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Música

A Tempestade Catastrófica e Gigantesca do Jupiterian

Eles querem fazer você se sentir uma formiguinha perdida num maremoto.

Uma formiga caminhava sobre a superfície de uma extensa praia. Em um determinado ponto, a formiga caiu numa cratera feita a partir de uma pegada deixada por um homem. Enquanto a formiga tentava arduamente sair do buraco, as ondas batiam e chegavam cada vez mais perto. Ao observar o desespero da formiga, outro homem resolveu ajudá-la mas, temendo a dor da picada do inseto, decidiu não tocá-la. Então, ele construiu um caminho nivelado ao buraco e sentou por ali para observar o trabalho da formiga. Sem perceber o caminho facilitado, a formiga caiu mais algumas vezes antes de conseguir sair.

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Isso poderia ser uma fábula, uma metáfora bíblica que relaciona a proporção do amor de Deus por nós, meros mortais, e nossos problemas tão pífios perante o tamanho das ondas, da praia e das pegadas gigantes que mais parecem crateras, mas não, foi só um devaneio que eu tive enquanto fumava um durante as férias no litoral. Se, na época, o Jupiterian já tivesse lançado o Archaic, provavelmente a Parábola da Formiguinha seria muito mais intensa.

Caiu no meu colo este EP de estreia dos caras de São Paulo, masterizado pelo James Plotkin do Khanate, que já trampou com Bongripper e Isis, e como eu curto poco um bom sludge-stoner-doom-metal e os caralhos, dediquei toda a minha atenção a este trampo e fui trocar uma ideia com o guitarrista e vocalista Thiago Vakka pelo Facebook. Leia a conversa abaixo, enquanto ouve esta maravilha:

Noisey: Cara, como é o processo de composição desses sons? Tem uma linha de raciocínio que vocês seguem ou é a partir de uma improvisação que acaba dando certo?
Thiago: Bom, em geral eu crio o riff base da música e mostro pros caras no ensaio. Aí a gente vai acrescentando coisa em cima e todo mundo dá ideia, até sobre o clima que a música tem que ter, se ela precisa acelerar mais depois, ou ficar ainda mais lenta.

Saquei. Porque eu sempre relaciono com imagens na minha cabeça, aí a música faz sentido, porque cria uma narrativa, como se fosse uma trilha sonora. Foi assim que vocês pensaram pra fazer o clipe de “Archaic”?
Certamente. Acho que a paixão por música vem justamente dessa correlação com sentimentos e momentos de cada um. É bom quando um vídeo pode mostrar isso. Especificamente nesse da “Archaic”, eu quis retratar como seria uma viagem a um outro planeta e encontrar uma civilização primitiva e seus rituais, tanto que a edição foi feita com imagens do primeiro documentário da NASA sobre Júpiter da década de 1970, misturado com cenas do On the Silver Globe, que é um filme completamente esquecido, mas maravilhoso, sobre praticamente o mesmo tema. Me remete a uma viagem meio que O Planeta dos Macacos, que de longe é meu filme preferido. A ideia toda do vídeo e da viagem, me remete ao filme.

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E por que Júpiter, especificamente?
O nome que pensamos a princípio era Codex Jupiter (escrito Lvpiter) mas era muito ruim de falar, e toda vez tinha que explicar pro pessoal como escrevia. Aí pra simplificar ficou Jupiterian. Júpiter por ter toda a simbologia, desde os gregos. Sou fascinado por mitologia e por Lovecraft. A gente pensou em criar meio que uma temática pra banda, como se existisse uma raça jupiteriana de seres gigantes louvando deuses de proporções cósmicas em tamanho.

Um dos sons se chama “Procession Towards the Monolith”, e eu imaginei pra ele meio que um dia que essas pessoas fossem cultuar uma estátua de seu Deus, que por coincidência em Júpiter, um monolito seria impossível, dado que o planeta é todo formado por gases.

E a pira é fazer um som que remetesse ao que este planeta faria? Algo grave e potente?
[risos] Bom ponto de vista. Talvez chegar o mais próximo do som que aquela tempestade de centenas de anos (e que remete a um olho quando você vê foto do planeta) deve fazer na superfície. E triste com a extinção de um planeta inteiro por ela.

Uma tempestade catastrófica…
Exato! Eu imagino muito uma paisagem como é descrita no livro Nas Montanhas da Loucura do H.P. Lovecraft, saca? Tudo gigante, parede enormes, estátuas e tudo mais em templo cerimonial em proporções gigantescas.

Eu também. Você acha que essas proporções gigantescas têm a ver com a ideia de percepção alterada? Tipo quando você fuma um e começa a reparar em detalhes insignificantes, como uma formiguinha andando na areia da praia…
Acho que isso ajuda sim [risos]. Mas é mais baseado na minha piração literária. Eu leio pra caralho, especialmente Lovecraft e acho que a construção de mundos dele é genial, assim como o Tolkien, que são meus dois favoritos.

Livros também são formas de alterar a percepção, afinal. E essa pira da formiguinha eu tive uma vez e sob a perspectiva dela, o som que eu (um gigante) produzo, deve ser bem parecido com o som que a Jupiterian faz, certo?
Caralho! É exatamente isso.