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Música

Do Hardcore Stoner à Horta de Tomates, o Clutch Envelheceu Bem – e Vai Tocar em SP

Por que não aproveitar para fazer uma bela de uma entrevista com os caras, não é mesmo?

Com mais de 20 anos na estrada e 10 discos na bagagem, o Clutch desembarca para fazer o seu primeiro show no Brasil (e na América do Sul) no próximo domingo (3) no Cine Joia, em São Paulo, dentro do festival Converse Rubber Tracks Live, que também traz ao país uma miríade de artistas internacionais de diferentes gêneros, incluindo Busta Rhymes, Dinosaur Jr., The Sword, Fucked Up, Classixxx e mais.

A banda de stoner do estado americano de Maryland é um caso raro: conta com a mesma formação desde o seu início, na primeira metade dos anos 1990, quando ainda tinha uma pegada mais hardcore e fazia turnês com nomes como Sepultura, Fear Factory e Fudge Tunnel.

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Recentemente pude falar com o vocalista Neil Fallon sobre esse show em SP, o próximo álbum dos caras, quais discos (e shows) mudaram a sua vida, a influência do Bad Brains no som da banda, e também sobre sua pequena plantação de tomates, entre outras coisas.

Noisey: Essa será a primeira vez do Clutch no Brasil. Queria saber como isso aconteceu. Pelo que tinha falado com o Jean Paul (baterista da banda), essa já era uma vontade antiga da banda.
Neil Fallon:Bom, para ser honesto, nós estamos tentando ir ao Brasil há uns 20 anos (risos). Sobre como aconteceu, a Converse falou diretamente com a gente. Foi algo que aconteceu do nada. Nós já tínhamos marcados todos os nossos shows até o fim do ano, porque estamos escrevendo um disco novo. Mas pensamos que era uma oportunidade boa demais para deixar passar. Foi mais ou menos assim que aconteceu.

E o que podemos esperar do show? Talvez algumas músicas diferentes do que vocês costumam tocar?
Bom, será difícil porque vai ser a nossa primeira vez tocando no Brasil. E acumulamos 10 discos nesse tempo todo. Provavelmente vamos tocar bastante coisa do Earth Rocker (2013) porque é o disco que estamos promovendo, mas vamos tentar colocar pelo menos uma música de cada disco anterior já que nunca estivemos aí.

Vocês vão tocar em uma pequena casa de show em São Paulo, onde costumava ser um cinema japonês. Onde você acha que a banda se sai melhor, em locais menores ou maiores?
Você disse que é um antigo cinema japonês? [Risos] Legal, cara. Bom, provavelmente nos saímos melhores em pequenas casas de shows porque é onde nos sentimos mais confortáveis. Já tocamos em arenas e grandes festivais, mas os locais menores possuem uma intensidade que você não consegue em nenhum outro lugar.

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O show de vocês por aqui terá abertura do The Sword, uma banda com quem vocês já fizeram vários shows. Queria saber mais sobre a relação entre as duas bandas.
É, já fizemos várias turnês com o The Sword. Acho até que saímos em tour juntos na época do primeiro disco deles, meio quando eles estavam começando, há um ou dois anos. Desde então, fizemos várias turnês juntos. Eles são bons amigos, nos damos bem e também gostamos muito da música deles. Essa é uma combinação rara.

E foram vocês que escolheram eles para tocar no Brasil? Ou a própria Converse decidiu isso?
Acho que apenas há uma pessoa na Converse com um ótimo gosto musical [Risos].

E você vai conseguir ver algum outro artista desse festival, talvez o Dinosaur Jr.?
Ah, eu não sei. Acho que nós vamos um dia antes, tocamos e voltamos no dia seguinte. Mas ainda não sei qual será a programação geral que vamos seguir.

Falando no Brasil, vocês fizeram alguns shows históricos com o Sepultura nos 1990, certo?
Isso mesmo. Nós fizemos duas turnês com o Sepultura. Uma na época do Chaos A.D., provavelmente em 1994. Depois fizemos outra em 1996 na época do Roots. E essas duas turnês foram realmente importantes para nós, porque não fazíamos turnês grandes como essas. Além disso, era fenomenal poder ver eles (Sepultura) ao vivo. Nos tornamos bons amigos.

Aliás, vocês têm algum ritual antes dos shows?
Na verdade, não. Nós apenas nos aquecemos. Não falamos muito… não porque não nos damos bem, mas porque ficamos juntos por tanto tempo que todos sabem o que está acontecendo. Se há algum ritual, diria que é para escrever o setlist. Nós nos revezamos nisso. Na primeira noite da tour o Dan (Maines, baixista) escreve, depois o Jean Paul, e então eu. Desse jeito, não precisamos falar sobre isso e mantém as coisas interessantes.

