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Música

Old Man Gloom Fala Sobre Velhos Amigos, Experimentalismo e ‘The Ape of God’

Com o novo disco a caminho, a ser lançado por um novo selo, perguntamos a Aaron Turner, ex-membro do ISIS, sobre o seu processo criativo, música texturizada e se reunir com amigos das antigas.

Em 2012, após oito anos sumido, o Old Man Gloom se reuniu, de repente e sem cerimônias, e soltou NO, um novo disco da banda. A atitude surpreendente do supergrupo de hardcore/sludge (composto por membros das bandas Cave In, Converge, ISIS, e outras) foi um choque para a comunidade que tanto havia apreciado o trabalho anterior, Christmas. Depois que a poeira baixou, ficou mais evidente que NO era um trabalho de valor, e mais uma vez o Old Man Gloom voltou ao trono como um dos mais coesos supergrupos da música pesada. Dois anos depois, usando como base o impulso gerado por NO, surge o trabalho mais recente da banda, The Ape of God, que será lançado pela Profound Lore/SIGE no dia 11 de novembro. Ouça as novas faixas "Predators" e "The Lash", a primeira fazendo sua estreia.

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Com o novo disco a caminho, a ser lançado por um novo selo, fizemos a Aaron Turner, ex-membro da tão amada banda ISIS e também de Mamiffer, Split Cranium, House of Low Culture e outras, algumas perguntas sobre o seu processo criativo, sobre música texturizada e sobre se reunir com amigos das antigas. Confira abaixo para saber mais.

Além disso, fique atento para o documentário sobre o retorno do Old Man Gloom que será lançado na quinta-feira (17).

Noisey: Uma boa parte dos seus projetos tem elementos ambientes sombrios e/ou estão um pouco para o lado do experimental. O Old Man Gloom talvez seja o seu projeto mais tradicional. A sensação é de que você estava no ISIS, e então a banda acabou, daí você foi entrando cada vez mais fundo no mundo do experimental (não só você, mas a gravadora SIGE também), mas agora há quase um retorno para onde você estava antes.
Aaron Turner: Consigo entender o que você está dizendo a partir de uma perspectiva de quem vê de fora. De uma certa maneira, acho que para mim houve uma certa quebra que foi proposital, no sentido de tentar fazer de novo uma banda de rock pesado. O Old Man Gloom nunca entrou oficialmente em hiato, a coisa só chegou a um ponto em que estávamos cada um em seu canto, e todos ocupados com suas outras bandas. Quando finalmente pudemos nos reunir, acho que eu tinha tido tempo para recarregar as baterias, no sentido de que havia passado algum tempo dedicado a uma música que era essencialmente mais serena, e de algum modo mais experimental.

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Em mim, para falar a verdade, o impulso de fazer música pesada nunca se esgotou, e acho que há alguns fatores circunstanciais, e também a mecânica de se estar em uma banda era algo do qual eu precisava me distanciar por um tempinho.

Tipo, o Mamiffer é uma banda, de certo modo, mas em um nível muito diferente. Não é um elenco fixo de pessoas que estão sempre trabalhando juntas – é basicamente a dupla central, Faith e eu, e mais um monte de outras pessoas que vêm e vão conforme as necessidades ou desejos. Então, parte do que aconteceu em termos de eu fazer coisas de natureza mais experimental, por um lado, e fazer coisas que são mais pesadas, por outro, é circunstancial, e parte também intencional; foi de sentir como se eu não tivesse nada a oferecer no tocante a escrever música pesada.

Até mesmo no último ano, ou nos dois últimos do ISIS, eu simplesmente sentia que era muito difícil para mim escavar qualquer coisa que me deixasse empolgado quando eu pegava minha guitarra, então acho que eu simplesmente precisava me dedicar a outras coisas por um tempo. Isso realmente mudou e expandiu a minha perspectiva, de modo que, quando chega a hora de compor riffs, me sinto cheio de energia e pilhado para entrar em ação.

Faz sentido. Dito isso, por que você voltou para o Old Man Gloom? Poderia simplesmente ter começado um novo projeto.
Nossa história em conjunto é o elemento principal. A gente é amigo há muito, muito tempo; e, como eu disse antes, o hiato que tivemos não foi proposital. Foi só que as circunstâncias das nossas vidas fizeram com que fosse impossível nos reunirmos, e depois chegou uma hora que parecia o momento certo de começar a trabalhar juntos de novo. Na verdade, a coisa nunca passa de surtos intermitentes de atividade extremamente intensa – é assim que a gente funciona, só isso. Acho que funciona bem para todos os envolvidos. Mas a verdade é que a força motivadora essencial por trás da banda é que gostamos de estar próximos uns dos outros, sentindo que somos capazes de criar com grande tranquilidade e com uma alegria espontânea, e é isso que permite que a coisa funcione, e o que a torna divertida. Acho que é isso que gera os resultados que temos. E que, se estivéssemos todos mais ou menos na mesma região, trabalharíamos juntos mais vezes. Mas trabalhamos sempre que podemos, e curtir a companhia uns dos outros, e o resultado dessa reunião, é na verdade o que faz tudo valer a pena para todos nós, acho eu.

