O nosso Mexefest foi bom e suado

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O nosso Mexefest foi bom e suado

O Mexefest é um festival extremamente fotogénico, e no limite, mesmo que todos os concertos fossem um desastre, teríamos sempre imagens belíssimas para levar para casa.

No vaivém constante, esperar não é de todo mau.

O Mexefest é um festival extremamente fotogénico. No limite, mesmo que todos os concertos fossem um desastre, teríamos sempre imagens belíssimas para levar para casa. Na máquina, no telefone, ou na cabeça. Talvez bastasse isto: caminhar por Lisboa à noite, com aquele frio que cheira a Natal a aquecer-nos a alma e poder ir saltitando entre o esplendor de salas como a da Sociedade de Geografia, da Casa do Alentejo, da Igreja de S. Luís dos Franceses, ou do Palácio Foz, o peso histórico do Coliseu, do São Jorge e do Tivoli e o apelo rock-espalha-brasas do Tanque, da Garagem da EPAL, da Estação do Rossio, ou do adolescentíssimo ginásio do Ateneu Comercial, onde a cerveja entornada cola as sapatilhas ao chão e o cheiro a ganza e a condensação da humidade do ar trazem à memória noites históricas do Pavilhão dos Belenenses, do Carlos Lopes, ou do Dramático de Cascais.

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Talvez bastasse, mas não foi preciso ficar pela descoberta (ou redescoberta) de parte da história cultural da cidade. Nesta quinta edição de um Mexefest consolidado e bem oleado não faltaram momentos grandiosos em várias formas e feitios, como não faltou aquele ambiente de festa partilhada entre filas para entrar e sair, shuttles para cima e para baixo, concertos perdidos, ou vistos de esguelha, dois ou três passos de corrida pela Avenida da Liberdade para chegar a horas, pregos e imperiais nas portas de Santo Antão… Em modo "é pró' menino e prá' menina", portanto.

Havia no cartaz amplitude suficiente de rotas musicais para antecipar isso, na verdade, bem como para prever a elasticidade geracional e a proficuidade de tribos urbanas que se confirmou.

Chairlift. Nova Iorque dos Recreios.

"Tribos urbanas" é tão anos noventa, desculpem! Já agora, a talho de foice, desculpem-me também os meus muitos amigos, conhecidos, familiares e afins, que andam pelo beicinho com o Benjamin Clementine. Não vou dizer que o homem é uma fraude (acho que no Sábado cheguei a dizer isso a alguém, mas era só daquelas coisas que se atiram para o ar em tom de voz mais elevado para armar ao pingarelho), mas há alguma coisa ali que me continua a escapar, mesmo depois de compreender a monumental consagração de um Coliseu apinhado e rendido ainda de luzes acesas. Compreendo, aceito, percebo o charme e o apelo da figura descalça, de jaqueta em tronco nu, tão imponente como sensível, com mais Nina Simone na voz (roubei-te esta Sara) que gente a ver Peaches no Tanque…e, no entanto, não me arrepia, não me faz querer ver nenhum dos próximos 250 concertos atestados que dará em Portugal nos próximos seis meses, não me obriga a ir tentar ouvir outra vez "At Least For Now". É, provavelmente um problema de soberba da minha parte perante tamanha unanimidade. Não seria a primeira vez, é-me fácil reconhecer. Acontece-me com os Radiohead, por exemplo (acendam o crematório). Nem todos podemos gostar de bacalhau, mas tenho a certeza que os que sentaram à mesa desta ceia natalícia antecipada saíram de barriguinha cheia e haverá hoje muitas histórias a ser contadas no pátio do teu Liceu, na cantina da tua faculdade e na copa do teu escritório e todas terão um nome em comum: Benjamin Clementine.

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Bombino, obviamente a dar-lhe.

E nessas conversetas de segunda-feira dolente também não vai faltar o estrondo épico, bonito e eterno com que Patrick Watson regressou a Lisboa e que certamente fará muitos correr atrás de "Love Songs for Robots", mais recente disco e forte candidato a "slow burner" do ano. E nem era preciso o momento instagram da noite com o refrão de "Man Under the Sea" a ser arrancado a partir da Tribuna com o músico canadiano armado de megafone e acompanhado à guitarra. Não era preciso, mas ainda bem que existiu, porque fica gravado a ouro na mesma memória colectiva (um exagero, eu sei, mas ainda vai piorar nas próximas linhas) que vai eternizar o aconchego desarmante da actuação perfeita de Villagers no São Jorge, a comunhão soul da versão acústica de Akua Naru no escurinho da Blackout Room em 15 minutos de puro deleite, a surpresa da versão de sonho de Ariel Pink da sua própria versão da pérola country soul ultra lo-fi que é "Baby", dos irmãos Donnie & Joe Emerson perante um Coliseu atordoado e confuso com a esquizofrenia habitual de um gajo que tem como desporto favorito o auto boicote, a beleza cristalina do segredo mais bem guardado da música brasileira, Castello Branco, no cenário surreal da Sociedade de Geografia de Lisboa, os ducktails a despejarem "massive tunes" num Tivoli embevecido com esta versão "Real Estate meets Pavement" em câmara lenta comandada por Matt Mondanile, ou, claro, o ressuscitar momentâneo do electro clash de princípios do século pela mão (pelo corpo todo, melhor) de uma Peaches electrizante (passe a redundância) capaz de levar uma piscina a rebentar pelas costuras à histeria total.

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Houve, claro, muitas outras coisas espantosas que se viram em bocadinhos (They're Heading west, Glockenwise, Flamingos), outras que não se viram e não faz mal e outras que pela lente da Ágata Xavier nos chegam com um brilho tal que nos faz querer bater com a cabeça na parede tal é o arrependimento (Tó Trips, Bombino, Chairlift, Cave Story). Para a próxima, promete-se, não pouparemos quilómetros entre a Avenida da Liberdade, os Restauradores e as Portas de Santo Antão.

Tó Trips em modo Sociedade de Geografia encantada.

Conheces Lisboa? No mexefest conheces mais de Lisboa.

Akua Naru a sentir a capital.

Cave Story em ambiente natural…na Garagem.

Da Liberdade às Portas de Santo Antão. Ela vai de monociclo, tu vais mesmo a pé?

Há música na Estação.

Matt Mondanile e os seus Ducktails de "massive tunes" e "incredible melodies".

O festival mais fotogénico.

Vamos à piscina, todos prá piscina.

Pessoas a guardarem coisas na cabeça.

The teaches of Peaches.