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Música

O Pop Nunca Dorme: 48 Horas em Las Vegas com a Charli XCX

Passamos um final de semana frenético em Las Vegas com a artista de 22 anos.

Foto: Bella Howard / cortesia da artista

Charli XCX está gritando, colocando o corpo para fora de um táxi em movimento. "Sobe nessa janela comigo! É tão leeeegaaaaal!" Estamos passando pelas limusines da Las Vegas Boulevard às 4h30 da manhã. Tecnicamente, é uma manhã de segunda-feira, o dia seguinte do Billboard Music Awards 2015, em que Charli venceu a categoria de Melhor Música de Rap por sua colaboração no hit "Fancy", da Iggy Azalea. "Vem aqui em cima comigo, está tão fresquinho". Sentada no banco de trás, meto minha cabeça para fora da outra janela. "NÃO! Entra nessa janela. Vem voar comigo!" Quando subo e sinto o ar noturno batendo no meu rosto, meu pé é mutilado pelo salto plataforma de Charli pressionando meu tornozelo. "COMO ESTÁ SE SENTINDO?", ela grita no meu ouvido. Ignoro a dor, bato no peito e faço minha melhor imitação de Titanic. "Sou a Rainha do Muuuundoooo."

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É difícil não se contagiar com a ambição de Charlotte Emma Aitchison (Charli XCX era o seu antigo apelido no MSN Messenger), de 22 anos. Ela vendeu o sonho da fama, diversão e fortuna com músicas como "Boom Clap", "Doing It" e "London Queen" (um exemplo de letra: "nunca achei que fosse viver nos Estados Unidos, fazer as coisas do jeito americano"), mais recentemente no disco Sucker, de 2014. Eu a conheci no verão de 2013, depois de "I Love It", do Icona Pop, estourar – uma música que ela compôs para a dupla sueca e na qual também fez os vocais. Charli estava em uma sessão de fotos de capa para uma revista de música inglesa, em que aparecia ao lado de outras novas estrelas indie do país. Bandas como Palma Violets, Drenge e Peace esperavam a sua vez. Charli chegou usando o tipo de vestido de renda, meio camisola, que causaria uma hérnia no pai da Cher de Patricinhas de Beverly Hills. Ela colocou um k-pop para tocar no som do estúdio, pegou dois extintores de incêndio da mesa de objetos cenográficos e os disparou, borrifando uma porra química cor de leite por tudo. Os membros do Fat White Family observavam, suas ideias de "punk" subitamente comprometidas. A matéria continua abaixo. Charli é uma agitadora que foge totalmente às regras. Ela incorpora a atitude gótica da Siouxsie Sioux e a língua solta da Saffron, do Republica. Começou a compor quando ainda era adolescente em Hertfordshire, e, musicalmente, atravessa as fronteiras do pop, rock e electro. Conduziu sua carreira de uma maneira focada e pouco convencional, tocando em raves em Londres e lançando sozinha o seu primeiro single e uma série de mixtapes até chegar no seu disco de estreia em uma grande gravadora, True Romance, de 2013. O disco era profundamente eletrônico, dos samples do Gold Panda ao single "Stay Away", uma versão moderna da música-tema de Top Gun, do Berlin.

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"Quando True Romance saiu, quase todas as minhas músicas já estavam na internet", ela diz. "Estou muito dividida. Acredito em discos como conceito, mas, hoje em dia, tem jeitos mais interessantes de lançar música do que colocando 12 faixas numa caixa. Estou meio triste no momento. Sinto como se tudo estivesse se repetindo. Prefiro sempre criar a repetir."

Charli esteve em Las Vegas durante três dias para participar de uma série de eventos que reuniram a maioria dos líderes das paradas pop do planeta. Ela se apresentou no Rock in Rio, abrindo para Taylor Swift e Bruno Mars, e foi indicada ao Billboard Awards, além de apresentar uma das categorias. "Apresentei um prêmio uma vez no Brit Awards e foi assustador, porque não consigo ler o teleprompter. Minha visão é uma merda, não gosto da ideia de colocar coisas no meu olho e os meus óculos não combinam comigo."

