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Razões por que Londres É o Pior Lugar do Mundo

Londres é a última metrópole num país que naufraga num continente faminto, uma ilha dentro de uma ilha vazando nos Home Counties como uma mancha de óleo de concreto.

Fotos por Jamie Taete, Laura Oliver, Bruno Bayley, Anis Ali e Pascaline de Foucauld.

Samuel Johnson, famoso pelo dicionário de inglês publicado pela primeira vez em 1755, disse uma vez que, quando um homem se cansa de Londres, ele está cansado da vida. Se você já foi para lá, já deve ter ouvido essa de algum taxista britânico. O que esse pessoal, que cita isso toda vez que você reclama da poluição mortal do ar e dos caixas automáticos que cobram duas libras para você ter acesso a seu próprio dinheiro, não sabe é que, mesmo o Johnson sendo um cara inteligente, ele passou boa parte da vida lidando com a síndrome de Tourette. Então, ele provavelmente passava mais tempo jorrando palavrões involuntários do que bolando ditados mordazes.

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A questão é a seguinte: a maioria das pessoas em Londres está cansada da vida. É só ver as filas naquelas lojas de departamento em Westfield, ou a reação no metrô quando um bebê começa a chorar, para perceber que essa é uma cidade que está permanentemente na pior. É possível viver em Londres e estar cansada dela sim, porque – diferente da época do Sr. Johnson – Londres não é mais um punhado de ruas de paralelepípedo e uma prisão grande e velha. Ela é a última metrópole num país que naufraga num continente faminto, uma ilha dentro de uma ilha vazando nos Home Counties como uma mancha de óleo de concreto.

Eu cresci em Londres, assim como meus pais e meus avós. A cidade pode ser um lugar incrível para se viver, e, para ser honesto, provavelmente eu não conseguiria morar em nenhum outro lugar. Há muitas razões para uma em cada dez pessoas chamar um dos 32 distritos de lar, mas também há bons motivos para um monte de gente desistir da vida e se mudar para aquele buraco de classe média que é Brighton.

Razões tipo essas:

Pubs Chiques

Em algum lugar do caminho, os taverneiros de Londres decidiram que não estavam contentes com seus destinos. Eles decidiram que não estavam ali unicamente para fornecer um santuário para quem tinha uma vida tão escrota em casa, que preferia pagar mais para beber menos numa sala úmida cheia de gente perigando ter cirrose. Os proprietários decidiram que queriam educar sua clientela. Eles queriam que as pessoas aprendessem sobre petiscos de bar artesanais e cervejas de barril, que elas enchessem o nariz com o cheiro de comida que não podem pagar e jogassem jogos de tabuleiro de criança enquanto bebem pints checas de água da chuva a £4,50.

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Primeiro, esses lugares só existiam em bairros como Muswell Hill e Sheen, mas hoje até aqueles pubs que você vê sendo construídos com blocos de concreto vendem sanduíches com o prefixo “chique”. Os Wetherspoons têm uma má reputação por causa da decoração limpinha, ovos de micro-ondas e óculos Grey Rage, mas pelo menos você não precisa ter uma renda terciária para sentir raiva dentro deles.

Escória de West End

Sabe por que ninguém mais vai para West End? Talvez porque, todo final de semana, a área entre a BT Tower, o sinal de neon da TDK, o Hyde Park e o Centre Point vira uma fábrica boschiniana de babacas. Na verdade, não estou sendo justo. O lugar não produz tantos babacas quanto atrai – no início da noite, nos bairros vizinhos, é possível ver esse pessoal se aproximando do alvo: caras nojentos de jeans bootcut, putos porque os táxis com o sinal apagado não param para eles, Hummers pink levando e trazendo uma mulherada cacarejante pela Seven Sisters Road e tios de Canary Wharf com a cara mais laranja do que a passagem de trem de volta enfiada na carteira deles.

O jogo está acabando para a Zona 1; logo, isso só vai existir como um núcleo de inferno turístico, a cidade vai se definir por suas expansões e seu coração será como um Centre Parcs, só que com menos passeios de bicicleta em família e mais bordéis diurnos que cobram por hora.

Papo Furado Pitoresco

Isso é quase um tropo da Londres do velho mundo, que ainda não foi cooptada pelo tipo de puto que assina a The Chap e passa o verão falando do Shard no Facebook. Londres tem uma história sombria e rica, e, pouco a pouco, cada pedacinho dela vai sendo vendido por uma loja não mobiliada em “Stokey”, para novos adultos que se vestem como apresentadores da CBBC e expatriados de Melbourne que têm inveja de antiguidades. Já tivemos cera de bigode, bailes de salão, ópio (provavelmente) e molduras de porta, então, acho que, se você for um desses idiotas, você também vai gostar de cólera, ataques aéreos e um turno de 48 horas numa oficina que usa trabalho infantil.

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Um dos principais sintomas dessa pandemia de papo furado pitoresco é o cupcake, um gênero alimentício que funciona como o significante mais inócuo de racismo arraigado concebido pelo homem. Quem realmente gosta de cupcake? É o tipo de coisa que você come metade e dá o resto pro cachorro.

Clapham

Apesar dos preços das casas e do que as estatísticas oficias da Polícia Metropolitana dizem, Thamesmead e Edmonton não são os piores lugares de Londres. O pior lugar de Londres é Clapham. O que há de tão errado na frondosa e rica Clapham, você me pergunta? Bom, principalmente as pessoas. Pode parecer injusto, mas só se você nunca passou uma manhã de sábado aterrorizante assistindo a torcedores do Millwall brigar pelos últimos sais de banho atrás da estação Clapham Junction. Ou uma tarde de sábado assistindo a moleques norte-americanos jogar ultimate frisbee lá. Ou uma noite de sábado vendo uma sucessão interminável de bombados australianos, cheios de escárnio, tentando xavecar sua namorada.

