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Música

É impossível não se emocionar com os Novos Baianos no palco

O grupo baiano faz show histórico em São Paulo, com direito a muito choro e ‘Fora Temer’ do público, depois de 17 anos sem se encontrar sob as luzes da ribalta.

Novos Baianos. Foto por Guilherme Santana

Se você não consegue contemplar a magia de ver Pepeu Gomes, Baby do Brasil, Paulinho Boca de Cantor, Moraes Moreira, Luiz Galvão, Dadi Carvalho, Jorginho Lopes e Didi Lopes juntos no palco, acho que este texto lhe será deveras maçante. As linhas abaixo nada mais são do que uma descarada mesura aos Novos Baianos, o grupo mais simbólico da música brasileira.

A ideia desse revival surgiu, como era de se esperar, para um show em Salvador, em maio deste ano. O projeto Eu Sou a Concha — que marca a volta da concha acústica do Teatro Castro Alves, depois de uma reforma de três anos — foi a ocasião perfeita para os Novos Baianos passarem por cima das tretas e dos egos e voltarem para baixo dos holofotes todos juntos.

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Para irmos com calma, dá um confere na apresentação de Salvador (alguma boa alma disponibilizou o show completo), enquanto continuamos o papo:

O show acima foi tão foda, tão foda que a galera sentiu o gostinho do palco e voltou para uma turnê no Sudeste. São Paulo já desfrutou no último final de semana (12 e 13 de agosto) e ainda tem Rio de Janeiro nos dias 2 e 3 de setembro e Belo Horizonte no dia 10 de setembro. Pois bem, dito tudo isso, podemos falar sobre o ácido bom que foi o show da sexta-feira, dia 12, na capital paulista. Pega lá um lencinho — principalmente se você não foi — e bora baêa.

Os Novos Baianos e a Caravan. Foto por Guilherme Santana.

Uma Caravan infinitamente hippie entra vagarosamente no palco do Citibank Hall. Em cima dela Baby, Moraes, Pepeu e Paulinho acenam diante de dezenas de baldes pendurados no teto (tudo isso e muito mais é obra de Gringo Cardia). Eles descem, assumem seus postos e atacam com "Anos 70", curiosamente gravada apenas em 1997 no álbum Infinito Circular, registro feito ao vivo no extinto Palace, em São Paulo.

O coro de "Ah, e Beatles, viver ouvindo João, assim como John. Deixando marcas na imagem e no som, e no som" já fez boa parte da plateia se virar em lágrimas e euforia. Ainda nadando no choro, o público se deparou com uma versão emocionada de "Dê um rolê". Quando Paulinho Boca de Cantor me deu um toque dizendo que a vida é boa, eu já tava pensando em abraçar os meus confrades jornalistas de mesa (é, uma parte das pessoas estavam em mesas), mas achei mais prudente não me exaltar.

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Baby Consuelo, a menina que dança. Foto por Guilherme Santana

Na sequência, Baby cantou "A Menina Dança" e emendou a primeira menção a Jesus Christ da noite, mas bem de leve. É impressionante olhar para ela, aos 64 anos, dançando como uma garota de cabelo roxo da Funhouse. Sua voz é uma arma arrebatadora. E se você fecha o olho ela ainda dança.

Daí pra frente foi uma saraivada de clássicos, emoção e performance. "Preta Pretinha", "Tinindo, Trincando" e "Samba da minha terra", de Dorival Caymmi.

Esse violão do Moraes é uma coisa de outro mundo. Taqueopariu.

Pepeu e Didi. Foto por Guilherme Santana.

Jorginho Gomes, baterista e irmão do Pepeu, sai de seu instrumento, pega um cavaquinho e começa a dedilhar "Um Bilhete pra Didi". Pepeu assume a guitarra e Didi, o outro irmão de Pepeu e a pessoa a quem endereçava o recado, está no baixo. Esse chorinho com LSD foi um chamado de Jorginho para que o irmão mais novo entrasse na dança. E deu deu certo, ele veio para o Rio e para a banda.

Ainda teve tempo para "Swing de Campo Grande", "Na Cadência do Samba", de Ataulfo Alves. "Sei que vou morrer, não sei o dia. Levarei saudades a Maria". Neste momento eu já era pura serotonina. Que lugar maravilhoso, que grupo.

Luiz Galvão, que passou quase todo o espetáculo sentadinho numa mesa de boteco escrevendo compulsivamente, se levanta com folhas de papel que são jogadas ao público. Poesias frescas, recém saídas da cachola. Ele, se pá fugindo um pouco ao protocolo, recita uma poesia, segundo o próprio a mais bela que já fez, chamada "Um abraço em Pessoa", uma ode ao poeta português Fernando Pessoa. Em seguida ele descorre os versos de "Amar-te", poesia musicada na sequência por Moraes. A única parte, digamos menos feliz, de toda a apresentação é ver a saúde mais frágil de Galvão e a voz menos potente de Moreira, mas nada disso inibe a qualidade e o sentimento apresentado.

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Moraes Moreira. Foto por Guilherme Santana

Ainda rolou aquela homenagenzinha básica à João Gilberto com uma versão de "Chega de Saudade" e uns momentos rock progressivo nivel 10 com Pepeu Gomes dichavando sua guitarra. Que homem. Quantos acordes, escalas, solos.

Foto por Guilherme Santana

Paulinho Boca de Cantor, que por sinal está com tudo em cima, manda uma profética frase. "E continuamos sendo o mistério do planeta". E é vedade. A CIA, a NASA, a Segurança Nacional, ninguém ainda conseguiu identificar o mistério dos Novos Baianos para conseguir ultrapassar e emocionar gerações com seu som. Na plateia era comum ver filhos e pais abraçados e compartilhando o mesmo sentimento. Foi bonito e ainda teve uma versão de "Brasileirinho" e "Besta é Tu".

Paulinho Boca de Cantor. Foto por Guilherme Santana

1:01 da madrugada, duas horas e um minuto depois do início da apresentação, os Novos Baianos voltam para o bis com "Brasil Pandeiro" e finalizam a parada com a mesma Caravan hipponga e tocando "Anos 70". O público, ainda extasiado, sustentou por pouco mais de um minuto o coro de "Fora Temer", mas os artistas não se pronunciaram.

Foram duas horas de muito amor e celebração. Algo que ultrapassa o tempo, as gerações, os gostos musicais. Novos Baianos é de todo mundo, é do menino indie e do jornalista maleta. É do pai, da meninada. É coisa de velho, de moleque. É muito maravilhoso. Ficamos aqui na torcida para mais apresentações e para que este reencontro dê um ânimo nestes senhores e nesta iluminada mulher. Queremos mais de vocês, mais vezes, por mais tempo, para sempre. Muito obrigado por esta amostra de bons sentimentos.

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Novos Baianos reunidos. Foto por Guilherme Santana

O show já se foi, mas o que fica na cabeça até agora é que eu sou, eu soooou. Eu sou amor da cabeça aos pés.

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