Diferentemente de Charli, meu papel é escrever uma matéria sobre persegui-la durante 48 horas em Vegas. Mas isso logo é esquecido quando a verdade óbvia vem à tona. Charli mal tem o Natal para tirar folga. Ela nunca fica mais do que oito horas no mesmo lugar, que dirá 48. A programação dela no fim de semana em que a acompanhei é fazer um show, imediatamente voar para Miami para fazer o encerramento de um jogo de basquete, ir para Los Angeles para passear com o seu melhor amigo, Rostam Batmanglij, do Vampire Weekend (ela diz que ele é "completamente louco, mas ótimo"), depois voltar para Vegas para se arrumar para o prêmio da Billboard. Ela iria para Nova York na manhã seguinte, depois de participar de um debate com Nile Rodgers (ela diz que Nile também é "completamente louco, mas ótimo").

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Charli levanta a saia quando sentamos para começar a entrevista, indicando que fazer xixi definitivamente é algo que merece tempo na sua programação. "Certo, preciso fazer isto, mijar, depois subir no palco. Estou usando um macacão. Basicamente, tem um buraco aqui."

Segurando o dictafone ("Estou me sentindo em Twin Peaks agora", brinca), ela acaba de falar sobre o seu terceiro disco,

Sucker

, lançado nos Estados Unidos no finalzinho do ano passado e na Inglaterra muitos meses depois. Um dos singles, "Break the Rules", é sobre as armadilhas da indústria musical ("Não quero ir para a escola, só quero quebrar as regras") e um indicativo de como ela se sente em relação ao

show business

de modo geral. "Nunca achei que o disco fosse sair", ela me conta, explicando a diferença entre as datas de lançamento como "um monte de logística chata pra caralho". Parece estranho que o público americano a tenha arrebanhado pela sua constante presença aqui, enquanto que na Inglaterra ela não é um nome tão conhecido. "Me sinto assim também", ela concorda. "Desculpe! Não é minha culpa."

Charli está na estrada desde fevereiro. Primeiro abriu para a Katy Perry na turnê americana de Prismatic, depois fez sua própria turnê, indo à Ásia e Austrália, e, agora, está em uma turnê americana com o Jack Antonof, do Bleachers, no que ela quer se concentrar mais do que tudo.

"Para ser sincera, tudo estava começando a parecer repetitivo. Sei que, sendo uma 'popstar', você não deve reclamar dessas coisas. Você deve ficar tipo, 'minha vida é ótima!' Mas… Eu ando angustiada, deprimida com tudo. Na Nova Zelândia, cantei "London Queen" inteira com a cara no chão. Literalmente assim". Charli se joga na grama e deita de bruços, desmaiada, parecendo um Robert Smith em miniatura. "Todo mundo ficou tipo, 'ela está bem?'. Passei um mês na Austrália e tive uma crise existencial."

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O que está deixando Charli triste?

"Tenho dificuldade em entender por que você precisa passar tanto tempo promovendo um disco. Digo isto com toda a convicção: eu realmente não ligo para as vendas. Fiz Sucker para mim e quero lotar shows. Depois quero estar no estúdio. Estou achando difícil entender por que ainda tenho que falar sobre uma coisa que está na internet."

Então Charli não quer que as pessoas perguntem se Sucker foi inspirado pelos Ramones?

"Não! Pesquisem no Google, porra! Sei que não devo dizer isso, mas estou muito desesperada para ir em frente e fazer outra coisa. Acredito em discos, mas eles podem ser digeridos muito rápido. Os fãs não ficam desesperados para conseguir um disco porque ele já está todo lá, com download gratuito da faixa bônus."

