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The Vaccines

Primavera com a corda nos sapatos

O domingo em pós-pós-ressaca.

Já é tradição em Barcelona: o Primavera Sound inaugura a temporada de aquecimento para festivais, com alguns dos melhores nomes da sopa indie mundial. Em tempos de Cultura, a música ganha um lugar central, com uma edição em Portugal, um filho mais novo do evento-mãe que teve lugar em Guimarães, durante o fim-de-semana, simultaneamente em três espaços (Plataforma das Artes, Centro Cultural Vila Flor e o São Mamede), o que obrigava a percorrer a cidade com corda nos sapatos, para se conseguir acompanhar toda a oferta.

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No domingo, aproveitei o último dia para relaxar da ressaca pós-pós Pinheiro e arrastei-me até à PdA para assistir a um espectáculo dividido em três e render-me ao trabalho dos portugueses Blac Koyote, Dear Telephone e la la la Ressonance. Os primeiros começaram com uma viagem através de portas entreabertas, com sons cumulativos que nos levavam a divagar pelas imagens projectadas como pano de fundo (cansa só de escrever). Um crescendo de sons e artistas, que iam subindo para o palco, um a um, para dar um pouco mais de cor à paisagem visual com baixo, bateria, órgão e, inclusive, trompete e saxofone (esqueçam os detalhes de marcas e modelos, pois sou totalmente incapaz de distinguir um vocoder de um sintetizador, ou um violino de um baixo). Seguiram-se os Dear Telephone, com a voz que faltava para dar mais alma ao concerto, e conseguir, assim, arrancar os primeiros urros por parte do público. Isto, apesar de se tratar de música calma — o pessoal da fila de trás devia estar a arrepender-se das pastilhas que tomou, porque não parava de bater com os pés no chão, o que abanava a nossa fila de assentos. Deviam estar na onda: “Também ia agora para o palco tocar bateria, pena que não sei…” Para finalizar, os la la la Ressonance, que continham elementos das duas bandas anteriores, conseguiram-nos fazer esquecer os nossos vizinhos pastilhados e fizeram-me imaginar que as cadeiras tinham sistema de vibração ligado aos instrumentos que estavam em palco. Não sei se já experimentaram os binaural beats, solfeggios ou E-drugs, mas a sensação com que fiquei foi de quem estava tão pedrado, que nem consegui fumar um charro quando saí destas duas horas de concerto. Como não sou omnipresente (ainda), fui jantar e tentar decidir se ia ao CCVF ou ao São Mamede, mas, como o que é finlandês é bom, optei pelo segundo e ver os Cats on Fire. Foi uma boa escolha, porque os tipos trouxeram um espírito old school ao que estava a ser um dia muito psicótico, animando-me a sair do filme em que me encontrava antes (minimalista e, ordenadamente, sentado na cadeira), para uma sala bem recheada de pessoas vindas de todo o lado  — imagino que esta festinha foi perfeita para os Erasmus todos: de São Lourenço de Selho a Ponte de Lima. O cantor, um pouco tímido ao princípio, prontamente se desinibiu e começou a perguntar se sabíamos quanto ficava alugar uma casa cá no Porto (já sei que não vivemos no Porto, mas para um finlandês pronunciar Guimarães é o mesmo que tu ires para lá dizer “vittu, olen kehdosta kaupunki” — vais mesmo ter de ir ao Google Translate). Para finalizar, foi a vez dos The Vaccines, que, mesmo antes de entrarem para o palco, fizeram algumas pessoas perguntarem-se porque é que o guitarrista precisava de sete toalhas e de um ventilador montado, mesmo em frente do sítio onde ia actuar. Com uma entrada a rasgar que pôs toda a gente aos saltos, os britânicos brindaram-nos com o melhor da noite: música, pura e dura, com a sala a cantar as letras. Quanto ao guitarrista Freddie Cowan (que era bem giro, como um jovem Sylvester Stallone antes da trombose), conseguiu aguentar duas músicas antes de começar a transpirar como um animal e ligar a ventoinha. No final, os maiores fãs conseguiram arrancar-lhe das mãos as toalhas embebidas em suor e ir snifá-las discretamente para as casas de banho. Um grande concerto com o vocalista ao rubro e uma grande participação do público conseguiu fechar em grande um festival que se espera ser a primeira de muitas Primaveras. Fotografia por José Caldeira