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Música

Este Artista Curte Confinar Bandas de Death Metal num Cubo Até Elas Desmaiarem

Hermeticamente lacrada e com isolamento acústico à toda prova, a escultura do português João Onofre vai levar o Unfathomable Ruination a várias sessões de exaustão extrema.

A primeira vez que o artista português João Onofre expôs ao público seu mix de performance e escultura Box sized DIE, a ideia causou uma acalorada repercussão. Já se passaram anos, e toda mão que ele retoma este projeto as reações são igualmente intensas. Sempre rende boas chamadas na mídia e altos compartilhamentos nas redes sociais. Por alguma razão, a proposta, que consiste em encaixotar uma banda de death metal dentro de um cubo com isolamento acústico até que o primeiro integrante venha a desmaiar ou passar mal, obtém as mesmas respostas: espanto, curiosidade, apreço e reprovação. A estreia foi em 2007, com os caras do Sacred Sin, na Cristina Guerra Contemporary Art Gallery, em Lisboa. A mais recente exposição foi com a banda Holocausto Canibal, que participou em novembro de 2013 e em fevereiro deste ano, também em Portugal, no Palácio de Cristal (Porto).

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O lance do João na hora de escolher as bandas é achar um representante metaleiro do cenário de cada país por onde o cubo transita. Atualmente, o happening está em curso em Londres, como parte da quarta edição da mostra Sculpture in The City. Onofre escolheu a banda Unfathomable Ruination para participar dessa vez, e a obra abriu o evento no último dia 2 de julho. Liguei para o artista logo após a premiere para saber como tinha sido a experiência, se tinha colado muita gente pra sacar, uma vez que a parada ganhou até destaque no The Guardian, e ele me disse que "muitas pessoas apareceram para ver, houve uma grande cobertura da imprensa; pessoas comuns, que estavam por ali e ficaram curiosas, se aglomeraram para observar se algo extraordinário aconteceria. E até bateram palmas".

A peça foi instalada em frente ao icônico edifício The Gherkin, onde a banda se submete a sessões de exaustão que rolam a partir das 18h, todas as quartas e sextas, até o seu encerramento, no dia 1º de agosto. Dentro do cubo, dá-se um jeito de enfiar os músicos munidos de seus instrumentos, com bateria e tudo, e os amplificadores. "A reação de quem está de passagem e é surpreendido com um elemento novo, no caso um improvável cubo preto inserido no ambiente, fecha o ciclo. A forma como os observadores interagem com a obra faz parte da performance", comentou o artista. Antes de aportar em Londres, João Onofre levou sua Box sized DIE para lugares como o Palais de Tokyo, em Paris, o Museu d'Art Contemporani de Barcelona, e Art Basel, na Suíça, onde, em 2008, os caras do Darkmoon bateram o recorde de suportar pouco além de meia-hora dentro do cubo, me contou o João. O comum é a galera aguentar cerca de 14, 15 minutos.

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A escultura é assumidamente inspirada pelo trabalho do minimalista Tony Smith, que em 1962 construiu um cubo de aço de 183x183cm intitulado Die. A figura geométrica assinada por ele tem, inclusive, as mesmas dimensões. O mais curioso é que, após a entrada dos músicos, a porta é hermeticamente fechada e escapam apenas ruídos, tênues resíduos das vibrações no interior do objeto. "As pessoas que não sabem do que se trata param, examinam, percebem que há um ruído baixinho, e tentam entender o que está acontecendo, intrigadas", detalhou.

Já que a reação à obra faz parte do barato, a minha reação foi pensar no motivo de confinar um bando de cuecas num espaço minúsculo para tocar para ninguém além de si mesmos. Tipo, por que não transmitir a parada, pra gente se entreter com os caras surtando? Não se ouve porra nenhuma do lado de fora e Onofre também não faz questão de filmar ou registrar a música que está rolando lá dentro. Pelo jeito ele não quer dar uma de Grande Irmão, nem mesmo no intuito de usar depois o material eventualmente colhido em algum trabalho decorrente ou complementar. O artista argumenta que "esta realização foi feita para ser apreciada na rigidez de suas formas, em sua simples presença. Pensei nela para ser vista, percebida, e o que acontece em seu interior, imaginado". Daí ele mencionou algo sobre o paradigma de reduzir a manifestação artística a um objeto puro, e na hora me pareceu fazer sentido.

Quando pergunto ao João se ele curte um rock, ele diz que gosta de metal, mas que a escolha por expoentes do death metal tem um gancho estritamente conceitual. Assim, é possível estabelecer ramificações que conectam o trocadilho com o nome da invenção de Smith, as punhaladas sonoras do death metal e a sensação de estar à beira da morte causada pela falta de oxigênio; sem contar que o peso e o volume da pulsação dos riffs lá dentro, naturalmente absorvidos pelo corpo humano, contribuem para que os músicos se sintam atordoados. "Não sei se outros tipos de banda aceitariam com facilidade participar do projeto, mas no caso do death metal, todos os convidados sempre foram receptivos à ideia e orgulham-se de fazer parte, mesmo depois de saírem esgotados e vermelhos", disse João Onofre.