O entusiasmo dela se multiplica quando fala do que vem pela frente. Em maio, Charli lançou uma colaboração com Giorgio Moroder, lenda da disco music, chamada "Diamonds", mas os dois nunca se conheceram pessoalmente. Ela está trabalhando com o SOPHIE, o cabeça da PC Music, também. "Adoro a PC Music. É inteligente, e gosto de como eles estão zoando as pessoas." Em janeiro, Charli foi para a Suécia com o Rostam, a MNDR e o SOPHIE. O convite veio dela. "Nós clicamos e fizemos quatro ou cinco músicas. Uma delas se chama ‘Vroom Vroom’. Não sei se vamos lançá-las logo ou se elas vão entrar no meu próximo disco, mas o meu próximo disco vai ser a coisa mais eletrônica que eu já fiz". Charli gosta de trabalhar com gente nova, incluindo o colaborador da Robyn, Klas Ahlund. "No próximo disco, quero que os shows sejam como ir ao cinema. Cada música vai ter uma narrativa completa." Foto: Eve Barlow

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É a teimosia rebelde de Charli de fazer pop nos seus próprios termos que torna o seu senso de escapismo selvagem ainda mais revigorante. Apesar da sua ousadia em comparação a outras superstars com quem esteve naquele fim de semana, ela está conseguindo se dar bem mesmo não tendo uma aparência limpinha. Sucker ganhou o prêmio da Rolling Stone de Melhor Disco Pop em 2014. "Na verdade, isso foi antes mesmo dele ser lançado nos Estados Unidos", ela diz, reforçando a natureza absurda das atuais campanhas de divulgação de discos. O público americano foi conquistado particularmente quando o single principal, "Boom Clap", apareceu na trilha sonora do drama adolescente A Culpa É Das Estrelas. O rosto de Charli estampou a capa das revistas americanas, e até agora, ela parece estar em absolutamente todo lugar neste ano. "Vou cancelar coisas na próxima semana e nunca fiz isso antes. Estou tão empolgada", ela diz, acelerando os momentos finais do tempo que temos reservado. "Vou descansar porque estou muito cansada. Espere, acho que tenho que ir. Ok. Tchau!"

Assisto ao show dela ao entardecer, do lado do palco. Charli faz um show simplificado, mas provocativo, com uma banda de rock que deve muito aos anos 90, imitando a estética punk de um L7 ou de um Luscious Jackson. Durante "I Love It", recebida com êxtase pela plateia, ela finge transar com o baixista, e, em "Famous", faz beicinho usando óculos de sol e meias arrastão como se fosse a filha bastarda do Liam Gallagher com a Debbie Harry. Em "Body Of My Own", ela olha para as mulheres mais velhas na plateia e grita: "Esta aqui é sobre o poder da buceta, filhos da puta!". Durante "Need Ur Luv", menciono entusiasmadamente para um dos seguranças a vez em que ela cantou em cima do piano do Rostam no David Letterman Show. Ele me diz que os joelhos dela ficaram todos roxos de engatinhar sobre o piano sem joelheiras durante os ensaios. Todo mundo concorda que essa foi a melhor aparição de Charli na televisão. Ela dá de ombros quando sai do palco, incerta de que se saiu bem. "Certo, o que vem agora?", ela pergunta. "Fotos? Uhu! Vamos fazer fotos."

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Chega o domingo de manhã, e O Virgem de 40 Anos está passando na TV do quarto de hotel de Charli. Cansada, mas ainda sorridente, ela mergulha as mãos numa tigela de batatas fritas enquanto é arrumada por um quarteto de especialistas em cabelos, unhas e roupas. Quando perguntam como foi em Miami, Charli parece ter quase esquecido que isso aconteceu. Mas Los Angeles foi legal, e Rostam continua "louco" e "ótimo". A conversa do grupo flutua entre a performance de Iggy e Britney que rolaria mais tarde, o lançamento grandioso do clipe "Bad Blood", da Taylor Swift, o documentário Going Clear, da HBO, e a festa na piscina para onde todo mundo iria depois, com discotecagem do prodígio do EDM, Zedd. Charli está ansiosa com a possibilidade de esbarrar em Nick Jonas. "Sabe como eu comemorei o lançamento de Sucker?", ela pergunta. "Fui patinar no gelo em Boston com ele e com a Meghan Trainor. Ele fechou um rinque e tomamos chocolate quente. Foi a coisa mais inocente que eu já fiz."

Charli repete o seu discurso de apresentadora sem parar, porque, como ela disse antes, não consegue ler o teleprompter. Ela enumera os indicados para Melhor Dupla ou Grupo, que incluem o One Direction e o Five Seconds of Summer. "E se o One Direction perder para o Five Sos?", ela pergunta, prometendo anunciar que o "Five Sos" é o vencedor, se o "Five Sos" ganhar.

