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Música

Paraíso Perdido: O Purgatório Rap-Pop de Big Sean

Ninguém dava muito moral pro cara, mas isso está mudando com o lançamento de 'Dark Sky Paradise'.

Dark Sky Paradise de Big Sean / Imagem cedida por Def Jam Recordings

Na noite anterior ao lançamento de seu meio que esperado terceiro disco, Dark Sky Paradise, Big Sean colou no palco do SOB’s, no centro de Manhattan, com um cardigã branco volumoso, corrente de ouro, e claro, um par de Yeezy Boosts novinho. O público – uma seleção de vencedores de concurso não lá muito animados – foi carinhoso o suficiente enquanto ele tomava seu lugar para a seção de perguntas seguinte. O trio subsequentemente lançou perguntas das mais tranquilas e teceu elogios ao iminente disco do segundo maior rapper de Detroit, que por sua vez deu respostas padrão bem lubrificadas com um tico de clichês.

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Questionado a respeito de sua abordagem no material presente em Dark Sky Paradise, por exemplo, Sean respondeu: “É pegar uma música e deixá-la melhor, então voltar lá e melhorá-la ainda mais”. Se este evento promocional semi-privado tinha como objetivo revelar um pouco do processo criativo do artista e gerar alguma empolgação em torno da Dark Sky Paradise, falhou miseravelmente. Uma das piores coisas para um fã é ouvir seu artista favorito só para descobrir que além da música ele não tem praticamente nada para falar. Mas, novamente, este é Big Sean, um rapper conhecido por seus hits pop e cujo valor sempre residiu aparentemente (e talvez quase exclusivamente) em seu benfeitor artístico, Kanye West. Realisticamente, o que esperávamos?

Big Sean no SOB’s / Fotos feitas pelo autor do texto

Se há um ano você dissesse a alguém que Big Sean lançaria um dos discos mais bombados de hip hop de qualquer ano, essa pessoa provavelmente te olharia com descrença ou até mesmo gargalharia gostoso. Enquanto Sean Anderson tem um papel importantíssimo como carinha alegre que faz participações nas faixas dos outros neste robô-gigante das good vibes que é a G.O.O.D. Music, ele nunca foi necessariamente o rapper favorito de ninguém. Mas isso tudo foi antes dos singles “Blessings” e “I Don’t Fuck With You” o elevarem ao patamar de um dos parças mais confiáveis do ramo e até mesmo um possível candidato ao título nos primeiros trimestres das calmarias do hip hop de 2015. Que série de lançamentos bizarros tem rolado, viu?

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Como parte de um cast da G.O.O.D. que ao longo dos anos lhe pôs ao lado da sinceridade nada polida de Pusha T, o baladismo sofisticado de John Legend, e a poesia de rua de alto nível de Common, Big Sean, o peso-pena engraçadinho, parece um peixe fora d’água, nos levando a perguntar o que Kanye West ainda vê nele. Mas a inegável queda do nativo de Detroit por ganchos pop e frases de efeito combina bem com as sensibilidades de Ye. Seu estilo leva muito da música de Kanye a locais em que ela se leva menos a sério, e ele equilibra o cast de forma similar ao resto de seus colegas, orbitando em volta do chefão todo-poderoso.

Trata-se de um acordo mutuamente benéfico, com Sean usando seus pontos fortes em troca do crédito e “bacanice” de Kanye, o Curador. Se não fosse por este crítico e contínuo suporte, críticos e fãs talvez não tivessem sido tão lenientes com as falhas de Sean. Apesar de ter vindo de uma cidade tão durona como Detroit, a sinceridade de Sean enquanto rimador foi questionada diversas vezes. Seus sucessos solo, “Beware”, “Dance (A$$)”, “Marvin & Chardonnay” e “My Last” todos ganharam ouro ou platina da RIAA por conta de downloads ou streaming, ainda assim a noção de que Sean não é um rapper sério persistiu. Como um artista mais voltado a singles e participações nas faixas de outros, Sean tem falhado no formato álbum, e seus dois discos anteriores por grandes gravadoras, Finally Famous e Hall of Fame, sendo bem gentil, tiveram vendas modestas. Mesmo em resenhas relativamente positivas, os críticos chamam a atenção para a leveza de suas letras, muitas vezes excêntricas e raramente substanciosas. No reino dos rappers de frases de feito, nos seus melhores dias ele é como Jim Gaffigan: mediano. Até mesmo Wale – cujo LP de 2013 The Gifted vendeu mais que duas vezes na primeira semana do que o disco Hall of Fame de Sean, do mesmo ano – ao menos aspira ser Jerry Seinfeld.

