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Música

Como Montar uma Festa Partindo do Zero

Michael Potvin é o responsável pelo Sustain-Release, um festival techno de Nova York que transforma locais desinteressantes e vazios em florestas cyberpunk ou distópicos cárceres de prazer.

Estou de pé no centro de um grande salão de festas. Ele fica situado a algumas centenas de metros, descendo, de uma quadra de vôlei de areia, uma trilha suspensa de arborismo e um caminho de cascalho, que passa sob um portão de madeira com a inscrição "Camp Lakota". São umas quatro e meia da manhã, e estou cercado por 400 pessoas dançando, paramentadas com óculos de sol holográficos, arneses de couro, pinturas de guerra, e variados acessórios xamânicos. Elas estão pulando, se sacudindo e fazendo o shuffle, ao som de loops de um techno gelado e hipnótico, que parece se enrodilhar em volta do corpo; nos cantos escuros, alguns se estiraram em colchões de espuma ou em alguns aparelhos de ginástica isolados, repondo as energias antes de voltar a dançar ou simplesmente dando uns pegas.

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O salão cavernoso e tudo o que está dentro dele é banhado pelo brilho alienígena de uma gigantesca instalação de LED, que vai alternando cores, deixando apenas a silhueta de um DJ alto e esbelto numa plataforma elevada. Se você não parar e apertar os olhos para enxergar através das espessas massas de névoa iluminada pelo neon, e observar, no alto, as vigas de madeira e as decorações artesanais que guarnecem as paredes, talvez confunda o lugar com uma boate de Berlim – e não um acampamento para crianças nas montanhas Catskills. Escondido no fim da pista de dança, envolvido por metros de cabos multicores desenrolados, está Michael Potvin, vulgo Nitemind. Ele está entrincheirado por trás de uma mesa dobrável, com alguns notebooks antigos, alguns controladores MIDI retroajustados, uma mão sobre o controle de um mixer de vídeo analógico, e ele é a cabeça por trás dessa transformação techno.

Esta cena, um instantâneo do festival techno Sustain-Release, realizado nos sopés de Wurstboro, Nova York, em setembro, é basicamente uma manhã de sábado normal para Potvin, que construiu uma carreira transformando locais desinteressantes e vazios em florestas cyberpunk ou distópicos cárceres de prazer. Ele já construiu imensas paredes de vídeo, painéis de LED, sistemas de laser, e instalações imersivas e atmosféricas para todo mundo, desde Alexander Wang até a School of Seven Bells, e para eventos na Art Basel, em Miami. Ele já comandou o design de ambiente para a SHADE, uma festa itinerante em galpões. (No evento com o tema "Detropia", ele instalou luzes fluorescentes e máquinas de névoa em carros fodidos de ferro velho.)

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Trabalho é o que não tem faltado nos últimos tempos, graças à engenhosidade que ele demonstra ao encher de assombro e deslumbramento espaços antes sem grandes atrativos. Na opinião dele, criar um ambiente inesquecível não se resume a umas luzes e cores bonitinhas – é preciso contar uma história. "Saber fazer com que a noite pareça uma jornada é muito importante", ele disse ao telefone. "A história que contamos pode ser bem vaga, mas queremos criar uma dinâmica que se entenda pela noite toda". A capacidade dele de, como um MacGyver, criar uma instalação conceitual com base em qualquer coisa que estiver à mão também significa que seus projetos tendem a não extrapolar o orçamento, de modo que os promoters podem contratar seus serviços sem a necessidade de um patrocínio que reforce o orçamento.

Em várias ocasiões fiquei na espreita, quieto, observando fascinado o Nitemind manipular controles remotos e inserir comandos em aparelhos caseiros, construídos com pechinchas compradas pelo eBay, alguns achados em vendas de fundo de quintal, e peças de computador antiquíssimas. Então, para o bem dos festeiros e futuros especialistas em iluminação de todo o mundo, pedi que ele nos desse um curso rápido sobre este ofício raro e esotérico, na esperança de que você também consiga, um dia, montar um espaço de festa alienígena partindo do zero.

Finja até Conseguir

"Meu primeiro trabalho de iluminação foi construir uma peça com a qual a School of Seven Bells faria uma turnê, em 2008. Um amigo meu recebeu o telefonema através de algum contato aleatório com a banda, e ele sabia que eu tinha algum conhecimento de engenharia. Então ele chegou para mim e disse: 'Você acha que dá conta?' Eu não fazia ideia, mas pesquisei na internet e achei uma comunidade muito ativa de pessoas que estavam criando o seu próprio código aberto, e o disponibilizando. Então achei algumas peças, achei o código, e liguei para ele algumas horas depois, dizendo: 'Sim, a gente dá conta'. Quero dizer, por aí você encontra muita coisa que os nerds já deixaram prontas pra você. Hoje eu uso código aberto para tudo, tipo o ambiente Processing ou o ambiente Arduino – os dois são maneiras de escrever códigos para coisas interativas."

