Julgando meus discos: Brann Dailor ranqueia os álbuns do Mastodon

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Noisey

Julgando meus discos: Brann Dailor ranqueia os álbuns do Mastodon

O baterista revisita obra e lembranças da banda que hoje é uma verdadeira potência metálica.

Na série Julgando Meus Discos , batemos um papo com integrantes de bandas que lançaram discografias substanciais ao longo dos anos e pedimos que elenquem seus discos por ordem de preferência. Traduzida do Noisey US .

Por mais que o baterista Brann Dailor tenha acabado de mandar sua lista dos discos de Mastodon por ordem de preferência, ele ainda estava em dúvidas ao que tinha acabado de fazer até o começo da entrevista. Por alguns minutos, parece que o futuro da conversa acabaria com um telefone batido na minha cara.

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"Nem sei se aquela lista é de verdade. Isso é muito difícil. Quase te liguei e cancelei tudo de tão perplexo que fiquei", disse o baterista, sinceríssimo.

"Nem sei porque me meti a fazer isso, esse negócio de dar nota pra disco me parece coisa de crítico, coisa que eu não sou. Vou fazer, mas é capaz que coloque tudo em primeiro lugar, porque é como se cada um fosse um filho. Você pode me pedir isso de novo amanhã e a ordem inteira vai mudar por motivo x ou y."

Categorizar seus filhos em favoritos e não-tão-favoritos demora. Mas 45 minutos após a hesitação inicial, Brann havia meticulosamente dissecado a história da banda e traçado seu crescente legado como potência do metal progressivo, comentando ainda sobre as tragédias e perdas pessoais de cada integrante, incluindo a sua própria.

Os discos conceituais do Mastodon estão cheios de riffs sludge/rock matadores tendo como pano de fundo histórias sinistras e fantásticas sobre redenção e dor, mas eles também sabem apoiar uns aos outros quando dá ruim. Durante a composição de Emperor of Sand, Dailor diz e que ele e o guitarrista Bill Kelliher passavam boa parte das manhãs só conversando. (A mãe de Kelliher sofria com um tumor no cérebro, enquanto a de Daillor sofria com lesões cerebrais contínuas). Dailor diz que essa foi uma maneira que os dois encontraram de dissipar a tensão antes de entrar em estúdio para criar riffs e batidas complexas.

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"A sorte dos artistas, músicos e pessoas é que eles têm essa válvula de escape artística, passional, e eles podem colocar toda a merda que acontece na vida deles lá dentro, dar uma chacoalhada e transformar coisas terríveis em algo bonito", diz Dailor.

8. Call of the Mastodon (2006)

Noisey: Por que Call of the Mastodon ficou na última posição?
Brann Dailor: Creio que ficou aí porque sinto que esse não é o Mastodon em sua forma definitiva, coisa que sinto em relação ao Remission também. Adoro essa nossa época porque foi quando nos conhecemos e tem aquela faísca de uma sonoridade nova que havíamos descoberto juntos. Foi o disco que nos mostrou pro mundo e nos fez pegar a estrada. Estávamos loucos pra sair em turnê e começar a tocar como banda. Essa é a basicamente nossa demo — o chamávamos de The Nine Song Demo inicialmente — um título nada criativo. Tocamos esses sons em porões e em salões de festas de vetreranos de guerra. Foi bem louco.

Entendi o que você quis dizer, que era o Mastodon e ainda assim não era o Mastodon, mas dava pra sacar a direção que vocês tomariam.
Essa gravação meio que salvou a banda também. Eu estava meio em cima do muro com a ideia de ficar ou não em Atlanta. Por algum motivo as coisas não estavam indo bem de cara e eu estava sem paciência. Tinha acabado de conhecer os caras e disse “Olha, vamos gravar esse disco e depois vemos o que acontece”. No segundo dia estávamos ouvindo o que fizemos, senti que havia algo de especial ali e não tinha como largar aquilo tudo. “Não vou embora, não vou me mudar para Nova York. Vou ficar aqui e fazer essa parada de Mastodon”, disse.

