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Música

Andando Sem Roupas de Baixo e Com Cordas Vocais Dignas de Um Jim Morrison: o Diário Final da Turnê de Buzz Osborne

Em seu último registro de sua turnê acústica solo, o frontman do Melvins dá um rolê pela Costa Leste e sobrevive.

Em seu último registro de sua turnê acústica solo, o frontman do Melvins dá um rolê pela Costa Leste e sobrevive. Se você perdeu, dá um confere nos textos anteriores: Parte 1, Parte 2, Parte 3 e Parte 4.

Portland, Maine

Em uma turnê dessas, ou seja, uma em que tudo que você traz é um violão e você mesmo, fica bem claro que baixo e bateria têm uma responsabilidade gigantesca. Estou aqui sozinho sem bateria e baixo para me esconder, então é tudo comigo.

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Mas ok, tô preparado.

Chegamos em Portland por volta das cinco da tarde para o show daquela noite. Fiz a passagem de som e então Dave e eu fomos até a orla e comemos uma saladinha junto com umas tortinhas de siri em um barco-restaurante…

Acabamos sentado do lado de fora, num calor desgraçado, porque o tempo de espera para uma mesa na área interna, com ar-condicionado, era de uma hora e meia.

O Maine é um lugar esquisito. Muito remoto e meio confuso, mas é excelente pra tocar com fãs empolgados que sempre nos trataram com respeito.

Eu gosto daqui.

Já que estávamos comendo em um barco, por algum motivo minha mente viajou com imagens de um deus tribal atlante saindo da água e matando todos nós.

Tive a visão de cada uma das crianças da cidade estripada por esta besta enquanto seus pais assistiam sem poder fazer nada e imploravam por misericórdia quanto à vida patética de suas crianças, mas misericórdia era um conceito desconhecido para este monstro atlântico e ele matou a todos, um a um.

Então ele assava os pais bem devagarinho sobre um buraco de 900 m cheio de fogo infernal, um fogo quente o bastante para eventualmente matar, mas não rápido, não senhor, de jeito nenhum, não antes de seus olhos explodirem e de cada pedaço fedorento de suas peles derretesse, gotejando sobre o fogo. Esta, é claro, uma forma inacreditavelmente dolorosa de se morrer que agrada à besta e assim que todos os moradores da cidade estiverem mortos, o monstro incansável subiria ao ponto mais alto do centro do Portland e tacaria fogo em toda a cidade e no campo em todas as direções possíveis, por quilômetros.

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Ele senta bem no meio deste inferno, contente com a situação, respirando silenciosamente o cheiro acre de prédios em chamas, árvores e carne humana assada, satisfeito por completo com seu massacre purificador.

Eu quase podia ver tudo rolando bem diante dos meus olhos quando a garçonete interrompeu minha convalescência ao perguntar se queria um refil do meu chá gelado sem açúcar.

Voltei caminhando sozinho até a casa de show, toquei e foi bem bacana. Gosto de tocar em Portland e acho que mandei bem.

Chovia forte depois e fomos de carro em silêncio absoluto, com exceção do limpador de para-brisas e do barulho de estrada molhada como nossa trilha sonora desoladora.

O próximo dia era de folga.

Começamos pela manhã em um restaurantezinho esquisito o qual acabamos frequentando por três manhãs seguidas. Eu sempre pedia a mesma omelete vegetariana com torrada “surpresa” todas as vezes. Amo torradas surpresa. Explico: torrada surpresa é quando você deixa a garçonete decidir que tipo de torrada você vai comer.

Numa dessas manhãs rolou um muffin inglês.

Chegamos no Brick House em Dover, fizemos a passagem de som, jantamos lá mesmo e assistimos a um jogo de baseball até que fosse hora de abrir.

O show foi foda. Muitos fãs com cara de caipira gritando bem na frente.

Subi no palco me sentindo como uma versão bizarra do messias leproso de David Bowie. Os fãs faziam barulho e não pararam nem mesmo por um segundo.

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Toquei em uma casa noturna que não conhecia na outra noite, em Boston, e a experiência foi o completo oposto do que rolou em Dover. O público em Boston foi bem respeitoso e ouviu as músicas ao invés de gritar feito retardados. Valeu Boston!

Em alguns locais mais afastados parece que a seriedade e o realismo foram pro brejo e monstros bárbaros estão livres para fazer o que bem entenderem como se fosse normal, porém o típico morador da cidade com consciência social tem uma agenda própria que pode ser até pior e geralmente se resume a repetir o balbuciar insano daqueles que vivem enfurecidos.

