades na lata, o cantor se transformou em vários personagens: o reggaeiro, o artista puto da vida, o observador de mil fitas e também em um cara mais humorado – é só ver o trabalho vocal e a letra de "Cartão de Visita”, em que até sobra para a história do Lázaro. Mas o disco é forte não só pelas novas viagens vocais e pessoais do Criolo. Quando a caneta dá alguma falhada e você fica meio de cara, há sempre um Daniel Ganjaman, banda e convidados (Juçara e Síntese, ambos gigantescos em suas participações) segurando as pontas para garantir o álbum como um dos melhores de 2014. (Leo Martins)

5. Gasper – A Cor do Futuro

O Gasper é a evolução natural daquilo que acabou se conceitualizando como “rap nacional” – em oposição ao “underground” dos anos 00. Diferente das contrapartes mais sisudas paulistanas, o rapper goiano criou uma personalidade própria, com flows entortando o gangsterismo e papos retíssimos, entre um rap de Brasília (Tribo da Periferia, 3umSó) sem melodine e subgrave, e um Costa a Costa versão interior treta. Sampleando Tim Maia, ameaçando os inimigo e surfando no moog, Gasper chegou como o segredo não tão bem escondido de quem ainda leva rap a sério no Brasil. (Amauri Gonzo)

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4. Matheus Mota – Almejão

2014 foi um ano bem atribulado, principalmente nesse último semestre. Parece que se passaram uns três anos dentro deste. Quando caiu no meu colo o novo disco do Matheus Mota eu estava tão atribulado que, de primeira, não consegui entender direito. Um piano, som de TV ligada ao fundo, letras improvisadas sobre o cotidiano e muita tranquilidade. Só depois, num domingão ensolarado em casa, almoçando e ouvindo o disco que eu captei a onda. Que vibe. Não poderia concordar mais quando ele diz “é melhor refletir em uma caminhada/algo me diz que eu vou suar”. E 2014 foi isso, uma longa e suada caminhada. Espero que 2015 seja um delicioso domingo ensolarado. (Lucas Panoni)

3. Juçara Marçal – Encarnado

Se 2014 foi ruim para todos nós, nada como uma trilha sonora à altura. Juçara Marçal resolveu falar sobre morte no seu álbum solo de estreia. Junto com os seus já velhos conhecidos do Metá Metá, Kiko Dinucci e Thiago França, a voz acalentadora e ao mesmo tempo violenta da cantora traz aflição para o ouvidos dos ouvintes, aumentada pelos instrumentais tortos que compõem as melodias das músicas assinadas por nomes que vão de Itamar Assumpção a Douglas Germano. Encarnado não é só um dos melhores discos do ano, mas também dos anos seguintes que virão. (Marie Declercq)

2. Séculos Apaixonados – Roupa Linda, Figura Fantasmagórica

Esses meninos do Rio ouviram muitos discos do pai, piraram num AOR, e fizeram um álbum de estreia meio pop de motel meio Ariel Pink brasileiro. Tem gente que acha isso hipster demais, tem gente que acha que é irônico, mas na verdade é sincerão (obviamente) e bem do bonito. O poder de uma boa canção fica evidente nas grudentas “Refletir É Inútil” e “Um Totem do Amor Impossível”. Pode mandar mais saxofone, por favor. (Taís Toti)

1. Racionais MCs – Cores e Valores

A capa já diz tudo: o conceito é “ladrão de banco” – até quando Mano Brown rima sobre tráfico (em “Finado Neguin”), o papo parece um assalto. Sem alarde, fim de ano, direto nas redes, roubou o topo das lista, cê nem viu, sumiu na neblina. Com uma carreira que já permite a auto-contemplação histórica (“O Mau e o Bem”, “A Praça”), os Racionais ainda olham pra frente, como sempre prometeram. Incorporando peças de trap em sons altamente remixáveis – aí Beatwise e Metanol, quem vai sair na frente nos edit? – os Racionais atiram com concisão inédita em estrutura de mixtape. O início tenso da suíte de cinco faixas, encerrada com um sonoro “arrombado”, soa como sirene no pesadelo do sistema. Edi Rock, pesadamente rouco, chega melhor que seu disco solo, enquanto Ice Blue divide os microfones com Brown e Helião em resultados distintos. Brown, sempre a estrela, brilha mais ainda na segunda, aberta e arejada metade do disco: “Você Me Deve”, com salves aos velha guarda Rappin Hood e Lakers, ressignifica o Robin Hood bom ladrão de banco no contexto do orgulho negro, “Quanto Vale o Show” vem em ritmo de pugilista no melhor momento autobiográfico da era pré-Racionais de Pedro Paulo, e “Eu Te Proponho” dá uma espiadela do que poderia ser o disco solo de Brown, falando macio de amor emprestando soluções estilísticas da nova guarda. No fim, a chave vai sendo decifrada conforme a influência do disco se espaçar no tempo, mas fica um recado e lição para todos nós em 2015: nada vai bem se os negócios vão mal. (Amauri Gonzo)