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Música

O War On Women Está Invadindo a Festinha de Rapazes do Punk Rock

Para o War On Women, gênero (sexual) claramente não é gênero (musical). O fato de um ou mais membros de uma banda serem mulheres não significa que é uma banda riot grrrl.

Acaba de passar das 18h30 e Shawna Potter está sentada em uma van em frente ao Lee's Palace, um teatro transformado em clube punk, coberto de pichações, a algumas quadras de distância da Universidade de Toronto. Ela deveria estar na passagem de som nesse momento – o resto de sua banda, War On Women, está tocando guitarras e bateria do lado de dentro – mas Potter não está preocupada. Esta é a segunda noite seguida em que sua banda subirá ao palco do Lee's Palace e mandará seu estilo tipicamente Baltimoreano de thrash punk. O técnico de som, diz Potter, já sabe o que fazer.

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Potter e o pessoal do War On Women está há dois dias em uma turnê pela costa leste com o Propagandhi e o RVIVR, três bandas que colocam diversidade no espectro do punk político – desde o ataque amplo aos erros do mundo feito pelo Propagandhi até a abordagem do RVIVR das questões pessoais como política. É uma combinação legal para a banda, diz Potter. Eles se sentem confortáveis com seus companheiros de turnê, o que ajuda a suportar as experiências que muitas vezes podem ser marcadas por comportamento machista ou puro chauvinismo – mesmo nos shows punk, onde geralmente espera-se que o público esteja em sintonia com a mensagem da banda que estão vendo.

Para o War On Women a mensagem é clara: o tipo de chauvinismo que eles às vezes presenciam em seus shows é um sintoma da persistente desigualdade em todos os cantos da sociedade, de modo que o feminismo e a luta por igualdade de gênero continua sendo crucial.

Elas não estão sozinhas. Ao longo dos últimos anos uma onda de bandas de hardcore foram catapultadas das cenas locais para selos maiores e listas de destaques ao mesmo tempo em que exibiam firmemente suas inclinações políticas em suas mangas. No momento, muitas dessas bandas falam algo em comum.

Veja bem: gênero (sexual) claramente não é gênero (musical). O fato de um ou mais membros de uma banda serem mulheres não significa que é uma banda riot grrrl ou que o fato de haver membros mulheres afeta o som ou a mensagem ou qualquer coisa da banda. E bandas com membros mulheres que cantam sobre feminismo e política do ponto de vista pessoal têm o direito de fazer isso ser serem classificadas ou rotuladas como um tipo de banda ou outra.

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Agora, isso é verdade: a lista de bandas punk com membros mulheres que ganharam notoriedade nos círculos da música indie é grande e vem crescendo. O hardcore descarado e distorcido do Perfect Pussy penetrou nas paradas da Billboard dias após o lançamento do aclamado pela crítica e profundamente político Say Yes To Love no início deste ano. Deep Fantasy, o novo álbum das punks feministas de Vancouver White Lung, foi lançado e recebeu resenhas resplandecentes e honras de álbum-da-semana. As Priests, dance punks de Washington DC, lançaram seu EP de estreia, Bodies and Control and Money and Power, no selo indie formador de opiniões Don Giovanni Records no início deste ano. E muitas outras bandas, do Downtown Boys, passando por Shady Hawkings, até o Girlpool e por aí vai, povoam o florescente underground punk.

Ainda que existam muitas diferenças, o que todas essas bandas têm em comum é que a política das relações pessoais e, mais especificamente, o feminismo, ocupam a posição central. Por agora, é suficiente dizer que essas bandas existem, que todas fazem canções e letras que falam de experiências comuns a todos e que a mensagem delas é importante tanto para o punk quanto para a cultura em geral.

O War On Women alcançou o sucesso recentemente, assinando com o selo punk Brigde Nine e planejando um novo álbum que deve sair lá para o fim deste ano. O Noisey encontrou-se com Potter antes de ela subir novamente ao palco em Toronto.