Isto se manifesta no morador da cidade agora vivendo em um período de irracionalidade generalizada. Oportunistas reconhecem este tipo de estupidez e vão seguindo de acordo com ela, logo fica MUITO mais fácil para eles dizerem coisas que simplesmente não são verdadeiras para levarem suas carreiras adiante.

Este fato passa desapercebido pelo cidadão típico e este é engambelado e perde seu suado dinheiro bem mais rápido.

Estes cidadãos se sentem bem com este rebuliço porque sentem que estão fazendo uma diferença, enquanto os sempre enfurecidos faturam aqueles milhões e passam seu tempo em condomínios fechados distantes do povão o máximo possível porque, no final das contas, todos os animais são iguais, mas uns são mais iguais que os outros.

Em Pawtucket fiz meu único show de abertura de toda a turnê tocando com o Dinosaur Jr. e realmente serviu pra me mostrar o quanto não quero mais fazer muito disso no futuro.

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Não me entenda mal, eu curto muito Dinosaur Jr. e gosto muito de cada um dos membros da banda, só não gosto de tocar violão na frente do público dos outros. O público não deu a mínima e ficaram fazendo barulho durante toda a apresentação.

No fim das contas, não fez sentido nenhum tocar ali e de forma alguma isso é culpa da banda, na verdade, eles fizeram um show ótimo!

Acho que preferiria tocar pro pessoal que vai nos shows acústicos do Jay ou Lou mesmo.

Quem sabe um dia.

Depois da apresentação, um fã do Dinosaur Jr., em consolação, disse que eu deveria pensar em meter uns covers do Doors no lugar de algumas das minhas músicas porque eu tenho “as cordas vocais dignas de um Jim Morrison”.

Até onde sei, nunca estive em Hamden, Connecticut, mas de qualquer forma estava prestes a tocar lá.

Ficaria bem mais do que feliz em tocar lá de novo no futuro.
Baita show!

Nova York, Nova York

Cheguei em Manhattan com um desejo intenso por confusão, mas tudo isso foi deixado de lado quilômetro após quilômetro de engarrafamento, enquanto rumávamos para o hotel em Jersey.

Nós NUNCA ficamos em Manhattan e não é preciso ser um gênio para entender o porquê. Os quartos ali são os mais caros dos Estados Unidos e tudo que é lugar mete no seu rabo cobrando até US$60 por carro/noite, o que dá um total de US$400 por quarto pra ficar num lugar de merda. Foda-se isso.

Tivemos muita sorte naquela noite na Santos Party House ao conseguir uma vaga bem na frente do local! Deu vontade até de comprar um bilhete de loteria.

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Hoje em dia Manhattan é pouco mais que um playground de gente rica. Além de conseguir um apartamento com aluguel decente, conseguir um lugar pra estacionar está no topo de grandes prêmios em Nova York.

O que me impressiona é que esses bobões de Nova York nunca imaginam que a razão pela qual os aluguéis lá são tão altos é POR CONTA do esquema de controle de aluguéis em pirâmide. Além de condomínios de luxo, não há razão alguma para se investir em moradia na cidade com tantas restrições. Não há incentivo porque não dá pra ganhar grana com isso, aí adivinha? Eles não investem.

Historicamente, a escassez de qualquer coisa é precedida por controle de preços.

Dã…

Meu show no Santos foi bem divertido com um público bem receptivo. Adoro isso.

Apesar de todo o resto, minha experiência em tocar nesta cidade quase sempre foi excelente. Digo quase porque odiava tocar naquela merda de CBGB. Não importa o que me digam, era um buraco. Fácil fácil uma das piores casas noturnas de todos os tempos.

Eu sei que isso é blasfêmia, mas nem ligo. Nos trataram mal pra cacete, o lugar todo era mais sujo que um puteiro em Tijuana e o PA superaquecia e desligava a cada dez minutos durante nosso show, que estava com ingressos esgotados. Além disso, eles foram babacas desde que chegamos, como se fôssemos tocar no Madison Square Garden ao invés de uma espelunca no Bowery. Aquela foi a última vez que botei os pés naquele lugar.

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Se alguém quer fingir que tá tudo bem por conta da história ali, beleza. Me diverti bem mais nos shows dessa turnê aqui do que naquela porcaria de CBGB.

Sendo bem sincero, adoraria passar com um trator no meio daquele lugar quando ele fechou ou, melhor ainda, ANTES de ter fechado! Rá!

