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Música

Como o Hit "German Whip" Pode Trazer o Grime De Volta

Teria o grime potencial para uma terceira onda? Nosso especialista britânico foi atrás da fita.

O telefone toca, eu atendo. “Alô?” Há uma pausa. “É o sr. Blacked Out Windows Leaning Back”.

Você praticamente consegue ouvir Meridian Dan sorrindo, e é fácil entender o porquê. A faixa do MC de Londres, “German Whip”, é um dos maiores hits de grime em anos -- um hino genuíno que tem uma trajetória ascendente e não apresenta sinais de queda. “German Whip” desfrutou de apoio significativo da 1Xtra e da Rinse, e Zane Lowe está por trás do remix do Two Inch Punch, e o seu vídeo já passou a marca de 1 milhão de visualizações. No fim de janeiro, foi anunciado que Meridian Dan tinha assinado com a PMR, casa do Disclosure e Jesse Ware e que em 31 de março o single teria seu devido lançamento.

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Perguntei a ele qual foi o momento em que ele percebeu quão grande se tornou “German Whip”. “Fui a uma entrevista de rádio com o Charlie Sloth”, Dan explica, “e ele estava tipo, ‘Esse é um som do caralho’. Eu achava que as pessoas estavam apenas sendo legais comigo. Isso tudo foi muito além de quaisquer expectativas que eu pudesse ter”.

“German Whip” é importante porque tem o potencial de se tornar um belo crossover. A PMR já tem um histórico de colocar sucessos nas paradas, e o Meridian Dan está agora esperando entrar nalguma lista de Top 40 com “German Whip” e o vindouro I Am London.

Muito foi dito do potencial comercial do grime no mainstream e, por um tempo, parecia que esse potencial tinha sido atingido. Boy In Da Corner, aclamado disco de estreia de Dizzee Rascal, chegou ao 23º lugar, e Showtime, seu disco na sequência, ficou ainda melhor classificado com o oitavo lugar. Mas mesmo quando o grime estava em ascensão havia ali uma certa tensão na sua relação com o mainstream. O single “Pow! (Forward)” de Lethal Bizzle conseguiu um impressionante décimo primeiro lugar, o que também trouxe à tona um leve pânico moral. A faixa ocasionou quebra-quebra em casas noturnas e foi supostamente banida por quase o mesmo número de rádios que a tocaram, e é considerada por alguns como responsável pelo notório Formulário 696, uma espécie de avaliação de risco da Polícia Metropolitana pra que as casas noturnas especificassem a etnia dos frequentadores, o que fez com que o grime fosse aos poucos expulso das baladas.

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Logo, os hits começaram a decair. Faixas como “Next Hype” do Tempa T viraram hinos do underground, mas nenhuma delas conseguiu chegar ao mainstream. O grime atingiu o ponto alto do seu sucesso comercial no meio da primeira década dos anos 2000. Então, o que aconteceu nesse ínterim?

A primeira resposta óbvia pode ser que os pioneiros do grime simplesmente desistiram do grime. Dizzee é um dos maiores artistas pop do país, e as chances de ele fazer outro Boy In Da Corner são ínfimas. Ao invés disso, ele agora tem uma vida bem da boa fazendo raps sobre feriados e colaborando com gente tipo Armand Van Helden. Wiley, enquanto isso, tendo flertado com algumas gravadoras, finalmente alcançou o sucesso com The Ascent, seu nono disco e o primeiro pela Warner, que produziu três singles top 10, incluindo “Heatwave”, seu primeiro número 1. Mas The Ascent é um disco pop, não é um disco de grime. Ele tremeu nas bases com o peso das aspirações de uma grande gravadora, e enquanto essas aspirações foram atendidas, elas não necessariamente fizeram um bom disco. Inclusive o próprio Wiley parecia estar bem frustrado com a Warner, ameaçando abandonar a gravadora em abril passado.

De fato, fora o Wiley, muitos artistas de grime que tentaram subir nas paradas falharam. Dizzee desceu a lenha na Radio 1 por causa da falta de apoio da estação ao seu último disco -- disco que almejava sucesso nos EUA, foi elevado pela crítica, e foi comparativamente um fracasso. O Third Strike de Tinchy Stryder mal conseguiu chegar nos Top 50. Muito frequentemente, os artistas de grime abandonaram o grime apenas pra descobrir que não estarão nas paradas de sucesso.