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“Antes de gravarmos este disco, eu estive com ‘Ye e ouvimos [My Beautiful] Dark Twisted Fantasy”, Sean relembrou aos apresentadores da Hot 97. “E eu falei tipo ‘mano, é esse feeling que eu quero’”. Dark Sky Paradise nem de longe é uma contraparte à opereta hip hop maximalista aclamada pela crítica de West. Sean até mesmo admitiu isso, voltando atrás para dizer que o disco de seu chefe “não inspirou nenhuma música, ideias, nada”.

Se Big Sean tinha ou não um clássico instantâneo em mãos, parecia que sim nos meses anteriores ao lançamento de Dark Sky Paradise. O burburinho começou com um anúncio vago de contrato com a Roc Nation e o lançamento surpresa simultâneo de quatro novas faixas, incluindo “Paradise” (produzida por Mike WiLL Made-It) e a já mencionada “I Don’t Fuck With You” (co-produzida por West e DJ Mustard). Ambas acabariam entrando no disco, mas a última findou por virar um sucesso gigantesco e outro single platinado. Na seção de perguntas e respostas, Sean revelou-se surpreso que a faixa recheada de palavrões tenha se tornado item básico na programação de rádios como a Hot 97. “Sinto como se as pessoas tenham transformado essa em uma música para as rádios”, disse.

Como sabemos, sucessos radiofônicos, historicamente, não levaram a boas vendas para Big Sean, mas o disco parecia que ia quebrar essa tradição. Tendo como produtores executivos o próprio Sean e Kanye West, as faixas de Dark Sky Paradise contam com participações de Chris Brown, Lil Wayne e John Legend, dentre outros. Drake, um artista em meio à sua própria reinvenção, impregnou a própria “Blessings” com a mesma fanfarronice e força que carregava sons como “0-100” e “Trophies”. E o primeiro verso de Sean foi ao menos tão conciso quanto o de Drake. Boatos de que Sean estava rimando viraram um só rugido nas mídias sociais não muito depois de “Blessings” ter sido lançada no mês passado, alterando a narrativa o suficiente para sugerir um salto nas habilidades de Sean. O hip hop não é exatamente conhecido por prestar atenção às demais opiniões, mas as piadas haviam diminuído e praticamente parado naquilo que muitos chamavam, antecipadamente, de melhor obra da carreira de Sean.

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Big Sean no SOB's

Agora que Dark Sky Paradise está aqui, porém, não há mais espaço para especulações. Na superfície, há pouco que o separe dos discos anteriores, com sua familiar mistura de sons para rádio ou festas. Sean está mais pessoal, como na recapitulação de um relacionamento anterior (e colaboração de relacionamento atual) intitulada “Research”, ou a tocante homenagem à sua avó em “One Man Can Change The World”. Dizer que Sean faz rap agora implica afirmar que ele não o fazia o antes – e ele rimava, por mais que seus melhores momentos chegassem à obviedade de piadas feitas por nossos pais. Seu segundo verso metralhado e recentemente adicionado em “Paradise” é, como muitos sugeriram, um ponto alto. Ele ainda usa muitos trocadilhos e frases de efeito, e tem muita coisa sem graça. Mas também há um carisma inegável em meio à sua pieguice. No final das contas, ele não está nem mais nem menos sério do que antes. Até mesmo quando fala da questão de raça ele parece limitado a símbolos de status sociocultural superficiais como a fonte do lado de fora do Ritz-Carlton. Esta não é a mudança radical entre 808s e MBDTF ou MBDTF e Yeezus. Seu paraíso mais parece um purgatório; nem mesmo as batidas comparativamente mais obscuras diferenciam muito o disco de Finally Famous e Hall of Fame.

Por mais que Dark Sky Paradise não seja o álbum que transformará Big Sean no messias do hip hop de 2015 – especialmente depois da última mixtape/disco de Drake ter roubado a cena – é meio que o melhor trabalho que já vimos dele. O sucesso é relativo, afinal de contas; nem todo rapper precisa ser como Kanye West. Assim sendo, a carreira de Big Sean aguenta as críticas com base somente em números: ele não só ainda está por aí, como está maior, melhor e mais quente do que nunca. Seu lugar é aparentemente seguro na G.O.O.D., e no final das contas ele ainda será lembrado por uma série de singles memoráveis, mesmo que Dark Sky Paradise não seja um sucesso absurdo. Mesmo assim, pode ser: como Sean tão trivial e precisamente sugeriu, o álbum é o produto de um artista focando no que o faz bom e aos poucos o vai deixando ainda melhor.

Gary Suarez é um jornalista residente sob os céus turvos de Nova York. Siga-o no Twitter.

Tradução: Thiago “Índio” Silva