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Música

Os Caras do The Presidents of the United States of America Queriam Ter Topado Aquele Comercial de Sprite

"Dissemos 'Não queremos apoiar refrigerantes cheios de açúcar!'. Agora olho pra trás e penso em todo o dinheiro que poderíamos ter ganho e como fomos burros".

No Irving Plaza, em Nova Iorque, no primeiro dia da turnê norte-americana do Presidents of the United States of America para divulgar o (mais ou menos) novo disco da banda Kudos to You!, o vocalista e “baixotarrista” Chris Ballew pula por todo o palco com o desprendimento de um jovem de 18 anos – com a diferença de que ele completará 50 ano que vem.

“Eu sinto o prejuízo depois”, diz. “No outro dia, minhas costas e joelhos doem”.

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Como ele aguenta?

“Faço esse lance de respiração chamado Qigong”, comenta. “Bem simples: você respira, espalha a energia pelo corpo e curte esse fluxo. Faço isso, medito, e muitos alongamentos. Não bebo durante boa parte do tempo nas turnês. Me mantenho hidratado, com a energia fluindo e durmo o suficiente. Se faço isso e não caio na farra demais durante a turnê, então o show é o ponto alto do dia. É lá que consigo soltar toda aquela tensão que vem se acumulando”.

Este compromisso com uma vida saudável e consciência plena é uma das muitas surpresas que surgem em um papo com a voz que você ouve cantando hits dos anos 1990 como “Lump” e “Peaches”.

Ele retira sabedoria de uma série de amigos músicos completamente diferentes como Sir Mix-A-Lot, Weird Al Yankovic, Beck e Madonna. E, apesar de ter seu oitavo disco para crianças saindo em setembro, sob a alcunha Caspar Babypants, ele não está ansioso para pegar a estrada e tocar para os pequenos assim que a turnê do Presidents chegar ao fim.

“Eu não vou mesmo fazer uma turnê [para o disco infantil]”, declara. “Tem esse ritmo que encontrei na minha vida, que é basicamente fazer nada e eu gosto mesmo: ir ao parque, praticar um pouco de Qigong, meditar, curtir a natureza. É bom, bicho. Assim que você começa a entrar na sintonia desse grande show que é o mundo, você sente que não precisa enchê-lo tanto com o seu próprio som. Aprendi a ser humano e não fazer humano, saca?”.

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Por mais centrado que seja, Ballew passa a impressão de ser um homem pragmático com um olhar para o resultado ao discutir o senso de humor de sua banda, sua adoção cautelosa do crowdfunding e porque eles não deveria ter negado um contracheque gordo de um refrigerante durante seu auge nos anos 90.

Noisey: Algumas bandas parecem ser assombradas por um ou dois hits que seus fãs casuais queiram ouvir – por que vocês conseguiram lidar com os seus numa boa?
Chris Ballew: No começo da banda tínhamos essa regra que se um de nós olhasse para o setlist e dissesse “não estou tão empolgado pra tocar essa”, nos livraríamos dela. Então o setlist que tínhamos no começo era só de músicas que adorávamos.

Uma das razões pela qual fiz isso é que logo que Beck conseguiu um contrato, eu tocava na banda dele. Ele sempre achava que “Loser” era uma canção pra se jogar fora, e a odiava. Ele odiava a atenção que ganhava por conta dela; que ele era o rei dos vagabundos e tal. Era como ir pra escolinha da fama, dando um rolê com o Beck [risos]. Conversamos muito sobre sua transição e a música que o perseguia e que ele não curtia tanto assim.

Quando voltei a tocar com a banda, pensei “beleza, caras: não vamos lançar nada do qual não estejamos 100% orgulhosos, porque pode ser que seja um sucesso. E aí vamos ficar presos”. Acabou que adoro aquele disco e fico feliz de tocar cada música que tocamos todas as noites. Digo, é fantástico.

