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Música

Entrevistando o Exhale The Sound: Carahter

Depois de 13 anos dedicados à pancadaria sonora, o Carahter anuncia seu último show, no festival Exhale The Sound, que rola em outubro em Belo Horizonte.

Quando eu penso que o Carahter vai acabar, diante do anúncio de uma derradeira apresentação no festival Exhale The Sound, que rola agora nos próximos dias 10 e 11 de outubro em Belo Horizonte, a sensação que fica é a do fechamento de um ciclo. E desenrolo essa reflexão tomando por base tanto a evolução artística como o amadurecimento pessoal de cada um dos integrantes, já que os caras meio que “viraram adultos” no mesmo compasso em que se tornavam músicos cada vez mais exímios. Fazia milianos desde a última vez que dei rolê com o Renatão (vocalista), até que me caiu no colo essa entrevista pra fazer… Poxa, como deixar de lado algumas memórias? Eu me lembro do Renato colando na banca de dread, de quando eu passava umas temporadas em Belo Horizonte, zoando pela Savassi, e ele, em São Paulo, zoando pelo São Judas. Rolava toda aquela camaradagem punk de se hospedar na casa um do outro pra aproveitar os shows da época e tudo mais.

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Estávamos na virada dos anos 2000, todo mundo no auge de seus 18, 19 anos, a cena hardcore começava a atrair cada vez mais gente, e os eventos, pelo menos aqui na capital paulista, não cabiam mais em lugares para 500 pessoas como o Black Jack ou a casinha do Jabaquara que acolhia a Verdurada. De repente veio aquela onda de festivais em galpões, imensas rodas de dança estranha abriam-se na pista, usar bandana na cabeça virava moda, as influências metálicas tiravam a pegada old school da evidência, e o Carahter, para mim, evoca toda essa pantomima de reciclagem estética e comportamental, ao lado de nomes como Point Of No Return, Constrito e Confronto.

Depois de atravessar diferentes fases, altos e baixos, idas e vindas desde então, o Carahter encerra suas atividades em grande estilo. Se desta vez é quente, nunca dá pra ter certeza. Mas, com 13 anos de estrada no currículo, talvez seja o tempo de reciclar as coisas novamente, deixar o legado para a história e seguir em busca de inéditos experimentos. Parte da formação acredita estar tocando essa bola pra frente com um novo projeto, o Civilian. Vamos ver no que dá. Por hora, marca aí na agenda e já faz o corre pra garantir sua presença no Exhale the Sound. Além do Carahter, tocam mais 23 das melhores bandas da atualidade dedicadas à música torta e pesada no Espaço CentoeQuatro, um pico muito legal que fica no centro da cidade. É isso. Acompanhe a entrevista:

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Noisey: Bem, esta entrevista tem chances de entrar para a história como um dos últimos depoimentos do Carahter a respeito de sua música e proposta. Quais as memórias ou pensamentos imediatos vêm na sua cabeça quando pensa na caminhada até aqui?
Renato Rios Neto: Cara, quando penso na trajetória da banda até aqui o que me vem à cabeça é como o tempo passa rápido e a vida é uma só. Outro dia mesmo éramos jovens de 18, 19 anos montando uma banda pra tentar fazer algo diferente. Logo depois gravamos demo, CD, fizemos turnês, shows e mais shows e, de repente, um hiato. Voltamos com a banda, gravamos mais e, de repente, outro hiato. E agora temos esse último canto do cisne. Nesse meio tempo cada integrante viveu um bilhão de coisas, boas e ruins, experiências que hoje podem ser resumidas em um parágrafo. É essa loucura toda que me vem à cabeça quando eu penso nesses 13 anos… Na importância de se valorizar os amigos e viver as coisas intensamente, porque depois de todo o tempo passado, é isso o que vai importar de verdade.

Os sons que vocês já tinham na manga e que vão sair sob o nome de um novo projeto, o Civilian, são na verdade o que resultaria num novo disco do Carahter? O que muda, de fato? A formação? Vocês acham que o Carahter tem mais a cara do hardcore da década passada?
O fim da banda não teve nada a ver com uma questão de achar que estávamos ultrapassados ou em relação a uma estética temporal. O que rolou foi que, no processo de gravação, houve uma ruptura e a banda terminou mesmo. O Civilian não é o Carahter. É outra banda, com outro vocalista, outra proposta, outras letras, enfim, uma outra banda.

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Quando o Carahter começou, em 2001, vocês eram uma banda straight edge? Muita coisa mudou desde aqueles tempos, uma nova geração de bandas surgiu, enfim… Qual a avaliação que vocês fazem da evolução da cena nesse período?
O Carahter nunca foi uma banda straight edge. No início, a maior parte dos integrantes realmente era straight edge, mas nunca nos colocamos como uma banda militante porque essa nunca foi a proposta. A gente sempre preferiu tocar em outros assuntos e nunca fomos de falar de política de cena. Quanto às mudanças na cena, acho que hoje é muito mais fácil ter acesso a tudo por causa da internet. Isso é o melhor e o pior ao mesmo tempo. Melhor porque fica mais fácil pra todo mundo ter acesso a bandas, sons, vídeos, etc. E pior porque ninguém valoriza mais nada, existe um “excesso” de informação muitas vezes inútil e coisas que fizeram parte da nossa cultura e formação, como os fanzines, estão morrendo, o que é uma pena. A impressão que fica é que a internet e toda essa informação, ao invés de aproximar, muitas vezes distancia as pessoas, ou pelo menos torna a convivência mais fria.

