Está-se bem em Paredes de Coura

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Música

Está-se bem em Paredes de Coura

A romaria minhota do rock alternativo.

Ignorar a história edificada por este festival é um pouco como saltar a consciência do que aconteceu este ano nas margens da praia do Taboão. Há 20 anos que Paredes de Coura se veste a rigor de transeuntes esfomeados por música e que se promove como a romaria nacional do rock alternativo, porque existe uma urgente necessidade em afirmar-se como tal. Essa necessidade é notória para a vila minhota e para toda a gente que, religiosamente, vai coleccionando pulseiras nos pulsos como se mais fosse mais uma pena num índio. Mesmo para mim, que estou longe de ser novato nestas andanças, esta edição de 2013 demarcou-se das demais por um forte manifestação de vitalidade perante outros festivais. Sim, Paredes este ano marcou uma posição claríssima. Já não está à procura de um espaço, está a afugentar com sucesso os predadores desse espaço. Não falamos de um festival qualquer. Falamos de uma experiência sociocultural que desde 1993 vai esperando pacientemente por um lugar ao sol na sombra de um Vilar de Mouros que, então, dominava de forma aristocrática aquele território encantado.

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Com a chegada de outros tubarões como o Alive ou o Super Rock, este western começou a ser demasiado pequeno para tantos pistoleiros e novamente uma decisão nuclear teve de ser feita. Vamos competir com eles ou vamos tentar ocupar um papel autónomo? 2013 foi o corolário desta segunda opção. Preparar o caminho para aquele festival que em 2000 lançou os Coldplay (não gozem, a street cred dos gajos era bem diferente da que é hoje) foi o de diferenciar pela qualidade, sendo rampa de lançamento para outros “preguiçosos”. Uma espécie de Milhões de Festa em ponto ampliado. Um festival que ainda esconde aquela inocência, bem patente na cara de muitos. Os dois dias que antecederam a tríade final deram o aquecimento para uma semana que seria bem extensa e que teve na sua base um dia mais ou menos (terceiro), um monumento ao tédio (quarto) e um renascimento em grande (quinto e último). Provavelmente é nisto que as principais cabeças deste festival se deviam concentrar no futuro. Para quê uma programação tão vasta se tudo se torna tão disperso e ondulante? Por que não uma aposta concludente em algo que estaria visto à partida: bandas excelentes que darão SEMPRE grandes concertos e manequins que só estão a alimentar uma máquina trendy que se imiscui superficialmente. Desde a total negação do conceito de concerto que os The Knife protagonizaram (atenção, isto não é uma crítica negativa), à reiteração de grandiosidade dos Calexico e Belle & Sebastian, para uns The Horrors, mimetismo shoegaze que em condições normais não tocariam em lado nenhum. É claro que o cancelamento dos The Kills é alheio a uns Echo & The Bunnymen que foram o maior bocejo desta edição. Sentia-se um desgosto colectivo por parte daquele público, mesmo o mais velho. Grandes sequências? Unknown Mortal Orchestra, Alabama Shakes e Bombino. O concerto deste último foi estratosférico. O blues e todos os ritmos africanos de que o ocidente se apoderou estão em guia de marcha para a casa-mãe. O melhor guitarrista da actualidade é tuaregue e a capacidade de quatro homens fazerem uma festa daquelas, de forma tão simples e directa, leva-nos a pensar o que a complexidade estética e estilística trouxe de frio e calculista a uma atitude tão simples perante a vida: dançar. Aproximamo-nos vertiginosamente do que uma cerimónia musical deve ser. Na sexta-feira, Iceage lança a maior provocação intencionada do festival, naquele hardcore militarista, de rejeição suburbana com uma postura deliberadamente distante e arrogante que muitos não compreenderam. Outros actos a ter em conta: Bass Drum of Death, And So I Watch You From Afar, Cold Cave, Delorean e Simian Mobile Disco. Os piores? Para além do que já referi, Peace, The Vaccines e Hot Chip. Nota muito positiva para Paredes de Coura, um festival que escolheu ser indissociável e que, como quase todos os outros, tem de limar algumas arestas na sua programação. Fotografia por Rui Oliveira

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