Já vai tarde.

Na outra noite toquei em um clube do Brooklyn chamado The Wick and the Well que tinha uma vibe meio prédio bombardeado muito massa, resultado dele ter sido mesmo bombardeado.

A primeira coisa que notei é que parecia que o lugar inteiro tinha a fiação feita com extensões penduradas e a parte interna, olhando de perto, parecia ser coberta com uma fina camada de pó de amianto.

Acho que eles estão no meio de uma reforma, ou ao menos espero que estejam.

Não tinha nenhum pingo de isolamento no local, nem ar-condicionado.

Maravilha.

Show quente PRA CACETE.

Pelo menos um fã subiu no palco e pude ver a poeira de amianto espiralando ao meu redor o set inteiro.

Se eles planejam instalar algum tipo de isolamento, ar-condicionado ou aquecimento eles provavelmente pagarão dezenas de milhares de dólares e não vejo isso acontecendo em um futuro próximo, então futuros pagantes podem esperar temperaturas escaldantes durante todo o verão e frio de gelar os ossos no inverno.

É tipo acampar.

Uma pá de gente legal, porém, e o show foi foda.

Antes de entrar no lugar percebi que estavam colocando pregos na parede atrás do bar para poder pendurar sua recém emoldurada licença para vender bebidas.

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Na outra noite rolou uma treta com um fã no meu show na Filadélfia.

Eu estava contando uma longa história com o [Mike] Patton e ele continuava gritando “cala a boca e toca alguma coisa!”

Fazia sentido, mas foi grosseiro mesmo assim.

Isso só tornou o tempo de espera pela música mais longo porque aí fiquei falando, falando, falando…

Será que um dia as pessoas aprendem?

Baltimore, Maryland

Terra de John Waters e, é claro, do Ottobar. Há muito tempo tocamos lá e sempre é divertido e não vejo nem pra que tentar tocar em outro canto de Baltimore.

Baltimore, aliás, é um lugar esquisito. A maior parte da cidade parece prestes a explodir em chamas, desmoronar ou à beira de uma guerra racial.

Dave e eu comemos em um lugar bacaninha pertinho do local do show com uma garçonete ranzinza que resmungou que havíamos chego tão cedo que os pratos do dia ainda não tinham como ser servidos.

Enquanto ela saía, derrubou o bloquinho com os pedidos e, quando se inclinou para pegá-lo, reparei que suas calças dividiam a bunda inteira…

E ela não estava usando calcinha…

Foi como olhar para o sol.

Charlottesville, Virgínia

Fizemos um passeio de carro interessante em autoestradas de duas pistas cercadas por belas árvores decíduas e valas profundas nos dois lados da pista cheias de lixo.

O local do show em si era meio subterrâneo e tinha um jeito meio de casa que deu certo.

Um dos amigos do Dave até foi de moto no show, vindo lá de Richmond.

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Já que ele planejava encher a cara depois, havia reservado um quarto no mesmo hotel que a gente e nos acompanhou até lá depois do show sob uma tempestade violenta. Era uma viagem de uns 50 km e assim que chegamos lá, ele estava completamente ensopado.

Vi tudo pelo retrovisor, horrorizado enquanto ele era atacado pela água que era rebatida pela nossa van.

Charlotte, Carolina do Norte

Toquei em um lugar que parecia um cinema antigo misturado com uma filial do Bennigan’s. Certeza que era um cinema antigo em uma de suas vidas passadas, mas a pegada Bennigan’s tinha chegado com tudo.

Tenho tocado no Cat’s Cradle há mais de 20 anos, então sempre fico feliz de voltar. Eles comandam o lugar muito bem e tornam nossas viagens à Carolina do Norte bacanas e sem nenhum incômodo.

Desta vez eu toquei em um clube novo, menor, dos mesmos donos, e foi bem divertido. Fizeram um puta trabalho em reformar o que provavelmente era um armazém imundo, transformando-o num lugar muito legal de se tocar ou assistir a um show.

Toquei com vontade e falei sobre Jesus em algum dos intervalos. Acho que foi uma citação do Marquês De Sade sobre como Deus deixou aquilo acontecer com o próprio filho, então o que vocês acham que ele faria com a gente?

De fato…

Tivemos um dia de folga longo dirigindo até Atlanta e chegamos bem no finzinho da tarde, quase no começo da noite.

Brian e eu tivemos um bom jantar, sem pressa, e falamos de diversas coisas mundanas.