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Mas isso talvez seja simplificar demais a história. O Dizzee, por exemplo, ainda representa a maior tentativa de sucesso do gênero na virada de casaca. Apesar de não mais fazer isto, de alguma maneira Dizzee ainda representa o grime. Quando ele apareceu na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos vestindo um jaco de baseball com os dizeres “E3”, ele ainda tinha relevância. Spyro, que comanda o show de grime da Rinse FM, sugere cautela ao se esquecer da primeira onda do grime. “Há pessoas que são consideradas pioneiras do grime”, diz, “que não estão no rádio nem arrancando o coração toda semana -- mas que ainda contribuem com a cena. O Jammer manda ‘Lord Of The Mics’; Cheeky e Wiley tem o ‘Eskimo Dance’. As pessoas ainda estão contribuindo.”

Mas o Spyro também acredita que o potencial comercial do grime foi um pouco contido pelo teor das suas letras. “Às vezes”, diz, “o assunto que um MC aborda… Não vou dizer que é um tiro pela culatra, mas é só um motivo pra maluco dizer ‘tô fora’. As pessoas falam sobre o que aconteceu com elas. Alguns estão inventando, outros, não. Mas a razão pra tanta gente ser contra é por causa dos assuntos que eles abordam”. Houve, entretanto, um sentimento comum entre alguns dos artistas de grime que, pra se chegar ao sucesso que eles querem, eles talvez precisem se conter. Essa tensão levou a impressionantes contradições entre postura e prática. Uma das mais bizarras veio em 2010, com o lançamento auto-intitulado “Rei da Guerra de Londres” Riko Dan com “The Phone Call”. O vídeo retrata um tiroteio em massa, com Riko cantando a maioria dos seus versos sob o cano de uma arma de fogo. Mas termina por fim com uma mensagem contra a maconha e as armas de fogo encomendada pela da Trident, a muito criticada unidade anti-gangues da Polícia Metropolitana.

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A mudança mais avassaladora no grime pós-paradas pode ser notada na própria forma da música. Como diz o Spyro: “Certa feita, quando se pensava em grime, se pensava apenas nos MCs, não nos produtores, ou nos DJs. Era muito focado nos MCs”. Ultimamente, no entanto, o foco mudou. Ao invés de MCs comandando o show, o grime agora está surfando uma forte onda instrumental.

Essa onda (a terceira do grime, talvez?) está ajudando trazer a cena de volta ao seu ponto alto criativo. Simon Hiscocks dirige a Oil Gang, uma gravadora especializada em novo grime instrumental, e co-dirige a Box, uma casa noturna dedicada ao gênero. Como Spyro, Hiscocks notou uma mudança no tom dos MCs. “Quando cheguei no grime”, conta, “as pessoas mandavam suas melhores linhas – as linhas para serem decoradas pela geral, as linhas lokas. Sempre curti essas faixas, mas então as letras foram ficando mais e mais complicadas. Já não era mais o meu lance.” Hiscocks se viu mais interessado pelo aspecto instrumental do grime desde a sua primeira onda. “Todo mundo adora os primeiros estágios, quando o instrumental era insano -- todas as faixas do Youngstar, por exemplo. Pessoalmente, meus favoritos vieram um pouco depois, com coisas tipo “Mission Riddim” do D Dark. Aqueles instrumentais me pegaram de jeito”.

A Oil Gang agora já tem oito discos, e a gravadora ajudou a definir o som da onda mais recente do grime. Seu terceiro lançamento veio de Darq E Freaker, cujo EP Cheeryade continua a ser o maior hit do selo. O produtor de Londres, cuja faixa “Trojan” foi o ponto alto do Grime 2.0, uma coletânea da Ninja Tune sobre a cena, também foi responsável pela “Next Hype” do Tempa T. Deste então, ele assumiu a produção de Danny Brown. O vídeo de “Blueberry”, uma das colaborações da dupla, é uma fusão perfeita entre o hedonismo das festas caseiras de Detroit e dos principais nomes do grime, fazendo um generoso uso de imagens da Trellick Tower e ilustrando as férteis inspirações que o gênero continua a provocar em artistas de outros países.