Apesar do tempo de vida, o Carahter tem apenas uma demo e um álbum lançado? Esse play que estava pra sair seria o segundo? Por quais desencontros vocês passaram nesses anos que impossibilitaram outros registros?
Foram vários desencontros. Acho que daria pra escrever um livro ou, na pior das hipóteses, uma novela mexicana. Mas geralmente foram desencontros de ordem pessoal. Talvez falta de comunicação, talvez falta de sincronia na vida de todo mundo. O fato é que na gravação do segundo disco a banda acabou duas vezes. Talvez seja uma sina, talvez seja só o acaso, deixamos a resposta para os universitários! [risos]

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Vocês chegaram a tocar no Hellfest?
Na verdade não chegamos a tocar no Hellfest, fomos convidados, o que foi muito legal, mas infelizmente não deu certo por questões burocráticas de visto.

Quais momentos foram marcantes na história do Carahter? Manda um Top 5 aí pra gente.
Isso é outra coisa complicada de se chegar após 13 anos, mas vamos tentar:

1) Turnê da Europa;

2) A volta do Carahter em 2011, todos os shows envolvidos e a gravação das três músicas que lançamos;

3) Turnê da América do Sul;

4) Último show com o Debarry no Liberation Fest de 2004;

5) E, por fim, mas não menos importante, todo o processo de ter uma banda, principalmente com amigos de verdade. Ter uma banda é uma experiência única que é praticamente impossível descrever. Toda a convivência, desde os momentos da composição das músicas, ensaios, discussões eternas sobre letras, nomes, arte, gravar esse ou aquele som, tocar nesse ou naquele outro show, brigas, resenhas, horas de conversa fiada depois dos ensaios, problemas e alegrias divididas. Tudo isso é muito marcante e único.

Quais são as influências de ontem e hoje no som do Carahter? Fora a música pesada, que outros tipos de som vocês curtem?
Nossas influências são muito díspares e diferentes. Cada membro traz sua bagagem e experiência pessoal. Mas acho que nos encontramos no som de bandas como Neurosis, Isis, Sepultura, Today is the Day, His Hero Is Gone, entre outras. A gente tá longe de ouvir só música pesada, mas aí é um lance pessoal de cada um. Entre os integrantes, rola desde um The Police até um Racionais, passando por muita, mas muita coisa mesmo, demoraria uns dois dias para citar tudo!

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De que outras bandas vocês já participaram aí em BH?
Poxa, todos nós já tocamos em diversas bandas. Mais fácil ir citando: Ride 4 a Fall, Contrataque, Desonra, Unfashion, Heffer, Alliance, Invictus, Old Shoe Box, Udora, Transmissor, Moldest e Moan. Isso pelo que a gente consegue lembrar!

Como rolou a oportunidade do Carahter tocar no Exhale The Sound? Vocês são amigos dos caras da organização?
O pessoal que faz o ETS é uma galera bem mais nova que a gente, de uma outra geração, que tá tentando dar uma levantada na cena de Belo Horizonte. Fizeram o convite pra esse show e, conversando entre nós, chegamos à conclusão que seria a oportunidade perfeita para fechar essa história com chave de ouro. Um momento pra relembrar tudo o que construímos e ficar em paz com a nossa memória e nossa história.

Vocês são ou já foram ligados a algum tipo de militância política?
As nossas letras foram mudando com o tempo. Primeiro era uma abordagem mais agressiva e direta, como “Ruína Sobre Ruína” e “Flagelo Terrível”. Depois, fomos adotando mais metáforas e um tom indireto, como em “Vítimas da Própria Arrogância” e “Civilização Morta”. Na última fase da banda, as letras ficaram ainda mais indiretas e metafóricas, mas ainda com um teor político. Não digo uma política partidária ou militante ideológica, mas a política do individuo que tenta achar um caminho nesse mundo opressor. Algo mais subjetivo, mas ainda crítico e questionador.

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Renatão, você já foi eleito o melhor vocalista de metal de Belo Horizonte pelo Mondo Metal, não é? Depois da despedida do Carahter, não vai mais nos brindar com sua potência vocal?
Rapaz, que pergunta complexa! Fiquei esse tempo todo parado simplesmente por não ter achado as pessoas certas pra montar um novo projeto. Nessa volta do Carahter, eu vi o quanto sinto falta de cantar e tocar. Nunca digo nunca, quero voltar a tocar o mais breve possível. Mas tem que ser com uma rapaziada que eu confie, já que não sei tocar nenhum instrumento. Mas vamos viver cada momento de uma vez. Agora, tô empolgado pra caralho com o show do Exhale The Sound.

Para sacar o discurso e o som de outras desgraceiras, é só passear pelos links abaixo:

Entrevistando o Exhale The Sound: Ereção de Elefante

Entrevistando o Exhale The Sound: Herod

Entrevistando o Exhale The Sound: Chakal

Entrevistando o Exhale The Sound: ROT

Entrevistando o Exhale The Sound: Abske Fides

Entrevistando o Exhale The Sound: Expurgo

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Exhale The Sound 2014

Dia 10/10, a partir das 19h; 11/10, a partir das 15h.

Espaço CentoeQuatro. Pça Ruy Barbosa, 104, Centro, Belo Horizonte/MG.

Ingressos: R$ 20, para o dia 10; R$ 35, para o dia 11; R$ 45, para os dois dias.

À venda no Espaço Veg: R. Fernandes Tourinho, 441, Savassi, Belo Horizonte.

Pela internet: Sympla / Noise Stuff