Como sempre, o relógio está correndo. Tic tac.

"Ok, o que eu vou dizer no tapete vermelho? O que estou vestindo? Esta joia é Vivienne Westwood, certo? Alguém pode pedir umas vodcas com Red Bull?" Ela desliza para dentro de um vestido preto vintage, dos anos 30. "Você precisa de uma vodca com Red Bull também." Nos bastidores, a equipe dela conta os minutos até o carro chegar – cada um correndo para superar o outro nas suas respectivas tarefas. Entre eles, a maquiadora de Nova York de Charli, cujo cachorro tem seu próprio agente de talentos. "Como isso funciona?", pergunta Charli. "Você fica com todo o cachê do seu cachorro?"

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Momentos depois, estamos todos no tapete vermelho, enxotando os jornalistas que a cercam. "Charli! Se você tivesse uma casa em Vegas, como ela seria?", grita um deles. Ele é vencido por dois indivíduos que se aproximam da glamurosa XCX com um emoji de cocô de papelão e pedem que ela diga algo para a câmera. "Espere, tenho que falar sobre cocô?", ela diz, perturbada, e depois coloca o cartaz em cima da cabeça. "Ha! Você tem merda na cabeça!", diz a consultora de moda dela. Todo mundo ri. Charli vai para o salão principal da premiação, onde arrasa com o seu discurso e recebe um novo prêmio para a sua crescente coleção. Depois, ela volta para o hotel para tirar um cochilo antes da festa. Aparentemente, todo mundo se reúne de novo às 23h.

Foto: Eve Barlow

Às 0h30, coloco o pijama e assisto ao episódio final de Mad Men, rezando para que Charli finalmente tenha decidido ter uma merecida noite de sono. Mas o pop nunca dorme. À 1h, chega uma mensagem de texto. Todo mundo está entrando num táxi e indo para um clube chamado XS. Tem uma piscina ao ar livre e meninas de biquíni em cima de golfinhos infláveis, chacoalhando ao som de EDM. Atrás da cabine do DJ, Charli coloca a sua terceira roupa da noite – um collant, que também oferece alguns desafios. "Isto aqui faz o meu xixi ir em cinco direções diferentes", ela diz, prometendo buscar uma potencial parceria com a Juicy Couture, para que não tenha mais que perder tempo criando estratégias quando vai ao banheiro.

Zedd convida Charli para entrar na cabine e (embaraçosamente) promover sua própria música, "I Love It". Ela parece surpreendentemente insegura sobre o que fazer, e, mais tarde, revela abertamente o quanto pode ser introvertida. "Não gosto de socializar em grandes festas de celebridades", ela grita, enquanto toca um remix horroroso de "Rude", do Magic. "Só gosto de sair e me divertir com os meus amigos. Isto é divertido". Apesar das suas declarações de que gosta de se manter à margem da cena vip, Charli aparece horas depois na festa do Ed Sheeran, em um bar exclusivo no terraço do Nobu Hotel. "Ed é ótimo", ela diz. Só ótimo.

A proibição da entrada de jornalistas no tal Nobu Hotel exige que eu mais uma vez abandone a minha perseguição a Charli XCX. Mas outra mensagem da equipe dela convoca para a continuação da matéria. Quando chego na reunião silenciosa, Charli ri: "Como diabos você entrou aqui? Rápido, tire uma foto minha com a cara da Mariah Carey no fundo". Ela deita no parapeito do terraço, me ordenando, de forma pouco sutil que eu tire uma foto dela com o Ceasars Palace e a vista de Vegas de fundo "para a matéria". Depois, monta em cima de mim e enterra minha cara na sua adornada virilha. "Não consigo nem imaginar sobre o que vai ser essa sua matéria", ela diz. Roubando uma frase que Charli disse antes no palco, esta matéria é sobre "o poder da buceta, filhos da puta".

Eve Barlow ainda está se recuperando desse fim de semana insano num retiro em algum lugar perto do letreiro de Hollywood. Siga-a no Twitter.

Tradução: Fernanda Botta