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cinema

Filmes maus que eu vi: 8 Mile

Sexo, battles e retretes.

Curtis Hanson
2002
3/10 Tenho muitas saudades de spoof movies como Ases pelos ares e Onde pára a polícia?, porque faziam paródia de filmes que conhecia. O Leslie Nielsen (RIP), tal como o Fernando Mendes ou o Paulie d’Os Sopranos, é daquelas figuras que me faz rir mesmo sem dizer uma palavra. Depois desliguei-me do género, dado que não conhecia os filmes de adolescentes ou vampiros referenciados. Não chego ao ponto de dizer que 8 Mile é um spoof movie, mas por vezes parece uma grande colagem de patetices. O Eminem é como o Francisco Louçã: está constantemente zangado com tudo. Portanto, o Eminem, numa fase descendente (e pré-carocho) da carreira, aceita fazer de si próprio num quasi-biopic, que descreve a ascensão de um rapper branco desde o bloqueio total até à noite em que parte a loiça toda numa battle apoteótica (talvez a única boa cena de todo o filme, ainda que tardia). Por mais incrível que pareça, o que acontece pelo meio não é assim tão importante. A culpa será provavelmente de um argumento pobrezinho que estraga tudo por onde passa. As situações parecem clichés em movimento e as mulheres são retratadas da pior forma possível (esqueçam as letras de gangsta rap e o tratamento do Rocco Siffredi — isto é muito mais hardcore e misógino). As mesmas mulheres que, como é óbvio, representam a razão de toda a desgraça e ira na vida dos homens, que trabalham arduamente enquanto elas andam na safadeza. Depois existem outros aspectos bem mais engraçados: 8 Mile, tal como os melhores objectos de exploitation, sabe (ou acha que sabe) inserir a martelo umas quantas cenas de sexo (explícitas q.b.), quando os índices de interesse do drama estão nas lonas. Chamar o “sexo” como quem pede socorro aos bombeiros para salvar um filme, quando esse já está queimado há muito tempo, provoca graves consequências. Reparemos, por exemplo, naquela cena (surgida algures no vazio do segundo acto) em que a mãe white trash (Kim Basinger) se queixa ao próprio filho de que o seu parceiro não aceita dar-lhe prazer oral, como se isso fosse muito mais grave do que ela viver numa rulote ou ter a renda por pagar. O Eminem fecha-se na casa de banho e diz que não quer saber, e esse é um gesto que se repete ao longo de todo o filme como um mantra escatológico: sempre que as coisas estão sofríveis, o protegido do Dr. Dre fecha-se na retrete para se alienar da realidade e quem sabe livrar-se do Happy Meal que comeu no dia anterior. Eminem à porta do David Carreira para lhe implorar um featuring. A maior felicidade de 8 Mile acaba por ser o discernimento de que dispõe para não activar o modo “musical / vamos todos começar a cantar à parva”, quando o Eminem está na retrete. Isso seria demasiado South Park. Mas esse modo acaba por surgir e relembrar-me de todos os motivos pelos quais odeio palhaçadas como Sweeney Todd ou Evita (também esse um projecto de vaidade de uma estrela pop caucasiana). O modo musical é então activado quando o Eminem e o seu bro The Future estão em frente à rulote do primeiro e começam a rimar sobre a música de “Sweet Home Alabama”, numa cena ligeiramente gay, que, logo ali, acaba com todo o street cred que restava a 8 Mile.Sim, no final o Eminem aceita participar no torneio de rappers e arrasa com a crew rival, mas essa cena eu já tinha visto no Karate Kid e o Daniel San só precisou de uma perna. O Eminem estava com um olho inchado, mas fez o freestyle com as duas pernas. O pessoal de Detroit vai ao rubro e é nessa altura que fico à espera que o Eminem faça uma de duas coisas: ou começa a gritar “Adriaaaaan” como um tontinho, ou salta para o colo do Pat Morita. Não aconteceu uma coisa nem outra. Que desilusão.