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Noisey: Eu sempre fui fascinado com a linhagem das bandas. Quais você considera as bandas que firmaram as bases para o War On Women, seja na música ou na mensagem?
Shawna Potter: Seria errado não considerar a influência que o riot grrrl exerceu em todos nós, ainda que isso possa levar pessoas a fazer comparações diretas, o que eu acho meio bobo. Eu diria que a cena punk de Washington DC dos anos 80 e 90, estando disposta a se posicionar sobre algo – é claro que ela faz parte da coisa. Mas tem também o outro lado em que nós apenas adoramos um bom riff, sabe como é? Como coisas thrash antigas. O que nós não víamos muito por aí e onde achamos que havia espaço pra nós era em casar essas duas coisas – que isso poderia existir, que você poderia ter um bando de garotas em uma banda e ainda assim tocar música pesada, rápida e divertida.

Era bem claro pra nós que esse era o tipo de banda que queríamos formar – a parte da política e a parte de ser alto e pesado – mas não sabíamos muito mais que isso. Simplesmente começamos a compor para ver o que aconteceria. Aí surgiu o Improvised Weapons, basicamente.

Me interesso em como a coisa se formou. Você diz que a política era intencional. O nome War On Women é essencialmente tão direto e político quanto pode ser um nome de banda punk. E há a questão de gênero, à medida que é uma referência a uma coisa específica acontecendo a um gênero específico. Como a banda chegou a esse nome?
Acho que nos círculos do hardcore feminista esse era um termo que já vinha sendo usado. Mas nós começamos a compor músicas e nos encontrar nos ensaios antes do termo “war on women” (guerra contra as mulheres) se tornar tão conhecido. No último grande ciclo eleitoral ele passou a ser mencionado pela grande mídia. Então tudo fez sentido. Ainda que as pessoas possam considerar coisas como o assédio de rua como uma questão superficial e sem consequências, como se não fosse grande coisa, chamar a banda de War On Women e falar sobre as coisas que falamos é apresentar a ideia de que todas essas coisas se assomam a uma questão maior. Estamos tentando salientar a ideia de que há esta coisa maior operando, e isso é uma guerra às mulheres, e cada pequena coisa que acontece é parte disso. Talvez nem todos percebam todas as facetas, e as experiências de cada um são diferentes. Em diferentes países, continentes, línguas, culturas, a coisa funciona de forma diferente. Mas isso não significa que não está lá, e não estamos todos conectados.

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Qual você espera que seja o seu público?
As bandas que eu gosto escrevem canções sobre coisas que eu não tenho ideia do que sejam até eu comprar o disco porque gostei do riff ou algo assim. Da forma menos pretensiosa possível eu posso dizer o seguinte: é claro que eu espero que alguém possa absorver algo das nossas canções e que isso as faça pensar sobre algo de forma diferente. Mas ao dizer isso eu espero que eu faça o mesmo quando ouvir o novo disco do Propagandhi. Essa é a beleza de qualquer tipo de arte: tentar lançar uma luz sobre algo e levar uma ideia ao conhecimento das pessoas que, se não fosse por isso, poderiam não tê-la conhecido.

Então eu não acho que temos um público ideal em mente. Queremos escrever canções para nós mesmas, certamente. Queremos escrever canções que a gente goste. Mas eu gosto da ideia de dar a mais mulheres a permissão de gostar de música pesada, de dar a elas uma opção que não está obviamente tentando excluí-las. Porque isso é algo real. Algumas pessoas desanimam com música pesada, porque ela não é apenas pesada, é o pacote completo de ser agressiva, machista e para homens. É assim muitas vezes, ainda mais no esquema ao vivo DIY. E isso pode desanimar as pessoas. Então queremos das às mulheres uma opção para música pesada, e falar sobre coisas relacionadas a elas. E quem já gosta de música pesada nós esperamos que goste da gente também. Talvez absorvam algo. Talvez nossas mensagens feministas penetrem em seus cérebros e nós transformemos eles todos em aliados homens.

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Você acha que o punk ainda é um clube do bolinha?
Acho sim, mas não só por ser punk. A maioria das coisas, o mundo, ainda é meio que um clube do bolinha. Não é que a culpa seja do punk, nem que seja algo específico ao punk. É algo que nós temos que trabalhar em cada comunidade da qual fazemos parte, ou em cada cena com a qual nos importamos. Temos que trabalhar para fazê-las mais inclusivas para mulheres e pessoas LGBTQ. Pra mim, o verdadeiro significado do punk é ir contra a norma social e o que é determinado aceitável pelo mainstream. Aceitando essa definição, não há nada mais punk que uma trans mulher, ou uma pessoa genderqueer cantando sobre coisas que importam pra elas.

