FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Poço de Chorume: Internautas Antifeministas Fizeram Comentários Ofensivos Contra o Coletivo de Mulheres Discwoman

Misoginia e desinformação marcaram os comentários na matéria sobre a crew feminista nova-iorquina publicada na NPR.
From left: Christine Tran, Frankie Decaiza Hutchinson, and Emma Burgess-Olson of Discwoman

Um ano atrás, em uma tarde ensolarada de outono, a crew Discwoman chegou no escritório da VICE US para uma entrevista sobre a ausência de mulheres na dance music. Dias antes, o coletivo feminista tinha realizado o seu primeiro mini festival no clube nova-iorquino Bossa Nova Civic Club, com um lineup exclusivamente de artistas que se identificavam como mulheres. Essa tática se provou naturalmente eficiente para destacar a grande quantidade de mulheres talentosas trabalhando na indústria — e, ao mesmo tempo, fazer uma festa incrível. (Além disso, os fundos arrecadados pelo festival foram doados para a Sadie Nash Leadership Project, uma ONG voltada para jovens mulheres.)

Publicidade

Naquela época, o coletivo feminista do Brooklyn ainda estava nos seus primórdios, mas já era fácil perceber como as fundadoras Christine Tran, Frankie Decaiza Hutchinson e Emma Burgess-Olson planejavam algo grandioso. Desde então, a Discwoman já realizou festas em tudo quanto é lugar, de Porto Rico à Filadélfia, atraindo muitos admiradores e a atenção da mídia pelo caminho. Eu mesma já colaborei com a crew várias vezes, e inclusive falei em um painel da Discwoman no Red Bull Studios.

Na semana passada, a crew ganhou uma das suas maiores matérias jornalísticas até o momento: um perfil no NPR, escrito pelo jornalista musical Michaelangelo Matos. Habilmente, Matos delineia como a Discwoman evoluiu, no último ano, de um coletivo indefinido para uma agência de booking para DJs. Em um momento particularmente engraçado, ele narra uma festa no clube Verboten, no Brooklyn, em que o DJ de abertura, um cara sem noção que tocava um "bro-house tosco" na sala ao lado de onde estavam as meninas da Discwoman, soltou um clássico da 2 Live Crew: "Heyyyyyyy! We want some puuu-ssy!" [em tradução livre, "Eeeeei! Queremos buceta!"].

O perfil é excelente, cheio de cenas vívidas que ilustram os desafios que essas mulheres enfrentam e a determinação que elas têm para superá-los. No entanto, como que para provar que ainda resta muito trabalho a ser feito, a seção de comentários logo se transformou em uma fossa de lixo misógino, salvo por algumas raras exceções aqui e ali. Vamos resumir brevemente:

Publicidade

Comentarista 1: "As feministas só estão preocupadas em colocar mulheres em posições de poder."

"E continua o mimimi feminista do NPR. Vamos inventar um problema para gerar conflito e ter alguma coisa do que reclamar. Depois disso, podemos escrever músicas e fazer rios de dinheiro. É uma ótima fórmula. Elas podem fazer isso em qualquer indústria. Varejo de sapatos: "Espere! Tem mais sapatos femininos do que sapatos masculinos em uma loja; portanto, precisamos de uma quantidade proporcional de mulheres vendendo sapatos. Coleta de lixo: "Espere aí, metade das pessoas que jogam lixo fora são mulheres. Precisamos que metade dos coletores de lixo sejam mulheres, porque elas vão entender melhor o lixo feminino". É claro, isso provavelmente não aconteceria porque as feministas só estão preocupadas em colocar mulheres em posições de poder. Isso porque o feminismo não tem nada a ver com liberdade ou compaixão, mas com aquisição de poder. Isso associado ao fato de que o feminismo acha que deve ser permitido às mulheres se organizar e ter grupos, mas não aos homens. Depois tem o mantra de algumas feministas que dizem que homens e mulheres são exatamente iguais, exceto por algumas mulheres que contribuem de um jeito especial. Este tipo de jornalismo de gênero lixo é o que o NPR adora. Embora eles possam cobrir bem outros assuntos, gênero não é um deles."

Comentarista 2: "Meninos e homens são atacados pelo feminismo."

"Acho que meninos e homens são atacados pelo feminismo. Minha percepção é baseada em filosofia e ações, não é o que um partidário diria de si mesmo. Por exemplo, quando Donald Trump diz que está disposto a reerguer os Estados Unidos, você exige que eu simplesmente acredite nele e não me sinta atacado? Posso contestar as palavras dele apontando suas ações? Ou devemos todos apenas concordar com a teoria feminista sem criticá-la?

Feminismo: as mulheres são iguais aos homens, mas não são iguais aos homens, portanto devem ser tornadas iguais aos homens recebendo privilégios especiais que os homens não têm, para que, no fim, homens e mulheres sejam menos iguais, mas as feministas fiquem mais felizes com o esquema todo, embora não exista felicidade feminista, e a lista de reclamações vai se estender para todo o sempre."

Comentarista 3: As mulheres precisam parar de reclamar!

"Vivo na realidade. Toda a ideia feminista é simplesmente absurda, e se mostra absurda pelo fato de que é isso que sobra para elas reclamarem. Buá — elas precisam trabalhar para ter fama… Como todo mundo."

Comentarista 4: "O feminismo destruiu tudo em que se meteu."

Comentarista 5: Por que vocês não fazem música de verdade, cara?

"Se elas tocassem instrumentos de verdade, seriam levadas mais a sério do que sampleando e fazendo scratching em cima do trabalho de outra pessoa."

Quando procurei a Decaiza Hutchinson no Facebook para perguntar o que ela achava desses comentários, a resposta dela foi previsivelmente heroica: "Literalmente, não tem um bom argumento ali que nos faria pensar: 'Cara, você está certo'. Então eles que se fodam".

"Só reforça o que já sabemos: a misoginia é muito real", ela explicou. "Homens negando que mulheres têm razão é um ato de misoginia. Eles odeiam mulheres falando, [e isto] acontece sempre que uma mulher faz qualquer coisa. [As mulheres são] constantemente policiadas. Sou muito grata por ter uma carapaça bem grossa, especialmente quando se trata de interagir com homens, então comentários misóginos praticamente não me afetam. Mas eu não deixo de vê-los."

Publicidade

Como sempre, a Black Madonna acabou com a discussão com este tuíte sobre a história toda:

@blackmadonnachi @DISCWOMANNYC @MichelleLhooq @nprmusic @matoswk75 "É como um ouroboros, só que é um pau se comendo, não uma cobra."

Siga a Michelle Lhooq no Twitter.

Tradução: Fernanda Botta

Siga o THUMP nas redes Facebook // Soundcloud // Twitter.