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Das tendências predominantes do novo grime instrumental, duas se destacam. A primeira, da qual Darq E Freaker é defensor, pega o futurismo intrínseco do grime e coloca numa máquina do tempo, imaginando poderosos novos timbres que soassem como a presumida senciência do edifício Lloyd de Richard Rogers. Outra tendência pode ser imaginada como “fantasmológica” (de “hauntology”, essa fita que o Simão Reinaldo explica aqui), que tanto pega vocais etéreos de batalhas gravadas de rádio pirata, cortando-as e colando-as em novas formas, como no excelente EP Commotion, do Wen, ou então presta homenagem direta ao passado clássico do grime, como no caso do EP de remixes do Mr Mitch, Peace Dubs.

Por vezes, porém, essas duas vertentes se encontram. Recentemente, o Future Brown, um super grupo norte-americano que conta com nomes tipo Fatima Al Qadiri e Nguzunguzu, fez sua estreia em Londres no clube Oslo, em Hackney. O grupo tem ligações estéticas próximas dos Night Slugs, e sua música parece aumentar ainda mais as alturas glaciais e formas pesadas da série Club Construction, comprimindo-as em canções mais convencionais. Mas Future Brown também tem ligações diretas com os pioneiros do grime, tendo colaborado com Prince Rapid e Dirty Danger do Ruff Sqwad e Roachee do Roll Deep. Muitas das coisas do Ruff Sqwad estavam presentes no show de Hackney, junto com chegados tipo Riko Dan -- e a colaboração ao vivo deu ali uma ideia da trajetória potencial do grime. Riko soltou umas linhas clássicas do Roll Deep por sobre os instrumentais do Future Brown, enquanto Future Brown curtiu com as batidas do Ruff Sqwad num freestyle cinético e estridente. Havia ali um sentimento de síntese perfeita entre passado e futuro.

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“Acho que é só grime”, disse Prince Rapid sobre Future Bown, “mas do seu modo particular, assim como o Ruff Sqwad tem seu próprio som.” O próximo EP do Rapid vai ser o primeiro da Ruff Sqwad Entertainment, e em seu trabalho solo ele soa como um velho estadista, indo de “bater e roubar” pra algo mais contemplativo. “Se você ouve muito as faixas dos dias de Ruff Sqwad”, conta, “vai sacar a minha época mais rueira. Mas, agora, estou vivendo um tipo diferente de vida. Ajudo na educação dos jovens de Bow. Estou tentando melhorar minha vida.” Com o Future Brown, entretanto, Ruff Sqwad e Riko parecem incorporar toda a progressão do grime, de faixas furiosas pra uma nova onda de produção mais luminosa.

O envolvimento da PMR em “German Whip” pode ainda sinalizar uma grande mudança na forma como as grandes gravadoras lidam com o grime. Ben Parmar, o chefe do selo, diz que o grime “saiu um pouco de moda pras rádios e a mídia em geral. É uma pena”, ele diz, “que há um esse estigma negativo ligado ao grime na grande mídia. Muitos dos artistas tiveram que mudar seu som pra torná-lo mais comercial e conseguir viver de música.” Agora, no entanto, Parmar está mais teimoso. Pra ele, o sucesso de “German Whip” é sintomático de um novo cenário em que o underground e o mainstream se unem -- o mesmo cenário em que a PMR fez tanto sucesso com “Latch” do Disclosure, e o mesmo cenário que Parmar acredita estar mais receptivo aos novos crossovers do grime. “As linhas entre a música comercial e a música underground estão emaranhadas”, afirma. “Se algo é legal e as pessoas se conectam com aquilo, você encontra um caminho pra promover aquilo comercialmente.”

A assinatura com Dan marca um novo caminho pra forma como a indústria trata o grime. Ele talvez seja a nova esperança comercial do gênero, mas o espírito pioneiro do grime nunca desapareceu. Desde a primeira onda até a segunda, e agora a possível terceira, o grime nunca parou de existir -- mas agora, com a posição de “German Whip” nas paradas, o grime parece estar se colocando de volta na consciência popular. Essa música de vanguarda, em todas as suas permutações avant-garde, tem potencial para assegurar seu lugar no mainstream outra vez. Como Dan resume: “É essa a batida do meu coração -- 140 batimentos por minuto. Isso é música pra mim”.

Siga o Josh no Twitter: @JoshAJHall