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Acho que o Brian é um artista inacreditavelmente talentoso com um quê de humor que não é comum nessa galera que faz pôsteres.

Um senso de humor com qual me dei bem de cara logo que vi seu trabalho há mais de 30 anos, baseado essencialmente na Revista Mad dos anos 70, algo que entendo completamente.

Acho que muita gente não percebe isso, incluindo os bobalhões que foram seus parceiros de banda ao longo dos anos.

Isso é um erro.

O show em Atlanta foi em um complexo subterrâneo, tipo um bunker, com um número ok de pessoas, que aliás eram barulhentas demais pro meu gosto. Mas não me entenda mal, fico feliz de tocar pra qualquer um.

Mesmo com aquela leve irritação foi, com certeza, bem melhor que o primeiro show que fizemos em Atlanta há 28 anos, quando abrimos pro RKL e DOA. Dois dos caras do RKL agora morreram por conta das drogas então isso diz bastante sobre o estilo de vida deles na época. Os caras do DOA foram cuzões e nada mais.

Sempre odiei aqueles desgraçados.

Eu já havia esbarrado com o pessoal do DOA antes daquele show e nenhuma das vezes foi legal, além do que, eu não aguentava aquele blábláblá pseudo-político deles que nada mais era que bobagem comunista em torno de asneiras juvenis anti-guerra e músicas sobre dividir a grana de todo mundo menos a deles.

Algo que seria comprovado belamente ao fim da noite.

Na época eles sempre tentavam conseguir algum apoio pros doidos com os quais estavam afiliados de alguma forma, como os “Cinco de Vancouver”, que na época foram presos por incendiarem, dentre outras coisas, lojas de filmes pornôs.

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Pesaaaaado…

De qualquer forma, tocamos e no final de tudo, o DOA, é claro, era responsável por dividir o pão, nos dando US$25 pra rachar com os caras do RKL.

US$12.50 pra cada.

Maravilha.

Deus do céu, continuo puto.

Estávamos a 5.000 quilômetros de casa, sem dinheiro e dirigindo uma van Dodge 1972 baqueadíssima que vazava constantemente qualquer líquido que se colocasse nela.

Só queria tacar fogo naqueles canadenses do caralho.

Birmingham, Alabama

Toquei no Bottle Tree, onde já estive muitas vezes. Lotaram o lugar com peças de arte altamente irônicas, peças publicitárias clássicas e pôsteres hilários, o que é muito mais interessante do que o interior preto da maioria dos lugares.

Os caipiras ficaram gritando o show inteiro.

A caminho de Nova Orleans, no outro dia, conversamos sobre como era esquisito estar no meio do verão, e não foi até chegar na maldita Louisiana que havíamos sentido o calor desgracento do verão sulista.

Você nunca vai ouvir a gente reclamando disso, não senhor, é do caralho!

Estava preparado para cair na estrada este verão e suar minhas bolas por sete semanas seguidas, mas isso não tinha rolado até agora e estávamos confortáveis demais.

Aparentemente é tudo resultado do “vórtice polar” ou, como nós o chamamos, “Kotex polar” [absorvente feminino dos EUA].

Normalmente, em julho, a maior parte dos Estados Unidos é um pesadelo calorento de umidade horrorosa que torna a vida miserável para qualquer um durante meses. Felizmente, o Kotex polar tem impedido o ar quente de seguir em frente e chegar à parte central do país.

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Esquisito.

É interessante ver que os fatos parecem ser opcionais no falatório dessa galera do aquecimento global, que se enrola toda pra explicar o que acontece.

Agradeçamos ao Kotex!

Tivemos um dia livre para ir até Nova Orleans e chegamos no começo da noite depois de consertar o medidor de pressão dos pneus da van.

Estava mais quente que sauna turca quando chegamos lá. Dirigi a noite a inteira. Ouvimos o disco Blue Valentine, do Tom Waits, duas vezes, e muito Porter Wagoner.

Passei a viagem me concentrando em manter a velocidade bem em cima do limite porque tenho uma teoria de que nenhum policial interestadual vai te parar por no máximo por uns 8 km/h a mais.

Talvez o façam, mas eu duvido.

Claro que não precisam de um MOTIVO pra te parar. Eles inventam esses pelo meio do caminho.

Fecho a porta do meu quarto, ligo o ar no máximo, desfaço minha humilde mala, arrumo a cama do meu jeito, algo que faço sempre que chego em qualquer hotel, fecho as cortinas, tiro a roupa e apago na cama enquanto escuto o barulhinho do ar-condicionado que parecia estar cantando bizarramente, algo que só dava pra perceber ficando parado e prestando o máximo de atenção.