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Falando agora sobre a sua carreira de forma mais geral. Qual foi o "ponto de virada" para o Clutch? Talvez o segundo disco, autointitulado, quando vocês meio que acharam o seu "próprio som"?
É, acho que sim. Penso que no primeiro disco (Transnational Speedway League, de 1993) nós ainda estávamos descobrindo, ainda tinha hardcore ou um metal mais lento no nosso som, curtíamos muito Prong, The Swans. Nós curtíamos essas bandas, mas acho que percebemos rapidamente que não era tipo de som que devíamos estar tocando. E penso que começamos a ouvir mais rock clássico, e tentar tocar as músicas das bandas que gostávamos desse gênero, aconteceu meio que um "clique". Nós mudamos bastante desde então, mas acho que esse foi o disco que nos colocou no caminho para chegar onde estamos hoje.

O Clutch é uma banda que faz muitas e muitas turnês. Quais os pontos negativos de ficar tanto tempo na estrada, se é que há algum?
Acho que você pode encarar isso de diferentes maneiras. Sou feliz por poder tocar música como um meio de vida, sou muito sortudo. Mas, ao mesmo tempo, quanto mais velho você fica… Você tem família, filhos, sua raízes ficam mais profundas. É difícil sair de casa. Eu adoro ir para lugares novos tocar, mas é apenas que o tempo entre os shows, como ficar sentado em um estacionamento de um lugar que não conheço pode ser tedioso. No entanto, ao mesmo tempo, eu lembro que prefiro fazer isso a ficar no trânsito para ir fazer a mesma coisa todos os dias em um emprego. E a banda também permite que eu fique em casa. Quando não estou em turnê, posso ficar com a minha família.

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E o que você gosta de fazer quando não está tocando com o Clutch?
Bom, quando estou em casa o meu filho de quatro anos toma todo o meu tempo. Fora isso, eu sou bastante tranquilo, tenho um jardim nos fundos, onde tenho uma plantação pequena de tomates [Risos]. É o oposto do rock, mas acho que é por isso que gosto.

E vocês ainda vivem na mesma cidade? Pelo que sei, vocês não gostam muito de ensaiar.
Bom, nós não ensaiamos as músicas antigas. Na verdade, eu estou no ensaio agora, enquanto falo com você. Estamos tentando escrever material novo para o próximo disco. Isso leva algum tempo porque escrevemos muitos riffs, mas nem todos são ótimos. Algumas vezes é preciso bastante trabalho para encontrar um momento em que descobre algo novo. E é isso o que estamos tentando fazer no momento.

Já tem uma previsão para terminar esse disco, talvez na primeira metade de 2015? E quem vai produzir o álbum?
Sim, nós esperamos gravar em janeiro ou fevereiro, talvez com um lançamento daqui um ano. E o Machine, que já trabalhou com a gente no Blast Tyrant e no último disco, vai produzir o novo álbum.

Desde que vocês começaram a sua própria gravadora, a Weathermaker, há alguns anos, pensa que o contato com os fãs ficou realmente mais direto?
Eu espero que os fãs gostem da ideia de comprar o disco diretamente da banda. É algo um pouco mais pessoal. Nós também já estivemos em grandes gravadoras, como a Columbia e a EastWest, já fizemos isso nos anos 1990. E tínhamos muito apoio dos fãs naquela época. Mas agora os nossos shows são maiores do que nunca. Acho que é uma combinação de fatores. Um deles é a Internet… Porque com o compartilhamento de arquivos agora as pessoas sabem sobre o Clutch, elas não precisam depender de um representante de publicidade para isso. O segundo é que é difícil vender discos atualmente. Mas se você conseguir diminuir a quantidade e apenas vender diretamente para os seus fãs, então você não precisa vender milhões e milhões de discos. Apenas (vender) a quantidade correta de discos para as pessoas certas. É meio que uma fórmula da sorte para o Clutch.

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Pensando nessa relação mais direta com os fãs. Vocês pensam que esse show em São Paulo pode abrir as portas para o Clutch voltar ao Brasil (e América do Sul) em uma turnê completa depois? Já tiveram algum caso parecido?
Certamente espero que sim. Temos tentado tocar aí, mas por qualquer razão tivemos dificuldade em convencer os produtores de que as pessoas queriam assistir ao nosso show. Isso já aconteceu antes. A única comparação que posso fazer é com a Grécia. Nós tivemos dificuldades para convencer os produtores de lá sobre agendar um show nosso e hoje a Grécia é o lugar onde fizemos nossos maiores shows na Europa. Eu não espero chegar em lugares que nunca estivemos antes e ser um artista gigante. Mas o rock é algo universal e as pessoas gostam disso na Noruega ou no Canadá, por isso tenho certeza que também vão gostar na América do Sul.

