FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Entrevistando o Exhale The Sound: Abske Fides

Trocamos uma ideia com o trio de doom metal que é uma das 24 atrações da segunda edição do festival mineiro mais firmeza dedicado à música torta e pesada.

O Abske Fides é um trio que produz uma combinação sonora pesadamente climática, cuja estética toma como ponto de partida o death, o doom e o black metal. Veja bem, tais referências são apenas o começo da viagem. Porque, na verdade, o barulho horrível lindo dos caras transita por vários subgêneros do metal e até fora dele com latente desenvoltura. A banda nasceu em 2003, a princípio como um projeto de estúdio, e sua formação é a mesma desde 2005: K. (baixo, bateria e vocal), N. (guitarra, synths, violino e vocal) e Nihil (guitarra). No começo, a ideia era apostar num black metal na linha de bandas como Deinonychus, Bethleheim, Silencer e Shining. Contudo, logo entre 2004 e 2005, a experiência passou a imergir cada vez mais para dentro das fissuras do doom metal. Tanto que, para muitos apreciadores no estilo, eles são tidos como a esperança de uma renovação aqui no Brasil.

Publicidade

Um certo espaçamento entre a chegada de novas faixas e a realização de shows pode ter levantado a suspeita de que o AF se tratava de um projeto que os integrantes deixavam em segundo plano. Pelo menos em relação às outras investidas das quais fazem parte. Mas isso não tem nada a ver. “A ideia inicial era se reunir para compor, fazer poucos ensaios e gravar, lógica essa que acabamos seguindo por muito tempo e até mais recentemente”, me contou o Nihil quando fui sondá-lo para esta entrevista. “É possível dizer que o Abske Fides sempre foi um projeto sólido que só não se tornou uma banda antes pelo fato de termos morado por muitos anos em cidades diferentes. No caso, o K. e o N., em São Paulo, e eu em Curitiba e, depois, Rio de Janeiro”, explicou.

Agora que eles estão morando novamente no mesmo lugar, a promessa é de manter uma regularidade nos ensaios e até tocar mais vezes ao vivo. No que tange aos temas tratados nas letras, eles costumam discorrer sobre o lado subjetivo do ser humano, sobretudoas questões que brotam do modo de vida urbano, capitalista e individualista em rápida transformação. “Um mundo onde valores e relações são constantemente esvaziadas de significado. Isso provoca efeitos nos indivíduos que têm tudo a ver com os temas mais gerais do doom e do black metal, como a desolação e a melancolia”, filosofa Nihil.

Nesse compasso introspectivo eles carregam uma discografia composta por uma demo (Illness, 2004), dois EP’s (…Apart of The World, 2006; Disenlightment, 2009) e um autointitulado álbum que saiu em 2012. A caminho do próximo trabalho, o combo figura entre as 24 atrações no line-up da segunda edição do festival dedicado à música torta e pesada Exhale The Sound, que acontece em Belo Horizonte, Minas Gerais, nos dias 10 e 11 de outubro. Acompanhe a conversa que tive com o guitarrista:

Publicidade

Noisey: Vocês preferem ser descritos como uma banda de black metal, death metal ou de doom metal? Ou, nenhuma dessas coisas? Como vocês definem a sua própria música?
Nihil: A questão do rótulo é sempre complexa, mas prefiro que o Abske Fides seja descrito como uma banda de doom metal. Uma vez, um dos moderadores da Encyclopaedia Metallum escreveu que o uso genérico do termo doom metal remete ao som de bandas como Candlemass, Trouble, Pentagram, Count Raven, etc. e que, portanto, a melhor categoria para o Abske Fides seria a de “black/funeral doom metal”, já que há todos esses elementos em nossas músicas, para além do doom tradicional. De certa maneira ele tem sua razão, porém se levarmos essa explicação até o final teríamos que acrescentar “black/death/post/sludge/funeral doom metal”, e isso seria totalmente ridículo. Nossas músicas, é claro, perpassam várias vertentes do heavy metal e até fora dele, com destaque para o death e o black, mas certamente o doom metal ainda é central.

Antes de montar o Abske Fides, qual a trajetória musical de vocês? São egressos de outras bandas ou experiências musicais? Vocês vêm de uma amizade antiga que antecede a banda?
Nihil: Sim, antes do Abske Fides já éramos amigos e agora estamos ficando velhos juntos, pois desde finais dos anos 1990 e começo de 2000 estamos ligados a outras bandas e projetos. O K. já passou por vários gêneros como o Jackknife (heavy) e o Shall Suffer the Eclipe (black), e desde sempre liderou o Infamous Glory (death), além de estar envolvido com outros projetos como o Horns of Venus (death/grind) e o Death By Starvation (black). O N. tem base no hardcore junto ao extinto Intifada, mas já passou por vários gêneros como no Au Sacre des Nuits (black) e atualmente toca no Noala (sludge/post), Afro Hooligans (experimental/eletro) e provavelmente mais algumas outras coisas. Já eu passei por bandas menores de thrash e death e atualmente estou tentando retomar o trabalho com o Shyy, um projeto desde 2008 que tende a misturar black, death-rock e shoegaze.

