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Cinema de guerrilha

Um, dois, três: acção!

O Lobisomem de Guimarães, o Vampiro de Pevidém, o Homem Invisível da Penha ou a Besta das Taipas. Mitos e lendas que chegaram com o Festival Ver e Fazer Filmes, do qual resultam três curtas de produção low-budget, elaboradas por equipas de oito elementos. Cinco semanas — mais coisa menos coisa — foi o tempo que cada equipa teve, desde a escrita do guião até à edição. Cinema de guerrilha, onde até vale arrancar olhos, se o argumento assim o exigir. O responsável por esta temática “do outro mundo” foi o Rui Tendinha, uma presença assídua em Guimarães, que tem andado entre capital e capital e que achou que a cidade não tinha histórias sobrenaturais suficientes. Que é feito dos encontros em salas do Sheraton? O que é feito dos entrevistados impecavelmente vestidos nos seus Armani? Fui ter com o Rui à Churrasqueira do Toural — um belo tasco —, para lhe perguntar coisas de cinema. Dei com ele (e com mais umas 30 pessoas das equipas de filmagem) a comer bitoques e francesinhas, numa sala que é uma espécie de armazém improvisado. (Vamos chamar-lhe de sala contígua.) O jornalismo já não é o que era, ainda que o Tendinha estivesse bem apessoado para me receber. VICE: No outro dia, encontrei um “jovem” a transbordar adrenalina, porque andava a participar na gravação de umas curtas. Foi assim que fiquei a conhecer o projecto Ver e Fazer Filmes.
Rui Tendinha: O Ver e Fazer Filmes é uma maratona, são putos a fazer filmes de manhã à noite, que têm de estar prontos num curto espaço de tempo. É um jogo com muitas regras. Os putos tiveram um tempo para escrever o guião, mais um pouco de tempo para gravar e outro para poderem editar. É um festival que já existe no Brasil. Não estamos a inventar nada. Estamos, a área de cinema da CEC 2012, a acolher o festival — que é organizado de dois em dois anos em outras paragens — cá em Guimarães. Trabalhamos com as regras deles e há um brasileiro a controlar tudo. São três curtas e o pessoal está quase a arrancar olhos. Há uma grande rivalidade, principalmente entre a Universidade Católica e a Universidade do Minho. Mas as regras são iguais para todos e, no fim, há prémios. Prémios? Os Afonsos de Ouro?
O melhor de tudo são os prémios. São umas estatuetas que se enfiam na cabeça, feitas pelo Instituto do Design [de Guimarães]. E a fundação brasileira, que co-produz o festival, oferece viagens ao Brasil aos vencedores, para se mostrar o filme num festival luso-brasileiro chamado CINEPORT. Há várias categorias — melhor argumento, melhor produção, actor, actriz. Quem arrecadar mais prémios, vai ao Brasil. Há um mote comum entre estas produções?
Guimarães não tem muitas lendas. Não há o lobisomem de Pivedém, ou o fantasma das Taipas. A ideia é pegar nos mitos e desconstruí-los. É o tema comum entre os filmes. E qual é o teu papel no meio desta gincana cinematográfica?
Estou a coordenar as produções das três equipas — Universidade de Minas Gerais, a Católica e a Universidade do Minho — e estou também com a parte do "ver", que tem de ter um quê de pedagógico, uma vertente de descoberta do cinema. Para a maior parte deste pessoal é a primeira vez que está a trabalhar mesmo a sério em cinema. Estão “fora” e têm de se desenrascar. Vêm sem professores… sou o mau da fita. Sou o vilão, o que diz não. Foi uma epopeia montar tudo isto. Há muito pormenor logístico. Juntar isto a tudo o resto que andamos a fazer, nomeadamente à estreia mundial do filme Centro Histórico — de Pedro Costa, Oliveira, Aki Kaurismäki e Victor Erice —, no Festival de Roma, que acontecerá em breve e no qual estamos super concentrados. É uma altura na área de cinema da CEC em que estamos absorvidos em mil coisas. Há muita coisa a acontecer. Está tudo a acontecer, na verdade. A selecção das três equipas foi feita por quem?
Nós fazemos o convite às universidades e elas têm de se amanhar. Têm de ser equipas multifacetadas. Em coisas tão simples como usar música para o filme, tens de ter em atenção que não podes usar uma música dos Rolling Stones, por causa dos direitos, por isso há elementos a compor a banda sonora original, por exemplo. Está tudo com um ar cansado. Lá se vai a ideia de que o cinema é uma cena pausada.
Com este processo percebem como é difícil produzir um filme. Levam com a chuva e com uma série de dificuldades. Quem filma à noite leva com bêbedos e os putos chegaram a ser roubados nas filmagens — uma perche. Evito estar ao pé deles, para não me estarem sempre a pedir coisas, para que sejam autónomos, até porque tenho um budget muito controlado. Temos uma base, no Hostel Vimaranense, e ali criou-se a base de guerrilha. E aqui nota-se que a cidade acolhe muito bem toda esta miudagem. São quatro dias de rodagem. Dois dias de montagem. É uma produção expresso. É usar as obstruções, para criar filmes. Cinema de guerrilha. A melhor cena é que podem trabalhar com actores profissionais. Quem são as estrelas destas produções? Malta conhecida?
Pensámos usar pessoal da Globo, mas o melhor é usar a matéria-prima de cá. Quisemos usar o novo curso de teatro da Universidade do Minho. Os actores foram muito disponíveis e trabalharam de graça, seguindo o nosso plano de gravação, como, por exemplo, o Valdemar Santos e a Diana Coelho. O Marco Barbosa foi o preparador de actores. Por falar em profissionais: há cenas de orgias aí pelo meio.
Sim. Havia uma cena que era uma orgia e escolheram a minha casa cá em Guimarães. Nem sei bem porquê. Não sei como vai correr o resultado final, mas tem ar de ficar meio feliniano. Existe algum risco de não haver filmes hoje?
Sim, claro. Estamos a trabalhar em contra-relógio, a dar as condições para trabalharem, mas já sabes que é um risco. Só logo vamos saber. Se tudo correr como esperado, a escola brasileira Ormeo Teatro Dança, de Minas Gerais, apresenta  MI(n)TO. A Universidade do Minho preparou um thriller chamado A Escolha, enquanto a Universidade Católica apresentará Até Amanhã. “E o vencedor é…”