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Uma Nova Geração de Mafiosos Está Aterrorizando Nápoles

Na segunda passada, a Comissão Antimáfia italiana, liderada por Rosy Bindi, do Partido Democrata italiano, se reuniu em Nápoles para discutir o problema.

O funeral de Genny Cesarano. Foto cortesia de Raffaella Ferrè.

Até recentemente, como parte da campanha antimáfia, o palácio Piazza del Plebiscito de Nápoles tinha sido coberto com cartazes enormes com os rostos de vítimas de assassinatos do crime organizado. Chamada #noninvano (não em vão, em tradução direta), essa iniciativa inclui fotos de algumas pessoas mortas em ataques cruéis de vingança e inocentes que acabaram pegos no fogo cruzado. Ultimamente, depois da morte de Genny Cesarano, 17 anos, num tiroteio no centro da cidade, muitas pessoas começaram a falar sobre uma onda de jovens mafiosos.

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Como muitos jovens italianos, os garotos de Nápoles passam o dia mandando mensagens de texto para os amigos e dirigindo suas scooters pela cidade, porém, como acontece com muitos adolescentes, alguns começaram a se envolver com a organização criminosa local – a Camorra. O problema dos "jovens camorristas" não é novo. Trinta anos atrás, Giancarlo Siani (um jornalista napolitano morto pela máfia) escreveu sua última matéria sobre os garotos empregados pelo sistema criminal local. "Eles são chamados de muschilli [mosquinhas] – traficantes e jovens mensageiros. Eles trabalham como intermediários, fazem papéis menores. Os chefões do tráfico os usam para se manterem fora de problemas", ele escreveu. Naquela época, eles eram praticamente invisíveis, ou melhor, se escondiam em plena luz do dia. Eles também eram dispensáveis.

Hoje, os muschilli não existem mais, pelo menos não da mesma maneira. Os jovens estão muito mais envolvidos em gangues e já fazem parte dos escalões mais altos. Um bom exemplo é Pasquale Sibillo, nascido em 1991, que supostamente já lidera sua própria gangue. Irmão de um chefão assassinado, seus acólitos o respeitam; além disso, da última vez que alguém tentou matá-lo, ele escapou entrando numa viatura da polícia. Ele é o epítome do jovem camorrista, o tipo de cara que fala sobre sua arma do mesmo jeito que fala sobre a namorada.


Assista ao documentário da VICE sobre o controle da máfia sobre a indústria do lixo em Nápoles:

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No passado, você tinha de ter uma idade mínima para ascender de ranque e precisava de coragem para realizar o piezzo – assassinato. Quem conseguia subir de nível, arranjava um trabalho na Camorra pela vida toda e oferecia sua lealdade em troca. Naquela época, a máfia tinha empregados; hoje, quem trabalha para a Camorra se sente mais como um freelance. Com o processo de recrutamento acelerando, gangues e clãs se tornam cada vez mais fragmentados e acabam brigando por cada rua da cidade. Isso levou a uma cultura de gangues menores e criminosos oportunistas ameaçando a sociedade.

Em Rione Traiano, a situação atingiu um ponto crítico: o bairro agora tem as mais altas taxas de troca de tiros em Nápoles. O local é conhecido pelos ataques envolvendo scooters. Por dias, é possível ouvir o som de tiros pela área. E, quanto mais armas a polícia apreende, mais acabam nas ruas.

As autoridades estão lutando para manter o pico de violência sob controle. A severidade da situação ficou clara num relatório do Departamento de Investigação Antimáfia (DIA) divulgado no final de 2014: "Vários grupos têm se infiltrado amplamente na região, e um sistema criminal está profundamente enraizado na área, operando com violência desproporcional para atingir seus objetivos". O relatório continua: "A situação põe em risco a ordem pública… geralmente, através de ações de criminosos pertencendo à nova geração. Entre as figuras-chave, estão descendentes de poderosas famílias locais que aparentemente foram enfraquecidas por prisões e deserções".

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No relatório de janeiro, o DIA apontou esses criminosos ainda mais precisamente, identificando brigas em andamento "tanto nos subúrbios como no coração da cidade, no norte e no leste de Nápoles".

Há muitas provas dessa mudança geracional. Em junho passado, cerca de 60 jovens afiliados às famílias criminosas Giuliano, Sibillo, Brunetti e Almirante foram presos. Eles comandavam uma área entre os distritos de Forcella a Maddalena. Investigadores descobriram que esse cartel, que tinha ganhado um "monopólio sobre as atividades ilegais no centro de Nápoles", era formado por "membros muito jovens de famílias criminosas bem estabelecidas".

Essa nova geração de criminosos tem um jeito diferente de fazer negócio, o que atualmente tem se mostrando um grande desafio para as autoridades. A Inteligência Antimáfia italiana escreveu um relatório dizendo que "essa nova conjuntura tem um impacto devastador em qualquer contraoperação possível, tornada particularmente difícil pela imprevisibilidade de suas ações, que parecem não seguir nenhuma racionalidade".

Na segunda passada, a Comissão Antimáfia italiana, liderada por Rosy Bindi, do Partido Democrata italiano, se reuniu em Nápoles para discutir o problema. Durante o primeiro dia de audiências com a polícia, os promotores e vários grupos antimáfia, a comissão deu um grande deslize. "A Camorra é uma parte integral da nossa cidade", afirmou Bindi, provocando indignação entre aqueles lutando diariamente para livrar Nápoles do crime organizado.

Claro, Bindi queria dizer que a máfia é uma grande parte da cidade e que isso tem de mudar. O que não impediu um morador de comentar: "Se os políticos acham que Nápoles significa Camorra, por que estão aqui?".

Tradução: Marina Schnoor

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