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Entrevista com o Anarcopanda de Montreal

Num protesto recente, ele recebeu uma segunda multa por ocultar o rosto e teve a cabeça de sua fantasia confiscada como prova.

Anarcopanda e amigos, indo para um protesto.

Na sexta retrasada, pela quarta vez no mês, centenas de pessoas que participavam de um protesto pacífico se viram encurraladas pela polícia de Montreal. Sob a estatuária municipal P-6, a polícia pode declarar ilegal qualquer protesto, assembleia ou ajuntamento, prender essas pessoas e dar multas que vão de 637 até mais de mil dólares canadenses, só pelo fato de a pessoa estar ali. Entre aqueles que foram cercados pela tropa de choque, detidos por horas e multados, estava o misterioso personagem conhecido como Anarcopanda. Um professor universitário da área de Montreal que vai aos protestos usando fantasia de panda, o Anarcopanda se tornou uma figura popular na greve estudantil do ano passado. Num protesto recente, ele recebeu uma segunda multa por ocultar o rosto e teve a cabeça de sua fantasia confiscada como prova. A VICE Canadá conversou com ele algumas horas antes desse protesto e perguntou o que motiva esse panda.

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VICE: Vamos começar com uma pergunta metafísica fácil. O que é o Anarcopanda?
Anarcopanda: [Risos] O Anarcopanda foi uma resposta à violência que os estudantes estão sofrendo. Isso veio de uma ideia que tive muito antes da greve, de ter uma linha de frente de mascotes usando diferentes fantasias entre a polícia e os manifestantes. Como eu não tinha uma equipe para realmente fazer isso, resolvi pôr essa ideia em prática sozinho.

Por que um panda? Por que não um Anarcolêmingue ou uma Anarcovaca?
O panda funciona, as cores dele expressam minha própria filosofia, que é o anarcopacifismo. Mas a razão verdadeira mesmo é que essa era a fantasia mais legal e mais resistente que consegui com o meu orçamento. Vou te falar, mesmo no eBay China, as fantasias de dois mil paus parecem bem frágeis! Eu estava pesquisando várias opções diferentes, mas assim que vi a roupa de panda, algo nasceu em mim…

Foi amor à primeira vista?
É, com certeza! [Risos] Ela era fofa, parecia sólida e não muito surrada. Nem é uma fantasia de qualidade, já estou na segunda, e acho que essa não aguenta muitas manifestações mais.

Ano passado você se tornou um símbolo (ou um mascote) para o movimento. Em que momento você percebeu que tinha esse papel, que é muito maior do que simplesmente ser um participante desses protestos?
Se as pessoas me percebem como mascote, isso é com elas. Não vejo meu papel assim. No começo, eu via meu papel como o de tentar proteger os manifestantes da violência policial, agora pode-se dizer que expandi meu mandato para lutar contra a repressão e contra a estatuária P-6.

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Muita gente diz que meu papel é pacificar, aliviar as tensões, mas sou mais direcionado do que isso, na verdade. Não tento pacificar os manifestantes, apesar de ser conhecido por falar com eles quando vejo alguém fazendo algo que considero completamente estúpido e perguntar por que essa pessoa está fazendo o que está fazendo.

Meu papel é realmente focar na polícia, e isso começou quando tentei abraçar os policiais. Acontece que, em algum momento do conflito, os manifestantes também precisam de abraços. Comecei a fazer isso e, quando um policial recusava meu abraço, eu parecia triste. Então os estudantes vinham me abraçar para me consolar por causa da recusa dos policiais em aceitar meus abraços.

Acredite em mim, como professor de filosofia, nunca foi minha intenção abraçar estudantes nas ruas! Isso simplesmente aconteceu e, quando aconteceu, bom, por que não?

Não dá nem para falar a quantidade de mensagens que tenho recebido dizendo o quanto um abraço ou algumas poucas palavras que eu disse significaram para alguém.