Perguntei isso porque não sei se você sabe, mas esse show de vocês em São Paulo vai funcionar por um esquema de distribuição de ingressos pela Internet. E, na minha opinião, os ingressos devem esgotar em pouco tempo, provavelmente nas primeiras horas.
Uau [Risos]! Isso é legal, mas agora me faz querer tocar em um lugar maior [risos].

Quais eram as suas principais influências no começo da banda? O Jean Paul me disse que o Bad Brains significava muito para ele nessa época. É o mesmo para você?
Ah sim. Nós crescemos meio que no subúrbio de Washington DC. E o Bad Brains era algo enorme aqui, como em qualquer outro lugar, mas especialmente aqui. E também o Minor Threat e o Fugazi e todas as bandas da Dischord. Isso era muito importante para nós. Escutávamos essas bandas quando estávamos crescendo. E também ouvíamos muito rock e metal clássicos, como Black Sabbath e ZZ Top. Acho que todas essas coisas se misturaram no que nós temos no Clutch.

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E quais discos mudaram a sua vida?
Hmm…vamos ver. Existem tantos para escolher. Poderia falar…Eu não sei se um disco chegou a mudar a minha vida. Posso dizer que alguns shows mudaram a minha vida. Ver o Bad Brains pela primeira vez, acho que em 1988. Nunca tinha visto uma energia daquele tipo antes e era como uma droga que eu queria mais e mais e mais. E isso me fez começar a tirar péssimas notas na escola, mas eu aprendi muito mais sobre música (risos). Me tornei um obcecado por isso. Na verdade, pensei agora que há um disco que mudou a minha vida e é provavelmente o primeiro álbum do Black Sabbath. Lembro muito bem de quando o escutei pela primeira vez em uma festa, e o som me assustou. Mas de uma maneira que eu queria ser assustado muitas vezes mais. Acho que às vezes esse é um dos poderes da música e esse é certamente um disco intimidador.

Entendi. E quais as suas principais influências como vocalista?
Sou um grande fã do Tom Waits e do Chuck D, do Public Enemy. Esses dois caras me influenciaram muito quando eu estava crescendo. Mas também gosto muito dos nomes antigos do blues como o Howlin Wolf. Sabe, eu nunca tive uma voz particularmente boa para cantar, era terrível com melodias, então sempre gravitei em torno de cantores que focavam mais na entrega e nas palavras do que especificamente na melodia como o Robert Plant ou o Ian Gillan.

Voltando aos shows de vocês. Pensa que a experiência é muito diferente de quem só está acostumado a ouvir a banda em discos? Digo isso porque seus shows são sempre muito elogiados e definidos como intensos.
Eu espero que sim (risos). Quero dizer, acho que sempre fomos melhores no palco do que no estúdio. Ninguém na banda gosta realmente de gravar, mas adoramos fazer shows. Quando uma música é gravada, ela torna-se algo muito estático, que nunca muda, enquanto que ao vivo você pode ter "acidentes felizes" e aquele caos, violência e energia que você nunca terá em um disco ou em um vídeo.

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Falando nisso, você toma cuidados especiais com a sua voz durante as turnês?
Ahh, eu tento. Eu costumava fumar, ir para bares depois dos shows e falar e falar e falar. Agora eu tento não falar muito antes e depois dos shows, ficar longe de muito café, aquecer a voz, eu respeito isso agora. Eu não fazia isso, costumava dar como algo certo, não ligava muito. Como tantas coisas que os jovens fazem, eles tomam as coisas como certas, garantidas, até que aconteça alguma merda.

Você já está com o Clutch há cerca de 20 anos. Queria saber qual o maior desafio que enfrentou nesse período e também a coisa mais importante que aprendeu nesse tempo todo.
Acho que fazer turnês é algo que pode ser difícil, mas é a melhor educação pela qual você poderia pedir. Você realmente pode conhecer pessoas do mundo todo, sem estar no circuito de turistas. Você conhece pessoas nas casas de shows e tudo mais. Eu tenho amigos ao redor do mundo e esse tem sido um presente incrível e inesperado. Quanto a desafios, acho que sempre tento ser um estudante e é sempre um desafio aprender coisas, mas é algo necessário. Se você quer descansar nas suas conquistas e achar que você já fez tudo ou já disse tudo que devia, então é hora de parar.

Essa é a última pergunta. Do que você tem mais orgulho na sua carreira?
Hum…É tão simples quanto vai soar: o que mais me orgulha é a ideia de ter passado quase metade da minha vida tentando entreter as pessoas. Claro, eu grito e a nossa música é barulhenta e agressiva, mas ela deixa as pessoas felizes e saber que fiz o meu melhor para deixar as pessoas felizes é um sentimento muito satisfatório. E tenho orgulho de poder dizer isso.

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Tá pouco de entrevista do Luiz Mazetto, manda mais:

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