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Você Vai Precisar de um Barco Maior… (ou de um Caminhão de Mudanças)

"Para a Sustain-Release, trouxemos um caminhão de equipamentos – praticamente tudo o que eu tinha: quatro computadores, duas mesas DMX, um sintetizador modular de vídeo, a parede de vídeo de LED Nitemind, um laser RGB, uma placa de LED, luzes estroboscópicas, espelhos, fios com luzes, 25 apontadores laser, e vários tipos de luzes de cabeça móvel. Além disso, as luzes FX, os LED PAR do tipo que se encontra em lojas normais, e também equipamentos de montagem e elevação, e ferramentas para tudo. Levei todas as máquinas de névoa que eu tinha, e queimamos três delas durante o final de semana.

Conhecerás um Fornecedor

"Meu lugar favorito para comprar equipamentos é uma distribuidora chamada Adafruit, em Nova York. Eles vendem coisas e ajudam a aprender como usá-las. A dona é uma mulher que se chama Ada; foi ela quem inventou o x0xb0x – um clone do Roland TB-303, o melhor de todos – anos atrás, no MIT, e agora tem essa distribuidora de peças eletrônicas e uma comunidade em torno disso, em Nova York. Não compro tudo com ela, porque dá pra encontrar mais barato na China. Você faz o pedido e a coisa chega no dia seguinte, ou dois dias depois, e quando compra da China com certeza isso não rola."

Deixe-se Guiar Pelo Poder Positivo da Festa

"Nossa peça para a School of Seven Bells fritou enquanto eles estavam no meio da turnê. Ligaram para mim da costa oeste às quatro da manhã, eles dizendo: 'Quebrou! Queimou lá na boate!' Fui para o Facebook e postei 'conheço alguém em Portland que pode resolver isso?' e fui entrando num labirinto de números de telefone, e ali pela quarta ou quinta ligação, encontrei um cara da cidade que faria o conserto para eles no dia seguinte. Até hoje não sei quem era o cara, e, tenho que elogiar, nunca me mandou uma fatura. Então vai saber quem era ele – um salvador."

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Se Vira

"Trabalhando com a Aurora Halal na Sustain-Release, a gente só fez o que podia com as coisas à mão. É tipo 'ah, você sabe fazer isso, eu sei fazer aquilo, a gente não tem patrocinador e nem um público fiel de mil pessoas que vai aparecer só porque a gente é famoso', então a gente faz a coisa acontecer. Não tem que parecer malfeito, saca? Não precisa ter muita coisa, ainda assim dá para fazer parecer bem maneiro."

Acidentes Fazem Parte

"Luzes fluorescentes são perigosas. Fizemos nós mesmos um monte de instalações de luz para a festa Shade, e colocamos dentro de carros, com máquinas de névoa sob o capô, para dar aquela impressão de carro quebrado. As luzes acabaram fazendo um dos carros pegar fogo durante a festa. Estava soltando faíscas, e quando eu vi, tinha uma chamazinha ali. Eu estava lá, ainda bem, então só desliguei e guardei tudo, e não houve mais problemas. Mas aquela mesma instalação de luz deu um belo dum choque também, no estúdio em que a gente estava montando. Tome cuidado com luzes fluorescentes. Um homem prevenido, etc."

Tenha Peças Reservas

"Cedo ou tarde tudo vai dar defeito, então é bom ter sempre peças reservas à mão. No fim de semana passado aparecemos para um trabalho e um dos lasers da boate, o grandão, controlado por computador, estava quebrado. Por sorte, eu tinha exatamente a peça necessária no meu estúdio. Eu tinha comprado em 2009, porque ia construir meu próprio sistema de lasers, mas acabei nunca fazendo. Então voltei para o meu estúdio à meia noite, e por volta da uma hora eu tinha consertado o treco, daí voltei pro trabalho e pronto. Felizmente durou até as seis da matina."

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Não Pegue Pesado Demais

"Sendo um cara que mexe com luzes, escurecer os ambientes é um dos grandes lances que eu faço. É engraçado me ouvir dizer isso, mas muitas luzes são realmente fortes, e as pessoas querem sair ligando tudo e pirar o cabeção. A escuridão – espaço negativo – é muito importante. É por isso que não gosto de fazer projeção de vídeo quando se trata de uma boate. Prefiro soltar uma névoa, deixar ela escura; um projetor acaba virando uma grande fonte de luz branca num mar de névoa. E se você solta névoa num lugar, nem dá para ver as projeções."

Economize Dinheiro, Monte Você Mesmo

"Quando você compra um controlador para iluminação de boate, começa ali nos US$500 só pela caixinha. Daí entra nos milhares de dólares para controlar essas coisas. Então eu literalmente comprei uma caixa de US$70 que não faz coisa nenhuma, e escrevi meu próprio software de computador, e agora ele funciona em um controle MIDI pequeno. Ele comanda três tipos diferentes de cabeças móveis; comanda holofotes; comanda as luzes estroboscópicas que a gente tem; comanda uma barra de LED animada móvel que eu tenho. Ele funciona num notebook PC que comprei por US$80. O sistema todo custou US$200, por um sistema de controle que faz frente a outros muito maiores. E talvez ele não tenha a flexibilidade, mas faz o que eu preciso que faça. E quando você liga, vê que sou eu. Somos nós. É Nitemind."

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Tradução: Marcio Stockler

Nossos broders do THUMP também tem dicas para festas clandestinas. Se liga:

Guia THUMP para Organizar uma Festa de Galpão Clandestina