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Música

Era Uma Vez a Cinderela Tecnobrega do Pará

Uma releitura com festa de aparelhagem, açaí adulterado, elenco impecável e o melhor vocabulário.

O conto da Cinderela todo mundo conhece. A história da pobre coitada que é humilhada a vida toda pela madastra e suas filhas megeras já foi replicada milhões de vezes. O que muita gente não lembra é que o Brasil tem um lugarzinho especial no coração pra esse conto. Lá no começo dos anos 90, tivemos Lua de Cristal, com a rainha Xuxa. A coitada sofria nas mãos da tia Zuleika mas teve seu final feliz ao lado do príncipie Bob (aka Sergio Malandro). Anos depois, na Bahia, surgiu a maravilhosa Cinderela Baiana, interpretada por ninguém mais ninguém menos que Carla Perez. <3 essa="" versão="" era="" mais="" biográfica,="" e="" não="" envolvia="" nenhuma="" madrasta="" megera,="" mas="" virou="" um="" clássico="" da="" cultura="" trash.="" tem="" também="" a="" Cinderela de Recife, que tinha talk show com direito a Galo José (versão pernambucana do Loiro José). Depois de tantas versões maravilhosas da Cinderela, eu imaginei que nunca mais teríamos outra princesinha tão eloquente como nossa Xu (#desempregada) ou prolixa como Carlinha Perez. Mas, ainda bem, eu estava errado! Agora temos uma Cinderela vinda diretamente do melhor estado brasileiro: o Pará. Encantada do Brega nada mais é do que uma releitura fantástica do conto da Cinderela. Entretanto, nessa versão, a gata borralheira se chama Stefhany. A madrasta é uma velha desfrutável maravilhosa que vende açaí adulterado (misturado a papel higiênico e acetona pra engrossar o caldo). As "irmãs" megeras são uma piriguete e a Aleijada Hipócrita. O baile, claro, é uma festa de aparelhagem cheia de pirotecnia e LED. A Fada Madrinha não quer nem saber de vestido de gala, o look babado é blusa Pitbull, calça Absoluta colada no bumbum, uma Melissa, piercing no umbigo e chapinha no cabelo. E a abóbora que vira carruagem? É um jerimum que se transforma em passe pro ônibus, claro. O príncipe é o DJ da festa e o sapatinho de cristal perdido é um celular roubado. E o mais maravilhoso é que a Cinderela não tá nem aí pro príncipe, ela só quer é curtir a vida, como deixa muito claro. Só vi realidades.

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Na real, Encantada do Brega é um projeto de extensão universitária dirigido por Leonardo Augusto, da Platô Produções (responsáveis pelo maravilhoso clipe da Gina Lobrista, que já mostramos por aqui). Ele e seus amigos tem tipo um "Porta dos Fundos" paraense (sendo que engraçado e com gírias deliciosas) e tinham Encantada do Brega como ideia de uma das esquetes do canal. No meio do caminho, eles descobriram o anúncio do FUSCA (Festival Universitário de Criação Audiovisual) e tiveram a genial ideia de transformar todo o material no primeiro curta metragem sobre tecnobrega da história.

Para Leonardo, "tudo foi muito natural, os acontecimentos, os personagens, mas com um toque paraense na composição e recheado de referências regionais, além das paródias dos bregas clássicos que todo mundo que mora no Pará conhece". E pronto, nasceu Stefhany e seu sonho de ir pra festa de aparelhagem. Claro que não podemos deixar de lado o incrível talento dos atores. O curta é repleto de webcelebridades e celebridades paraenses, como Samara Castro, a Stefhany, a verdadeira it girl paraense; Paulo Colucci, a.k.a. Aleijada Hipócrita, famosíssimo pela sua parceria com Leona Vingativa (também presente no curta); Keila Gentil e Will-Love, ambos da Gangue do Electro; Betty Dopazo, interpretando a madrasta, com certeza a Meryl Streep paraense; além de Gaby Amarantos, que nem preciso apresentar.

Mas o que mais encanta em Encantada está nas entrelinhas. É a vontade desse grupo formado por jovens de registrar o universo paraense atual. "Todo audiovisual paraense mostra a floresta, os rios, a cultura ribeirinha, aquilo que é exótico aos olhos das pessoas de fora. Pouco temos de fato um registro da cultura urbana atual de Belém", lembra Leonardo. Além disso, o registro musical do tecnobrega feito por Leonardo e Will-Love é simplesmente incrível para a história da música paraense. Leonardo completa: "Essa sim foi a primeira tentativa de adaptar o universo do tecnobrega e da periferia paraense para a ficção, usando as webcelebridades, que são uma febre na nossa ‘pequena’ cidade. Queríamos eternizar as expressões únicas da nossa linguagem, as músicas marcantes que todo mundo que cresceu no Pará conhece, de uma forma super divertida e descontraída".

O trabalho da Platô Produções foi tão bonito que ganhou 6 prêmios do FUSCA: Melhor Cartaz, Melhor Atuação (Paulo Colucci), Melhor Produção, Melhor Roteiro, Melhor Curta de Ficção e Melhor Filme no Júri Popular. Além da premiação, o curta foi exibido no festival e, segundo o Leonardo, foi lindo ver todo mundo cantando junto e gargalhando. Podemos até imaginar.

E o que eu aprendi sobre Encantada do Brega? Que o Pará é mesmo o melhor estado do Brasil e que eu quero viajar pra lá agora mesmo pra bater um açaí, colocar uma calça Absoluta, me jogar na aparelhagem e chamar todo mundo de "mana". É BOCA DE TRACAJÁ, MANA!