Policiais armados observam um protesto em Montreal.

Você já teve sucesso em abraçar algum policial?
Ah sim, definitivamente. Já abracei uns dez desde o começo. Infelizmente, nunca consegui abraçar nenhum policial da tropa de choque. Eles são diferentes; eles se comportam diferente quando estão com aquela roupa. Mas abracei sim alguns policiais, e geralmente em situações muito difíceis e tensas, então tenho muito orgulho disso.

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Vamos falar sobre a estatuária P-6 e a repressão atual aos protestos. Três dos quatro maiores protestos em Montreal foram encurralados preventivamente e todos os participantes foram presos e multados em $637 sem nenhuma provocação. O que você acha da P-6 e da legitimidade das prisões preventivas?
Bom, estou lutando contra essa estatuária municipal na Suprema Corte de Quebec sob meu nome humano. Acredito que isso seja inconstitucional porque restringe indevidamente o direito do povo de se reunir pacificamente e se expressar.

Agora é o direito de protestar em si que está sendo suprimido. Então é algo deprimente de outra maneira. E, claro, as multas são ridiculamente altas. Mesmo para mim, que não tenho $637 para torrar, realmente não tenho. Mas para os estudantes que trabalham meio período, que não ganham muita coisa, é uma medida realmente repressiva.

Acho isso extremamente preocupante.

O desafio que você está montando contra a P-6 será ouvido em outubro, e sei de outros casos de pessoas contestando a estatuária que serão ouvidas depois de você. Então seu caso vai abrir precedentes para mais alguém, certo?
Sim. Acho que essas pessoas acreditam que, se eu provar que isso é inconstitucional no meu caso, eles vão poupar muito tempo derrubando outros casos que estão sendo contestados.

Ano passado houve uma discussão significativa dentro do movimento estudantil sobre participar ou não das eleições provinciais. Agora, com uma eleição municipal marcada para novembro, algumas das mesmas questões serão levantadas. Você acredita no voto e em participar das eleições?
Eu ia votar no Quebec Solidaire na última eleição, até que essas propagandas totalmente agressivas começarem a aparecer. O Diretor Geral das Eleições dizia basicamente que, quem não votasse, devia calar a boca. Isso me fez decidir não votar.

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E o discurso público é problemático também. Claro que você pode acreditar no voto, e eu acho isso importante, mas dizer que isso é o ato democrático definitivo, o que foi dito muitas vezes nas propagandas e pela mídia, só mostra que não temos mais ideia do que seja democracia.

Tenho uma visão diferenciada sobre isso, assim como da maioria dos assuntos.

Há muito debate sobre pureza dentro do movimento anarquista e tenho certeza que não me qualifico como anarquista para muitas pessoas. Mas não me preocupo muito com isso.

E nas eleições municipais? Você vai se envolver para tornar a P-6 uma questão relevante nessas eleições?
Com certeza. Mas não vou fazer campanha ou apoiar nenhum partido político. Vou ler a plataforma deles, mas suspeito que nenhum desses programas vai estar à altura das minhas expectativas. Digamos que sou naturalmente pessimista sobre o processo político, mas estou sempre pronto para ser surpreendido.

As pessoas têm me pedido para concorrer, mas…

Então o Anarcopanda não vai concorrer para prefeito?
Não em breve! Acho que realmente precisamos de uma democracia mais direta, mais transparente, mais responsável, precisamos do direito de relembrar nossos representantes, então, se alguém for nessa direção, talvez eu vote nele. Mas continuarei sendo um militante de base e não estou interessado em dizer se as pessoas devem votar ou não.

Primeiro, não deve nunca haver nenhuma autoridade num panda, por razões que acho bastante autoevidentes. Segundo, as pessoas devem formular sua própria opinião, fazer sua própria pesquisa, falar com os candidatos, conferir os registros deles. Elas não precisam da minha ajuda para fazer isso.

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