Eu espero que possamos fazer parte desse espírito. Há tantos grupos pelo país criando essas coisas maravilhosas e criando esses espaços progressistas e inclusivos. Hoje em dia talvez ninguém coloque dinheiro nisso, mas está lá. O fascinante sobre a época em que vivemos é que você pode encontrar quase qualquer coisa, em qualquer comunidade, na internet ao menos. Então esperemos que a ideia de que isso é possível, de que você pode formar uma banda e criar essa cena você mesma e que não precisa ser simplesmente uma festinha de rapazes atraia mais pessoas e que mais pessoas sintam que podem fazer parte disso.

Quero dizer, é revigorante! Eu venho tocando em bandas já faz uns 15 anos, e ainda me surpreendo quando uma cena é tão fascinante e inclusiva. Isso me deixa muito feliz.

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Na mesma linha, é animador sair em turnê com bandas como RVIVR e Propagandhi?
É legal. Você ainda tem que lidar talvez com alguém no público que não entende bem, ou está bêbado e fazendo piadas “engraçadas” que se você conhecesse eles talvez você risse, mas você não conhece então fica: eu não sei qual é a tua, você está sendo esquisito. A gente se acostuma, isso vai acontecer, porque é a vida, é a realidade. Mas é muito legal não ter que se preocupar que as bandas com quem você está excursionando digam algo esquisito ou tenham alguma opinião estranha sobre os direitos da mulher, ou saúde reprodutiva, ou pessoas LGBTQ. Eu não preciso me preocupar com o RVIVR e com o Propagandhi. Essas bandas entendem. Estamos todos no mesmo time, e isso é revigorante. Torna as coisas fáceis. E eles são todos muito legais! Posso te dizer o quão legais para caralho essas duas bandas são? É ridículo.

Ao longo dos últimos anos houve essa procissão de bandas que têm mensagens bem parecidas, essencialmente sobre feminismo e igualdade de gêneros. Você vê semelhanças entre essas bandas? Você sente afinidades em relação a essas bandas e a essa mensagem em particular?
Eu me sinto muito afortunada, feliz e grata de que as pessoas estão dando atenção a mais de uma banda que têm mulheres na formação. Minhas ideias são mais sobre a mídia e a forma que estão cobrindo essas bandas e permitindo que mais de uma banda com mulheres na formação esteja em listas de top 100 e coisas do tipo. Acho que isso quer dizer alguma coisa, que talvez tenhamos passado da fase de: ó, nós já temos uma banda com mulher na formação tocando essa noite, então não dá pra marcar mais uma. Ou: só bandas de mulheres podem tocar juntas em uma noite. Sabe como é? Digo, tratar gênero como sexo!

Como vocês acabaram entrando para o rol da Bridge Nine?
Acho que desde o começo nós achamos que a Bridge Nine seria um lugar perfeito pra gente, levando em conta as bandas que eles têm; eles têm artistas mulheres e bandas lideradas por mulheres. Não têm medo disso. E eu acho que eles são ótimos em apoiar suas bandas, divulgá-las em publicidade e fazer as pessoas saberem que suas bandas existem.

Nós somos amigas do pessoal do Lemuria. Nós só ouvimos coisas boas sobre a experiência deles com a Bridge Nine. Então, sabe como é, eu enviei nosso disco e algumas demos para alguns selos, e eles foram um dos selos que responderam: “sim, estamos interessados, vamos conversar mais”.

O maravilhoso, incrível, fascinante disso é que eles nunca tinham nos visto ao vivo quando assinamos.

Uau. Isso é incomum.
É incomum, e é por isso que estamos tão empolgados em ir tocar na cidade deles, em Boston, nessa turnê. O timing não poderia ser mais perfeito. Nós de fato iremos até a Bridge Nine encontrar todo mundo, e eles vão ver a gente, o que é muito legal. Mas sim, a banda parecia se encaixar bem com o selo, parecia que podíamos apoiar um ao outro. Eles estão bem alinhados com a mensagem, então nós estamos bem empolgadas.

Ron Knox está no Twitter @ronmknoxDC