Havia um ritmo e fluidez de cara que achei ser constante, mas depois de um tempo percebi que era só um barulho aleatório. Nada de mágica e certamente nenhum sinal de ritmo universal.

Me virei para a TV, que estava ali, como um espelho preto ao contrário.

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Se entro num quarto sozinho como estava hoje, a TV continuará desligada. Quase nunca ligo o aparelho em hotéis a não ser que esteja passando algum jogo de baseball, mas raramente tenho paciência de passar por centenas de canais em busca de um jogo aleatório que talvez nem exista. Não aguento nem a ideia de até mesmo SABER COMO fazer isso, quanto mais fazê-lo.

Praticamente não sei do que passa na TV ou que tipos de produtos são anunciados nos comerciais. Não presto atenção nisso desde antes de sair da casa dos meus pais, no começo dos anos 1980.

Minha esposa e eu tivemos TV por assinatura quase 15 anos atrás, e quase nunca assistíamos porque sempre estávamos ocupados com outras coisas e sem tempo livre para desperdiçar vegetando na frente daquilo. Se paramos pra assistir algo, é algum evento o qual planejamos com antecedência, então nos livramos da assinatura. Eu prefiro gastar essa grana na conexão de internet mais rápida possível, ir ao cinema ou comprar DVDs.

Encontrei Brian depois e jantamos bem ali mesmo no hotel.

Enquanto estava sentado no saguão esperando ele se materializar de lá de cima, vi um hippie com uma mochila de acampar gigantesca sentar de pernas cruzadas no chão, comer três rosquinhas recheadas com geleia e beber um líquido marrom de uma garrafa marrom dentro de um saco de papelão marrom.

Como de costume, o show em Nova Orleans lá no One Eyed Jack’s foi demais e caímos fora da cidade entrando pela interestadual 10, correndo o máximo possível até o Texas.

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Eu pensava sobre Nova Orleans e tudo que fiz desde meu primeiro show lá em 1986, enquanto dirigia pela noite negra de Louisiana. Nova Orleans é uma cidade que sempre nos aceitou e sou grato por isso.

Vejo vocês no Halloween!

Chegamos em Houston e tentei cortar o trânsito, que parecia engarrafado por quilômetros. Ficou claro o porquê quando finalmente chegamos no local e descobrimos que a casa de show ficava entre o estádio de baseball do Astros e um puta estádio de futebol, ambos com jogos prestes acontecer.

Jesus amado, que zona…

A região estava infestada com fãs grotescos de esportes.

Algo que só piorou quando tentamos comer algo.

Fomos a alguns bares depois da passagem som só pra dar de cara com multidões de entusiastas de esportes altamente inebriados lotando qualquer buraco, não importando quão imundo fosse ou quão feia parecesse ser a comida.

Não existia a possibilidade de uma refeição e não tínhamos como ir de carro a canto nenhum.

Fazer o que…

Costumava adorar praticar esportes, mas larguei de mão porque comecei a odiar gente que os praticava.

Aqui, cercado dessa gente, fica óbvio porque também odeio quem assiste esportes.

Austin, Texas

Toquei no Red Seven, que tinha um misericordioso ar-condicionado, graças a Deus, porque tava quente demais lá fora. O show deu bastante gente e rolou suave. Deu merda no meu violão uma hora e tive que trocar, algo que ODEIO fazer, mas segui em frente.

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No geral, Austin sempre é um lugar legal de se tocar.

No outro dia comemos em uma churrascaria que supostamente tinha “o melhor churrasco em Austin”. Não sei quantas vezes já ouvi a mesma coisa sobre um monte de outros restaurantes espalhados pelo Texas e preciso admitir que…

Todos são iguais.

Assim que você afoga seja lá qual for a carne que está comendo em molho barbecue, poderia muito bem ser papelão porque não faz muita diferença dali em diante.

PRONTO, FALEI.

Churrasco é tudo igual, só muda o molho e, mesmo assim, não faz diferença.

Discutir isso é loucura.

Mais tarde, em San Antonio, fomos a um restaurante grego na mesma rua do local do show.

E por falar nisso, parecia que o lugar em que toquei em San Antonio NUNCA havia sido varrido e o palco era ainda pior. Coberto de sujeira e meleca de sabe Deus o quê. A área ao redor do palco estava abarrotada de equipamentos quebrados, latas de tinta e lixo mesmo.