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7. The Hunter (2011)

O clima deve ter sido bem complicado pra banda. [O irmão do guitarrista Brent Hinds morreu em um acidente de caça durante a composição de The Hunter.]
Foi dureza. Era difícil se concentrar trabalhando nesse disco, sendo bem sincero. A coisa aconteceu quando começamos a pegar a manha das composições para este álbum, então Bill nos disse que precisaria de um tempo para passar por uma reabilitação. Além disso, o irmão de Brent havia acabado de morrer. Com tudo isso acontecendo, em termos pessoais, não foi lá muito bom mesmo. Brent também não passava por um bom momento mental.

Logo de cara, o clima era pesado. Para passar por isso tudo, tivemos que deixar tudo o mais tranquilo possível no estúdio, acho. Então para muitas das músicas acabamos deixando de lado o conceito do disco. Foi quase que como um retrocesso. Tínhamos acabado dois anos de turnês de Crack the Skye, depois de termos criado estruturas musicais extremamente progressivas, com composições bastante densas, então acabamos não indo fundo em algumas canções deste disco. Para faixas como “Blasteroid”, por exemplo, só juntamos tudo e era algo legal de se falar sobre e tocar, então dissemos “É isso aí, não vamos além disso com essa música. Essa está pronta. A próxima… Pronto, está feita”. Tentamos não pirar muito nem se frustrar ao tocarmos porque não era possível por conta do momento mental que vivíamos, especialmente para Brent. Precisávamos que o estúdio fosse um local feliz. Ainda amo esse disco e poderia colocá-lo em primeiro lugar se assim precisasse.

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6. Remission (2002)

Achava que esse era o disco de estreia da banda e você acaba de me falar que o primeiro disco foi Call of the Mastodon.
Compomos todas as músicas aqui juntos. No disco anterior, Call of the Mastodon, tínhamos acabado de nos conhecer, faziam uns poucos meses. Enquanto estávamos na estrada, tocando em porões, começamos a compor o que viria a ser o Remission. Ficamos com esse material em mãos por um bom tempo para juntar tudo e analisar o que faríamos. É um disco bastante complexo e doidão, mas acredito que conte com alguns momentos mais suaves, delicados. Tem a última faixa, “Elephant Man” e também “Trilobite” e “Train Wreck”, dá umas dicas do que faríamos no futuro.

Foi um álbum mega pesado e feroz. Ainda o adoro e acredito que, certamente para algumas pessoas, esse disco bombou. Foi algo novo na música pesada. Estávamos ansiosos para que saísse, curiosos para saber até onde levaríamos o som e para onde iríamos depois.

O disco te ajudou de alguma forma em lidar com a morte da sua irmã?
Sim, eu sempre estou escrevendo sobre isso. Foi o primeiro disco no qual participei com algumas letras, foi interessante. Nunca tinha feito isso.

5. Once More Round the Sun (2014)

Tinha muita coisa pessoal rolando aqui?
Sim, como sempre.

Deve ser dureza ver seus discos fazendo sucesso com base na dor de familiares e amigos.
As coisas acabam rolando assim. Depois da tour de The Hunter, estávamos compondo bastante E quase todas as músicas estavam prontas, mas ainda não tínhamos as letras. Acho que foi em 4 de janeiro — poucos dias após o ano novo — minha mãe caiu da cadeira e teve hemorragia cerebral, abrindo seu crânio e ficando bem mal; ela ficou um mês em coma. Assim sendo, mal participei das gravações e fiquei na UTI em Rochester, escrevendo letras.

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É difícil relembrar disso tudo agora?
Não, tudo bem, tudo bem. Como a maioria das pessoas, você acaba construindo uma barreira pra si mesmo em que fica fácil falar de algo de forma bastante clínica, como a morte da minha irmã. Consigo ficar aqui falando sobre isso porque trabalhei em cima disso por anos e anos. Sobre não falar de algo como se tivesse acontecido comigo, mas com outra pessoa, como se falasse de algo que aconteceu com elas. É uma boa ferramenta, creio.

Pra mim, este disco resume todo aquele período. Foi péssimo. Mas quando voltei a gravar, foi foda ter Bill [Kelliher], Brent e Troy [Sanders] lá comigo. Somos como uma família. Há algo de muito especial em nossa banda no sentido de que somos todos muito próximos e permitimos uns aos outros explorarem estas situações familiares trágicas por meio da música. Isso é uma coisa que curto muito nos caras e ajudou bastante todos nós a lidarmos com situações que infelizmente surgiram ao longo dos 20 anos em que tocamos juntos. Há uma maneira de quase se alterar o resultado de algo quando se lida com o fantástico e se está no controle da música e da narrativa; você pode mudar o que acontece.