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Quando o NO saiu, foi meio que uma surpresa para muita gente. Pareceu uma jogada inesperada, considerando o modo como foi lançado e a fase criativa em que você estava.
A gente basicamente não mencionou o assunto, e então agendamos alguns shows, e basicamente disponibilizamos o disco nos shows. Com certeza queríamos que fosse uma surpresa, e fizemos todo o possível para tentar brincar com as percepções das pessoas do que estamos fazendo, e também com o contexto do mundo em que operamos. Todos esses elementos de pegadinha no que a gente faz são bastante propositais.

Estou curioso sobre o novo disco, e o fato de que, claramente, você é associado ao selo Hydrahead, que meio que ainda está vivo, mesmo que vocês não estejam lançando novos discos e tal. E tem também a SIGE, e a Profound Lore. E você é profundamente associado tanto com a HH quanto com a SIGE. Por que exatamente decidiu sair desse campo – foi por um desejo de se afastar de algum modo de ser o "homem dos bastidores"?
Sim, com certeza. Com exceção da SIGE, que foi criada basicamente com o objetivo de lançar os trabalhos com que Faith e eu estamos envolvidos, a Hydrahead só lançava coisas em que eu estava metido quando eu sentia que não havia outra opção que pudesse fornecer o mesmo tipo de recursos, distribuição e apresentação. Houve casos em que certos projetos meus poderiam ter encontrado algum outro lar, mas para ser sincero senti que as pessoas que talvez fossem receptivas a trabalhar comigo não teriam feito o trabalho tão bem quanto nós somos capazes.

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Em outros casos, houve oportunidades para bandas das quais participei, para a ISIS, ou, nesse caso, a Old Man Gloom, em que senti que havia outras pessoas que curtiam a coisa e que poderiam trabalhar no mesmo nível de qualidade de que Hydrahead ou SIGE são capazes, e em alguns casos oferecer muito mais. O alcance da SIGE e da Hydrahead, neste momento, é bastante limitado; eu faço música porque quero que as pessoas a ouçam, então, se há uma chance de trabalhar com alguma outra pessoa com a qual eu me sinta confortável de trabalhar, estou sempre aberto.

Com a Profound Lore isso surgiu de ter trabalhado em outras coisas junto com Chris. Ele fez um LP ao vivo do ISIS uns anos atrás, acho que foi em 2005 ou 2006, por aí, que foi a primeira vez que trabalhamos juntos, embora eu já o conhecesse anos antes. Essa foi nossa primeira experiência de trabalho, foi uma coisa low profile, sem muito barulho, mas gostei, e sempre curti o que ele fez com a gravadora. Uns dois anos atrás fiz o álbum conjunto de Mamiffer/Locrian com ele, e acho que essa também foi uma experiência muito positiva. Ele foi muito prestativo, ajudou mesmo a promover o lançamento, e essa foi uma experiência legal para todos os envolvidos. Então, quando chegou a hora do novo disco do Old Man Gloom, eu sabia que o Chris tinha gostado do NO, então não perdemos contato, a gente continuou se falando e trocando discos. Começamos a conversar sobre o assunto, e senti que aquele era realmente o melhor lugar para estarmos, porque a Profound Lore é obviamente voltada para a música pesada, mas me parece que eles têm uma abordagem bastante ampla. Com certeza têm uma atitude bem experimental em relação ao que lançam, e parecia um lugar bom para se estar. Acho que, até certo ponto, ele tem um público fixo, e também me parece que tem um alcance amplo o suficiente, de modo que as pessoas que já gostam de nós não teriam dificuldade de nos encontrar.

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Faz pouco tempo tive uma conversa na qual se fez uma comparação sobre a qual eu gostaria de saber a sua opinião. Uma pessoa disse que acha que a Profound Lore hoje é semelhante ao que eram as gravadoras Earache, Relapse e Hydrahead em pontos específicos, no que diz respeito à coerência dos lançamentos, e ter um "selo de qualidade", por assim dizer. Concorda com essa avaliação?
Com certeza. Isso foi um dos primeiros motivos que me atraíram para a Profound Lore. Acho que Chris com certeza tem uma abordagem de curador em relação à gravadora como um todo, não é uma coisa do tipo "ah, vou metralhar para todos os lados, e ver o que consigo atingir". Ele se dedica às coisas que o deixam muito empolgado, e mesmo que os trabalhos dele variem dentro de meio que um espectro amplo, parece mesmo que há continuidade. Seria difícil definir isso, mas com certeza existe, há um espírito por trás da gravadora que fica muito evidente na apresentação e no que eles lançam. Acho que isso é muito importante.

Acredito que Chris está num lugar interessante em termos do espaço que ocupa no mercado, para dizer de um modo tosco, onde ele faz as coisas de uma maneira underground, em que muita coisa ele faz pessoalmente, e não escolhe com base no que acha que pode vender melhor. Em consequência disso, as pessoas prestam atenção nele, e acho que isso é ótimo, pessoas que realmente buscam essa gravadora por ser coerente, e acho que esse é um lugar excelente para estar enquanto banda.