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A meditação te influencia a compor canções como “Flea vs. Mite”, que é sobre uma luta entre insetos?
Amo antropomorfizar as coisas, e me sentir livre para fazer isso é parte de ver o mundo como um lugar em que posso dobrar as regras e mudar o roteiro. Alguns dias quando faço Qigong e medito, me sinto como Neo em Matrix – como se pudesse ver o código. Se você vê o código, pode reescrevê-lo.

Houve uma fase há um tempo atrás em que achei que todas as músicas tinham que ser sobre amor, ou ideias e conceitos importantes. Compus canções sobre galinhas e macacos e animaizinhos e tal, e encarava-os como cidadãos de segunda classe. Então, [nos anos 90], vi um cara chamado “Spider” John Koerner em Boston. Ele faz interpretações incríveis de folk antigo, e é uma baita influência. De repente, penso “uau – aqui estão estas músicas que tem integridade e sobreviveram ao teste de tempo, e tratam de animaizinhos e frivolidades. Acho que consigo fazer isso também”.

Você acha que rola um esnobismo na ideia de que se uma música te faz rir, ela não é importante?
Sim – mas o lance é que não estou esperando alguém chegar pra dizer que tá tudo bem comigo. Eu nem ligo. Ligo sim de lançar uma música que me parece coesa e bem escrita, e com um componente visual que te leve numa pequena viagem, te faça ver algo e te deixe feliz. Mas como isso então reverbera na cultura… Estou preocupado com o ouvinte, não com a cultura. Somos meio que culturalmente invisíveis, e vejo isso como algo de valor.

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Agradeço à Madonna por ter esta visão. Tivemos uma reunião com ela tempos atrás. Dependia da sua gravadora [Maverick] e da Columbia contratar a gente nos anos 90. Ela me puxou de canto e disse “assinando comigo ou não, vou te falar uma coisa: você é um bom compositor, mas você é engraçado. E o mundo nunca vai respeitar sua obra, porque você é engraçado. Então não espere por isso. Não fique sentado esperando. Só faça o que você faz tão bem”. Não assinamos o contrato com ela, mas aquele conselho me poupou muitas dores de cabeça.

Kudos to You! foi seu primeiro disco feito na base do financiamento coletivo.
Não sei ainda ao certo como me sinto com esse negócio de crowdfunding.

O que te incomoda?
Nós conseguimos bancar nossos próprios discos, não é como se precisássemos de doações. E pode parecer, de certo modo, meio de mau gosto. Tipo “pô cara, faz o cheque logo aí”. Se você não consegue pagar por um álbum, talvez não devesse fazê-lo desse jeito. Pelo menos é o que eu penso quando vem gente até mim falando sobre isso [pedindo doações para seus projetos]. É tipo “bem, talvez você não deva fazer um filme. Sossega aí” [risos].

Por outro lado, muitos dos fãs adoram sentir como se fossem parte de um disco.
Esse é o outro lado da moeda. Foi uma oportunidade única para fãs de se envolverem neste processo, de se sentirem parte, e foi isso que me convenceu. Nós leiloamos duas guitarras customizadas com duas e três cordas, demos aulas por Skype para as pessoas que as queriam. Foi uma ligação cara-a-cara bem legal com pessoas que nunca teria conhecido em outra ocasião.

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O Weird Al tem dado as caras nas notícias. Vocês ainda cantam “and that’s all I have to say about that” no final de “Lump?”
Isso meio que faz parte da música pra sempre. Adoramos o Weird Al como pessoa. Ele é um bom homem – um cara legal, um grande ouvinte e uma pessoa muito inteligente, criativa e intuitiva. Ele fez um vídeo pra gente, da música “Mixed Up S.O.B.”. Era um vídeo bem louco e complicado. Teve um dia de filmagem em que fazíamos flipbooks e no outro dia os filmávamos nas cenas. Foi tudo muito matemático e científico, mas Al sabe lidar com esse tipo de coisa.