Não vá para Clapham. Não interessa quão bom é o Slug & Lettuce de lá se você se sente preso num tipo de peep show do Grand Guignol.

“Ciclistas”

Existem dois tipos de pessoas. Pessoas que fazem alguma coisa, consideram isso apenas uma parte necessária de suas existências e seguem com a vida, e pessoas que se definem pelo que fazem. Essa é a diferença entre quem come comida e os “foodies”, gente que têm blogs e blogueiros e, o caso mais extremo, pessoas que andam de bicicleta e “ciclistas”.

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Não vejo problema nenhum em ir de bicicleta para o trabalho, você vê partes da cidade que não vê do ônibus e fica se sentindo menos um puto mimado que está sufocando o planeta. Mas eu não explodo essa faísca de autorrespeito num incêndio florestal de pretensão.

E há outros usuários desse tipo de transporte que são as piores pessoas: designers gráficos que passam o dia postando piadas hilárias tipo Nathan Barley na sua seção de comentário, depois passeiam pela “Roundabout do Silício” em micro scooter, ou aquelas pessoas que escolhem passar a noite de sexta desfilando pelas ruas num bando de ciclistas enquanto as pessoas gritam “babacas!” para eles. Mas é engraçado quando isso acontece e você vê a luzinha no banco dos machos beta piscando furiosamente enquanto eles desaparecem mais à frente.

Londonistas

Há essa raça de londrino (quase nenhum deles é originalmente de Londres) que acha que a cidade é um grande RPG da vida real, um lugar que não pode ser navegado sem um mapa de “tesouros escondidos” da Time Out. A quantidade de vezes que escapei do caos de uma festa na casa de alguém, desesperado por alguma cafeína, proteína ou suco de laranja para melhorar meu estado, unicamente para ser confrontado com “Você nunca foi ao Cafe Oto? Você tem que ir! O gammon kedgeree deles é de morrer!”. Ô seu filho da puta, eu só quero beber alguma coisa quente que não tenha gosto de ecstasy, foda-se essas dicas de blog escroto que você fica jorrando para me impressionar.

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O South Bank

Claro, lá tem uma vista bem interessante de lugares que você viu nos filmes do James Bond da era Pierce Brosnan, mas sério, deixe o South Bank para os turistas e finalistas do Britain's Got Talent. É uma ideia “Richard Curtis no Epcot” do que Londres realmente é, uma ideia gentrificada, diluída e excessivamente planejada de uma cidade que, na verdade, é definida principalmente por seu fluxo caótico. O lugar parece mais uma vila modelo de Londres feita por um jardineiro provinciano que nunca esteve lá – claro, o Tate Modern, o British Film Institute, o Royal Festival Hall, etc. estão lá, mas também pubs frequentados exclusivamente por quem só assiste rugby e centenas de quiosques que cobram £2,50 numa lata de Fanta morna.

O Cabaré Alternativo

Existem dois grandes crimes da mídia inglesa do começo do século 21. Um é o escândalo Leveson, o outro é a perpetuação do mito de que cabaré e burlesco são alguma coisa além de uma merda total. Um escritor melhor do que eu uma vez descreveu o burlesco como “supletivo de stripper”, e eu concordo completamente. É, eu sei que isso faz você se sentir “empoderada”, eu sei que você tem ideias condescendentes sobre “mulheres de verdade”, mas isso não muda o fato de que isso que você faz é um puta saco.

Não só é um negócio brega, também é um negócio desonesto. Por alguma razão, Londres virou o epicentro dessa loucura; a Time Out tem um seção de cabarés e a BBC Londres sentiu a necessidade de fazer um programa sobre uma ex-professora que dança numa taça de martini gigante. Pelo menos os velhos esquisitos que frequentam casas de strip-tease não mentem para si mesmos. Deixe essas coisas no Edinburgh Festival, gente.

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Turistas

É fácil culpar os turistas, mas sério, eles são os ancestrais de toda essa imundice. E não estou sendo xenofóbico, famílias de Rotherham (as portas estão abertas, é só entrar!) são piores do que quem vêm do exterior porque são mais cúmplices. São as pessoas que ficam paradas do lado errado da escada rolante, que não se importam de pagar £4 num pint, que vão ver Spamalot, pessoas que justificam a monarquia numa sociedade democrática do século 21.

Foram eles que originaram esse inferno que descrevi acima, os instigadores, os Oppenheimers. Eles estão em toda parte e em lugar nenhum, exércitos de fantasmas sem rosto de mochila vermelha que existem como um estereótipo errante, um demônio popular de quem os londrinos podem reclamar. Eles vão embora logo, mas sua atitude mão-aberta faz a gente ir dormir com medo do chuveiro gelado da manhã seguinte e da bota do oficial de justiça na nossa porta.

O Estado Perpétuo de Falência

Aluguel de um flat comum de 1 quarto no centro de Londres: £495 (por semana)
Preço médio do pint no centro de Londres: £3,50
Preço médio de uma refeição para dois (incluindo o vinho):__ £40
Passagem de ônibus: £2,40
Ingresso de cinema no Odeon Leicester Square: £13

Bom, acho que esse é o preço que você deve pagar por não morar em Skipton.

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