O Animal Collective segue fazendo dance music que não parece exatamente com dance music

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Música

O Animal Collective segue fazendo dance music que não parece exatamente com dance music

Conversamos com o Noah Lennox aka Panda Bear sobre a conexão que há entre o house de Baltimore e os samples com ‘Painting With’, o novo disco do grupo.

Ao longo de mais de uma década, o Animal Collective manteve uma dedicação ao eletrônico e à experimentação que supera barreiras de gênero. Panda Bear (Noah Lennox), Avey Tare (Dave Portner), Geologist (Brian Weitz) e Deakin (Josh Dibb) construíram uma carreira seguindo seus impulsos mais tortos, mas nos últimos anos eles estiveram mais nos holofotes muito mais que outros tantos doidera. Seu disco de 2009, Merriweather Post Pavilion até mesmo lhes rendeu algo que poderia lembrar de longe sucesso no mainstream — faixas como "My Girls" e "Brother Sport" tiveram impacto junto a um público mais amplo, além da aceitação crítica. Centipede Hz de 2012 parece mais uma carta de intenções próxima à transmissão pirata de Max Headroom, ainda mais seguida pelo novo Painting With — um disco com uma dinâmica central entre os vocalistas Lennox e Portner, com uma paleta tonal distanciada da abordagem de banda ao vivo que pudemos ouvir em Centipede Hz. Há um tom lúdico em Painting With. Ele é, em partes, bobo. É fácil esquecer, em meio a toda "artistice" da banda, que o Animal Collective é, na verdade, é uma banda divertida, fundada numa amizade de muito tempo.

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Falando ao telefone direto de Lisboa, em Portugal — sua base de operações nos últimos 11 anos —, Lennox mostra-se humilde e modesto, inclusive quando se trata da banda (cita Dibb como integrante, apesar de sua ausência tanto em Merriweather Post Pavilion e Painting With). Sua voz, suave em comparação à gravada nos discos, distante do êxtase da sonoridade da banda. Abaixo, uma discussão abalizada sobre seu estonteante novo disco e as raízes de sua euforia digitalista na pista de dança.

THUMP: "FloriDada" nos introduz a Painting With, o 11º disco de estúdio do Animal Collective. O dadaísmo sempre foi uma influência para a banda?
Noah Lennox: Certamente não posso dizer que pra mim tenha sido. Sendo bem honesto, não sabia muito sobre o movimento antes deste disco. Claro que Dave chegou com o título da música, então tive que saber um pouco mais sobre a coisa. A real é que sou bem burro quando se fala do aspecto visual da coisa. Talvez de outras formas também.

A estética geral do disco é uma mudança drástica da abrasividade de Centipede Hz, foi difícil fazer tal transição para algo um pouco mais etéreo?
Obviamente o tempo facilita tal transição. O lance aqui é que somos três, e no último [ álbum], éramos quatro. Quando a quantidade de gente fazendo barulho muda, é dureza. Tentar entender como você preencherá o vazio com várias pessoas, como delegar os sons, isso dá um trabalhinho. Estas músicas foram muito mais definidas que quaisquer outras que já tenhamos feito, em termos de demos. Com os vocais tinha que ser assim, era necessária uma precisão em várias das faixas. Antes era tipo "Olha o que eu estou fazendo aqui, vou cantar assim, seria bacana se você pudesse cantar algo aqui", mas a tal pessoa se virava para decidir como entrar na música. Agora, por conta de como queríamos os vocais, tinha que estar tudo definido logo no começo. Foi a primeira vez que escrevemos linhas de voz uns pros outros. Foi complicadinho.

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Vamos falar das vozes. Há faixas como "Summing the Wretch" e "Line in the Grass" nas quais há esta harmonia dividida entre você e Dave, em que as mesmas sílabas são separadas ou multiplicadas entre ambos. Como vocês construíram esta dinâmica?
A ideia era tentar compor música para dois vocalistas em que parecia haver só uma linha de voz, mas se você tira algum elemento dali, não funciona da mesma forma. Penso que no final das contas eu e Dave abordamos este conceito de formas um pouco diferentes. Formas que, espero, complementem uma a outra. Sinto que as partes dele são mais uma pessoa fazendo de um jeito e a outra pessoa de outro, indo e vindo. As duas canções citadas por você foram as que eu escrevi. Deixa eu voltar um pouco: a primeira vez que fiz isso foi numa música do Panda Bear chamada "Boys Latin" há uns dois anos. Foi um golpe de sorte, creio. Gostei como soou. Queria ver se conseguiria expandir um pouco aquela ideia, até onde ela poderia chegar, o quão maleável ela seria. Queria que soasse quase como um delay. Ou pegar uma harmonia e adiantá-la ou atrasá-la no tempo. Não soa como um delay porque as notas nas vozes são diferentes. Era essa a intenção.