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É bom estar entre outras bandas que estão realmente se superando em termos criativos, e ser parte de algo que tem uma dinâmica forte. Com certeza há muitas outras gravadoras do mesmo porte, ou até bem maiores, mas acho que o coração que bate dentro dela, e a qualidade do que é lançado, são as coisas mais importantes, principalmente nos dias de hoje, em que me parece que ter algum tipo de personalidade e um propósito forte é muito importante.

Entrando no assunto do novo disco, o NO foi meio que um disco de "retorno", por vocês estarem quietos e tal. Agora que estão "de volta", quais são alguns dos seus objetivos com o novo disco? A abordagem de vocês foi diferente em algum sentido?
Acredito que a maior pressão, sobre mim especificamente, foi criativa. Tem algo no qual venho trabalhando com o OMG desde o início, que é a integração de elementos abstratos não-musicais, ou de textura, a uma estrutura musical de metal mais dentro da norma, e como essas coisas podem interagir ou ganhar uma com a outra – o que esse tipo de contraste pode significar para quem ouve, como pode afetar quem ouve. Nesse disco especificamente tentei muito criar uma síntese mais inteiriça desses dois mundos. Em vários dos outros discos, eles eram separados, de uma maneira mais dissonante, tipo copiar e colar, em que há transições abruptas entre ruído ou trechos de música ambiente e as músicas propriamente ditas. Neste disco eu queria muito tentar descobrir como essas coisas poderiam ser fundidas, ou entrelaçadas de modo que realmente se complementassem, e se tornassem mais uma coisa só em vez de uns pedaços que foram meio que costurados um ao outro.

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De uma certa maneira, parte daquela sensação absurda ou surreal dos discos anteriores ainda está presente, e sinto que a inclusão dela ainda é importante. Quero que haja coisas que se destaquem por serem surpreendentes, ou de alguma forma contra-intuitivas em relação às expectativas das pessoas. Num outro sentido, eu queria ver como essas coisas poderiam trabalhar em conjunto. Para mim, foi esse o maior desafio, já que o estágio final da produção é em grande parte onde me sinto em casa.

Além disso, acho que para nós, enquanto grupo, os objetivos continuam a ser os mesmos, se divertir compondo as músicas, produzir o máximo que pudermos no tempo disponível; acho que houve um certo progresso em termos do que somos capazes de fazer, simplesmente porque fomos mais ativos nos últimos poucos anos. Fizemos alguns shows, e sinto que nossa química está tomando um pouco mais de forma por conta disso, então as partes do disco que são músicas mais simples têm um fluxo melhor, e talvez um pouco mais de consistência, ou são um pouco melhores no sentido de "espetáculo".

Para muita gente, compreender a música ambiente, que é texturizada, e tem menos a ver com a composição tradicional de música, e mais a ver com uma espécie de sensação e atmosfera, é um campo em que muitos encontram dificuldade de entrar. Quais bandas ou discos você diria que influenciaram vocês a entrar nesses campos?
Acho que há algumas coisas que ficam no meio termo, que não foram necessariamente "discos fundadores". De uma certa maneira, acho até que foram. Earth Vol 2 seria um exemplo excelente. Escutei esse disco pela primeira vez acho que ali em 1997 ou 98, e ele realmente abriu meus olhos para a possibilidade de uma guitarra que fosse mais que um mero veículo para riffs. Com certeza riffs são essenciais para o arranjo desse disco, mas ele também expande as fronteiras um bom tanto, não há bateria, há uma ênfase pesada no drone, em texturas e na atmosfera, mas por outro lado claramente há uma forte determinação e muita força na música. Então esse certamente foi um dos primeiros exemplos para mim.

Godflesh com certeza seria outro caso em que há muitas evidências nas músicas que não eram necessariamente identificáveis como instrumentos específicos, e parecem mais com ruído do que, tipo, rock. Acho que algumas outras coisas vão meio que por esse caminho, estão em um mundo intermediário, como The Dead C, por exemplo, que tem bateria, baixo e guitarra, mas é uma coisa tão pesadamente abstrata e tão distante do rock em certos pontos que dá meio uma sensação de outro mundo, e tem uma boa quantidade de elementos aos quais se apegar como pontos de referência identificáveis, mas acho que também se aventura longe o bastante de modo a se tornar algo inteiramente diferente.

E também teve mais um pessoal que descobri antes que acredito que foram importantes para mim também, tipo Lull. O Lull ainda tinha o fator do pesado, em termos de atmosfera, mas estruturalmente era completamente distinto de grande parte da música que eu ouvia na época. Swans é outra muito boa, muita coisa da qual eu gostava muito eram as paradas que não eram canções, as faixas mais ambientes, e também o modo como essas coisas eram integradas – aquelas faixas texturizadas, meio que de atmosfera, que lentamente se transformavam em músicas, e as transações que aconteciam eram descobertas tremendamente empolgantes para mim.

Tradução: Marcio Stockler