Muito estranho.

Já vi paradas de ônibus no centro que eram bem mais limpas, mesmo com um mendigo bêbado a usando como casa.

Sabe, alguém É DONO deste lugar e escolhe deixar assim, o que acho incrível.

Com certeza existem funcionários que poderiam ser ordenados a limpar tudo, mas acho que o proprietário nunca pensou nisso, ou talvez queira deixar assim porque ele CURTE a coisa toda imunda, nojenta mesmo, sem nenhum centímetro livre pra que alguém possa ao menos querer se encostar.

Com isso em mente, imagine como era o banheiro…

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Sabiamente utilizei o banheiro masculino no restaurante grego e mijei no estacionamento dos fundos antes de subir no palco.

No outro dia tínhamos uma longa viagem pelo Texas na gloriosa interestadual 10, que é a minha estrada favorita por algum motivo.

Dirigimos o dia inteiro e chegamos em El Paso, no meio do caminho para Tucson.

Depois de me aconchegar em meu quarto, encontrei os caras pr’uma refeição mexicana decente em um restaurante que nos foi recomendado pela amigável equipe do hotel.

Pedi uma saladinha de entrada, e, de acordo com o garçom, foi a primeira vez que alguém a pediu.

Pensei em voz alta porque diabos aquilo ainda estaria no cardápio, mas aí o garçom já estava voltando com uma bandeja cheia de bebidas com oito margaritas em doses duplas, distribuídas a quatro latinos que esperavam seus pratos.

Fiquei impressionado! Duas margaritas duplas pra cada um.

Não é surpresa que o garçom nunca tenha visto a salada antes, porque é óbvio que essa turma não tinha tempo pra essas coisas.

O show de Tucson foi no grandioso Club Congress.

O lugar foi totalmente reformado desde a última vez que estive lá e, até agora, é o melhor clube que já vi em Tucson.

Fiz a passagem de som e então Dave e eu comemos no restaurante anexo, que era ótimo.

Depois, voltei ao salão principal e dei ao Brian um pedaço de torta de limão e merengue.

Voltei à van e passei um tempo antes do show ouvindo as masters do nosso novo disco, Hold it In.

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Uma hora e meia depois, toquei e arrumei minhas coisas, e minha noite foi basicamente isso.

Último show da turnê nos EUA!

A viagem de carro ao oeste pelo deserto foi longa e parecia ainda maior do que deveria, mas atribuí isso ao fato de ser a última data da turnê e eu estava meio ansioso, o que é estranho porque eu nunca tenho esse medo de fazer turnês ou tocar.

Vai saber, né?

Já tinha ido ao Pappy and Harriet’s antes e tinha me divertido, então estava ansioso por esse show.

O pessoal que trabalha lá é muito simpático.

O deserto tem um clima esquisito, lógico, e o clube também tinha uma foto emoldurada do Gram Parsons na parede, que nestas pradarias é meio que o santo padroeiro dos playboyzinhos drogados escrotos que morreram cedo demais rodeados por farinheiros mocorongos e traficantes vagabundos.

Maravilha…

Bem, ao menos ele nos deixou uma rica biblioteca de música com toques country medíocres que todo mundo ama e fala bem pacas, apesar de nunca ouvir. Rá!

É esse o fim de tudo?

Você acaba tendo uma overdose em um hotel escroto com nada além de uns babacas como companhia?

Foi exatamente o que aconteceu com Gram.

Mãe do céu…

ENTÃO, estes mesmos babacas roubaram seu corpo infeliz do aeroporto de Los Angeles, trouxeram até aqui no deserto e tacaram fogo nele depois de jogarem no meio de uma vala cheia de lixo próxima de uma autoestrada de mão-dupla no meio do nada.

Patético e adequado, acho.

Pensei nisso tudo na volta pra casa em Los Angeles após o show.

Foi uma bela noite e dirigi o mais rápido que pude e me senti seguro longe do deserto e de quaisquer outros mistérios tenebrosos que ficaram ali queimados e se esvaindo no calor escaldante daquele pesadelo esquecido por Deus.

Esta parte da minha turnê tinha acabado e eu estava ansioso por uma semana em casa com minha mulher e cachorros.

Eles não me querem morto em um buraco no deserto.

Uma gloriosa semana de folga antes da próxima parte da turnê.

Uma turnê acústica solo que me levará quando eu tiver viajado o mundo todo.

Tradução: Thiago “Índio” Silva

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