4. Emperor of Sand (2017)

Este também é um disco conceitual?
Este aqui nos levou de volta ao reino dos discos conceituais, o que é sempre divertido. Este tratava de câncer, tinha muito câncer rolando — mais tristeza e clima ruim no ar. Foram uns anos bem difíceis: a mulher de Troy teve câncer de mama e a mãe de Bill teve um tumor cerebral. Fora isso, minha mãe ainda estava se recuperando da lesão que sofreu e teve um monte de problemas desde lá.

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Isso é horrível.
Bill e eu conversávamos toda manhã sobre médicos e opções e coisas do tipo tomando um café, daí entrávamos em estúdio e começávamos a ver o que rolava em termos de riffs e gravações.

Gravar foi como um refúgio, então? Porque aí dava pra parar de pensar em tanta coisa escrota e só tocar.
Com certeza. Fora que é nosso trabalho gravar e compôr, mas também é algo que amamos fazer. É aquele clichê que todo músico vai te falar sobre como a música estava ali nas horas em que mais precisaram e tal. Pelo menos eles podem fazer isso. Certamente é animador quando você não está lá muito bem e envolto em circunstâncias horríveis ou quando tem aquela conversa que não chega a lugar algum com médicos. Desça no porão, toque uns riffs e se sinta bem por ter feito algo e encontrado algo de bom no meio da frustração.

3. Blood Mountain (2006)

A revista

Metal Hammer

elegeu

Blood Mountain

o melhor disco de 2006. Vocês ficaram empolgados com isso?

Provavelmente, acho. Não lembro. Acho que foi um puta feito pra gente. Foi nosso primeiro disco por uma gravadora grande, então ficamos bem empolgados com ele. Também sabíamos que um monte de gente que dizia que iríamos nos vender e fazer um disco pop e acho que ficou bem longe disso.

Inclusive acho que nos esforçamos bastante pra não fazer isso. Não que tenhamos parado e pensado “Puxa, temos que fazer um disco psicodélico muito doido”, mas queríamos e foi isso que saiu. Com faixas como "Bladecatcher" e "Capillarian Crust," foi selvagem e louco, e "Siberian Divide" e "Crystal Skull," eu acho que algumas das nossas melhores músicas estão nesse álbum. E "Colony of Birchmen" meio que abriu algumas portas para a gente também. Então sim, eu acho que foi uma grande estreia numa major certamente. Não acho que tenhamos sacrificado a nossa imaginação. Acho que demos o nosso melhor. É assim que eu percebo a coisa

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2. Leviathan (2004)

Creio que Leviathan mudou tudo pra banda. É nossa primeira tentativa de disco conceitual e dentro dessa temática de Moby Dick. É um disco em que tudo deu certo e eu gosto da estética. Foi o disco que nos tirou dos porões. Acho que foi aí que começamos a aparecer um pouco. Foi um disco em que colocamos a mão na massa, fomos lá e demos duro por ele, o que resultou em boas coisas para a banda. Com certeza nos levou um nível acima de onde estávamos com Remission. Quando lançamos o Remission rolou um burburinho no underground, como dizem. Mas quando saiu Leviathan, foi o sinal de que viemos pra ficar, que a parada era séria.

“Hearts Alive” foi o som épico que deixou claro que tínhamos mais a oferecer, artisticamente falando. Mas também éramos capazes de criar algo pesado e direto como “Blood and Thunder”, tudo em um só disco.

1. Crack the Skye (2009)

Acho que aqui rolou uma boa transição e crescimento, umas paradas meio Led Zeppelin e tal. O que você acha?
Acho que chegamos em outro ponto, completamente diferente, num outro nível de habilidade e composição — muitos momentos incríveis por parte do Brent. Sinto que meio que nos juntamos aqui e com ajuda de Brendan O’Brien [produtor], criamos algo especial que ficamos felizes de ter em nosso catálogo. Acho que é uma bela obra de arte.

Lembro de ouvir o disco pronto pela primeira vez e ficar impressionado, aquilo era tão empolgante que eu nem acreditava que era criação nossa. É o tipo de disco que acho que não me daria vergonha de mostrar pro David Bowie, saca? Seria esse o disco que mostraria pro cara e diria “Olha só, adicionamos umas coisinhas aí”.