Tem um clima muito animado, consigo ligar um pouco ao House deBaltimore.

Você faz dance music que não parece em nada com dance. O gênero ainda influencia a banda?
Sinto que posso falar por todos quando digo que foi algo tremendamente influente pra nós, especialmente o dance de Chicago e Detroit. Não sei se nenhum de nós está empolgadão em fazer nossa versão disso, mas pra mim, queria tentar algo desse jeito, mas não sei se teria algo a adicionar nesse sentido. Sinto que temos elementos destes gêneros, mas nada exagerado. Mas espero que o espírito da dance music transpareça.

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Você fala de Chicago e Detroit, mas há uma movimentação mais recente com o som de Baltimore. Você está ligado com o que rola nas pistas da sua cidade natal?
Não vivo nas boates, infelizmente. Não há referência consciente, mas agora que você mencionou, consigo traçar paralelos entre este som e o nosso. Tem um clima muito animado, consigo ligar um pouco ao house de Baltimore.

Não quero afirmar que vocês são a primeira banda a samplear Golden Girls [um sitcom norte-americno dos anos 80] em um disco, mas é uma abertura literal e abobada para "Golden Gal". Vocês estão se divertindo mais com samples agora?
Tendo criado música baseada em samples no passado, não creio que nenhum de nós estava lá muito interessado em refazer nossos passos. Não lembro quem era, acho que o Dave mesmo é o catalisador para este tipo de samples agora, então acho que foi ele mesmo — mas minha memória não é das melhores. Lembro de comentar algo sobre samples e como queríamos que eles dominassem a música ou tivessem seu momento de destaque, bem na cara. Fazer algo assim acaba tendo sua própria narrativa. Em "Golden Gal", tem o lance do seriado e o sample de "Wipe Out" em "FloriDada", é este pequeno espaço que colore a música de forma que seria impossível de fazer de outra forma. Creio que esse tenha sido o ímpeto para usar o samples dessa forma.

Sempre rolou uma sensibilidade pop muito forte, mas que não tinha nada a ver com tendências pop. Você tem ouvido o que rola no mainstream?
Todos ouvimos, mas sinto que entre nós, sou o mais ligado no que rola agora. Ou ainda: não sou o cara que fica escarafunchando caixotes de discos. Sou burrinho musicalmente, de certa forma. Me interesso mais por ver o que rola no momento, na internet, vendo o que pessoas têm feito. Se isso reflete na música, é difícil dizer. Sempre que há algo com influência musical óbvia, nosso instinto é jogar tudo fora, ou manipular essa influencia de forma que ela suma. Espero que não haja nenhum furto descarado, mas tem horas que não tem como fugir, acho. As coisas não surgem do nada, é o que estou tentando dizer.

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Você mencionou anteriormente como uma técnica vocal descoberta com o seu trabalho solo como Panda Bear acabou entrando em Painting With. Quanto de influência rola entre seu projeto solo e o Animal Collective?
Acho que os outros caras diriam o mesmo que eu — ninguém quer que nada fique muito exagerado, se repetindo. Mas em termos de equipamento, rola e muito. Meu setup agora será uma versão modificada do que fiz com o Panda Bear, talvez com menos samples. Não tem como uma coisa não influenciar a outra. Com sorte o que você fez no último [disco] ajuda a tomar melhores decisões no próximo.

Há um certo ritmo nos seus lançamentos, entre discos cheios e EPs. Haverá um epílogo em forma de EP em Painting With?
Temos algumas canções extras sim. Não estou muito certo de como a lançaremos. Não acho que será um EP, mas certamente há umas faixas vindo por aí.

Painting With saiu nesta sexta (19), via Domino.

Tradução: Thiago "Índio" Silva

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