Publicidade

Apesar de vocês terem uma década de formação, me disseram que vocês fizeram apenas uma apresentação ao vivo até aqui. A que se deve isso?
Nihil: Quando montamos o Abske Fides decidimos que não tocaríamos ao vivo, pois a coisa toda era muito pessoal e rejeitávamos qualquer tipo de exposição. Óbvio que ao longo dos anos mudamos completamente a visão sobre isso, mas ainda assim o fato de termos morado por muitos anos em cidades distintas e trabalhado basicamente com o mesmo formato acabou adiando cada vez mais a ideia de fazer shows. Só por volta de 2012 é que começamos a pensar mais seriamente nisso e, em 2013, finalmente a coisa rolou em São Paulo, no festival Let There be Doom.

Quais são as influências mais evidentes de vocês?
K.: As influências iniciais foram mais voltadas para o black metal, de ritmo lento e clima depressivo. No sentido do clima, eu diria que nessa época o Burzum foi uma grande inspiração para a banda. Conforme fomos seguindo para o doom metal, bandas como My Dying Bride, Amorphis e Shape of Despair também se tornaram referências, mas nunca deixamos totalmente o black metal para trás e, ao mesmo tempo, sempre fomos incorporando outras coisas até mesmo de fora do metal.

O show que vocês vão apresentar no Exhale The Sound será baseado no álbum de 2012? Ou levarão alguma coisa nova composta desde então?
Nihil: Apesar de atualmente estarmos trabalhando em material novo, no Exhale The Sound vamos tocar apenas as músicas do nosso full-lenght de 2012 e dos nossos antigos EPs. A ideia é contemplar diversos períodos da banda e deixar os sons novos para o segundo álbum.

Publicidade

Eu acho legal que a origem da capa do EP Apart of The World tenha inspiração no filme Fausto, de F. W. Murnau. Que, por sua vez, é baseado numa peça do Goethe, certo? O cinema e a literatura, de modo geral, exercem poder sobre os rumos e conceitos do som da banda? Que referências artísticas não musicais, ou mesmo filosóficas, têm a ver com o Abske Fides?
Nihil: Exato. Com certeza o cinema, a literatura e quaisquer outras expressões artísticas e culturais, assim como a filosofia, exercem algum tipo de influência em nossas músicas e visões sobre a banda. A inspiração da composição, o clima, a parte visual, o conteúdo das letras e o modo como concebemos e mantemos vivo o Abske Fides, embora bastante subjetivos, possuem significados que combinam nossos mundos internos com diversas referências que incorporamos ao longo da vida. Em Apart of The World, por exemplo, procuramos enfatizar uma estética escura associada às ideias de­­­­­ desilusão, desolação e conflito. Em outros contextos, essa sensação foi experimentada por diversos outros artistas/literatos/filósofos, a exemplo do próprio personagem Fausto.

O que significa Abske Fides? De onde vocês tiraram esse nome?
Nihil: Abske Fides é uma adaptação da expressão “absque fides”, que, traduzida do latim, significa “sem fé”. Na época em que montamos o projeto, um ex-integrante e eu ficávamos pesquisando palavras que traduzissem o conceito geral das nossas músicas e, ao mesmo tempo, soassem bem.

Publicidade

Ao vivo, vocês têm uma formação ou set diferente daquilo que escutamos nas gravações? Pergunto porque rolam uns teclados e uns violinos na gravação, e a produção do disco ficou bem “cheia”. Tem guitarra dobrada ou algo do tipo pra dar aquele clima?
Nihil: Ao vivo estamos contando com a presença do Mário (Crushing Darkness) na bateria. O set que utilizamos ao vivo procura adaptar muitos dos recursos que utilizamos nas gravações, mas não com a pretensão de fazer uma reprodução exata das músicas. Ao vivo a dinâmica é outra e a principal preocupação não é nem tanto o purismo da gravação, mas sim transmitir o clima geral da banda, que é cinza, denso e desolador.

Os caras do Exhale The Sound fizeram uma mixtape com as atrações desta edição, saca só:

Exhale The Sound 2014

Dia 10/10, a partir das 19h; 11/10, a partir das 15h.

Espaço 104. Pça Ruy Barbosa, 104, Centro, Belo Horizonte/MG.

Ingressos: R$ 20, para o dia 10; R$ 35, para o dia 11; R$ 45, para os dois dias.

À venda no Espaço Veg: R. Fernandes Tourinho, 441, Savassi, Belo Horizonte.

Pela internet: Sympla / Noise Stuff

Leia mais sobre o festival que é só porrada na oreia:

Entrevistando o Exhale The Sound: ROT