Vocês e o Sir Mix-A-Lot trabalharam juntos há alguns anos atrás num projeto de rap-rock chamado Subset, cujo álbum até hoje não foi lançado oficialmente. Vocês estão tentando disponibilizar essa música pro mundo?

Sim. Na verdade, fizemos um show juntos há umas seis semanas em Seattle. Foi durante um evento chamado Rock’n’Roll Marathon. Demos um rolê depois, e falamos meio que seriamente sobre o que seria preciso [para lançar o disco]. Então veremos – estamos conversando sobre isso.

Sir Mix-A-Lot disse em uma entrevista antiga que o disco deu uma empacada porque vocês tinham ideias diferentes sobre a sonoridade. Ele disse que queria fazer um negócio mais Nine Inch Nails com bateria eletrônica ao invés de música ao vivo. Vocês resolveram isso?
Não – mas é verdade. Mix e eu queríamos fazer algo ousado, e acho que Dave e Jason queriam deixar com mais cara de banda e com uma sonoridade mais orgânica. No fim das contas, Mix me chamou a atenção para as possibilidades computadorizadas e me descolou um equipamento com Pro Tools.

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Uma das razões pela qual chamamos a banda de Subset era porque nossa base criativa em comum era muito pequena. E esse território diminuía cada vez mais quando seguíamos em frente – e eventualmente desapareceu. É tipo um casamento entre quatro pessoas. Quais as chances de dar certo?

Entre o disco do Subset e os seus setlists, parece ser uma prioridade que todos concordem em cada decisão.
Este é um dos motivos pelos quais Caspar é algo que faço sozinho. Cansei de achar aquele terreno comum. Depois de um tempo é mais como se eu quisesse me aproximar de ser um pintor ou escultor. Um pintor não diz “quero pintar algo. Preciso arrumar mais três pessoas”.

Faz alguns anos, mas preciso perguntar como o Presidents acabou compondo aquela música de Pokémon “Can’t Stop Catching ‘Em All”.
Em 1998 ou 99, comecei a fazer trilhas para programas de TV e comerciais. Meio que já terminei com isso agora, mas [a música de Pokémon] foi uma das últimas que compus. Escrevi a canção e trouxe a banda, e eles foram pagos por tocarem ela.

[Na época], decidi que queria ganhar com dinheiros autorais. Se eu escrevo músicas que entram em uma biblioteca e acabam sendo usadas em comerciais ou programas, posso estar no parque praticando Qigong e ganho uma grana. Fazer turnês com uma banda é o equivalente a cavar uma vala ou trabalhar como padeiro todos os dias fazendo pão. Prefiro ser o cara que escreveu a receita.

Você já recusou algum comercial?
Enquanto banda, negamos um comercial de Sprite e o filme Independence Day quando estávamos no topo das paradas e nos sentíamos invencíveis. Dissemos “não, não queremos saber desse filme imbecil! Não queremos apoiar refrigerantes cheios de açúcar!”. Agora olho pra trás e penso em todo o dinheiro que poderíamos ter ganho e como fomos burros. Inclusive, essa é uma das razões pelas quais comecei a fazer trabalhos comerciais – tem todo esse dinheiro e é fácil. Bem, não é fácil, mas é uma forma de se ganhar dinheiro sem arrebentar a coluna no palco toda noite. Me arrependo de ter negado estas duas [oportunidades]. Depois dessa, diria sim pra tudo.

Então se você pudesse voltar no tempo, deixaria todas aquelas crianças com cáries?
Sim! Não é como se a nossa negativa tivesse diminuído a produção de refrigerantes.

Jonathan Zeller não conseguiu nenhum espaço nesta entrevista para quando Chris Ballew engasgou com uma barra de cereal, mas gostaria de mencionar que ele se recuperou bem.

Tradução: Thiago “Índio” Silva