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Música

A Guerra do The Bug Contra a Mediocridade

O produtor Kevin Martin quer alterar sua consciência através da música e para isso ele precisa de um porão, um sistema de som destruidor e a liberdade para poder tocar seu som no volume que quiser.

The Bug não quer tocar para você. Ele quer alterar permanentemente a sua consciência através da música. Para fazer isso, ele vai precisar de um clube minúsculo num porão, um sistema de som destruidor e, mais importante, da liberdade para usar este sistema em níveis potencialmente nocivos sem se preocupar com vizinhos putos da cara. E se você, o promoter, não cumprir a enérgica, mas direta lista de exigências do seu rider técnico, ele vai te avacalhar em público pessoalmente.

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"O gerente do lugar [em Vancouver] estava gemendo feito um cuzão por causa do volume na passagem de som", escreveu Martin na página oficial do The Bug no Facebook, onde vem registrando seus "relatórios de guerra", despachos da turnê do novo disco, o apocalipticamente pesado Angels and Devils. "Nosso respeito ao público, que curtiu mesmo com o volume sendo progressivamente abaixado, música a música, para compensar o número de reclamações dos vizinhos." Tem rolado um review como este de praticamente cada parada da turnê que levou Martin e seus MCs, Flowdan e Manga, a cerca de 20 lugares entre Canadá, México e Estados Unidos.

A parada dele no Rotture, em Portland, foi "puro punk misturado com o funk mais sexy", uma noite de "abandono completo e histeria geral" – mesmo com um prato quebrado e um pedal de efeitos funcionando mal. O Good Life Bar, de Boston, era um "porão suado" com um público "nojento, grosseiro, tosco, feio e terrível" (isto é um elogio). O público de Calgary foi "o mais drogadito até agora", com "caras doidos de quetamina" rodeando o palco e uma mulher na primeira fileira "agarrando o pau do Manga durante o set."

O clube Barcelona, em Austin, recebeu um review brilhante, apesar do público de menos de cem pessoas – "foi a fórmula perfeita: um clube num porão minúsculo com um sistema de som enorme" – e em Los Angeles "não tinha ninguém tímido, só ravers" e um "sistema de som gigante". As únicas cidades que não foram bem cotadas foram Nova York e Chicago, que ganharam tipo uma nota sete, se você for generoso.

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"Eu fiquei tão chocado com Williamsburg", ele conta sobre sua experiência no Output, no Brooklyn, "com quanto é neurótico e como tem gente esnobe por lá." Os ares da vizinhança de "decadência revestida de roupas de marca discretas – pessoas descoladas demais para se mexer e suar e fúteis demais para sentir empatia" ainda foram piorados pela recusa do lugar em utilizar toda a potência do seu formidável sistema de som e pela redução contínua do volume durante o set.

No Evil Olive, em Chicago, os problemas com o volume persistiram, provavelmente porque a gerência não queria "atrapalhar o som dos copos de coquetel brindando na área vip do andar de cima", brinca Martin, avacalhando a vibe classe alta do lugar. "Entendo que eles não queriam que a polícia viesse, mas por que agendar o nosso show, em primeiro lugar, quando o nosso agente e o rider deixaram muito claro que tocamos num volume extremo?".

Martin não quer que você pense que ele é intransigente só para satisfazer seu ego. A insistência dele em que tudo seja absolutamente perfeito – da iluminação ao som, passando por equipamento e ambiente – é toda em nome de uma experiência transformadora (ou pelo menos memorável) para o seu público.

"Mudei meu DNA vendo certos shows", ele diz, citando duas noites em particular que tiveram um efeito permanente na sua psique. "Um foi o primeiro sound clash que eu vi na vida, entre o Iration Steppas e o The Disciple num armazém minúsculo em Londres, e o outro foi um show dos Swans", uma banda de rock notoriamente barulhenta que ficou famosa por ter seus shows encerrados pela polícia e por vizinhos irritados. "Só estou interessado em atingir outras formas de percepção e consciência através de frequências e decibéis extremos."

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Artistas barulhentos como o Sun O))) e o My Bloody Valentine, famosos pelos seus drones de chacoalhar as entranhas, tiveram um papel importante na visão de Martin da experiência de um show. "Eu toco num volume altíssimo porque acho que tem um efeito de ignição no cérebro e no corpo das pessoas", ele diz. "Então tem sido divertido levar essa pegada agressiva para muitos desses shows nos Estados Unidos. E tem sido o máximo ver a cara das pessoas, seja de alegria total, choque absoluto ou nojo completo."

No começo deste mês, ele fez dois shows na Califórnia, um no Echoplex, em Los Angeles, e outro no The Independent, em São Francisco, com a lendária banda de noise americana Wolf Eyes. A decisão de reunir os dois pareceu bizarra a princípio, mas acabou fazendo com que as duas paradas entrassem para as suas favoritas da turnê. "Aqui estou em São Francisco", ele diz, "vendo o Wolf Eyes tocando em algum bar de rock para alguns caras vestidos de preto, parecendo mal humorados, e pensando: o que eles estão fazendo aqui? Por que nos colocaram para tocar com esta banda? E depois, quando nós aparecemos, subitamente todas as garotas vieram para frente do palco, e todo mundo na plateia começou a dançar loucamente, das garotas lá na frente aos coroas metaleiros de barba.

O que tornou esses shows únicos foi o fato de que, diferentemente de uma festa de dubstep comum ou de um festival de techno enorme, esta plateia chegou com poucas expectativas de como seria a noite. "Nas festas de dubstep na Europa eu fiz alguns dos piores shows da minha carreira", admite Martin, "porque a maioria das plateias de lá quer uma fórmula. Eles querem uma batida familiar. Eu não lido com isso. Eu lido com explosões, boeings decolando e massagens profundas. Estou muito mais interessado em insurreições vocais do que em oferecer trilhas sonoras passivas para noites de chapação."

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A dance music de hoje não corre riscos, Martin acredita, e do que ela precisa agora mesmo é alguém que entre rasgando no campo em vez de apenas passar a bola. "O problema é que a dance music se tornou muito user-friendly, e boa parte dela se baseia numa espécie de nostalgia retrô – ao passo que eu prefiro o choque do futuro", ele diz. "O motivo pelo qual me apaixonei pela música jamaicana foi que, sucessivamente, cada passo adiante foi revelador, tipo, que porra é isso?". Ele cita um show dos DJs Rashad e Spinn, do footwork de Chicago, como uma das únicas experiências verdadeiramente futuristas que ele teve recentemente.

Quando perguntado sobre a sua crescente reputação de enfant terrible no mundo da dance music, Martin insiste que está apenas sendo sincero. "Se você diz o que pensa e está sendo sincero, você é visto como uma pessoa difícil de lidar na indústria da música", ele diz. "Se você tem uma estética forte que não tem nada a ver com o resto, você é visto como uma espécie de aberração ou ovelha negra – mas eu estou do lado das aberrações."

Seja lá o que for que você pense da atitude quase militante de Martin em relação a shows e turnês, uma coisa é certa – ele exige tanto de si quanto do seu público. "Gosto de extremos nos sons, seja o som extremamente bonito ou fantasticamente feio", ele diz. "Do que eu não gosto é toda esta merda entediante no meio que só atrapalha." Acima de tudo, os exercícios de sinceridade de Martin – sejam eles reviews brilhantes ou apontar de dedos implacáveis – são parte de uma causa válida: ajudar a varrer do underground a mediocridade que constantemente ameaça envolvê-lo.

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Max Pearl gosta de livros de História e de dançar a noite inteira - @maxpearl

Tradução: Fernanda Botta